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Rodrigo Duarte
Depto. de Filosofia da UFMG
Também em sua obra escrita juntamente com Theodor Adorno, Dialektik der
Aufklärung3, aparecem inúmeras referências críticas ao Pragmatismo, sem
que, no entanto, sejam especificados nomes de autores clássicos pertencentes
a essa corrente.
1
Max Horkheimer, Gesammelte Schriften Vol.4: Schriften 1936-1941. Frankfurt (M), Fischer Verlag,
1988. Pp. 108-61.
2
Idem, pp. 162-225.
3
Theodor W. Adorno, Gesammelte Schriften 3: Dialektik der Aufklärung. Frankfurt (M), Suhrkamp
Verlag, 1981.
4
Continuum, New York, 1996. A partir daqui, essa obra será designada pela sigla “ER”, seguida pelo
número da página.
Essa situação facilmente experienciável, aponta, segundo Horkheimer, para
algo muito mais grave, em termos da história mundial, do que aparentemente
está em jogo. Seu ponto é que a redução da racionalidade ao que ele
denomina “razão subjetiva”, dependente da relação entre fins contingentes e
meios ad hoc para o seu alcançamento por parte um indivíduo, coincide com
o momento histórico em que a concepção de uma “razão objetiva” - razão
existindo fora do intelecto individual como índice do grau de racionalidade
da sociedade em questão - está completamente desacreditada. Segundo
Horkheimer,
Por muito tempo prevaleceu uma visão de razão diametralmente oposta. Essa
visão afirmava a existência da razão como uma força não apenas na mente
individual, mas também no mundo objetivo - em relações entre seres humanos e
classes sociais, nas instituições sociais e na natureza e suas manifestações. (...)
Essa concepção de razão nunca eliminou a razão subjetiva, mas a considerou
somente como uma expressão parcial, limitada, de uma racionalidade universal,
da qual os critérios para todas as coisas e seres eram derivados (ER 4-5).
Seu [da razão objetiva/rd] ataque à mitologia é talvez mas sério do que aquele da
razão subjetiva, que, concebida por si mesma como abstrata e formalística, é
inclinada a abandonar a luta com a religião e estabelecer dois diferentes ramos:
um para ciência e filosofia, e outro para a mitologia institucionalizada,
reconhecendo, dessa forma, a ambos (ER 12).
Horkheimer procura deixar o mais clara possível, sua idéia de que esse
potencial relativismo da razão subjetiva está, por definição, excluído de sua
congênere objetiva: seu vislumbre de uma possível racionalidade intrínseca à
praxis humana previne contra o flerte com qualquer forma de inumanidade
que substitua a promessa de felicidade pelo aceno com maior produtividade
ou eficiência. Essa posição fica resumida no trecho que se segue:
Os filhos podem imitar o pai que é acostumado com longas caminhadas, mas se a
formalização da razão progrediu suficientemente, eles considerarão ter cumprido
seu dever para com seus corpos se eles passam por uma série de ginásticas sob o
comando de uma voz de rádio. Nenhuma caminhada através da paisagem é mais
necessária; e assim o próprio conceito de paisagem, enquanto experienciada por
um pedestre, torna-se sem sentido e arbitrário (ER 37-8).
“Mussolini conheceu melhor a situação. Desde sempre ele se gabou de ter usado de relativismo no
confronto com os socialistas e com outras vertentes políticas” (p. 140 nota 37).
expressão, qualquer experiência de sua totalidade como uma imagem
daquilo que um dia foi chamado de ‘verdade’” (ER 40).
Mas, sem sobra de dúvida essa objeção epistemológica só pode ser entendida
dentro do âmbito mais amplo da crítica da racionalidade instrumental, na
qual estão inseridas não apenas a esfera da filosofia mas também aquelas da
ciência e da arte. E cada uma delas é atingida de modo diferenciado pelo
processo de formalização da razão: enquanto o cientista e o artista teriam
uma “independência” maior para se distanciar dos efeitos colaterais daquilo
criado por eles mesmos, o filósofo - enquanto tal - teria dificuldade de fazê-
lo sem invalidar tudo aquilo anteriormente por ele afirmado: “Como pessoa,
como reformador social ou político, como homem de gosto, ele pode se opor
às conseqüências práticas das suposições científicas, artísticas ou religiosas
do mundo tal qual é; sua filosofia, entretanto, destrói qualquer outro
princípio ao qual ele poderia apelar” (ER 51).
Ou, em segundo lugar, Dewey de certo modo concorda em aceitar certo tipo de
diferença entre desejo subjetivo e desejabilidade objetiva. Essa admissão
marcaria justamente o início de uma análise filosófica crítica - de outro modo o
pragmatismo está pronto, assim que se defronta com essa crise, a se render e
recair na razão objetiva e na mitologia (ER 54).
De certa forma, foi isso que fez Apel ao tentar incorporar certos ganhos da
filosofia pragmatista numa concepção transcendental renovada pelo advento
da filosofia analítica de extrato wittgensteiniano, falhando, a meu ver, apenas
no grau de radicalidade do teor crítico de sua “Pragmática Transcendental”6
(mal do qual padece também a “Teoria da Ação Comunicativa” de
Habermas).
6
Karl Otto Apel, Transformation der Philosophie. Band 2: Das Apriori de Kommunikationsgemeinschaft.
Frankfurt (M), Suhrkamp, 1993. Ver especialmente: “Von Kant zu Peirce: Die semiotische Transformation
der Transzendentalen Logik” (pp. 157-77) e “Szientismus oder transzendentale Hermeneutik? Zur Frage
nach dem Subjekt der Zeicheninterpretation in der Semiotik des Pragmatismus” (pp. 178-219).
Esse é o estofo legado por Horkheimer para nossa consideração e reflexão.
Dispensável dizer que a rápida e enérgica expansão da influência do
pragmatismo por todo o mundo contemporâneo vem se dando como um
processo paralelo ao aprofundamento e consolidação do capitalismo em sua
versão monopolista - fenômeno visível a olho nu sob o título de
“globalização da economia”. Seria esse paralelismo mera coincidência?