Sendo intrínseco a todos a todos os seres humanos, o melhor de nós
existe e está sempre lá. Por que será tão difícil, por vezes, trazê-lo ao de cima? Porque escolhemos ignorá-lo, permitimos que nos anulem esse legado ou, no limite, convencemo-nos de que não somos suficientemente válidos para o ter e, como tal, não podemos ir buscar? As respostas são múltiplas. Pode ter a ver com a forma como fomos educados – a liberdade a mais ou a menos que nos foi dada, a medida de amor e desamor que recebemos - e a forma como encaramos e gerimos o que vivemos. Mas também com a influência que algumas pessoas têm sobre nós, embora os especialistas esclareçam que, em parte, somos responsáveis pelo que nos acontece.
A formúla é simples: as pessoas que não nos valorizam não
nos merecem. Logo, há que ter a coragem de as manter longe. É válido nas relações de amor e amizade.
O estado de satisfação é uma capacidade que se conquista com
algum esforço, exercitando as emoções positivas. E que é possível modificar fisicamente o cérebro por meio dos pensamentos que escolhemos ter. Todas as pessoas têm capacidades que, activadas, são um caminho para o conhecimento de si, para a coragem e para a esperança, para resiliência e para a felicidade. Quem o garante é Ana Caetano, psicóloga clínica e terapeuta em brainspotting, uma abordagem neuropsicológica dos traumas. Os psicólogos Martin Seligman e Christopher Peterson chamam-lhes virtudes e forças, e classificam- nas. Ao todo, as primeiras são 6; as segundas são 24: VIRTUDES e FORÇAS Cada virtude inclui várias forças de carácter: o Sabedoria – criatividade; curiosidade; abertura a novas ideias; gosto pela aprendizagem; perspectiva o Coragem – valentia; perseverança; integridade; vitalidade o Humanidade – amor; bondade; inteligência social 1 o Justiça – cidadania; liderança o Temperança – perdão; humildade e modéstia; prudência; autocontrole o Transcendência – apreciação pela beleza e excelência, gratidão; esperança; bom humor espiritualidade. A terapeuta diz que costuma ter sempre uma lista com a classificação dos 2 especialistas em Psicologia Positiva para dar aos pacientes que duvidam ter estas competências. “A percepção que a pessoa tem de si, às vezes, está desfocada. O que acontece é que estamos muito focados no que pode acontecer-nos de mal e nas características negativas”. Comenta Ana Caetano. Em termos evolutivos, as coisas más têm um valor de sobrevivência. “Quem arquivou mais experiências de medo ficou mais preparado para o que pode pôr em perigo a vida”. Ainda temos “uma educação muito focada no erro. Aquilo em que eu foco a minha atenção é aquilo que acaba por se tornar a minha realidade”. “Não podemos impedir-nos de sentir, podemos é gerir aquilo que sentimos.” Ana Caetano fala na possibilidade de olhar as emoções como se fossem uma bússola: tal como este instrumento, dizem-nos onde estamos e podem orientar-nos. “É preciso ser pró-activo e procurar porque é que eu sou de determinada forma. E, em alguns casos, o que é que eu ganho em pensar sempre o pior”, diz Ana Caetano. “O melhor de nós a nível mais profundo, mais psicoterapêutico, até mais espiritual, está na nossa essência”, defende a psicóloga clínica e psicoterapeuta somática Maria Del Mar Cervantes, directora do Centro Português de Biossíntese. Lembra que a nossa essência é um lugar isento de culpas. E defende que o contacto de cada um com o seu melhor passa por um trabalho profundo de entrega e compromisso. Apresenta a biossíntese como uma forma de lá chegar – a psicoterapia somática com uma abordagem multidimensional do ser humano, que constitui a “integração da vida”. Ao contrário da ruptura com o que se foi acumulando ao longo dos tempos, sejam falsas visões sejam experiências dolorosas – a que Maria Del Mar se refere como “as máscaras que vamos acumulando” -, a especialista propõe a integração das mesmas. Esta integração pode de forma serena, homenageando o passado que nos acompanhou – essas que já não nos sirvam, como a vergonha excessiva, o stress e a tensão, mas que, em algum momento, nos foi útil”. O objectivo de integrar estas camadas que foram obstruindo a nossa essência não é ficar perfeito, iluminado ou curado, sublinha, “mas o de se estar a caminhar sempre e a melhorar sempre, como ser humano, descobrindo o que se é e o que nos faz pulsar”, de forma a atingir cada vez mais um estado de satisfação. “Precisamos de regredir para progredir”, conclui. 2 Ana Caetano apresenta o brainspotting como uma via para trazer ao de cima o melhor de nós. Justifica-se tanto mais quanto o bloqueio se fique a dever à vivência de experiências traumáticas. A outra via igualmente eficiente a este nível é o EMDR (Eye Movement Desensitization and Reprocessing em português Dessensibilização e Reprocessamento através do Movimento Ocular). Independentemente da abordagem que se escolha, é importante rodearmo-nos de pessoas boas que gostam de nós e de quem nós gostamos, e de nos mantermos perto de quem nos valoriza.