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Universidade de Brasília

Faculdade de Tecnologia
Departamento de Engenharia Florestal

AYAHUASCA: A SACRALIDADE DA FLORESTA E


A CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA

Aluno: Fabrício C. G. da Vinha


Matrícula: 97/03616

Orientador: Ildeu Soares Martins


Co-orientadora: Rosana de Carvalho Cristo Martins

Trabalho Final de curso apresentado ao


Departamento de Engenharia Florestal
como requisito parcial para obtenção
do grau de Engenheiro Florestal

Brasília, 2005
Universidade de Brasília
Faculdade de Tecnologia
Departamento de Engenharia Florestal

AYAHUASCA: A SACRALIDADE DA FLORESTA E


A CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA

Aluno: Fabrício Cavalcanti Gomes da Vinha


Matrícula: 97/03616

Menção:_______

Banca Examinadora

___________________________
Ildeu Soares Martins, Doutor
Orientador

___________________________
Rosana de Carvalho Cristo Martins, Doutora
Co-Orientadora

___________________________
Manoel Cláudio da Silva Júnior, PhD
Membro da Banca

Brasília, 01/07/2005
Agradecimentos

Agradeço à Deus pela força, carinho e amizade.


E por me auxiliar muito a realizar este trabalho.
Agradeço pela presença de Rubenite e Davi na minha vida
e pelo carinho e felicidade que me proporcionam.
Agradeço à minha mamãe querida pelo o que
só as mães podem fazer...
Agradeço aos meus queridos avós
pelo amor e direcionamento.
Agradeço ao Mestre Francisco e à nossa
Grande Família.
Agradeço aos meus queridos amigos pela força
em especial Camila pelo incentivo
de concluir este curso.
Agradeço aos professores Ildeu, Rosana e Manoel Cláudio
por acreditarem neste trabalho, pela boa vontade e
disponibilidade.
Agradeço aos pesquisadores: Emmanuel, Rafael, Florencia e Bia Labate.
Agradeço à Heloísa Dini e Pd. José Ricardo pelo grande suporte.

Dedicatória

Dedico este trabalho à Mãe Divina,


à Pachamama e
àquela que se doou para que eu
tivesse onde escrever
este trabalho:
Sra. Árvore.

“ A educação é a capacidade de perceber as conexões


ocultas entre os fenômenos.”

Vaclav Havel
(Ex-Presidente da República Checa)
RESUMO

No presente trabalho foi elaborado um questionário com base numa revisão de


literatura, onde foram abordados os temas: o sagrado e a floresta, considerando os
costumes religiosos entre o homem e a floresta no decorrer da história; a ayahuasca,
mostrando sua origem e seu tratamento atual pelo governo e pela população em geral;
e a consciência ecológica, com as bases e fundamentos deste conceito. Num outro
tópico relevante, foram feitas algumas conexões entre os temas abordados e a
engenharia florestal. Os resultados do questionário mostraram que os indivíduos
entrevistados relacionaram a sacralidade à floresta e deram crédito à consciência
ecológica como uma virtude humana. Poucas pessoas conheciam a ayahuasca e
também houve pouco interesse do público em conhecer este ritual.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Vista espacial do planeta Terra........................................................................... 3


Figura 2 – Posição de Yoga Vriksha-asana ......................................................................... 4
Figura 3 – Desenho esquemático de Yggdrasil.................................................................... 9
Figura 4 – Os animais que habitam Yggdrasil...................................................................... 10
Figura 5 – Representação da Árvore da Vida egípcia.......................................................... 13
Figura 6 – Árvore da Vida da Cabala................................................................................... 14
Figura 7 – Santuário na árvore ............................................................................................ 20
Figura 8 – Foto de um xamã................................................................................................ 23
Figura 9 – Recipiente contendo a ayahuasca ...................................................................... 25
Figura 10 – Banisteriopsis caapi.......................................................................................... 27
Figura 11 – Ilustração científica de B. caapi......................................................................... 28
Figura 12 - Psychotria viridis................................................................................................ 29
Figura 13 – Ilustração científica da P. viridis ........................................................................ 30
Figura 14 – Desenho feito por um xamã sobre uma visão proporcionada pela ayahuasca .. 31
Figura 15 – Sr. Raimundo Irineu Serra (Mestre Irineu)......................................................... 35
Figura 16 – Sr. Francisco Souza de Almeida (Mestre Francisco)......................................... 38
Figura 17 – Produção de mudas de B. caapi realizada pelo Centro de Cultura Cósmica..... 43
Figura 18 – Representação artística de Gaia....................................................................... 49
Figura 19 – Gráfico da Análise Geral................................................................................... 60
Figura 20 – Gráfico da Análise Específica .......................................................................... 61
Sumário

1- Introdução........................................................................................................... 1
2- Revisão de Literatura...................................................................................... 7
2.1 As florestas e o sagrado ........................................................................ 7
2.1.1 Árvores Simbólicas ......................................................................... 7
2.1.2 Crenças e Cultos das Árvores..................................................... 15
2.1.3 Florestas Sagradas ......................................................................... 19
2.1.4 Êxtase Vegetal: as Seivas Mágicas ........................................... 22
2.2 Ayahuasca: o vinho da floresta ........................................................... 24
2.2.1 Origens ................................................................................................ 24
2.2.2 Igrejas Atuais..................................................................................... 33
2.2.3 A Ayahuasca e a Legalidade........................................................ 39
2.2.4 Alquimia vegetal..................................................................... 44
2.3 Consciência ecológica .................................................................. 46
2.4 Conexões ocultas .......................................................................... 52
3- Material e métodos............................................................................... 57
4- Resultado e discussão ........................................................................ 60
5- Conclusões ........................................................................................... 68
6- Recomendações e sugestões............................................................. 70
7- Referências Bibliográficas .................................................................. 72
8- Anexos
(Anexo 1) Parecer do Confen de 1986
(Anexo 2) Ata da 5ª Reunião do Confen
(Anexo 3) Resolução 004/2004 do Conad
(Anexo 4) Carta de Princípios para o uso da ayahuasca
(Anexo 5) Registro de Plantio de B. caapi e P. viridis
(Anexo 6) Autorização para exploração de PMFS
(Plano de Manejo Florestal Sustentável)
(Anexo 7) Autorização para Transporte de Produto Florestal (ATPF)
(Anexo 8) Questionário Aplicado em Campo
1

1 – INTRODUÇÃO

Buda define a floresta como “um organismo especial de bondade e benevolência infinitas
que não faz nenhuma exigência para o seu sustento e espalha generosamente os frutos de sua
atividade vital. Ela fornece proteção a todos os seres e oferece sombra até mesmo ao lenhador
que a destrói.”
Todos dependem de alguma forma da benevolência das árvores. Além de embelezarem a
paisagem elas servem como lar para muitos seres. São elas que ajudam a regular o clima e a
conter a erosão que mata o solo. Quimicamente transduzem1 a energia solar e fixam carbono. São
fonte de alimento e remédios. Existem muitas funções para elas. Até mesmo aqueles que estão
cegos pela ambição, delas se beneficiam pois são a fonte de matéria-prima para a confecção do
papel moeda.
Muitos povos da antiguidade prosperaram devido ao uso da madeira. Seu valor era
comparado às vezes como o do ouro. Na Mesopotâmia, durante o reinado de Naramsin
(aproximadamente 2254-2218 a.C.), as ordens para saquear as cidades priorizava a busca por
madeiras.
A devastação das florestas em várias civilizações alcançou índices tão altos que
acarretaram medidas para a preservação deste recurso. Hamurabi (1792-1750 a.C.), assustado
com a devastação elaborou a seguinte sentença: “se eu constatar dano feito a um galho sequer
[...], não tolerarei que o culpado por esse crime continue vivo”.A pena de morte para quem
cortasse uma árvore também existia no direito de países como Roma, França, Itália e Alemanha.
Roma e Egito propulsaram seu desenvolvimento com o uso da madeira. Da mesma forma,
quando este recurso tornou-se escasso seus impérios decaíram. Em Roma, grandes áreas
florestais deram espaço para ovelhas e agricultura. Mesmo naquela época existiam pessoas
capazes de prever os danos causados pelo desmatamento, mas poucos davam-lhes crédito.
Percebe-se uma similaridade dos problemas ambientais antigos com os atuais. A diferença
é que hoje a destruição é mais fácil e potente.
Alguns povos antigos estabeleciam um contato sagrado com a floresta. Ela serviu de
templo ao ar livre e local de retiro espiritual para sábios. Esta relação também ajudava na

1
Transformar um tipo de energia em outra. Neste caso, converter a energia luminosa do sol em energia química.
2

preservação destes lugares. Acreditava-se que as matas eram morada dos deuses e por eles
protegidas.
Existia a crença de que se certas áreas florestais fossem molestadas recairia sobre os
homens a maldição dos deuses, na forma de prejuízo na agricultura ou doenças. É interessante
notar o reflexo desta crença nos dias atuais: quando o desmatamento avança muito nas áreas
silvestres aparecem novas epidemias e a terra é lixiviada. Mesmo sem possuir o conhecimento
científico de hoje, intuitivamente alguns homens sabiam que o uso desordenado dos recursos da
natureza não era uma atitude ‘natural’.
Observando a atitude do homem que destruiu muito de suas florestas, como é o caso da
Europa que possuía imensas extensões de áreas silvestres, e continua a destruir, conclui-se que
ainda persiste no homem um antigo hábito destrutivo.
O que falta então para que sejam tomadas as medidas equilibradoras que garantirão a
existência dos recursos naturais para as gerações futuras? Pode-se supor que o conhecimento
científico e os recursos financeiros sejam suficientes para trabalhar o desenvolvimento
sustentável. Mas os fatos mostram que ainda falta algo. Pois um dos países mais ricos do mundo
e que já foi até a lua recusou-se em colocar seu nome no Protocolo de Quioto2.
Qual seria o fator capaz de fazer o ser humano preservar a natureza e sua espécie? O que
dizer de mais consciência no manejo e uso dos recursos naturais e que o homem conheça mais
sua casa através da ecologia e a administre através da economia. Ele deve se desapegar dos
antigos paradigmas, pois são estes que dão suporte para as decisões dos homens que detêm o
poder e os atos resultantes, em sua maioria, mostram que eles não tratam bem de sua Oikos3 e dos
seres residentes deste mesmo lugar.
Os astronautas que foram à lua tiveram experiências capazes de mudar suas vidas. Não
apenas pelo privilégio reservado à poucos de pisar no solo lunar, mas um privilégio maior,
enxergar a Terra do espaço. Estes homens, imbuídos de uma missão essencialmente científica
puderam dar pequenos passos para além das fronteiras da mente. Trazendo novas idéias para um
novo paradigma.
O astronauta James Irwin disse: “a Terra nos recorda uma árvore de Natal dependurada no
fundo negro do universo. Quanto mais nos afastamos dela, tanto mais vai diminuindo seu

2
O protocolo de Quioto é um documento feito no Japão em 1998. Nele, vários países concordam em diminuir a
emissão de gases poluentes na atmosfera com o intuito de não alterar as condições climáticas planetárias.
3
Casa em grego e raiz das palavras ecologia e economia.
3

tamanho. Até finalmente ser reduzida a uma pequena bola, a mais bela que se possa imaginar.
Aquele objeto vivo tão belo e tão caloroso parece frágil e delicado. Contempla-lo muda a pessoa,
pois ela começa a apreciar a criação de Deus e a descobrir o amor de Deus”. Outro astronauta,
Gene Cernan, ao contemplar a Terra sentia-se “[...] interiormente, obrigado a louvar a Deus. Deus
deve existir por ter criado aquilo que eu tinha o privilégio de contemplar”.

Figura 1 – Vista espacial do planeta Terra

Um dos objetivos deste trabalho é abordar uma nova consciência que começa a surgir nos
seres humanos. Ela vem unindo uma visão holística4 e espiritual com a ecologia. Pode-se chamá-
la consciência ecológica. Como eixo indispensável de discussão, será tratada também sua relação
com a engenharia florestal.

4
Do grego Holos (o Todo). Esta é uma perspectiva que engloba todas as partes interconectando-as num todo
indivisível.
4

Outro tema que objetiva enriquecer a literatura das ciências florestais é a etnobotânica.
São poucos os trabalhos científicos que abordam este tema e mais escassos ainda são os que
tratam da sacralidade da floresta.
Muitos textos sagrados antigos construíram relações entre o homem e as árvores. Seja em
suas simbologias e mitologias ou na relação direta em que certa árvore era considerada como a
manifestação de alguma deidade. Em certos casos, imensas florestas eram consagradas à um deus
específico.
Esta relação entre o homem e a árvore assumia posições em que aquele se confundia com
esta. Foi por isto que um dos grandes filósofos, Platão, expressou este pensamento: “o homem é
uma planta invertida, cujas raízes se estendem para o Céu e cujos ramos mergulham na Terra”. A
antiga Índia deixou um legado cultural riquíssimo. Num de seus ramos do sistema de Yoga5
(Hatha Yoga) existe uma posição (ásana) do corpo humano que tenta imitar uma árvore. Esta
posição chama-se vriksha-asana6. Enquanto o praticante realiza esta posição, ele imagina que
seus pés são raízes, as pernas um tronco e os braços e cabeça os galhos de uma árvore.

Figura 2 – Posição de Yoga Vriksha-asana

5
Em termos gerais yoga são técnicas mentais e físicas que buscam trazer equilíbrio interior e união com Deus.
6
Vriksha em sânscrito (língua antiga da Índia) significa árvore.
5

O registro histórico da relação mágica entre o homem e as florestas pode enriquecer a


engenharia florestal. Pois tudo que relaciona-se com as florestas de algum modo está ligado a
engenharia florestal.
Neste trabalho encontram-se argumentos que ressaltam o lado ‘poético’ contido na relação
do homem com a natureza e a floresta. Sem, contudo, diminuir a importância da ciência pura.
Mas tende-se para este lado menos palpável, pois a maioria do enfoque sobre a natureza a encara
como um ‘tubo de ensaio’.
Buscando ainda enriquecer a literatura da engenharia florestal, este trabalho tem como
objetivo divulgar uma prática religiosa nascida no seio da floresta amazônica. É o uso ritualístico
da ayahuasca7. Ayahuasca é um chá preparado com duas plantas amazônicas e foi tradicional e
culturalmente transmitido pelos ancestrais indígenas até chegar aos grandes centros urbanos.
Mas não é só no Brasil que a ayahuasca ganhou espaço e importância. Vários cientistas do
exterior, das mais famosas universidades, interessaram-se em estudar este fenômeno religioso.
Outro objetivo deste trabalho é buscar possíveis conexões dos temas aqui apresentados
com a engenharia florestal. Para isso, o recurso utilizado será uma revisão bibliográfica.
Como o uso ritualístico da ayahuasca é uma das únicas religiões brasileiras e está
intimamente relacionado com a floresta (os constituintes do chá são produtos florestais não
madeireiros) a intenção de divulgar este tema para a comunidade científica e para o público em
geral é importante. Pois existem muitos tabus e informações erradas sobre os rituais
ayahuasqueiros8.
Outro objetivo esperado é a constatação do nível de conhecimento público a respeito do
uso da ayahuasca e também verificar se algumas idéias que serão apresentadas na revisão de
literatura assemelham-se com a opinião pública atual.
Até aqui foram expostos os objetivos específicos. Abaixo está uma lista com os objetivos
gerais:
• Mostrar a ligação da natureza com o ser humano numa visão holística;
• Mostrar que a ayahuasca pode contribuir para a consciência ecológica;
• Oferecer uma nova perspectiva ao mundo acadêmico sobre a natureza;

7
Palavra de origem quíchua que significa ‘cipó dos espíritos’.
8
Relativo a ayahuasca.
6

• Incentivar trabalhos que enfoquem este tipo de abordagem onde se encontram:


etnobotânica, religião, floresta e meio ambiente.
7

2 – REVISÃO DE LITERATURA

2.1 – AS FLORESTAS E O SAGRADO

2.1.1 Árvores Simbólicas

A concepção de uso que a maioria das pessoas possuem para atribuir a uma árvore limita-
se aos produtos ‘palpáveis’ que ela pode oferecer. Citando alguns: frutos, folhas, cascas e raízes
para remédios naturais, sementes para propagação ou adornos, óleos, resinas; em outro campo
servem como embelezadoras de ambientes para paisagistas ou plataforma de diversões infantis.
Sua madeira pode ser usada para construção civil, naval e como combustível. Para esgotar esta
lista é necessário conhecer muitas culturas e costumes mundiais.
Dependendo da interação e objetivo de estudo, novas abordagens podem se agregar a
multifuncionalidade de uma árvore. Para um ecologista ela se afigura como um ‘microcosmo’,
pois além da sombra produzida relevante para o estudo do cientista, seus galhos acolhem animais
vertebrados, invertebrados e até outras espécies do reino vegetal.
Sua representatividade como indivíduo possui importância que extrapola os limites de seu
organismo, principalmente quando muitas árvores estão juntas formando as florestas. Influenciam
a área que ocupam e a das regiões vizinhas nos processos: climáticos, do fluxo aquático de micro-
bacias, de erosão, e de lixiviação.
Nas florestas puderam ser encontrados os primeiros habitantes dependentes dos recursos
oferecidos pela natureza: o índio. Durante as descobertas de novas terras, o homem civilizado o
encontrou, e muitas vezes chamava-o também de selvagem.
O termo selvagem possui um significado ambíguo referente à agressividade e à selva
(THOMAS, 1983). Então os selvagens que viviam nas florestas, como os índios, foram os
primeiros homens a conviver com os seres chamados ‘árvores’. Dentro da cosmologia dos
silvícolas, lendas atribuíam nomes e valores culturais para as árvores que agora viviam como
integrantes do cotidiano das tribos.
Aborígines de várias regiões do mundo tiveram seu contato com as árvores e a viam como
um ser. Mesmo recebendo denominações diferentes, referentes a cada idioma, o objetivo de
8

denominar ‘algo de superfície áspera, geralmente de grande estatura, com ramificações e bordas
superiores verdes’ com palavras de seu dialeto que signifiquem ‘árvore’, parece ser algo de fácil
compreensão, pois o homem da cidade também tem seu termo ‘árvore’. Porém, o desenho de uma
árvore (com suas estruturas e partes) e mais suas funções fisiológicas podem formar um símbolo
para explicar ou comparar situações e idéias de natureza não vegetal.
Para Guénon (1962) “[...] o simbolismo nos parece especialmente adaptado às exigências
da natureza humana, que não é puramente intelectual e tem necessidade de uma base sensível
para elevar-se às esferas superiores”. O processo de conceder um significado para um signo
possui algumas variações. Por exemplo, o termo ‘enraizar’ normalmente refere-se às funções
fisiológicas de uma planta, ou ainda aos processos de aprofundamento de um conceito ou
comportamento numa pessoa. O simbolismo, que resulta da interação entre signo e significado,
principalmente nas tradições religiosas e culturais, tem como intuito facilitar o entendimento dos
iniciantes ou ocultar verdades dos não preparados ao conhecimento delas.
Os povos antigos, principalmente os paleorientais9, tradicionalmente religiosos, legaram
para a posteridade conceitos de como o universo é e como este se relaciona com o homem. Um
dos principais era de que existia um centro para o universo, ligando as três regiões cósmicas. Este
ponto poderia estar em qualquer lugar da Terra e assumia por exemplo, as formas de: “Árvore do
Mundo”, “Montanha Cósmica (na qual aparecia no topo uma grande árvore)”, “Pilar Central”,
“Umbigo do Mundo” e de templos e cidades que possuíam nomes de “Vínculo entre o Céu e a
Terra” e “Casa da Base do Céu e da Terra”. E destes símbolos o mais propagado para representar
o centro e ligar as três regiões é a Árvore Cósmica (ELIADE, 1991).
Este simbolismo da árvore seria a ligação e a forma de contato entre os três planos
cósmicos: Céu, Terra e Inferno (SCHLESINGER, 1995). As raízes subterrâneas representavam
os mundos inferiores, o tronco era o mundo visível comum e os galhos estavam nos mundos
superiores. A crença dos antigos orientais era que suas cidades estavam erigidas no centro do
mundo. Como a capital do soberano chinês perfeito que deveria estar próxima à Kieou-mou (Pau
Erguido), a árvore milagrosa que ligava os três planos e as Nove Nascentes aos Nove Céus10
(ELIADE, 1991,1993).

9
Antigos habitantes do oriente.
10
Elementos da mitologia chinesa.
9

Uma das representações clássicas de Árvore Cósmica ou Árvore do Mundo é a de


Yggdrasil, também chamada de Hoddmimir’s Wood (Madeira de Hoddmimir) e Laerad. Este
mito nórdico possui diferentes versões, apresentadas segundo alguns autores (CREWS, 2003;
ELIADE, 1991; FORLONG, 1964; HINNELLS, 1989; RAMOS, 2001) que não lhe alteram o
sentido original. Segue-se uma síntese das fontes consultadas: o nome desta árvore significa
‘Cavalo de Odin’ (Yggr siginifica Odin e Drasil cavalo). Sua representação no mundo físico
assume a forma de um freixo11. Cada parte da árvore estava relacionada com um reino: suas
raízes com Nifl-heim ou Hades, seu caule com Mid-gard ou terra e seus galhos com As-gard ou
‘Casa dos Deuses’.

Figura 3 – Desenho esquemático de Yggdrasil


Suas três raízes representavam o passado, o presente e o futuro. Em sua base havia três
fontes: Mimisbrunnr (a da Sabedoria), Urdarbrunnr (a do Destino) e Hvergelmir de onde se

11
Fraxinus sp.
10

originam muitos rios. Yggdrasil simboliza a vida no universo. Seus frutos eram homens e seus
galhos abrigavam animais: quatro veados representando os quatro ventos, um esquilo, uma cobra
e a Águia de Odin. Estes dois últimos animais lutam entre si. A serpente Nidhögg tenta derrubar
Yggdrasil e a águia lhe impede. O conflito representa a disputa entre o bem e o mal.

Figura 4 – Os animais que habitam Yggdrasil

A lenda conta que Odin sofreu durante nove dias e morreu, sendo regenerado cego
fisicamente, mas presenteado pelos deuses com a ‘visão divina’. No dia de Ragnarok o gigante de
fogo Surt incendiará Yggdrasil, esta deverá sobreviver e abrigar os destinados a repovoar o
planeta.
Dentre os textos antigos hinduístas e de rituais xamânicos, várias passagens retratam a
interação entre um homem e uma árvore real que assumia a identidade da Árvore Cósmica. Ao
derrubá-la, preces lhe eram oferecidas como se realmente os participantes estivessem perante
aquele símbolo. Certas passagens retratam a iniciação do xamã subindo numa árvore ritualística
qualquer e isto representava a subida na própria Árvore Cósmica. Deste modo, podia o homem
alcançar o céu (ELIADE, 1991). Noutras tradições, para chegar à Árvore Cósmica, o aspirante
precisava ‘renascer’, passando por uma purificação (CREWS, 2003).
11

Mesmo possuindo variantes genéticas (passíveis da classificação taxonômica),


diferenciadoras das espécies vegetais encontradas em todo mundo, nos mais diversos sítios, as
árvores influenciaram o imaginário humano. Observando a árvore, o homem pode ver a opulência
dos galhos balançando no ar, a longevidade, a beleza e a perda de folhas numa época com o
reaparecimento em outra, evidenciando crescimento e regeneração constantes (CREWS, 2003;
ENCYCLOPEDIA AMERICANA, [s/d]). Estas características proporcionaram uma aproximação
do cosmos com a árvore fazendo desta um símbolo daquele.
Para os hindus o Universo é uma grande Árvore invertida: as raízes nascem no Céu e os
galhos tocam a Terra, como apresentado no Bhagavad Gîtâ (cap. 11, vers. 1-3):

Ashvatta (força creadora do cosmos), a eterna árvore simbólica, tem suas raízes, a fonte
primeira, firmadas nas alturas, no Ser Supremo, e seus ramos se desdobram para baixo
pelo mundo ‘creado’12, em incessante mutação, quem isto compreende conhece o
universo.

Este esquema representa a origem (raiz) celeste da criação e o mundo material (galhos). A
seiva que passa pelo ‘tronco’ tem forma de luz (vida) e alcança toda as coisas como o próprio sol.
Esta idéia é reforçada por um dos termos que designa a Árvore do Mundo que na língua sânscrita,
falada em tempos antigos da Índia, é Nyagrodha. Seu significado expressa a idéia de ‘crescer
para baixo’ (GUENÓN, 1962). No Céu, também estavam as raízes da Árvore da Felicidade do
Islã (SCHLESINGER, 1995).
A Árvore da Vida é outra aparição mitológica variante deste elemento. A bibliografia
disponível, no campo antropológico, histórico e religioso, não apresenta uma distinção bem
definida entre os termos empregados como ‘Árvore Cósmica’, ‘Árvore do Mundo’ e ‘Árvore da
Vida’. Possível é observar uma tênue diferença ao se referir à ‘Árvore Cósmica’ enquanto

12
O termo ‘creado’ é utilizado pelo professor Huberto Rohden (tradutor da versão do Bhagavad Gîtâ utilizada neste
trabalho), o qual é explicado por ele mesmo em todos os seus livros: “a substituição da tradicional palavra latina
crear pelo neologismo moderno criar é aceitável em nível de cultura primária, porque favorece a alfabetização e
dispensa esforço mental – mas não aceitável em nível de cultura superior, porque deturpa o pensamento. Crear é a
manifestação da Essência em forma de existência – criar é a transição de uma existência para outra existência. O
Poder Infinito é o creador do Universo – um fazendeiro é criador de gado. Há entre os homens gênios creadores,
embora não sejam talvez criadores. A conhecida lei de Lavoisier diz que ‘na natureza nada se crea e nada se aniquila,
tudo se transforma’, se grafarmos ‘nada se crea’, esta lei está certa mas se escrevermos ‘nada se cria’, ela resulta
totalmente falsa. Por isto, preferimos a verdade e clareza do pensamento a quaisquer convenções acadêmicos”.
12

representação do universo. Mas dependendo de como os termos são inseridos em cada contexto,
podem assumir semelhança de significados.
Nos mais variados tipos de ‘Céus e Paraísos’ existentes nas religiões aparece a ‘Árvore da
Vida’. Sua função comum é ser a fonte da Vida (SCHLESINGER, 1995). O ocidente a conhece,
pois está presente na difundida Bíblia Cristã. Em seu primeiro livro (Gênesis), é mencionado
estando no Jardim do Éden (‘local repleto de belas árvores’), junto com a ‘árvore da ciência do
bem e do mal’:

Ora, o Senhor Deus tinha plantado um jardim no Éden, do lado do oriente, e colocou nele
o homem que havia criado. O Senhor Deus fez brotar da terra toda sorte de árvores, de
aspecto agradável; e de frutos bons para comer; e a árvore da vida, no meio do jardim, e a
árvore da ciência do bem e do mal. (Gênesis 2, 8,9).

Já no último capítulo, Revelação (Apocalipse cap. 22, vers. 2-3), aparece com
características para curar as nações:

Mostrou-me então o anjo um rio de água viva, resplandecente como cristal de rocha,
saindo do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da avenida e às duas margens do rio,
achava-se uma árvore da vida, que produz doze frutos, dando cada mês um fruto, servindo
as folhas da árvore para curar as nações.

O Alcorão, sagrado para os mulçumanos, também relata a existência de duas árvores em


lugares imateriais. Uma oliveira (Olea europea L.) representando o centro (GUÉNON, 1962;
RAMOS, 2001) como ‘Árvore Cósmica’, dada sua localização “[...] nem oriental nem ocidental
[...]” e por sua natureza reluzente (Surata, (cap.) 24, vers. 35). Outra referência, talvez única do
gênero pois só no Alcorão foi encontrada, é a Árvore Zacum que cresce no inferno (Surata (cap.)
37, vers. 62-68):

Qual é a melhor recepção, esta ou da árvore de Zacum? Sabei que estabelecemos como
prova para os iníquos. Em verdade é uma árvore que cresce no fundo do inferno. Seus
13

ramos frutíferos parecem cabeças de demônios, que os réprobos13 comerão e com eles
fartarão seus pandulhos14.

A forte influência do significado universal da árvore aparece no Japão, China, Havaí,


Babilônia, Egito e Mesopotâmia - estes dois últimos apresentam riquíssimas expressões deste
tema (ELIADE, 1993; RAMOS, 2001).
No portão oriental do paraíso Egípcio havia dois sicômoros ( Fícus sycomorus). A
imortalidade podia ser concedida por elas e seus frutos eram para alimentar os abençoados
(CREWS, 2003).

Figura 5 – Representação da Árvore da Vida egípcia

Buda alcançou a iluminação sob a árvore Bo ou Bodhi, uma figueira (Ficus religiosa).
Quando uma espécie arbórea representa um símbolo superior todos indivíduos da mesma espécie

13
Indivíduo mal, ruim, perverso.
14
Barriga.
14

na Terra são respeitados como tais (SCHLESINGER, 1995). No centro do paraíso hindu, Jambu-
dvipa, cresce a Árvore da Vida e do Conhecimento Jambu que tem como frutos elefantes
(FORLONG, 1964).
A semelhança nos mitos da Árvore da Vida é a crença que ela concedia o dom da vida, a
longevidade e a imortalidade. Heróis lendários tentaram conquistar seus benefícios , mas no
caminho várias provas e dificuldades eram enfrentadas. Gilgamesh, herói babilônico, que após
vencer obstáculos e se apoderar de tal Árvore a perdeu por astúcia de uma serpente (ELIADE,
1993); semelhantemente ao episódio de Adão e Eva.
O Antigo Testamento bíblico (a Torá), livro partilhado tanto pelos judeus quanto pelos
cristãos, apresenta uma passagem (Êxodo cap. 25, vers. 31-37) na qual Deus manda Moisés fazer
um candelabro (a Menorá), tendo sete braços e feito em ouro. Essa é uma das expressões da
Árvore da Vida na religião judaica (RAMOS, 2001). Porém a mais difundida, alcançando mesmo
os não judeus, é a descrita na Cabala15. Nela, a representação aparece como o diagrama abaixo,
contendo as dez sefirot16que são os canais para a manifestação da energia de Ein Sof , ou Deus,
no mundo dos homens. (PROPHET, 2004).

Figura 6 – Árvore da Vida da Cabala

15
Termo que significa Tradição.
16
Termo que significa dizer ou luzes brilhantes.
15

Este pequeno exemplo da interpretação do simbolismo da árvore, principalmente no


passado, mostra como esta relação homem-árvore-cosmo influenciou ricamente a cultura da
humanidade infundindo-lhe crenças e costumes, sendo que alguns destes podem ser observados
até os dias atuais.

2.1.2 – Crenças e Cultos das Árvores

Quando o homem observava as florestas ao longe, via um imenso manto verde


estendendo-se muitas vezes para além do horizonte. Sob o dossel da floresta ele pôde constatar
que partes menores formavam aquele manto: as árvores. E observando-as percebeu que possuíam
muitas características. Regeneração, longevidade, grandeza, resistência e beleza foram algumas
notadas por ele.

[...] O homem nessas épocas primárias viu nas árvores forças sobrenaturais, como sua
aparente morte no outono e seu ressurgimento na primavera, características que deram
expressões simbólicas de poderes divinos, dos quais o homem sentia-se dependente, já que
da árvore recebia muito do que necessitava diariamente, enxergando nela o quadro sagrado
de seu próprio ser. Esse convencimento formou nas antigas civilizações a origem de antigas
mitologias e para muitos uma fé, fé que em algumas novas gerações é manifestada pelo
homem, regando a árvore ou ajoelhando-se diante dela (IMAÑA ENCINAS, 1990).

Alguns destes mitos referem-se à origem do homem. Para os mongóis, a raça celestial
vinha de uma árvore atingida por um raio de luz divina e os índios norte americanos, Sioux,
criam que o primeiro homem e a primeira mulher eram duas árvores que foram mordidas por uma
cobra (FORLONG, 1964).
Quando o umbigo de um recém-nascido caía, na tradição dos Maoris17 era costume
colocá-lo junto de uma árvore, recentemente plantada, para esta ser um tohu oranga, ou o signo
da vida para a criança. Em tempos não muito remotos, árvores antigas também representavam
famílias, passando por várias gerações. Quando um novo membro da família nascia, um novo
espécime era plantado. Até a saúde da planta podia estar relacionada com a saúde de seus donos.

17
Povo antigo da Nova Zelândia.
16

Fazer de um vegetal um parente é um costume comum no oriente, sobretudo na Índia onde alguns
ritos literalmente casam um homem ou uma mulher com uma árvore. Na cerimônia a pessoa
ficava até horas com a mão encostada no tronco (FRAZER, 1982).
Várias formas de poder eram atribuídas às plantas, como o de conceder fertilidade e
proteção às mulheres. Algumas tatuavam galhos, troncos e raízes no abdômen para atrair a
gestação desejada e na África a Kigelia africana, com seus frutos parecendo o órgão sexual
masculino, estava relacionada com a fertilidade e mulheres lactantes amarravam fitas coloridas
em seus galhos para a proteção da criança (CREWS, 2003; SÈNE, 2003 ).
O animismo18, influência forte no modo de pensar dos antigos, permeava as relações com
a natureza. A vida estava em todos objetos da paisagem e certos componentes da natureza eram
tratados como seres humanos.
Nas ilhas Molucas19, os habitantes consideravam o craveiro-da-índia (Syzygium
aromaticum (L.) Merr. et Perry) como se fosse uma mulher grávida: não podia ser assustado com
barulhos para não perder os frutos ou para que estes não caíssem prematuramente. O costume
japonês responsável pela garantia de produção de frutos era ameaçar algumas frutíferas com
palavras rudes do tipo “se você não produzir frutos na próxima safra vou te cortar” (FRAZER,
1982, 1960).
O homem também temia a floresta. A palavra ‘pânico’, de origem latina, refere-se ao deus
grego Pã, morador das florestas. O barulho produzido nas matas assustava os transeuntes que
atribuíam o som desagradável a Pã (ENCYCLOPEDIA AMERICANA [s/d]).
Uma das referências bibliográficas mais ricas, sobre o culto das árvores, é a encontrada
nos livros de James George Frazer (1960, 1982) sendo muito citadas por outros sérios
pesquisadores. A extensão de seus livros, além de cobrirem um número enorme de páginas,
descrevem as minúcias de crenças e costumes relacionados com o mundo vegetal desde tempos
antigos e nas mais diversas regiões. Seguem-se mais alguns exemplos deste professor que detém
vários títulos como o de ‘Doutor honoris causa da Universidade de Paris’:
• O respeito e o temor, sentidos em relação à floresta, cresciam mais quando as árvores
eram dotadas de alma ou espírito e derrubá-las não era uma tarefa simples. Na África, os

18
Crença que atribui uma alma aos animais, à coisas e fenômenos da natureza.
19
Indonésia.
17

Wanica, consideram o coqueiro como uma mãe, pois este lhes dava a vida e comida.
Cortá-lo era considerado matricídio.
• Existia também na Europa antiga a crença de que as árvores sentiam dor. Os cortes eram
feitos com cuidados cirúrgicos e acreditava-se que quando se cortava um carvalho, podia-
se ouvi-lo gritar de dor a quilômetros de distância.
• Em muitos povos, as árvores eram vistas como a casa de alguns espíritos e existia o medo
de que se recaísse alguma maldição sobre quem cortasse uma. Os nativos da Indochina,
quando sob comando dos franceses, tinham que derrubar alguns bosques. Antes de
usarem seus machados, pediam desculpas para as árvores dizendo que só estavam
cumprindo ordens e que os verdadeiros responsáveis eram os seus chefes estrangeiros e
pediam para os espíritos encontrarem outra morada. O cuidado com tais espíritos era tanto
que até a madeira utilizada em construções deveria estar no mesmo sentido da árvore.
Este tipo de crença era compartilhado por outras regiões como na África e onde existiam
muitas extensões de floresta, sempre restavam algumas árvores para que os espíritos pudessem
ter uma casa e não se zangassem com os indivíduos da tribo. Muitas vezes os sacerdotes eram
consultados antes de qualquer intervenção na floresta. Oferendas e sacrifícios, inclusive
humanos, realizavam-se para aplacar a ira dos espíritos habitantes das matas ou se conseguir
favores. Na Tailândia, ofereciam-se orações pedindo a permanência dos espíritos nas árvores que
seriam transformadas em canoa, numa espécie de bênção (ENCYCLOPEDIA AMERICANA,
[s/d]).
A magia que permeava principalmente as antigas relações homem-natureza aparentemente
não possuía limites. Todas as construções de mitos, ritos e crenças se originavam numa
infinidade de formas (tão grande quanto o número de espécies conhecidas em cada época).
Se uma árvore fosse considerada com propriedades mágicas sua madeira conservaria estas
características. Nesta concepção, a madeira era utilizada para moldar imagens de deuses, cálices,
cetros, etc (HUGHES, 1984 apud CHANDRAN, GADGIL, 2005). Muitas espécies possuíam este
valor sobrenatural, participando de rituais e consagrando santuários. Uma espécie muito
valorizada durante a história da Europa é o carvalho.
O carvalho (Quercus sp.) era respeitado pelos gregos e séculos não apagaram sua
opulência podendo ser encontrado, no século XIX, em rituais da Igreja na Rússia (FRAZER,
1982). Os Arcadianos diziam ser originados desta árvore e que as abelhas que voavam nas copas
18

eram seus ancestrais. Os carvalhos participavam de cerimônias com os druidas e eram


considerados como oráculos pelos lituanos (até sua religião ser extinguida por povos invasores)
(FORLONG, 1964). Outras árvores possuíam papel semelhante. Seguem-se alguns exemplos:

• Amêndoa (Prunus amygdalus): citada na bíblia algumas vezes (como em Números


Capítulo 17, versículo 8) foi usada em rituais druídicos e considerada sagrada por povos
asiáticos e europeus. Causava encanto por produzir flores sem apresentar folhas em
determinadas épocas (FORLONG, 1964).
• Bétula (Betula alba) : considerada árvore da sabedoria. Para os noruegueses relaciona-se
com Thunar (Deus trovão). Os russos realizavam rituais próximos à bétula para evocar
Leische ,o Deus das florestas, e pedir-lhe bênçãos. (FORLONG, 1964).
• Oliveira (Olea europea L.) : Seus frutos e óleo eram usados em rituais sagrados e
mulheres imorais não podiam tocar nesta árvore. Foi o lendário Hércules quem plantou a
primeira oliveira em Olímpia. Seus ramos eram usados nas cabeças dos sacerdotes de
Zeus (FORLONG, 1964); e os vencedores dos jogos olímpicos também recebiam uma
destas coroas. Foi um ramo desta planta que a pomba trouxe a Noé indicando a
‘existência de terra seca’. Supõe-se que a escolha dos ramos de oliveira na bandeira da
ONU foi por eles simbolizarem a paz (RHIZOPOULOU, 2004).

Certas árvores possuíam ligações diretas com os deuses. Algumas, segundo a mitologia,
eram deuses transformados em plantas como forma de castigo ou prêmio. A tabela abaixo mostra
exemplos da ligação entre certas espécies e a relação com sua deidade:

Tabela 1 – Árvores relacionadas com deuses

Deus ou Deusa Espécie (nome comum) Espécie (nome


cintífico)
Apolo macieira Pyrus malus L.
Ártemis nogueira Juglans sp.
Atenas oliveira Olea europea L.
19

Hera salgueiro Salix spp.


Hércules poplar Populus fastigiata
Isis sicômoro Fícus sycomoros
Pã pinheiro Pinus sp.
Shiva bel tree Aegle marmelos
Zeus carvalho Quercus sp.

O costume de sábios indianos de todas as épocas era viver nas florestas, onde a vida
austera que buscavam podia ser encontrada. As árvores eram símbolo de paciência e tolerância e
sob elas estavam os melhores lugares para que os mestres pudessem passar seus ensinamentos
para os discípulos (PRIME, 1996).
Parte da tradição religiosa envolvendo o reino vegetal e o homem ainda resiste em alguns
países. Rituais pedindo bênçãos e de agradecimentos podem ser notados em regiões agrícolas. Na
Europa comemora-se o ‘1° de maio’, neste dia passeia-se nos bosques, jovens cantam e passam
de casa em casa recebendo vinho e plantando mudas. No dia 23 de abril (dia de São Jorge), há
uma procissão em que a figura principal é a personagem ‘Jorge Verde’. Estes rituais estão ligados
à chegada da primavera e à fertilidade (FRAZER, 1982; ELIADE 1993).
Além destes costumes, outra expressão religiosa liga-se ao culto da árvore e ainda pode
ser observada. As Florestas Sagradas são santuários que resistiram ao tempo e ao homem, por
serem consagradas aos deuses.

2.1.3 – Florestas Sagradas

Religiões como o hinduísmo e culturas indígenas norte-americanas acreditam que uma


alma permeia todo o universo. Esta alma sagrada imbui os elementos da natureza com um valor
espiritual merecedor de respeito e honrarias. Árvores, animais, rios, e rochas representavam
forças divinas.
Paisagens contendo bosques, nascentes ou rochas, dependendo de crenças específicas
inerentes aos povos, podiam ser consideradas manifestações dos deuses, ou consagradas para sua
adoração. Um exemplo são as Florestas Sagradas (Sacred Groves), que desde tempos muito
20

antigos e até hoje possuem presença significante nos registros histórico-culturais do homem
moderno.
Registros apresentam a árvore como um dos pontos originários de adoração. Segundo
Elíade (1949) “os mais arcaicos ‘lugares sagrados’ de que temos conhecimento constituem [...]
um microcosmo: paisagem de pedras, de águas e de árvores”. Os antigos santuários possuíam
como um de seus elementos a árvore, como ocorria na Ásia e na Grécia.

Figura 7 – Santuário na árvore

“Santuários ao ar livre foram os primeiros templos dos deuses. Um lugar sagrado


demarcado para uma deidade era chamado de temenos em grego e templum em latim”
(CHANDRAN, GADGIL, 2005). A palavra que os celtas usavam para designar santuário possui
raízes próximas com a palavra nemus que em latim significa ‘bosque’; existe uma floresta
sagrada dedicada à deusa da caça Diana que se chama Nemi (nome que se refere à nemus), este
bosque fica pouco distante de Roma (FRAZER, 1982). Na antiga língua germânica (teutônico) a
palavra templo também era estreitamente ligada à semântica de floresta.
21

Assim as florestas e bosques foram utilizados para adorações e dedicados aos deuses. Sua
importância sacra poderia ser adquirida quando o ancestral de uma tribo parou sob a sombra das
árvores para um descanso ou até mesmo quando um patriarca desapareceu sob as copas das
árvores; um grupo de árvores também poderia ser escolhido como um local de culto e para
oferecer orações aos antepassados tribais (SÉNE, 2003).
A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura)
reconhece a existência de florestas sagradas em regiões mundiais como: Austrália, Kênia,
Filipinas e Líbano (CREWS, 2003). Mas o país com maior índice destes bosques sacros é a Índia.
Segundo Swamy et al. (2003) dados indicam a existência de milhares de florestas sagradas em
seu solo e estas podem ser consagradas a deuses com forma de serpente, encarnações de Vishnu20,
Amman (deusa da fertilidade), etc.
Nas florestas de Uttara Kannada (Índia) derrubar árvores é um tabu e até mesmo usar
folhas e galhos mortos do chão destes bosques sagrados só é permitido se não existirem outras
alternativas (CHANDRAN & GADGIL, [s.d.] ).
Na tradição religiosa hindu, as florestas possuem relevância na formação das vilas.
Segundo Prime (1996) existem estes três tipos de florestas para os hindus:
• Shivan: um tipo de floresta que permite manejo e extrativismo.
• Maha vana: local que deveria permanecer intacto como santuário natural.
• Tapovan: refúgio dos sábios, onde apenas a presença deles nas florestas era capaz de deter
ações antiecológicas até de monarcas.
As florestas sagradas não se limitam a sua importância social, religiosa e cultural. Por
terem sido preservadas da ação antrópica puderam permanecer intactas, apresentando espécies
vegetais e animais que são encontradas apenas nelas (CHANDRAN & GADGIL, [s.d.] ).
O número de florestas sagradas existente hoje é menor que o apresentado no passado, pois
quando países como a Índia foram invadidos por culturas diferentes da sua, muitas destas
florestas foram destruídas ( SWAMY et al., 2003).
As florestas apresentam seu valor sacro quando dedicadas aos deuses e ao servirem como
local de adoração. Para os cientistas, a denotação sagrada é pouco usada para referir-se às
florestas, mas a valoração pelos homens da ciência é próxima ao valor dado por aqueles que

20
Deidade do hinduímo.
22

enxergam o lado sacro das selvas. Sabe-se que o clima, umidade, erosão, fotossíntese e outros
processos importantes para a humanidade possuem influência das árvores.

2.1.4 – Êxtase Vegetal: as Seivas Mágicas

O homem com seu gênio inquieto, que indaga e tenta desvendar as facetas do mundo
natural, buscou conhecer a floresta em suas minúcias. Porém, ela afigura como um universo:
impossível de ser conhecida por um único homem e com meandros tão obscuros que poderiam se
enquadrar como mágicos.
Expedições de várias partes do mundo se aventuraram pelas mais diversas florestas do
globo. Nenhuma conseguiu trazer a descrição completa deste ambiente. Ainda hoje espécies
novas são descobertas, tanto animais quanto vegetais, e não se pode dizer que a lista de novidades
se esgotou.
Cientistas das mais diversas áreas vêem florestas como um imenso laboratório. Coletam
as substâncias produzidas pelos vegetais como se estivessem na busca da pedra filosofal.
Acreditam que nestas seivas, óleos, resinas, etc., podem estar a cura para diversos males
orgânicos do homem. Um dos aspectos negativos desta incursão é a motivação destas indústrias
que nem sempre é filantrópica e dá abertura para a biopirataria.
Mesmo com muita tecnologia e conhecimento científico, o homem não conseguiu
conhecer todos os segredos das plantas e necessitou da ajuda dos silvícolas para seus estudos.
Estes simples habitantes, apenas com sua relação íntima com a floresta e muita naturalidade,
conseguiam extrair remédios para suas tribos.
Nas divisões das castas indígenas aparece a figura do pajé. Dos vários povos rústicos que
se tem conhecimento, em poucos não há a presença de um feiticeiro ou xamã. Esta classe de
homens era conhecedora de mistérios da natureza e tinham poderes de cura. Algumas doenças,
para eles, não eram de causas naturais; originavam-se no mundo dos espíritos. E para curar estas
doenças psíquicas (e as naturais) os índios utilizavam métodos para alterar suas consciências (que
também proporcionavam suas visões místicas).
23

Figura 8 – Foto de um xamã

Antigos são os veículos que o Homo sapiens vem utilizando para alcançar estágios
alterados de consciência. Este tipo de transe buscado por diversas tradições, possui diversos
mecanismos endógenos para sua manifestação: oração, mantras, meditação, jejuns, vigília,
mortificação, exercícios corporais, respiração, entre outros. Estas práticas buscam um contato
com a realidade espiritual. Mas os xamãs possuem um meio exógeno para alcançar o êxtase:
plantas e substâncias que produzem alterações de consciência (ZULUAGA, 2002). A própria
mitologia da “Árvore da Vida” já remetia-se á existência de um licor especial que dela era
extraído: o soma, haoma ou amrita - bebida da imortalidade (GUÉNON, 1962).
O soma também era uma bebida da antiga Índia, originada no céu, e comparava-se com a
ambrosia dos gregos (BLAVATSK, 1892). Não existe certeza quanto ao nome das espécies
utilizadas na preparação do soma, devido à extinção desta expressão cultural dos antigos hindus,
mas segundo Forlong (1964) e Blavatsk (1892) elas podem ser: Asclepias acida ou Sarcostoma
viminales.
24

Muitas plantas foram (e algumas ainda são) usadas em rituais de natureza xamânica. Um
dos autores que contribuiu para mostrar este mundo foi Carlos Castaneda. No seu livro “Erva do
Diabo” ele conta suas experiências com um índio mexicano, Dom Juan, que lhe ministrou o
peiote (Lophophora williansii) a datura (Datura inoxia) e um cogumelo (possivelmente o Psilobe
mexicana). Segundo este autor “[...] Desde antes do seu contato com os europeus, os índios
americanos já conheciam as propriedades alucinógenas destas três plantas. Devido as suas
propriedades, elas tem sido vastamente empregadas para o prazer, para curas, para feitiçaria e
para atingir estados de Êxtase” (CASTANEDA, 1997).
Seguem-se alguns exemplos de outras plantas que eram utilizadas para fins medicinais e
espirituais:
• Os escandinavos usavam as flores da bétula (Betula alba) na preparação de uma bebida
mágica e suas folhas tratavam males infantis (FORLONG,1964).
• Os druídas utilizavam o visco (Viscus album), uma planta parasítica, quando crescia nos
carvalhos (o que era um acontecimento raro). Outra bebida mágica se extraia desta planta
e chamava-se “cura-tudo”, podendo neutralizar o efeito de qualquer veneno
(FORLONG,1964).
• Os cogumelos: Amanita muscaria na Ásia e América Norte; e o Caviceps purpurea pelos
pré-socráticos da antiga Grécia (ZULUAGA, 2002).
Dentre estas plantas conhecidas para fins religiosos surge um chá de origem amazônica,
que merece destaque por ainda ser usado pelo homem moderno; a Ayahuasca. Segundo Labate
(2002): “a ayahuasca consiste geralmente na infusão do cipó Banisteriopsis caapi e da folha
Psychotria viridis, à qual se podem acrescentar ainda diversas plantas”. A Ayahuasca será tema
de mais detalhadas discussões no próximo capítulo.

2.2 – AYAHUASCA: O VINHO DA FLORESTA

2.2.1 Origens

Um dos mistérios que acompanham o uso da Ayahuasca é o de como estas duas plantas
(Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis) que compõem o chá, se encontraram num universo
que possui, praticamente, infinitas possibilidades de combinações vegetais.
25

Outro mistério que instiga a mente dos pesquisadores é a data e o local onde se obtiveram
as primeiras quantidades do chá. Para Milanez (1993) a união das duas plantas foi realizada por
Salomão e remonta ao início da civilização humana. Para Guerra (1976) os incas usavam o chá.
Na determinação da primeira aparição do chá, alguns artefatos arqueológicos – vasos de
cerâmica e estátuas – dão indícios que o chá era usado na Amazônia Equatoriana provavelmente
no período de 1500-2000 a.C. (NARANJO, 1979, 1986 apud METZNER, 2002).

Figura 9 – Recipiente contendo a ayahuasca

Deve-se a Richard Spruce as primeiras anotações científicas sobre as plantas psicoativas


da América do Sul. Este inglês se aventurou entre 1849-1864 viajando da Amazônia brasileira
aos Andes. Em 1852 teve contato com uma tribo Tukano, no Rio Negro (Brasil), e deles pôde
conhecer uma bebida chamada caapi. Os índios a utilizavam para induzir profecias e relações
divinas. Em 1859 encontrou, junto com os Záparos (nos Andes peruanos), a mesma espécie
26

encontrada no Brasil, só que com nome diferente. Neste novo local o nome tinha origem incaica:
Ayahuasca - vinho dos mortos (SCHULTES, 1968).
Os povos indígenas são pontos de referência quanto ao uso deste chá. Os xamãs
utilizavam o caapi como um meio de comunicação entre o mundo espiritual e o material e servia
ainda como fator de coesão do grupo. As tribos Kaxinauá, Sharanawa, Marubo e Ashaninka são
alguns exemplos das que utilizam o chá e o nome dado ao cipó e à bebida por cada uma delas
varia muito. Citando alguns poucos: nixipae, dunuan isun, oni kamarampi, etc (LUZ, 2002).
O costume indígena de beber a Ayahuasca incorporou-se nos rituais dos curandeiros ou
vegetalistas. Este contato cultural aconteceu quando os caucheiros21 encontraram populações
ribeirinhas da região amazônica já condicionadas por culturas estranhas às suas. Os países
envolvidos neste movimento foram: Brasil, Peru e Bolívia. E a época, final do século XIX e
início do século XX, coincide com o primeiro ciclo da borracha (LUNA, 2002).
Além da ayahuasca, os curandeiros podem usar outras plantas como o tabaco (Nicotiana
tabacum), outras espécies do gênero Banisteriopis (B. inebrans, B. quitensis e B. rusbiana),
banhos de ervas, chás, etc. Os curandeiros crêem que ao beberem a ayahuasca podem entrar em
contato com uma realidade diferente da normal, proporcionando comunicações com espíritos
(bons ou ruins). Para eles, a causa das doenças pode ser espiritual e por meio de exorcismos
conseguem curar os enfermos (De RIOS, 1972).
Para chegar aos centros urbanos da atualidade, a ayahuasca passou antes, também, pelas
mãos dos seringueiros. Devido à grande migração ocorrida no primeiro ciclo da borracha, vinda
do nordeste, os seringueiros tiveram contato com os índios e nativos amazônicos. Estas etnias se
“cruzaram” formando famílias mistas. Segundo Franco e Conceição (1999) “é quase certo que a
apresentação da ayahuasca aos seringueiros deu-se nesse contexto de proximidade e contato com
as populações indígenas”.
Na preparação do chá os dois elementos principais são o cipó (Banisteriopsis caapi) e a
folha (Psychotria viridis) fervidos na água. Em algumas tradições outros elementos podem ser
usados na decocção. A descrição dos dois elementos da ayahuasca é feito abaixo.

I – O cipó

21
Caucheiro é o nome dado às pessoas que extraem um tipo de látex do caucho (Castilloa elastica).
27

Este elemento relaciona-se como o aspecto da força contida no chá. Primeiramente


descrito por Richard Spruce, em sua expedição pela região amazônica da América do Sul, no ano
de 1952.
O primeiro nome científico que esta liana recebeu de Spruce foi Banisteria caapi. Porém,
em 1931, após novos estudos taxonômicos esta espécie mudou de gênero passando a chamar-se
Banisteriopsis caapi (Spr. Ex Griseb) Morton (Schultes, 1968). A literatura atual refere-se ao
cipó utilizando apenas o gênero e a espécie.

Figura 10 – Banisteriopsis caapi

Existe uma descrição botânica sobre o cipó no próprio livro de Spruce (1970)22:

Descrição: Liana inchada nas juntas. Folhas opostas, 21,3 x 11 (cm), ovais
acuminadas, apiculadas – agudas, finas, lisas na parte superior, pilosas na parte

22
Tradução feita do original de Spruce (1970).
28

inferior, panículas axilares ou umbelas. Pedicelos pilosos, brácteas somente na base,


cálice com 5 pétalas partidas, segmentos ligulados, glandular ou somente com
glândulas rudimentares. Possui 5 pétalas longas e afinadas. Lâminas pentagonais,
fimbriadas e clavadas. Estames no número de 10, desiguais, anteras arredondadas.
Com 3 estiletes, subulados; estigmas captados. Cápsulas muricato-cristadas,
prolongadas em um lado numa semi-obovada asa branco-esverdeada.

Figura 11 – Ilustração científica de B. caapi

Pode-se obter algumas informações adicionais sobre o cipó em Gates (1970): pertence à
família Malpiguiaceae. Sua origem não é conhecida, mas povos indígenas da Amazônia
brasileira, Equador, Bolívia, Peru e Colômbia cultivam esta espécie; além das encontradas
naturalmente. Este gênero está distribuído por quase toda a América do Sul e possui espécies que
podem ser encontradas no cerrado e Rio de Janeiro. Possuem formas que variam de cipó,
trepadeira, arbustos à pequenas árvores.
29

II – A folha
A luz23 encontrada no chá é proveniente da folha Psychotria viridis.

Figura 12 - Psychotria viridis

São raros os trabalhos científicos apresentando descrições botânicas sobre estas duas
espécies. Mais difícil é encontrar estes dados sobre a planta da família das Rubiáceas, da qual se
extraem as folhas.
Os autores Rivier e Lindgreen (1972) citam em seu artigo, uma descrição feita por Del
Castillo (1962)24, em sua tese, e eles se referem à descrição como sendo uma das espécies do
gênero Psychotria, utilizadas no chá:

23
Os principais grupos que bebem o chá acreditam que, essencialmente, ele possui dois atributos divinos: a ‘força’
(vinda do cipó) e a ‘luz’ (vinda da folha).
30

Descrição: a chacrona é um arbusto de 3 a 4 metros de altura, de raiz napiforme,


caule lenhoso, cilíndrico, de 10 ou mais centímetros de diâmetro. O córtex é de cor
verde, ligeiramente escuro com manchas esbranquiçadas e distribuídas como
pequenas áreas de aspecto geográfico do modo que o conjunto recorda a pele de uma
serpente. As folhas são de forma lanceolada, alargadas, inteiras, de pecíolo muito
curto. São folhas peninervadas, com mais de 10 nervuras secundárias. Por sua
disposição no caule são opostas e cruzadas. As folhas medem de 13 e 15 cm de
largura (incluindo o pecíolo) por 4,5cm. O pecíolo mede 0,5cm de comprimento. A
inflorescência é composta, definida. O fruto é pequeno, de 4,5 x 5 mm, epicarpo de
cor roxa como a cereja quando está madura; é uma drupa, encerra duas sementes que
nos recordam o café. As sementes são duas e se abrem igual ao café, convexas em
sua parte dorsal e aplanadas em sua parte ventral por onde se unem; unidas dão forma
de um ovóide, de 4 x 4,5 mm.

Figura 13 – Ilustração científica da P. viridis

24
Tradução do original de Del Castillo (1962).
31

III – O casamento alquímico

Da união do cipó (B. caapi) e da folha (P. viridis) surge o chá Ayahuasca. Os diversos
grupos que utilizam esta bebida possuem suas formas diferentes de prepará-lo, podendo ser
usados tempo de cozimento e quantidade de material diferentemente em cada ocasião.

Após os primeiros estudos sobre o tema em pauta, que abordavam os aspectos botânicos e
antropológicos, surgiram os pesquisadores da química buscando decifrar os elementos
constituintes do chá e as chaves de sua atuação no organismo humano.

Os pioneiros da ciência, que presenciaram a ação do chá em índios e xamãs e ouviram o


próprio testemunho destes sobre o que sentiam ao bebê-lo, descreveram os propósitos que
levavam os habitantes da floresta a utilizarem a ayahuasca em seus rituais. Talvez estes efeitos do
chá no homem despertaram a curiosidade dos fitoquímicos e bioquímicos. De Rios (1972)
oferece um resumo dos efeitos causados pela ayahuasca e buscados pelos nativos amazônicos:

Figura 14 – Desenho feito por um xamã sobre uma visão proporcionada pela
ayahuasca
32

1. Ayahuasca e o sobrenatural

a. Para magia e ritual religioso

Para receber orientação divina e comunicação com os espíritos animadores das plantas
ou receber um espírito protetor especial.

b. Adivinhação

Adivinhar se estranhos estão chegando; descobrir onde estão seus inimigos e quais são
seus planos; descobrir se suas mulheres são infiéis; ver o futuro claramente.

c. Feitiçaria

Causar doenças em outros por meios psíquicos; prevenção contra maldade alheia.

2. Ayahuasca e o tratamento de doença

Descobrir a causa da doença ou curá-la.

3. Ayahuasca, prazer e interação social

Dar prazer ou propiciar estados afrodisíacos, aumento da atividade sexual, alcançar


êxtase ou estados intoxicados; facilitar a interação social entre os homens.

Várias informações sobre os elementos químicos do chá já foram descobertas. O cipó


possui como constituintes principais os derivados beta-carbolínicos da harmina, tetrahidroarmina
e harmalina. O elemento principal das folhas é a N,N-dimetriltriptamina ou DMT. Estes
alcalóides são encontrados na ayahuasca e mais alguns traços de outros menos relevantes
(BRITO, 1992).

A atuação do chá no SNC (Sistema Nervoso Central) se dá por um intrincado processo:

O efeito psicoativo produzido pela Ayahuasca em seus usuários está relacionado


com a DMT, substância de estrutura molecular semelhante à da Serotonina25, presente

25
Neurotransmissor presente em várias áreas do sistema nervoso central. Regula uma multiplicidade de funções
mentais.
33

na Psychotria viridis e que se for administrado isoladamente por via oral é inativada
pelas enzimas monoaminoxidases (MAO) existentes no corpo humano. A Ayahuasca,
sendo assim, só é ativa por ser uma mistura das duas plantas, na qual os componentes
beta-carbolínicos no Banisteriopsis caapi possuem um forte efeito inibidor das MAO,
permitindo que a DMT permaneça ativa no organismo humano (LIMA, 2004).

À Ayahuasca ainda são atribuídos outros efeitos psíquicos e também visões26. Para Luna
(1983) os vegetais deste chá são “plantas professoras”. Para Castaneda (1997), segundo seu
mestre Dom Juan, plantas como a datura e o peiote eram aliados. Acredita-se numa ‘vida
consciente’ destas plantas de poder.

Uma das características de muita beleza que a Ayahuasca pode proporcionar aos grupos
que a utilizam é um encontro com a essência cultural do grupo e uma visão real da natureza e da
vida. Outro ponto importante de se ressaltar é que parte das experiências vividas por quem bebe o
chá não podem ser descritas pois estão além das palavras (LUZ, 2002).

2.2.2 – Igrejas Atuais

Os seringueiros vindos do nordeste, que mesclavam sua cultura com a indígena, e os


vegetalistas foram os precursores dos rituais nos centros urbanos. Esta nova modalidade de culto
com a Ayahuasca também sofreu influências de tradições vindas de fontes localizadas para além
dos limites da floresta.
Somente no Brasil existem grupos ayahuasqueiros27 que utilizam o chá fora de um
contexto somente indígena e esta releitura ritualística engloba as raízes primordiais xamânicas,
cultos afro-brasileiros28, o espiritismo kardecista29 e sociedades como o Círculo Esotérico da
Comunhão do Pensamento30 e a Ordem Rosa Cruz31. Ocupando grande vulto nacional, as três

26
Visões como: cobras, répteis, símbolos, jaguares, figuras religiosas, pessoas sábias, paisagens naturais são
descritas por Shanon (2002).
27
Palavra derivada de ayahuasca utilizada para se referir aos que a utilizam.
28
Por exemplo: junção da Umbanda com o Cristianismo.
29
Referente ao Espiritismo codificado por Allan Kardec.
30
Uma corrente filosófica-religiosa.
31
Ordem milenar de natureza mística.
34

linhas principais das igrejas ayahuasqueiras brasileiras são: O Santo Daime, a Barquinha e a
União do Vegetal (LABATE, 2002).
Estas linhas possuem fundadores diferentes, bem como rituais e costumes específicos.
Dissidências destes troncos principais (Santo Daime, Barquinha e União do Vegetal) são
encontradas, formando grupos distintos destes eixos, mas levando consigo a denominação e
traços ritualísticos semelhantes aos utilizados no grupo do qual partiram.
Além das três religiões ayahuasqueiras mais conhecidas, Lima (2004) cita o surgimento
de uma quarta: o Centro de Cultura Cósmica, Suprema Luz, Paz e Amor. Serão feitas breves
descrições sobre estas religiões.

I – Santo Daime32

Esta é a primeira religião fundada no Brasil (Rio Branco – Acre), no ano de 1930, pelo
maranhense Raimundo Irineu Serra. Este descendente de escravos, de alta estatura, chegou ao
Acre em 1912, para fazer parte do grupo de extração de látex (CEMIN, 2002; LIMA, 2004).

32
A palavra Santo Daime é utilizada para denominar esta religião ayahuasqueira e também para referir-se a
ayahuasca. Sendo comum usar somente “Daime” para referir-se à bebida. Este nome é a junção do verbo ‘dar’ mais o
pronome ‘me’ (Dai-me = Daime).
35

Figura 15 – Sr. Raimundo Irineu Serra (Mestre Irineu)

Ao chegar no Acre ficou sabendo de uma bebida preparada com cipó “jagube”33 e a folha
“rainha”34 e utilizada pelos índios dentro das matas. Interessou-se e foi conhecê-la. Após bebê-la,
a visão de um ser feminino lhe apareceu, denominando-se Clara. Mais posteriormente esta figura
associou-se à Nossa Senhora da Conceição e passou a ser chamada também de “Rainha da
Floresta”. Clara conduziu Mestre Irineu35 até Bolívia e Peru, onde pôde aprender com índios algo
mais sobre a bebida. Mais duas figuras fantásticas lhe aparecem: Rei Ahyusscar e Don Pizon.
Então Mestre Irineu começou a receber os moldes ritualísticos da doutrina do Santo Daime e as
instruções materializadas por meio dos cânticos denominados Hinos36 (JACOUD, 1975 apud LA
ROQUE, 2002).

33
No Santo Daime chama-se o cipó Banisteripsis caapi de jagube.
34
No Santo Daime o arbusto Psychotria viridis é chamado de rainha.
35
Forma respeitosa utilizada para se referir ao fundador desta doutrina.
36
Os hinos são cânticos religiosos utilizados no ritual do Santo Daime.
36

Os trabalhos37, de um modo geral, ocorrem nas igrejas onde os hinários38 são cantados na
forma de bailado39 ou sentado. Alto Santo ou CICLU (Centro de Iluminação Cristã Luz
Universal) são nomes usados para se referir à linha fundada pelo M. Irineu, que morreu no ano de
1971. “Após a morte do fundador, um grupo de adeptos (CEFLURIS – Centro Eclético da
Fluente Luz Universal Raimundo Irineu Serra) se expandiu para a maioria das capitais brasileiras
e para alguns países como, por exemplo, a Holanda e a Espanha, países estes onde o uso
ritualizado da ayahuasca é, atualmente, legalizado” (SANTOS, 2004).
O CEFLURIS, uma das dissidências do Alto Santo, foi comandado pelo Sr. Sebastião
Mota de Melo (Padrinho Sebastião) que morreu em 1990, passando-se o comando para seu filho
Alfredo Gregório de Melo.
“Atualmente no Brasil existem além dos sete centros que se autodenominam como sendo
diretamente ligados à origem CICLU, outras 42 igrejas associadas do CEFLURIS e pelo menos
mais 10 grupos independentes. Além de cerca de 30 grupos no exterior sob a bandeira do Santo
Daime” (LIMA, 2004).

II – União do Vegetal ou UDV

Este grupo fundado em 22 de julho de 1961 por José Gabriel da Costa, baiano de Feira
de Santana, também possui relações com o fluxo migratório nordestino para a extração do látex
na região norte. O período é o da 2ª Guerra Mundial que demandava borracha como matéria-
prima para os aliados. Em 1943 José Gabriel da Costa chegou nos seringais amazônicos e desistiu
de trabalhar neles em 1950, quando se mudou para Porto Velho. Em 1959, de volta aos seringais,
conhece a ayahuasca. E no ano de 1961 nasce a União do Vegetal (BRISSAC, 2002).
A origem da UDV também contém elementos que fogem aos fatos comuns. As passagens
são contadas pelo próprio Mestre Gabriel40, em cassetes antigos, numa narrativa intitulada
“História da Hoasca”. Esta gravação inclui detalhes de como o primeiro chá foi preparado há

37
Trabalho refere-se ao ritual utilizando a ayahuasca no Santo Daime.
38
Hinário é um conjunto de hinos religiosos de uma pessoa.
39
O bailado é uma forma de dança sagrada.
40
Forma respeitosa usada para se referir ao fundador desta doutrina.
37

milhares de anos, quando Salomão une duas plantas, o mariri41 e a chacrona42 que nasceram,
respectivamente, nos túmulos dos personagens Tiuaco e Hoasca43 (ANDRADE, 2002).
As sessões44 se realizam com as pessoas sentadas, onde uma fica como dirigente45
respondendo perguntas, autorizando participantes a entoarem chamadas46, etc. É comum ouvir
músicas populares do Brasil, dos mais diversos gêneros e épocas. O conteúdo destas remetem à
imagens construtivas e belas.
A UDV fundada por José Gabriel da Costa possui como nome de registro, perante a
justiça, Centro Espírita Beneficente União do Vegetal (CEBUDV); em 1988 esta instituição
apresentava em torno de 70 núcleos e 7000 sócios membros em todo o Brasil (BRISSAC, 2002).
Da igreja original desmembraram-se 2 grupos que também se intitulam UDV possuindo seus
próprios dirigentes (ANDRADE, 2002).

III – Barquinha

Barquinha é o nome usado para designar a “Centro Espírita e Culto Oração Casa de Jesus
Fonte de Luz”; religião ayahuasqueira fundada em 1945 por Daniel Pereira de Mattos. Daniel,
antes de fundar a igreja, era boêmio e numa das vezes que estava sob efeito do álcool teve suas
primeiras visões espirituais indicando sua missão. Ele conheceu a ayahuasca pelas mãos de
Raimundo Irineu Serra quando se tratava de uma enfermidade (ARAÚJO, 2002).
A barquinha criada por Mestre Daniel47 possui muitos elementos em seu ritual que
lembram o mar (marinheiro, barco, comandante, etc.), influência de sua passagem em escola de
aprendiz de marinheiro. Nas reuniões cantam-se lindas melodias chamadas de ‘salmos’
(ARAÚJO, 2002).
Como a morte de Frei Daniel em 1958, o senhor Antônio Geraldo assumiu por
aproximadamente 20 anos a liderança do “Centro Espírita e Culto Oração Casa Jesus Fonte de

41
Na União do Vegetal o cipó Banisteriopsis caapi é chamado de mariri.
42
Chacrona é o nome utilizado para designar o arbusto Psychotria viridis na União do Vegetal.
43
Hoasca é o nome da personagem do mito que dá origem ao chá e também como é chamada a ayahuasca no âmbito
da União do Vegetal. Para referir-se ao chá pode-se usar somente a palavra Vegetal.
44
Sessão é nome do ritual da UDV.
45
O dirigente de um ritual com ayahuasca é sempre uma pessoa experiente, com considerável tempo na igreja.
46
As chamadas são cânticos sagrados que ocorrem nas sessões da UDV.
47
Forma respeitosa usada para se referir ao fundador desta doutrina, também chamado de Frei Daniel.
38

Luz”, saindo depois para fundar sua própria igreja (LIMA, 2004). Pelo trabalho de Balzer (2002)
pode-se constatar a existência de mais três igrejas independentes originadas do tronco principal.

IV – Centro de cultura Cósmica Suprema Luz, Paz e Amor.

Esta igreja é a mais recente e talvez a única do gênero (focalizando sua estrutura e
montagem ritualística). Fundada por Francisco Souza de Almeida aos 20 dias de maio de 1990 no
estado do Mato Grosso.

Figura 16 – Sr. Francisco Souza de Almeida (Mestre Francisco)

Mestre Francisco48, além de conviver com o Mestre Irineu (do qual recebeu a ayahuasca
pela primeira vez) durante 11 anos (1960-1971), teve contatos pessoais e significativos com
Padrinho Sebastião (fundador do CEFLURIS), Mestre Gabriel (fundador da União do Vegetal) e
Mestre Antônio Geraldo (dirigente da Barquinha). Em suas passagens pela floresta conheceu
também parte do trabalho xamânico realizado com a bebida ayahuasca.

48
Forma respeitosa usada para se referir ao fundador desta doutrina.
39

O que tornam os trabalhos49 do Centro de cultura Cósmica diferentes é o seu sincretismo.


Todas as experiências adquiridas pelo fundador quando passou pelas diversas igrejas
ayahuasqueiras se tornaram a “bagagem” com a qual ele idealizou seu ritual, que une as várias
formas de culto em um.
Por exemplo: os hinários que são sagrados para os adeptos do Santo Daime não fazem
parte das reuniões da UDV. Já os rituais do Santo Daime não apresentam as músicas ouvidas nas
sessões da UDV. O Centro de Cultura Cósmica engloba: os hinos do Santo Daime, as músicas e
chamadas da União do Vegetal, os salmos da Barquinha; além de elementos das religiões
ocidentais e orientais.
Em 1996 a sede geral passa para Brasília – DF, onde permanece atualmente. Existem,
além da sede, três representações desta igreja: uma em Planaltina – DF, uma em Campo Grande -
MS e uma em Capixaba – AC. Em 21 de dezembro de 1999 ocorre o falecimento de Mestre
Francisco e a atual dirigente é uma de suas filhas, Keteylen Souza de Almeida. Desta igreja
originaram-se mais duas: “Fraternidade Rosa da Vida, Luz Paz e Amor” e “Centro de
Harmonização Interior Essência Divina”.

2.2.3 – A Ayahuasca: a Legalidade e o Meio Ambiente

O uso ritualístico da ayahuasca sempre fora encoberto por uma névoa, responsável por
deturpações, preconceitos e tabus que formaram a visão de grande parte da população sobre o uso
deste chá sagrado. A véu que encobre a verdade sobre o assunto tem suas origens no
desconhecimento do que é a ayahuasca.
A polêmica sobre a utilização do chá em rituais começou a se formar logo no início do
funcionamento das primeiras igrejas urbanas. Com certa razão, a população cobrava das
autoridades governamentais explicações e posicionamento sobre aquele tipo de manifestação
religiosa que não se enquadrava nos moldes tradicionais de culto espiritual. Iniciou-se deste então
um processo de pesquisas e estudos para comprovar a autenticidade e inofencividade do uso da
ayahuasca num contexto religioso.

49
Para se referir aos elementos (chá, plantas e sessões) desta religião ayahuasqueira pode-se usar tanto os termos do
Santo Daime quanto da UDV.
40

Um dos fatos iniciais do árduo processo de legalização foi a inclusão da ayahuasca na


lista de substâncias proscritas do DIMED (Divisão Nacional de Vigilância Sanitária de
Medicamentos) em 1985. Logo após esta inclusão, os ayahuasqueiros50, embasados na
inocuidade do chá e cônscios que seu uso ritualístico englobava não apenas o aspecto médico-
farmacológico mas também a sociologia, antropologia, cultura e religião, procuraram as
autoridades competentes para um esclarecimento da situação. Assim, em 1986 o Conselho
Federal de Entorpecentes (CONFEN), órgão do Ministério da Justiça, embasado em alguns
relatórios já existentes sobre o assunto, formou um grupo de trabalho multidisciplinar51 para
aprofundamento do conhecimento sobre o chá. O CONFEN solicitou também a retirada da
ayahuasca da lista de substâncias proscritas do DIMED, o que viabilizou seu uso ritualístico
(Anexo 1) (UNIÃO DO VEGETAL, 1989).
Um fato digno de ser ressaltado é o elemento contido na própria Constituição da
República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, assegurando a liberdade religiosa:

Art. 5º, inciso VI) é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas
liturgias.

O percurso processual de legalização da ayahuasca teve um acompanhamento assíduo das


igrejas que constantemente buscavam seus argumentos para concretizar em definitivo o uso da
bebida, pois o governo ainda precisava de mais estudos. Este processo foi abalado com denúncias
de que certos grupos estavam utilizando outras substâncias não autorizadas concomitantemente
com a ayahuasca. Superado este incidente e com base em novos estudos multidisciplinares, o
CONFEN reafirmou sua decisão em manter o uso religioso do chá na ata da 5ª Reunião
Extraordinária de 1992 (Anexo 2).
O pronunciamento governamental mais recente é a Resolução Nº 4 do Conselho Nacional
Anti-Drogas (CONAD) de 4 de novembro de 2004 (anexo 3). Esta resolução ganhou âmbito
nacional quando foi noticiada em tele-jornal brasileiro52 pois reconhece a legitimidade jurídica do

50
O termo ayahuasqueiro é usado com referência àquele que bebe o chá.
51
Ficou constatado que existem muitos aspectos envolvidos no uso do ritual da ayahuasca, tais como “sociológicos,
antropológicos, psicológicos, químicos, médicos e da saúde”.
52
Esta informação foi noticiada no Jornal Nacional (Rede Globo) no dia 8 de novembro de 2004.
41

uso da ayahuasca. O novo documento ressalta o já decidido nas resoluções e decisões anteriores e
institui um Grupo Multidisciplinar de Trabalho que agora contará com 6 participantes das igrejas
ayahuasqueiras. Um novo campo será explorado em caráter experimental que é o uso terapêutico
da ayahuasca.
Outro documento relevante é a “Carta de Princípios para o uso da Ayahuasca” (anexo 4)
onde os grupos que utilizam o chá, apoiados pelo CONFEN, assinaram este conjunto de diretrizes
onde acordaram sobre certos comportamentos quanto ao uso do chá. Por exemplo:
• Não comercializar o chá;
• Utilizar somente a ayahuasca sem misturar com outras substâncias que sejam proscritas;
• Os menores só beberão o chá com autorização dos pais;
• Fica assegurado o plantio das espécies vegetais usadas na preparação da bebida, pois o
habitat natural destas espécies é alvo de depredação, etc.

As religiões ayahuasqueiras ressaltam a importância dos plantios do cipó e do arbusto do


qual se extraem as folhas, em áreas particulares, para utilização própria. E isto a grande maioria
realiza. Porém, outra fonte destas espécies e a própria floresta virgem.
Além do plantio em áreas particulares, na floresta ou fazendas, existem grupos que
plantam estacas no local onde colhem o cipó para repor o material coletado. Ao cortá-lo, deixa-se
a raiz para sua rebrota. Um artifício usado para alcançar os cipós no alto das árvores é a técnica
de rapel. Este método possibilita a retirada do material sem precisar derrubar a árvore. Da
Psychtria viridis são tiradas somente as folhas que logo rebrotam. Para extrair produtos florestais
da mata, obedece-se a um a rito perante o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis). Há alguns anos, existia no estado do Acre, uma legislação
específica para a extração de produtos não madeireiros com fins religiosos, mas hoje não vigora
mais.
Atualmente, por não haver legislação específica na gerência executiva do estado do
Acre , o amparo legal para a extração do cipó (Banisteriopsis caapi) e das folhas da Psychotria
53

viridis, com fins religiosos, encontra respaldo no art. 56 da Instrução Normativa 004/2002 do

53
Toma-se o Acre como exemplo pois ele é o berço das religiões ayahuasqueiras. Cada estado pode ter sua
legislação específica para a extração do cipó e das folhas do arbusto.
42

IBAMA54. Ela não trata diretamente do uso religioso, mas abrange este tipo de extrativismo (o de
produtos não madeireiros).
Para extração do cipó e das folhas do arbusto, as igrejas podem registrar um plantio de
ambas as espécies, em área definida, perante o IBAMA, provando assim que estão realizando a
reposição florestal. Podem solicitar a retirada do material em áreas florestais que serão
derrubadas ou queimadas.
Sumariamente o processo é o seguinte55:
1. a igreja pede que seja registrado um documento de reposição florestal no IBAMA, onde
aparecem a localidade e a quantidade de mudas plantadas (Anexo 5).
2. após o IBAMA protocolar e processar o documento anterior, é expedida uma autorização
(Anexo 6) para a extração destas espécies, pois a reposição já foi realizada.
3. após a colheita do cipó e das folhas a igreja requerente recebe a Autorização para
Transporte de Produto Florestal (ATPF) (Anexo 7).

Por estarem intimamente ligadas à natureza, mais precisamente à floresta, as igrejas


ayahuasqueiras possuem atividades paralelas relacionadas com o meio ambiente. Além de seus
rituais possuírem recursos musicais que intencionam conscientizar seus participantes sobre
ecologia e lembrar as exuberâncias da floresta, alguns grupos criaram organizações
ambientalistas.
O CEFLURIS (Centro Eclético Fluente Luz Universal Raimundo Irineu Serra) criou um
Instituto de desenvolvimento ambiental chamado IDACEFLURIS56, esta organização não possui
fins religiosos. Alguns de seus objetivos são:
• ampliação de cooperativas agro-extrativistas;
• desenvolver projetos de auto-sustentabilidade;
• trabalhar nas áreas de saúde, educação, secagem de frutas;
• desenvolver técnicas de conservação e reflorestamento, etc.

54
Art. 56 - A exploração de produtos não-madeireiros realizada por populações agro-extrativistas tradicionais fica
isenta da apresentação de plano de manejo, até a expedição de normas específicas por parte do IBAMA.
55
Os anexos referidos desta lista são documentos reais do processo descrito e pertencem ao “Centro de Cultura
Cósmica Suprema Luz, Paz e Amor”.
56
Ver www.idacefluris.org.br/institucional/apresent.htm
43

Na União do Vegetal existe a Associação Novo Encanto de Desenvolvimento Ecológico57


que trabalha com:
• plantio e monitoramento das mudas de B. caapi e P. viridis;
• plantio de mudas nativas;
• educação ambiental,
• passeios ecológicos, etc.

Figura 17 – Produção de mudas de B. caapi realizada pelo Centro de Cultura Cósmica

57
ver www.udv.org,br/portugues/area_verde/links/link_para_1/principios_e_objetivos.html
44

2.2.4 – Alquimia Vegetal: do chumbo ao ouro - a transmutação pessoal proporcionada pela


ayahuasca

Distante das visões pessoais emitidas por leigos sobre o chá, intitulando-o muitas vezes
como “droga”, estão os benefícios alcançados por participantes de rituais ayahuasqueiros. Desde
os xamãs peruanos com seus ícaros58 aos centros urbanos não são raros casos de curas relatados
em depoimentos. Segundo Mckenna (2002), a ayahuasca é “não tóxica e terapeuticamente útil
para a medicina” e possui “potencial de cura”.
Estas curas podem alcançar níveis psicológicos59 e os dependentes químicos. Na cidade
de Tarapoto (Peru), o médico francês Jacques Mabit dirige o Centro Takiwasi60 que une o
xamanismo amazônico (com a ayahuasca) e as técnicas contemporâneas de medicina no
tratamento de toxicômanos.
Seguindo o mesmo tipo de trabalho realizado com a ayahuasca e dependentes químicos,
um vitorioso exemplo é o da igreja daimista61 “Centro Eclético e Espiritual, Sanidade, Gratidão e
Doação ‘Céu Sagrado’ ” localizado em Sorocaba – SP. A proporção alcançada de cura entre
dependentes químicos é tão grande que em agosto de 2004, rendeu à igreja “Céu Sagrado” o
“Prêmio Darcy Ribeiro”62, recebido na Câmara Municipal de Sorocaba, por atividades
filantrópicas. Os próprios profissionais da rede publica, em certos casos, encaminham pacientes
diretamente para esta igreja (PROENÇA, 2004).
Os efeitos psíquicos provocados pelo chá63, em última análise, não devem ser vistos como
o único fim almejado por quem utilizada ayahuasca. Existem as influências causados por quem
bebe o chá sobre a sociedade. O grupo de trabalho instituído pela resolução Nº 04/85 do
Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN64), num de seus trabalhos de campo em igrejas do
Santo Daime e UDV constatou em seu relatório65 que:

58
Ícaros são os cânticos dos xamãs curadores em seus rituais.
59
Vários relatos podem ser encontrados em Metzner (2002).
60
Ver www.takiwasi.com e MABIT (2002).
61
O termo daimista refere-se ao uso do Santo Daime (bebida) por uma organização ou pessoas.
62
Este prêmio é concedido pelo instituto de mesmo nome, “Darcy Ribeiro”, para a entidade que mais se destaca no
campo cultural e filantrópico de cada ano.
63
Ver exemplos de De Rios (1972) nas páginas 32 e 33 deste trabalho e Grob (2002).
64
Foi este grupo de trabalho que forneceu informações de campo para a formulação do parecer de 31 de janeiro de
1986 do CONFEN (Conselho Federal de Entorpecentes). Ver página 40.
65
Parte deste relatório está em União do Vegetal (1989).
45

• Findas as cerimônias, todos de uma maneira aparentemente normal e ordeira voltam aos
seus lares. Os seguidores das seitas parecem ser pessoas tranqüilas e felizes. Muitas
atribuem reorganizações familiares, retorno de interesse no trabalho, encontro consigo
próprio e com Deus, etc, através da religião e do chá.
• O efeito observado provavelmente é devido não somente ao chá, mas ao ambiente como
um todo, às músicas, e danças66 concomitantes, etc.

As músicas, hinários, chamadas, salmos, mensagens e palavras proferidas pelos dirigentes67


de cada religião ayahuasqueira, que podem ser percebidas nos diversos rituais, sempre remetem
aos valores espirituais como: amor, perdão, união, paz, firmeza, alegria, etc. Enfim, buscam
consolidar o que as grandes religiões mundiais pregam: fraternidade.

66
O relator deste parecer referia-se ao bailado, pos o termo danças retira um pouco da sacralidade e ordem do ritual.
Tal equívoco deve-se, provavelmente, à inexperiência.
67
Estes possuem virtudes de liderança e carisma que os fazem reconhecidos como pessoas de bem e éticas. Além das
mensagens proferidas pelos dirigentes atuais de cada religião ayahuasqueira (que usa ayahuasca), existem registros
de ensinamentos a palestras dos fundadores já falecidos. Quando não escritos por eles próprios ou gravados em
cassetes, foram (e são) transmitidas oralmente pelos contemporâneos que conviveram com estes sábios homens.
Muitos destes testemunhos foram transformados em livros.
46

2.3 – CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA: O CORDÃO UMBILICAL ENTRE O


HOMEM E A NATUREZA.

A ecologia68 é uma das pautas mais destacadas nos assuntos mundiais. Abrange escalas
globais, como a Amazônia, e vai descendo níveis geográficos e sociais até alcançar um córrego
ameaçado por grileiros69. Mesmo sendo um ramo científico, a ecologia possui um significado nas
mentes mais humildes.
Em 1866, o cientista alemão Ernest Haeckel uniu duas palavras gregas oikos, que
significa casa, e logos, que significa estudo, cunhando a palavra ecologia que, por sua vez,
significa o estudo da casa.
O sistematizador e o colecionador, da época de Haeckel, viam cada ser vivo como peças
individuais. A nova ciência ecológica que surgia considerava os seres como um todo, observando
também a vida dos organismos (AGUESSE, 1972). Parece que houve uma evolução do foco na
natureza, antes via-se as partes passando-se então à visão dos ecossistemas. A própria ecologia
vem evoluindo desde sua aparição como ciência e principalmente quando este termo alcançou
popularidade o que se deu, segundo Acot (1990), em 1970.
A ecologia pode ser definida em sentido estrito como o “estudo da estrutura e função da
natureza. Deve ser perfeitamente compreendido que a humanidade faz parte da natureza, desde
que estamos usando a palavra natureza para incluir todo o mundo vivente” (ODUM, 1975).
A ecologia deixou de ser apenas uma ferramenta de trabalho operada pelo homem para
estudar os animais e as plantas. Hoje existem vários segmentos onde a ecologia está inserida:
ecologia humana, antropologia ecológica, ecologia social, ecologismo, psicoecologia, economia
ecológica, etc.
Uma das lentes pela qual a ecologia passou a usar para observar a natureza é a ética.
“Temos aí uma boa possibilidade de aproximar os termos ética e ecologia. Êthos significa
inicialmente casa e oikos também. Aliás, é esclarecedor para nosso trabalho que o primeiro tenha
passado posteriormente a significar caráter” (DUARTE, 1983).
Unindo a ética e a ecologia surge a “ecologia profunda”, na década de 1970, criada pelo
filósofo norueguês Arne Naess. Contrariando a “ecologia superficial” que visa a proteção da
68
A palavra ecologia é usada, neste trabalho, no seu sentido mais amplo, não se referindo especificamente (nem
desvalorizando) seu sentido puramente acadêmico.
69
Aqueles que se intitulam donos de terras utilizando falsas escrituras.
47

natureza apenas para não se esgotar a matéria prima da economia, a “ecologia profunda” ressalta
o respeito pela vida e pelo valor que cada organismo intrinsecamente possui, independente do
valor que o homem lhe atribui (AVELINE, 1999).
O que acontece atualmente são provas de que o homem não vem respeitando a natureza. É
possível observar através dos meios de comunicação (cada vez mais rápidos e abrangentes) a
destruição constante do planeta Terra. Queimada em florestas, despejo de lixo industrial em rios,
desmatamento de áreas virgens para estabelecer monoculturas ou gado, acidentes ambientais em
larga escala, poluição, comércio de animais silvestres, etc. Mas pelo menos, “estes são os fatos
que estão por trás da tomada de consciência ecológica” (MOSER, 1992). Consciência ecológica é
uma expressão que vem ganhando espaço para além da literatura especificamente ambiental.
Para Capra (1982) a palavra “consciência” (formadora da expressão consciência
ecológica) é usada em varias disciplinas como a psicologia, a filosofia, a física, a neurociência, a
arte e nas tradições místicas. A maioria das concepções existentes, acerca da palavra, parece se
opor em duas correntes que podem ser compatíveis. São elas:
1. Ocidental: onde a consciência surge num determinado ponto de evolução biológica.
2. Mística: nesta corrente a consciência é um estado puro ligado ao divino, de natureza
espiritual.
Seguindo estas definições, pode-se inferir que a consciência ecológica aborda os aspectos
comum e abstrato da relação do homem com a natureza. Nestas relações pode-se incluir a
responsabilidade70 e uma tênue ligação com o planeta chamado Terra. Pois “[...] todas as coisas
estão ligadas como o sangue que une uma família. Há uma ligação em tudo” (SEATTLE, 1954).
Vários autores definiram ou trataram, segundo suas ciências ou culturas, a idéia da
consciência ecológica. Alguns exemplos são:
• “[...] a consciência ecológica está intimamente ligada à preservação do meio ambiente”
(SIRVINSKAS, 2005).
• “[...] não podemos desconhecer nem subestimar os elementos religiosos que integram –
mesmo veladamente – nossa consciência ecológica e nosso comportamento com o Meio
Ambiente” (COIMBRA, 2002).

70
Responsabilidade é um dos significados de consciência, segundo Ferreira (1986).
48

• “[...] a atual versão ocidental da consciência mística, nossa versão do budismo71 ou do


taoísmo72, será a consciência ecológica” (CAPRA, 1981).
• “a consciência ecológica emergiu de forma intuitiva e espontânea durante os movimentos
contraculturais dos anos 60, é espiritual em sua essência, pois espiritualidade [...] é o
modo de consciência em que nos sentimos unidos ao cosmo como um todo, e a ecologia
nos une a Gaia e ao cosmo” (DI BIASE, 1995).
Esta ultima abordagem cita uma entidade chamada ‘Gaia’ e uma breve descrição de seu
significado é importante para a elaboração de uma definição de consciência ecológica que será
apresentada neste tópico do trabalho.
Gaia é o nome dado à Mãe Terra pelos antigos gregos e como foi batizada a hipótese de
James E. Lovelock. Este cientista trabalhou como consultor da NASA (Agência Espacial
Americana) na década de 1960 (período de estudos do planeta Marte). Em suas reflexões, James
E. Lovelock, concebeu a Hipótese de Gaia73 na qual a Terra seria um super organismo dotado de
vida. Suas fundamentações estão no equilíbrio gasoso do planeta (processo que começou a se
formar em períodos pré-históricos) e na regulação das condições climáticas favoráveis à vida
(LOVELOCK, 1989). Ou nas palavras do cientista: “definimos então Gaia como uma entidade
complexa que abrange a biosfera, atmosfera, os oceanos e o solo da Terra; na sua totalidade,
constituem um sistema cibernético74 ou de realimentação que procura um meio físico e químico
ótimo para a vida neste planeta” (LOVELOCK, 1989).

71
Doutrina religiosa que tem como fundador Sidarta Gautama, o Buda.
72
Segmento filosófico-religioso fundado por Lao-Tsé que busca um caminho (Tao) de equilíbrio entre as duas
energias presentes no universo: ying e yang.
73
James E. Lovelock abrange minuciosamente os fatos que sustentam a sua hipótese, em suas publicações, com o
auxílio de Lynn Margullis que é microbiológa.
74
Palavra originada do grego kubernetes = timoneiro. Refere-se à capacidade de uma organismo ou máquina manter-
se num rumo ótimo mediante circunstâncias mutáveis para alcançar um objetivo. Por exemplo: um homem que se
capacita em manter o equilíbrio num barco na água. A cibernética seria o “jogo de corpo” (rumo ótimo); o balanço
da embarcação as “circunstâncias mutáveis”; e manter-se em pé o “objetivo”.
49

Figura 18 – Representação artística de Gaia

Esta concepção da Terra como a Grande Mãe e Pacha Mama, por sua imensa
fecundidade, era adotada por antigas civilizações (BOFF, 1995). Mas durante o progresso da
ciência foi sendo esquecida.
Francis Bacon, no século XVI, foi um dos iniciadores da mudança da forma de ver a
Terra. Antes, ela era uma mãe nutridora, de natureza orgânica, e com os pensamentos de Bacon
passou a ser vista como uma máquina. Descartes e Newton também contribuíram para realçar
esta visão mecânica do mundo. Para Descartes, os organismos (vegetal e animal) eram simples
máquinas. Newton já observava o mundo sob a ótica da física mecânica (que obedecia a leis
imutáveis), e o cosmos também seria uma grande máquina. Porém, a contribuição destes
pensadores é de muita importância para a ciência atual, pois baseando-se em sua doutrina foram
possíveis viagens espaciais (CAPRA, 1982).
Com o esquecimento da essência viva do planeta houve um distanciamento entre o
homem e a natureza. E para Merchant (1989) a imagem materna da Terra (vista como um
50

organismo vivo nutridor) era o que a protegia de degradação, pois ninguém iria destruir sua
própria mãe.
O homem, então esquecido de ‘Gaia’ e obcecado pelo dinheiro, veio ferindo a Terra até os
dias de hoje, formando uma cenário de destruição tão amplo e conhecido que dispensa
descrições.
Não obstante, a ‘hipótese de gaia’ vem ressurgindo tanto na mente dos filósofos e
cientistas como nas mentes das pessoas simples ou das mais variadas formações. Um exemplo é a
afirmação do professor de Direito, Edis Milaré (2004):

A Terra não é simples litosfera coberta, em parte pela hidrosfera e envolta pela
atmosfera. Ela é um gigantesco organismo vivo, de uma vida sui generis75, em que a
biosfera é somente parcela representativa. O maravilhoso fenômeno da vida
planetária é algo transcendente. Por isso requer os cuidados de uma ética apropriada:
a ética da Vida que não se limite à consideração parcial da biosfera, mas busque
alcançar dimensões planetárias e cósmicas.

Observa-se o surgimento de uma visão mundial, propiciada pela física moderna, em que a
“concepção mecanicista” é transcendida. Esta nova visão pode ser caracterizada pelas palavras
orgânica, holística e ecológica (CAPRA, 1982).
A consciência ecológica é formada por palavras que cada vez mais agregam para si novos
sentidos. Sendo assim, a consciência ecológica é uma expressão maleável.
Um dos grandes ecólogos mundiais, Eugene P. Odum, propôs uma “nova ecologia” onde
o “holismo”76 estaria na ciência e tecnologia. Não seria uma interdisciplina, mas uma disciplina
integrativa com abrangência nos campos da economia e da política (ODUM, 1977).
Esta visão holística possui um papel importante na ciência atual e a transdisciplinaridade
que pode envolvê-la foi ressaltada num documento chamado ‘Declaração de Veneza’77,
organizado pela UNESCO78, em seu terceiro ponto:

75
Expressão do latim que significa: peculiar (FERREIRA, 1986).
76
O holismo, do grego holos = o todo, é uma concepção de abrangência, onde, por exemplo, uma ciência conteria
uma parte de todas as outras ciência. Tudo estaria conectado e relacionado.
77
A Declaração de Veneza é um documento escrito por vários pensadores e cientistas mundiais em Veneza, entre os
dias 3 e 7 de março de 1986. Foi organizado pela UNESCO com a colaboração da Fundação Giorgio Cini. Pode ser
encontrada em Brandão (1991).
78
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
51

Recusando qualquer projeto globalizante, qualquer sistema fechado de pensamento,


qualquer nova utopia, reconhecemos, ao mesmo tempo, a urgência de uma pesquisa
verdadeiramente transdisciplinar, em intercâmbio dinâmico entre as ciências
“exatas”, as ciências “humanas”, a arte e a tradição. De certa forma, essa abordagem
transdisciplinar está escrita em nosso próprio cérebro através da interação dinâmica
entre seus dois hemisférios. O estudo conjunto da natureza e do imaginário, do
universo e do homem poderia, assim, aproximar-se melhor do real e permitir-nos
enfrentar melhor os diferentes desafios de nossa época.

Com os argumentos expostos nesse tópico é possível sintetizar uma definição


experimental de consciência ecológica. Qual seria:
A consciência ecológica é uma virtude espiritual enraizada num sentimento vivo de amor
e respeito entre os seres humanos e a natureza e que vê estas partes intimamente ligadas
formando um só corpo: o planeta Terra.
52

2.4 – CONEXÕES OCULTAS: INTERSECÇÃO ENTRE A ENGENHARIA


FLORESTAL, A AYAHUASCA, O SAGRADO E A CONSCIÊNCIA
ECOLÓGICA.

Num primeiro exame, é possível considerar todos estes elementos distintos entre si:
engenharia florestal, o sagrado, a ayahuasca e a consciência ecológica. Porém, uma observação
minuciosa e uma abordagem holística poderão iluminar as conexões ocultas que ligam estes
temas.
A abordagem holística é um dos princípios básicos do Programa Nacional de Floresta79 da
FAO (Food and Agriculture Organization). Também relacionada com a ONU (Organização das
Nações Unidas), a Agenda 2180, em seu capítulo 11 (Combate ao Desflorestamento81), ressalta a
proteção das florestas em seus valores ambientais, sociais e espirituais.
Sob esta perspectiva, a ciência florestal pode ser enriquecida com o holismo ou a
multidisciplinaridade e convida à reflexão sobre o caráter espiritual ou sagrado que as formações
florestais podem ter.
Alguns dos pioneiros escritores sobre a ciência florestal brasileira, possuíam a percepção
de “algo a mais” presente nas florestas. É o que sugere Pereira (1950) numa de suas definições de
floresta, encontrada na obra “Direito Florestal Brasileiro”:

O direito pela floresta não se continha nos puros limites da administração leiga. O
reconhecimento de sua importância, a perfeita verificação dos imensos benefícios que
ele traz ao Homem e a todos seres animados, elevou a floresta a um dos maiores dons
concedidos pela natureza. Encheu de admiração os seus espectadores, maravilhados
com a milagrosa influencia da mesma, na formação dos alimentos, do vestuário, dos
utensílios, da habitação, de tudo enfim que é indispensável à vida. Tão poderoso fator
para a sobrevivência da Humanidade não poderia deixar de ser uma “Força Divina” e
como tal merecedora de culto e de templos em que se fosse devidamente adorada.

79
Conferir www.fao.org/forestry/site/3067/en (Acesso em 13/06/2005).
80
A Agenda 21 é o fruto de uma das maiores reuniões mundiais (179 países), a “Cúpula da Terra”, no Rio de Janeiro
em 1992.
81
Capítulo 11 (11.13 (b) ).
53

Outro exemplo é um texto encontrado na coleção “Relíquias Bibliográficas Florestais”


(VIEIRA SOUTO, LÖFGREN, 2001) Umas das idéias transmitidas é que o valor das florestas
não se deve às somas do preço das madeiras nelas contidas. Existe também um benefício para a
saúde e o bem estar do povo.
Muitos povos mundiais vêem a floresta como uma manifestação do sagrado. Exemplos
são os hindus e aborígines. Mas os ayahuasqueiros também, pois mesmo estando nos centros
urbanos o uso do ritual da bebida possui vínculos com a floresta que para eles é o “centro do
mundo”82 (CHAPUIS, 2002).
A ayahuasca não se liga a floresta83apenas por esta ser seu local de origem. O próprio
manejo das espécies que compõem o chá necessita do parecer dos técnicos florestais. A FAO,
numa de suas publicações84, considera a ayahuasca um dos principais produtos florestais não
madeireiros e descreve o seu uso pelos xamãs, classificando o chá como produto medicinal e
estimulante.
Os parques florestais também são temas inspirados pelas religiões ayahuasqueiras.
Spencer Nogueira projetou um núcleo florestal, com hotel e um centro de estudos da flora e fauna
amazônicas. O projeto é inspirado na UDV, religião ayahuasqueira na qual tem experiência
(LABATE, 2002).
A arquiteta Florência Chapuis (2002) em sua tese de doutorado propôs a criação de um
parque onde o elemento central é o contato com a natureza. Primeiramente a autora decidiu criar
um Centro Regional85 que estaria em contato com a natureza mas perto da cidade. Com o
desenvolvimento da pesquisa o objetivo mudou, buscando-se então, a elaboração de um Parque
Público86, no qual muitos valores do ritual do Santo Daime estariam presentes. O parque do
Jaraguá87 seria no município de Osasco – SP e conteria 61% de vegetação (42% de mata atlântica
e 19% de plantio de eucaliptos). Alguns dos elementos fundamentais do projeto são:

82
Este “Centro do Mundo” é como o exposto por Elíade (1991, 1993)
83
Tudo que se relaciona com a floresta, se não diretamente, indiretamente pode ser relevante para a engenharia
florestal.
84
No site oficial da FAO está disponível em meio eletrônico o livro “Desarollo de productos florestales no
madereros em América Latina y el Caribe”. Conferir www.fao.org/docrep/t2360s/2360s00.htm e
www.fao.org///docrep/t2360s/t2360s04.htm (Acesso em 13/06/2005).
85
Esta primeira idéia seria um espaço físico apenas para daimistas.
86
O novo objetivo que é o Parque, agora torna-se um ponto de encontro para todas as religiões e visitantes, sendo
considerado um espaço ecumênico.
87
Jaraguá significa “Senhor dos Vales”. Referência à topografia da região.
54

• A idéia de retorno à floresta mítica;


• A necessidade de espaços para a celebração de rituais religiosos de religação, com a
natureza ou origem.
• A necessidade de disponibilizar esse contato com a natureza para a população em geral.
A natureza, a floresta e a ecologia são elementos presentes nas religiões ayahuasqueiras
que também proporcionam o desenvolvimento da consciência ecológica. O psicólogo PhD, Ralph
Metzner (2002) conclui que os ayahuasqueiros vivem os mistérios da natureza, buscam uma vida
equilibrada diminuindo os danos ambientais e celebrando a diversidade e beleza da vida.
Além do contato físico dos ayahuasqueiros com a floresta88, parte dos elementos
ritualísticos das religiões, que utilizam o chá sagrado da Amazônia, promove reflexões sobre a
consciência ecológica. Nos hinários89 e nas músicas90, observa-se a presença dos elementos:
Floresta e Natureza. Para ilustrar, abaixo estão as letras de um hino e de uma canção sobre o
tema.

88
Os ayahuasqueiros das metrópoles consideram a viagem para a floresta como uma peregrinação espiritual. É como
se a Amazônia fosse uma “Meca”.
89
Os hinários são um conjunto de hinos (a manifestação musical sagrada do Santo Daime).
90
As músicas, selecionadas dentre o repertório da música popular brasileira, são o veículo de transmissão de algumas
mensagens e ocorrem em religiões ayahuasqueiras como a UDV.
55

PLANETA AZUL AMOR À TERRA

Quando penso no futuro do nosso planeta Mamãe Terra, ela trata bem seus filhos
Fatalmente eu me lembro dessa gente tão careta Mas os filhos, não ligam importância
Que não ta nem aí pro que pode acontecer Dá o alimento, dá as curas, dá a força
Que tudo quer pra si e não quer nem saber E tanta beleza para apreciar
E o que será das crianças e de toda evolução
E o que fará a ciência contra essa corrosão Aprecie tudo o que ela oferece
Ecologistas sim, imediatistas não E a nós entrega com todo vosso amor
E como controlar toda essa poluição Respire fundo e preste mais atenção
Veja o que você joga pelo chão
Revolução, sem choro nem guerra
Evolução, paz, vida e amor na terra Muitos se dizem filho da floresta
Mas bem poucos a ela têm amor
Me sinto indispensável como tantos, e você Até lixo lhe atiram sem respeito
Tentando com a canção atrair a sua atenção Porque não ouvem o canto do beija-flor
Fazer um mundo novo sem fome, sem corrupção
Unindo nosso desejo numa só intenção Pra merecer esta morada é preciso
Precisamos salvar as florestas e a Amazônia Ter respeito e viver em harmonia
E proteger sua vida contra a devastação Educação, humildade, gratidão
É o pulmão da Terra, equilíbrio, proteção Porque tudo é sagrado, meu irmão
E como controlar toda essa poluição...
Lá no céu, o Sol, a Lua e as estrelas
Não dá mais pra esperar, não dá mais pra seguir É Deus em tudo e em todo o lugar
Tanto faz norte ou sul, a verdade está aí Deus no vento, Deus na Terra, Deus no Mar
É preciso salvar o planeta azul... Pra todos nós, louvar e respeitar.

Baby Consuelo e Nando Chagas – Ora pro nobis Hino 3 do Hinário “Fluente Luz Universal”
do Padrinho José Ricardo.
56

Uma pessoa com consciência ecológica91 muitas vezes pode agir (e contribuir) como um
engenheiro florestal. Em sua formação, este profissional, adquiriu conhecimentos de como
preservar o solo, as águas, as florestas, o ambiente e a necessidade de plantar árvores92. Este tipo
de atitude perante a natureza não é exclusiva dos profissionais da área ambiental e nem de
participantes de religiões ou filosofias específicas. Qualquer pessoa pode desenvolver este senso;
esta consciência ecológica.
O termo ‘engenharia’ significa: “arte de aplicar conhecimentos científicos e empíricos e
certas habilitações específicas à criação de estruturas, dispositivos e processos que se utilizam
para converter recursos naturais em formas adequadas ao atendimento das necessidades
humanas” (FERREIRA, 1986). O engenheiro florestal usa o conhecimento para extrair dos
recursos florestais produtos e serviços para a humanidade. Sendo assim, munidos de uma
consciência ecológica, as operações realizadas na floresta poderiam produzir menos impacto para
o meio ambiente e conseqüentemente menos repercussões negativas para o homem e menos
desperdício dos recursos naturais que são lentamente renovados e ameaçam extinguir-se.

91
Esta expressão não é apresentada em nenhuma parte deste trabalho como sendo a única para expressar respeito e
reverência pela natureza, bem como o conhecimento científico e ecológico.
92
O conhecimento de um engenheiro florestal também inclui: taxonomia, dendrometria, anatomia vegetal, etc.
57

3 – MATERIAL E MÉTODOS

A realização deste trabalho foi executada em duas etapas:

1ª) Revisão de Literatura

Nesta etapa foram expostos os temas: o sagrado e as árvores/florestas; a ayahuasca; e a


consciência ecológica. Buscou-se uma abrangência dos temas apresentando-se algumas
ramificações possíveis de cada um. Cada ramificação não foi abordada em sua plenitude e
aprofundamento, pois além de potencialmente serem temas capazes de originar, cada qual, um
‘trabalho final’, o escopo maior era possibilitar uma visão clara, ampla e sólida dos temas
principais.
A revisão de literatura também serviu para formalizar93 parte dos objetivos do trabalho e
como embasamento temático de um questionário.

2ª) Questionário

O trabalho de campo foi realizado com a aplicação de um questionário de 10 perguntas


relacionadas com a revisão de literatura e com os objetivos buscados. Ao responderem o
questionário, os entrevistados foram acompanhados pelo aplicador94 para eventuais
esclarecimentos.
Foram aplicados 100 questionários ao todo, divididos para 2 grupos que possuíam como
diferença básica o uso regular ou não da ayahuasca em rituais religiosos.
Sendo assim, optou-se aplicar 50 questionários numa igreja ayahuasqueira e os outros 50
em lugares de intenso movimento público. Os grupos foram chamados de ‘grupo aleatório’, para
aplicação em locais públicos, e ‘grupo ayahuasqueiro’, para a aplicação em igreja ayahuasqueira.
Ainda dentro de cada grupo, metade dos questionários se destinava aos homens e metade às
mulheres. Não se estabeleceu limites para as idades.

93
No sentido de dar forma.
94
Todos os questionários foram aplicados pelo autor deste trabalho.
58

• Grupo Aleatório: a aplicação do questionário a este grupo ocorreu no dia 30 de maio de


2005, no parque Olhos D’água (compreendendo as superquadras 413 e 414 e a área
comercial 414/415 todas na Asa Norte - Brasília) e no Campus Universitário Darcy
Ribeiro da Universidade de Brasília, também na Asa Norte.
• Grupo Ayahuasqueiro: neste grupo a aplicação ocorreu no dia 1º de junho de 2005, na
sede geral do Centro de Cultura Cósmica Suprema Luz, Paz e Amor (Núcleo Rural Casa
Grande – 8 MA – chácara 11 – Gama – DF). Aproveitou-se uma reunião ritualística
extraordinária que reuniu muitas pessoas.

As perguntas de 1 a 6 formam a parte do questionário referente à sacralidade da floresta e


a consciência ecológica. As perguntas de 7 a 10 participam do tema ayahuasca.
Cada pergunta poderá ser analisada de uma ou das duas formas95 seguintes:

a)Análise Específica: as unidades amostrais (grupo aleatório e grupo específico) serão


analisadas separadamente e comparadas entre si.
b)Análise Geral: a amostra (que são os dois grupos aleatório e ayahuasqueiro
considerados como um) mostrará a opinião dos entrevistados como um todo.

As perguntas do questionário96 aplicado são apresentadas aqui:

1-Você considera a floresta sagrada ?

2-Você acredita que um viver mais ligado à natureza influencia, positivamente , um contato
religioso para o ser humano ?

3-Para você é possível que a religião ajude o ser humano a proteger a natureza ?

95
De acordo com a característica de pergunta e as respostas obtidas.
96
Sua formatação para aplicação em campo é o anexo 8.
59

“A Consciência Ecológica é uma virtude espiritual, enraizada num sentimento vivo de amor
e respeito entre os seres humanos e a natureza e que vê estas partes intimamente ligadas
formando um só corpo: o planeta Terra.”

4-Esta é uma boa definição de consciência ecológica ?

5-Você acha que a consciência ecológica pode equilibrar, beneficamente, o convívio do ser
humano com a natureza e com os povos da Terra?

6- Para você, a palavra Amor pode trazer este equilíbrio ?

7- Você conhece o Daime ou a Ayahuasca97 ?

8- Você gostaria de participar de uma cerimônia que utiliza o chá, sem bebê-lo, com o intuito
de conhecer este tipo de reunião?

9- Você sabia que as igrejas sérias são legalizadas e autorizadas à funcionarem pela justiça
governamental brasileira e que existem grupos nos Estados Unidos e na Europa ?

10- Você sabia que existem relatos de curas orgânicas pessoais e de toxicômanos, em níveis
reconhecidos por autoridades competentes ?

97
Estas duas palavras são usadas como sinônimos; foi citada mais de uma possibilidade para abranger melhor o
conhecimento das pessoas.
60

4 – RESULTADO E DISCUSSÃO

Parte dos objetivo foi alcançada na revisão de literatura. Já o questionário será analisado
na seqüência das perguntas e de acordo com as respostas (em porcentagem) que podem ser
observadas nas figuras 19 e 20. A figura 19 mostra o resultado da pesquisa considerando os dois
grupos (aleatório e ayahuasqueiro) como um só e será chamado ‘Análise Geral’, sua
peculiaridade está na seqüência das perguntas que será até a de número 6 (pois este tipo de
análise não foi muito compatível com as perguntas de 7 a 10)98.
A figura 20 mostra a ‘Análise Específica’ tratando os dois grupos (aleatório e
ayahuasqueiro) separadamente. Em ambas as figuras o eixo Y representa as porcentagens e o eixo
X representa as perguntas (que estão representadas pela letra ‘P’ seguida do número
correspondente à questão).

98
As perguntas 7 a 10 são voltadas para o tema ‘ayahuasca’ e como um dos grupos é ligado diretamente com o tema
uma análise geral pode ser tendenciosa.
61

Pergunta 1: “Você considera a floresta sagrada ?”

Análise Geral: Para a maioria dos entrevistados (86%) a floresta é sagrada. Este valor
99
sacro também foi reconhecido na Eco-92 , mostrando que esta valoração ambiental existe em
níveis relevantes entre os seres humanos.

Análise Específica: O grupo ayahuasqueiro concordou totalmente (100%) com a idéia de


sacralidade da floresta. No grupo aleatório 72% das pessoas considera a floresta sagrada. Esta
diferença pode ser explicada pela presença forte do elemento ‘floresta’ na cultura ayahuasqueira.
As duas religiões mais bem estabelecidas, organizadas e divulgadas do Brasil, o Santo Daime e a
União do Vegetal, apresentam estes valores em relação à floresta :
• “É neste ponto que estamos guardiões dessa floresta, querendo preservar não apenas a
beleza e a diversidade de sua natureza, como também resgatar o sentido sagrado da sua
existência (Santo Daime)100”.
• “Como sociedade Religiosa, a UDV tem na Amazônia não apenas sua origem espacial,
mas a ela está ligada por valores essenciais de espiritualidade (UDV)101.”

99
Ver página 52.
100
Em:<http:www.idacefluris.org.br/institucional/apresent.htm> acesso em: 04 de junho 2005.
62

Pergunta 2: “Você acredita que um viver mais ligado à natureza influencia, positivamente , um
contato religioso para o ser humano ?”

Análise Geral: Atualmente os recursos naturais e paisagísticos vêm apresentando


utilidades psicológicas para o homem. No mundo existem vários relatos onde as pessoas dizem
existir entre elas e a natureza uma conexão espiritual (TAYLOR, 2004).
Uma das abordagens do ecoturismo é o retorno à natureza, na qual o passeio se transforma
numa experiência sagrada (GOMES, 2000).
A maioria das pessoas (90%) considerou que a natureza pode trazer mais espiritualidade ao
ser humano.

Análise Específica: Todos ayahuasqueiros (100%) concordam que a natureza exerce


influências espirituais no homem. Este índice foi 20% maior que a aceitação do grupo aleatório,
que também, em sua maioria (80%), respondeu sim à pergunta.
Este resultado reflete a intenção de muitas pessoas que bebem o chá em buscar um enlevo
de sua experiência religiosa na floresta, pois é nela que se originam os “mistérios” da ayahuasca.

Pergunta 3: “Para você é possível que a religião ajude o ser humano a proteger a natureza ?”

Análise Geral: A maioria dos entrevistados (87%) creditou à religião um fator ecologista.
Para Elíade (1971)102 “[...] a vida religiosa consiste precisamente no exaltar da solidariedade do
homem com a vida e a Natureza”.
Religiões mundiais possuem em suas raízes considerações importantes sobre a relação
homem-natureza. Eis alguns exemplos:
• Certas leis do Islã são baseadas no Al Corão. Passagens deste livro sagrado
reforçam que os elementos dos reinos vegetal e animal são seres viventes; seres
criados por Allah (Deus), assim como os humanos. E todos seres devem ser
respeitados (MASRI, 1997). O profeta Maomé (A Paz esteja com Ele)103 em

101
Em:<http:www.udv.org.br/portugues/area_verde/index.html> acesso em:04 de junho de 2005.
102
Esta citação de Mircea Eliade está em Schwarz et al. (1993).
103
Uma das expressões usadas em forma de respeito ao se referir ao principal profeta do islamismo.
63

sábias palavras mostra a unidade da criação: “Todo aquele que é bom para as
criaturas de Deus, é bom para consigo mesmo104“.
• Prime (1996) mostra que os hindus também possuem uma perspectiva ecológica
sobre a natureza. Para eles, a prosperidade e felicidade são o resultado da
harmonia religiosa entre o homem e a natureza. O mesmo autor declara: “viver em
harmonia com a natureza, demonstrar amor para com todas criaturas, nunca
maltratar um ser vivente, regozijar-se na Beleza de uma vida natural de
simplicidade: esta era a prática religiosa de Krishna105”.
• É interessante notar que o calendário judaico traz algumas festas que podem ser
consideradas ecológicas. Uma delas, descrita por Wainer (1996), é o “Ano Novo
das Árvores”. Esta comemoração anual ocorre em Tu Bishvat (15 de Shvat), o que
equivale a data aproximada de 15 de janeiro no calendário cristão. Neste dia são
plantadas muitas árvores, especialmente pelas crianças.
• O cristianismo ecológico é fortemente influenciado pelo exemplo de São
Francisco de Assis e pela mensagem de amor universal trazida por Cristo.

Análise Específica: Talvez por terem a floresta como sagrada e por serem adeptos de uma
religião ligada à natureza, os ayahuasqueiros possuam um sentimento de proteção ao
mundo natural. Estes fatos podem ter influenciado uma maior associação entre religião e
ecologismo no grupo ayahuasqueiro (98%) que no grupo aleatório (76%).
Mesmo distantes da floresta, os ayahuasqueiros urbanos estão fortemente vinculados à ela
e preocupam-se em preservar todo esse mundo encantado (CHAPUIS, 2002).

Pergunta 4: “A Consciência Ecológica é uma virtude espiritual, enraizada num sentimento vivo
de amor e respeito entre os seres humanos e a natureza e que vê estas partes intimamente
ligadas formando um só corpo: o planeta Terra”. Esta é uma boa definição de consciência
ecológica ?

104
Citação encontrada em Masri(1997).
105
Deidade principal do hinduísmo.
64

Análise Geral: De todos entrevistados 85% considerou esta uma boa definição de
consciência ecológica. A intenção desta definição foi englobar elementos
(interdependência, interligação, religião e espiritualidade) apresentados por Capra &
Steindl-Rast (1991) ao abordarem o tema; as idéias apresentadas no tópico Consciência
Ecológica deste trabalho; e o amor (por ser um valor difundido nas tradições
espiritualistas).

Análise Específica: O grupo dos ayahuasqueiros concordou plenamente (100%) que esta é
uma boa definição de consciência ecológica; um índice de 30 % a mais que o grupo
aleatório (este registrou 70% de aprovação do conceito apresentado).
A diferença constatada pode estar no fato de que um segmento religioso (qualquer um)
está mais familiarizado com a forma de uso das palavras no conceito que conecta
elementos subjetivos (espiritualidade e amor) com a ecologia enquanto ciência material.

Pergunta 5: “Você acha que a consciência ecológica pode equilibrar, beneficamente, o convívio
do ser humano com a natureza e com os povos da Terra?”

Análise Geral: Esta análise apresentou um resultado quase homogêneo (98%)106 e por isto
dispensou-se a análise específica. A maioria das pessoas entrevistadas acredita que a
consciência ecológica pode ser um meio de minimizar os danos à natureza bem como
diminuir os conflitos entre as nações. A interdependência e a conexão de todos os seres ,
implícitas na consciência ecológica, pode ter influenciado este resultado.
Um dos documentos apresentados pela ONU na Eco-92107 corrobora, ao menos em parte,
com a idéia contida na pergunta 5 do questionário. O documento em seu 25º Princípio diz:
“Paz, desenvolvimento e proteção ao meio ambiente são interdependentes e indivisíveis”.

Pergunta 6: “Para você, a palavra Amor pode trazer este equilíbrio ?”

106
Ou seja, os dois grupos responderam, praticamente em 100%, sim à pergunta.
107
O nome do documento é ‘Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento’ e encontra-se em
Grayson (s/d).
65

Análise Geral: Da mesma forma que na pergunta anterior, as respostas desta pergunta
foram quase homogênea e dispensou-se a análise específica. O amor foi considerado pela
maioria dos entrevistados (96%) como uma das formas de se obter o sucesso na proteção
da natureza e na harmonização dos conflitos humanos108. A causa pode ser que este valor
espiritual é muito difundido nas religiões e filosofias espirituais.
Em seu livro História da Ecologia, Acot (1990) faz um belo ‘casamento’ entre amor e
ecologia:

De fato, a essência do pensamento ecologista é ser, como veremos, um pensamento


de amor e de aliança. De amor e aliança entre os seres humanos; de amor e aliança
entre os homens e a natureza: necessidades profundas que ensinam as inter-relações
ecossistêmicas, em sua infinita complexidade.

Na pergunta foi utilizada a palavra amor como uma das formas de harmonizar as
relações do ser humano com seu meio, mas outras virtudes também poderiam ser citadas
como: compaixão, fraternidade, etc. Por serem pouco referenciadas na literatura científica
atual muitos cientistas não reconhecem estas virtudes inerentes à natureza humana e suas
possíveis repercussões positivas em todos os campos da sociedade.
A riqueza das qualidades humanas pode iluminar a ciência com uma nova
perspectiva; somando a sabedoria com a inteligência. Se este novo paradigma se
estabelecer muitos serão os benefícios, inclusive para a engenharia florestal. Pois a
“introdução de uma parcela de humanismo na Engenharia constitui aspecto de
extraordinária importância na atualidade, em face da necessidade cada vez mais imperiosa
de compatibilizar o desenvolvimento tecnológico com a manutenção da qualidade do
ambiente indispensável à sobrevivência e bem-estar da humanidade (BRANCO 1980)”.

Pergunta 7: “Você conhece o Daime ou a Ayahuasca ?”

Nesta pergunta será analisado apenas o grupo aleatório, pois o grupo ayahuasqueiro é,
obviamente, conhecedor do chá.

108
Conferir a relação entre as perguntas 5 e 6.
66

-Análise Específica: Menos de 50% (mais precisamente 44%) das pessoas entrevistadas
aleatoriamente conheciam a ayahuasca. Os meios de comunicação não abordam com
freqüência o tema das religiões ayahuasqueiras (que não fazem propagandas publicitárias
sobre si mesmas). Mas mesmo assim, Brasília apresenta uma alta concentração de igrejas
ayahuasqueiras e na internet é possível encontrar muito material sobre o assunto109. Esses
fatores são suficientes para informar pelo menos a existência desta prática religiosa.

Pergunta 8: “Você gostaria de participar de uma cerimônia que utiliza o chá, sem bebê-lo, com o
intuito de conhecer este tipo de reunião?”

A Análise Específica do grupo aleatório será realizada com base nos 44% (22 pessoas)
que disseram conhecer a ayahuasca na pergunta anterior (número 7). Para o grupo
ayahuasqueiro a análise foi feita apenas com as pessoas que responderam sim a esta
pergunta (pois houve omissões).

-Análise Específica (grupo aleatório): As poucas divulgações que ocorrem nos meios de
comunicações à respeito da ayahuasca, em sua maioria, são pejorativas ou não espelham a
verdade sobre a essência do tema. Isto pode contribuir para que as pessoas tenham má
impressão sobre o uso ritual deste chá.
Outras possibilidades que podem contribuir para a minoria das pessoas (36,4%) se propor
em conhecer este ritual são as convicções próprias religiosas ou éticas, o que, de modo
algum é degradante para a pessoa.

-Análise Específica (grupo ayahuasqueiro): A pergunta número 8 trouxe alguns


questionamentos para as pessoas que já bebem o chá. Elas julgaram ser difícil responder,
pois já lhes era conhecido um ritual ayahuasqueiro e por conveniência optaram se omitir.
A quantidade de omissões alcançou 14% (7 pessoas) . Foram favoráveis em conhecer um
ritual ayahuasqueiro, sem beber o chá, 64% do grupo e não favoráveis 22%.

109
Infelizmente na internet também encontram-se informações distorcidas sobre a ayahuasca.
67

Pergunta 9: “Você sabia que as igrejas sérias são legalizadas e autorizadas à funcionarem pela
justiça governamental brasileira e que existem grupos nos Estados Unidos e na Europa ?”

Análise Específica (grupo aleatório): A maioria das pessoas (63,6%) que conheciam o chá
(do grupo aleatório) já tinha conhecimento sobre o aspecto legal deste ritual perante a
justiça brasileira e da existência de igrejas ayahuasqueiras no exterior.

Análise Específica (grupo ayahuasqueiro): Todos entrevistados (100%) deste grupo


sabiam da legalidade de sua opção religiosa e da existência de igrejas no exterior.

Pergunta 10: “Você sabia que existem relatos de curas orgânicas pessoais e de toxicômanos,
em níveis reconhecidos por autoridades competentes?”

Análise Específica (grupo aleatório): O conhecimento da utilidade terapêutica do chá foi


demonstrada por 40,1% das pessoas aleatórias que conheciam a ayahuasca. A utilidade
terapêutica desta bebida está em caráter experimental como anunciado pela Resolução Nº
4/2004 do CONAD110.
Este tipo de estudo é relevante pois segundo um dos consultores da Organização Mundial
de Saúde, o médico Glacus de Souza Brito, muitas pessoas que bebem o chá relatam curas
de vários males e estados doentios111. Como exemplos de tratamento de toxicômanos,
recita-se o Centro Takiwasi112, em Tarapoto - Peru, e a “Igreja Céu Sagrado”113, em
Sorocaba - São Paulo.

Análise Específica (grupo ayahuasqueiro): Do grupo ayahuasqueiro a maioria (96%) tinha


conhecimento da utilidade terapêutica que o chá pode proporcionar.

110
Ver página 41 e anexo 3.
111
Conferir Brito (2002) na bibliografia.
112
Ver página 44.
113
Ver página 44.
68

5 – CONCLUSÕES

De acordo com o questionário aplicado, o qual foi embasado na revisão de literatura, as


seguintes conclusões puderam ser obtidas:

• Quanto à sacralidade da floresta (perguntas 1, 2 e 3):


Análise Geral: grande parte dos entrevistados estabeleceu uma ligação entre
espiritualidade e a floresta/natureza. Foi reconhecido, por 86% das pessoas em geral, um
caráter sagrado da floresta e creditado à natureza a característica de possibilitar uma
conexão religiosa para o ser humano por 90% dos entrevistados. Grande parte das pessoas
(87%) também julgou que é viável para uma religião estabelecer vínculos protecionistas
com o meio ambiente.
Análise Específica: comparando os resultados do grupo aleatório e do grupo
ayahuasqueiro foi possível notar que este último fez uma ligação maior entre a floresta e
os valores espirituais do que o grupo aleatório.

• Quanto à consciência ecológica (perguntas 4, 5 e 6):

Análise Geral: o conceito de consciência ecológica apresentado no questionário alcançou


boa aceitação (85%), mas ele pode ser melhorado. A consciência ecológica possui outras
definições, possibilitando que o público já tivesse uma noção de seu significado e que ela
fosse vista por 98% das pessoas como uma ferramenta para reparar os estragos na
natureza e para ajustar o relacionamento entre os seres humanos. Um dos meios para o ser
humano alcançar o equilíbrio entre si e com a natureza foi a expressão do amor. Quase
todos entrevistados (96%) aderiram favoravelmente a este valor humano como um recurso
valioso.
Análise Específica: o grupo ayahuasqueiro teve uma aceitação maior do conceito de
consciência ecológica e de sua importância, junto com o amor, para melhorar a proteção à
natureza e desenvolver a paz entre os homens.
69

• Quanto à ayahuasca (perguntas 7, 8, 9 e 10):

Análise Geral: Verificou-se ser razoavelmente conhecido (46%), pelo público aleatório, o
uso ritualístico da ayahuasca. Dentre estas pessoas que sabiam o que era a ayahuasca
poucas (22%) expressaram interesse em conhecer alguma igreja ayahuasqueira e boa parte
(63,6%) era consciente da legalidade desta prática religiosa. Verificou-se também ser
pouco conhecida (40,9%) a utilidade terapêutica do chá.
Análise Específica: este conjunto de perguntas foi específico para o grupo aleatório, mas o
grupo ayahuasqueiro também respondeu a esta seqüência de questões e apresentou maior
incidência de respostas positivas em comparação com o grupo aleatório.
70

6 – RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES

1) De caráter científico:
• A pesquisa iniciada com o presente trabalho mostra direções que podem ser tomadas
para o aprofundamento em certos temas apresentados. Pode-se abordar a consciência
ecológica como um dos meios educacionais para um desenvolvimento sustentável.
• O questionário pode ser aprofundado, aumentado e conter perguntas abertas. O
número de entrevistados pode aumentar criando também novas classes para análise
dos dados como sexo e idade.
• O conceito de consciência ecológica pode ser melhorado incluindo nele elementos
mais explícitos de sustentabilidade , manejo, extrativismo, etc.
• Como forma de enriquecer a formação acadêmica dos universitários poderiam haver
abordagens mais holísticas nas disciplinas.
• Os Engenheiros Florestais em formação poderiam exercitar a criatividade na busca de
‘soluções’ não convencionais. Ou seja, ir por caminhos pouco explorados. Por
exemplo, o que poderia se fazer com a lignina que é descartada dos processos de
fabricação do papel? Será que este composto químico, mesmo sendo complexo, não
poderia ter alguma utilidade? Ou ainda, será que os resíduos madeireiros descartados
pelas grandes serrarias não poderiam se juntar com o plástico (existente em excesso na
Terra) para formar um novo material pra fazer móveis, chapas, etc?

2) De caráter holístico:
• Odum (1988) diz: “Quando o ‘Estudo da Casa’ (Ecologia) e a ‘administração da
casa’ (Economia) puderem fundir-se, e quando a Ética puder ser estendida para
incluir o ambiente, além dos valores humanos, então poderemos realmente ser
otimistas em relação ao futuro da humanidade.” Com este intercâmbio poderiam
formar-se ecolomistas (ecologistas+economistas). Pessoas com a capacidade de
preservar e usufruir ao mesmo tempo dos recursos naturais. Existem muitas
pequenas atitudes do dia-a-dia que contribuiriam para diminuir o desgaste
ambiental como: emitir menos lixo que não seja biodegradável, usar menos
71

plástico, não usar carro quando as distâncias a percorrer forem pequenas, plantar
árvores, menos desperdício de água, etc.
• Uma das citações correntes nas novas abordagens holísticas ambientais é: “Pensar
globalmente. Agir localmente”.
• Contemplar a natureza que está dentro e ao redor de cada ser humano e tentar
perceber a presença da Grande Vida.
72

7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ANEXOS
ANEXO 1

PARECER CONFEN SUBMETIDO À PLENÁRIA EM 31 DE JANEIRO DE 1986

Segue-se o parecer do Grupo de trabalho, submetido à plenária em 31 de janeiro de


1986, que foi aprovado por unanimidade:

“O Grupo de Trabalho instituído pela resolução Número 04/85 para examinar


questão relacionada com a produção e consumo de substâncias derivadas de espécies
vegetais;

CONSIDERANDO o exame e o respectivo relatório, elaborados pelos Drs. ISAC


GERMANO KARNIOL e SÉRGIO DARIO SEIBEL, relativamente às plantas conhecidas,
popularmente, por “Mariri” e “Chacrona”, cujos nomes científicos são “Banisteriopsis
Caapi” e “Psicotria Viridis”;

CONSIDERANDO que o supracitado exame foi realizado em Rio Branco, Capital do


Estado do Acre, junto a comunidades religiosas, que fazem o uso ritual do produto da
decocção do “Mariri” e “Chacrona”, produto esse que corresponde ao chã, comumente
chamado de “Daime”;

CONSIDERANDO que o referido uso ritual do “Daime” há muitas décadas vem


sendo feito, sem que tenha redundado em qualquer prejuízo social conhecido;

CONSIDERANDO que, segundo o relatório antes referido, “padrões morais e éticos


de comportamento em tudo semelhantes aos existente e recomendados na nossa sociedade,
por vezes até de modo bastante rígido, são observados nas diversas seitas”;

CONSIDERANDO que a Resolução Número 04/85, atenta aos múltiplos aspectos


envolvidos no uso ritual de substâncias derivadas de espécies vegetais, por comunidades
religiosas ou indígenas, tais como os sociológicos, antropológicos, químicos, médicos e da
saúde, em geral, determina o exame de TODOS esses aspectos, que devem ser, assim, levados
em conta em decisões sobre questões relativas ao uso daquelas espécies vegetais;
CONSIDERANDO, entretanto, que pela Portaria 02/85 da DIMED, o “Banisteriopsis
Caapi” foi incluído entre as drogas constantes da lista de produtos proscrfitos, sem a
observância, porém, do que dispõe o §1º, do artigo 3º, do Decreto Número 85110, de
02/09/1980, posto que, sem prévia audiência do CONFEN, a quem cabe a orientação
normativa e compete a supervisão técnica das atividades disciplinadas pelo Sistema nacional
de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes;

CONSIDERANDO, finalmente, a necessidade de implementar diversos outros estudos


referidos na Resolução 04/85, além daqueles procedidos pelos Drs. ISAC GERMANO
KARNIOL e SÉRGIO DARIO SEIBEL, o Grupo de Trabalho sugere ao Egrégio Plenário do
Conselho Federal de Entorpecentes seja chamado à ordem o processo de inclusão do
“Banisteriopsis Caapi”, na supracitada lista da DIMED, para ser, provisoriamente, suspensa
aquela inclusão, até que sejam completados os estudos de todos os aspectos referidos na
Resolução 04/85 mantido, até lá, rigorosamente, o estado anterior (“status quo ante”) à
indigitada Portaria 02/85 – DIMED, oficiadas as seitas usuárias do “Daime” ou outro nome
que tenha a beberagem resultante da decocção das espécies supracitadas, sendo certo que o
CONFEN poderá, a todo tempo, reformar a decisão de suspensão provisória, ora sugerida,
caso sejam apurados fatos supervenientes que indiquem, por qualquer forma, o mau uso do
chá, inclusive traduzido no aumento de usuários.

É o parecer – S.M.J.”
ANEXO 2

ATA 5ª REUNIÃO ORDINÁRIA DO


CONSELHO FEDERAL DE ENTORPECENTES – CONFEN

RESOLUÇÃO DO CONFEN SOBRE A AYAHUASCA

Publicado no Diário Oficial, Seção 1, N.º: 11467 Em 24 de AGO 1992. (Of. n.º: 157/92)

CONSELHO FEDERAL DE ENTORPECENTES - ATA DA 5ª REUNIÃO ORDINÁRIA

(Realizada em 2 de Junho de 1992)

Às nove e trinta horas (9:30), do dia dois (02) de junho de mil novecentos e noventa e
dois (1992), reuniu-se, na Sala de Reuniões do Edifício Anexo II do Ministério da Justiça,
Brasília – DF, o Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN), em sua Quinta (5ª) Reunião
Ordinária do ano de em curso, sob a Presidência da Dr.ª Ester Kosovski, representante titular
do Ministério da Justiça. Presentes os seguintes membros : CÂNDIDA ROSILDA DE
MELO, Representante Titular do Ministério da Educação; DITA PAULA SNEL DE
OLIVEIRA, Representante do Suplente do Ministério da Educação; ARNALDO MADRUGA
FERNANDES, Representante Titular da Associação Médica Brasileira; ALOÍSIO
ANDRADE FREITAS, Representante Suplente da Associação Médica Brasileira;
UBYRATAN GUIMARÃES CAVALCANTI, Representante Suplente do Ministério da
Justiça; FRANCISCO DA COSTA BAPTISTA NETO, Representante Titular do Ministério
da Justiça; CARLOS CÉSAR CASTELLAR PINTO, Representante Suplente do Ministério
da Justiça; DOMINGOS SÁVIO DO NASCIMENTO ALVES, Representante Suplente do
Ministério da Saúde; WILSON ROBERTO GONZAGA DA COSTA, Representante Titular
do Ministério da Trabalho; MARIA DULCE SILVA BARROS, Representante Titular do
Ministério das Relações Exteriores; ÁLVARO NUNES DE OLIVEIRA, Representante do
Ministério da Economia Fazenda e Planejamento; CECÍLIA ISABEL PETRI, Representante
Suplente do Ministério da Economia Fazenda e Planejamento; SÉRGIO SAKON,
Representante Suplente da Secretaria de Polícia Federal, DOMINGOS BERNADO
GIALLUISI DA SILVA SÁ, Representante Titular Jurista e NÉLIO ROBERTO SEIDL
MACHADO, Representante Suplente Jurista. Contou ainda com a presença da Dr.ª ANA
LÚCIA ROCHA STUDART, Coordenadora Geral de Articulação Setorial e de ADÉLIO
CLAUDIO BASILÉ MARTINS, Assessor daquela Coordenação. A Dr.ª ESTER
KOSOVSKI, deu por aberta a Reunião,...

TRECHO DA ATA PERTINENTE A AYAHUASCA:

d) – O Conselheiro Domingos Bernardo Gialluisi da Silva Sá proferiu Parecer sobre o


"CHÁ AYAHUASCA", cujo teor foi aprovado por unanimidade e na conclusão diz: "29 – A
conclusão proposta, em 1987, no Relatório final, resultante dos estudos desenvolvidos pelo
Grupo de Trabalho; constituído pela resolução do CONFEN, n.º 04, de 30.07.1985, tem sido
mantida pelo CONFEN, ao longo de suas várias gestões. Não vejo porque mudá-la. Muito ao
contrário, há hoje um sério argumento, que se soma aos demais, para confirmá-la – o tempo
transcorrido, desde 1986, quando se deu a suspensão provisória da interdição. São seis anos
de acompanhamento, pelo poder público, do uso da ayahuasca no Brasil, após sua proibição
em 1985, época em que foi interrompida a utilização que dela se fazia, havia décadas. 30 – O
tempo comtribuiu para mostrar que o CONFEN agiu e vem agindo com acerto. A comunidade
soube exercer os seus controles de forma plenamente adequada, sem qualquer interferência do
Estado que, de outra forma, apenas criaria problemas com desnecessária e indébita
intervenção. ISTO POSTO, submeto à soberana decisão do Plenário, agora as seguintes
recomendações:

a) – a ayahuasca, cujos principais nomes brasileiros são "Santo Daime" e


"Vegetal", e as espécies vegetais que a integram o "Banisteriopsis Caapi", vulgarmente
chamado de cipó , jagube ou mariri e a "Psychotria Viridis", conhecida como folha,
rainha ou chacrona, devem permanecer excluídos das listas da DIMED ou do órgão
que tenha responsabilidade de cumprir o que determina o art.36 da Lei n.º 6.368, de
21.10.1976, atendida, assim, a análise multidisciplinar constante do Relatório Final, de
setembro de 1987 e do presente parecer;

b) – poderá ser objeto de reexame o uso legitimo da ayahuasca, aqui


reconhecido, bem como aliás de qualquer outra substância com atuação no Sistema
Nervoso Central, desde que com base em fatos novos, cujos aspectos substantivos ou
essenciais não tenham sido, ainda, apreciados pelo CONFEN, tendo em vista que o
acatamento a decisões relativas a matérias sobre as quais já se haja pronunciado o
Colegiado, é fator de estabilidade das relações no âmbito da própria Administração
Pública e perante os interesse individuais envolvidos;

c) – deve ser organizada comissão mista integrada pelo CONFEN que poderá
convidar assessores, e por representantes de entidades que observam o uso da
ayahuasca em seus ritos com o objetivo de consolidar os princípios e regras básicas,
comuns ás diversas entidades referidas, para fins entre outros, de acompanhamento da
Administração Pública;

d) – fazem parte integrante e complementar do presente parecer, o relatório


final e os documentos que os instruíram, apreciados pelo CONFEN em sua reunião
plenária e setembro de 1997 e que ora são reapresentados, por cópia, para os arquivos
do CONFEN e atendimento aos eventuais pedidos de esclarecimento formulados pelos
interessados em geral".
ANEXO 3

RESOLUÇÃO Nº 4 - CONAD, DE 4 DE NOVEMBRO DE 2004

Dispõe sobre o uso religioso e sobre a pesquisa da ayahuasca

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL ANTI-DROGAS - CONAD, no uso de suas


atribuições legais, observando, especialmente, o que prevê o art. 6° do Regimento Interno do
CONAD; e CONSIDERANDO que o plenário do CONAD aprovou, em reunião realizada no
dia 17 de agosto de 2004, o parecer da Câmara de Assessoramento Técnico-Científico que,
por seu turno, reconhece a legitimidade, juridicamente, do uso religioso da ayahuasca, e que o
processo de legitimação iniciou-se, há mais de dezoito anos, com a suspensão provisória das
espécies vegetais que a compõem, das listas da Divisão de Medicamentos - DIMED, por
Resolução do Conselho Federal de Entorpecentes - CONFEN, n° 06, de 04 de fevereiro de
1986, suspensão essa que tornou-se definitiva, com base em pareceres de 1987 e 1992,
indicados em ata do CONFEN, publicada no D.O. de 24 de agosto de 1992, sendo os
subseqüentes considerandos baseados na já referida decisão do CONAD;

CONSIDERANDO que a decisão adequada, da Administração Pública, sobre o uso religioso


da ayahuasca, foi proferida com base em análise multidisciplinar;

CONSIDERANDO a importância de garantir o direito constitucional ao exercício do culto e à


decisão individual, no uso religioso da ayahuasca, mas que tal decisão deve ser devidamente
alicerçada na mais ampla gama de informações, prestadas por profissionais das diversas áreas
do conhecimento humano, pelos órgãos públicos e pela experiência comum, recolhida nos
diversos segmentos da sociedade civil;

CONSIDERANDO que a participação no uso religioso da ayahuasca, de crianças e mulheres


grávidas, deve permanecer como objeto de recomendação aos pais, no adequado exercício do
poder familiar (art. 1.634 do Código Civil), e às grávidas, de que serão sempre responsáveis
pela medida de tal participação, atendendo, permanentemente, à preservação do
desenvolvimento e da estruturação da personalidade do menor e do nascituro;

CONSIDERANDO que qualquer prática religiosa adotada pela família abrange os deveres e
direitos dos pais "de orientar a criança com relação ao exercício de seus direitos de maneira
acorde com a evolução de sua capacidade" , aí incluída a liberdade de professar a própria
religião e as próprias crenças, observadas as limitações legais ditadas pelos interesses públicos
gerais (cf. Convenção Sobre os Direitos da Criança, ratificada pelo Brasil, promulgada pelo
Decreto nº 99.710, de 21/11/1990, art. 14);

CONSIDERANDO a conveniência da implementação de estudo e pesquisa sobre o uso


terapêutico da ayahuasca, em caráter experimental;

CONSIDERANDO que o controle administrativo e social do uso religioso da ayahuasca


somente poderá se estruturar, adequadamente, com o concurso do saber detido pelos grupos
de usuários;

RESOLVE:

Art. 1º Fica instituído GRUPO MULTIDISCIPLINAR DE TRABALHO para levantamento e


acompanhamento do uso religioso da ayahuasca, bem como para a pesquisa de sua utilização
terapêutica, em caráter experimental.

Art. 2º O GRUPO MULTIDISCIPLINAR DE TRABALHO será composto por seis membros,


indicados pelo CONAD, das áreas que atendam, entre outros, aos seguintes aspectos:
antropológico, farmacológico/ bioquímico, social, psicológico, psiquiátrico e jurídico. Além
disso, o grupo será integrado por mais seis membros, convidados pelo CONAD,
representantes dos grupos religiosos, usuários da ayahuasca.

Art. 3º O GRUPO MULTIDISCIPLINAR DE TRABALHO escolherá seu presidente e vice-


presidente e deverá, como primeira tarefa, promover o cadastro nacional de todas as
instituições que, em suas práticas religiosas, adotam o uso da ayahuasca, devendo essas
instituições manter registro permanente de menores integrantes da comunidade religiosa, com
a indicação de seus respectivos respon-sáveis legais, entre outros dados indicados pelo
GRUPO MULTI-DISCIPLINAR DE TRABALHO.

Art. 4º O GRUPO MULTIDISCIPLINAR DE TRABALHO estruturará seu plano de ação e o


submeterá ao CONAD, em até 180 dias, com vistas à implementação das metas referidas na
presente resolução, tendo como objetivo final, a elaboração de documento que traduza a
deontologia do uso da ayahuasca, como forma de prevenir o seu uso inadequado.
Art. 5º O CONAD, por seus serviços administrativos, deverá consolidar, em separata, todas as
decisões do CONFEN e do CONAD sobre o uso religioso da ayahuasca, para acesso e
utilização dos interessados que poderão, às suas próprias expensas, extrair cópias, observadas
as respectivas regras administrativas para tanto.

Art. 6º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação.

04/11/04

JORGE ARMANDO FELIX


Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional e
Presidente do Conselho Nacional Antidrogas
ANEXO 4

CARTA DE PRINCÍPIOS PARA O USO DA AYAHUASCA

(assinada em Novembro de 1991, com apoio do CONFEN)

As entidades religiosas que utilizam o Vegetal Ayahuasca (Hoasca) decidiram adotar


procedimentos éticos comuns em torno do chá, sem prejuízo à identidade e às convicções de
cada uma.

O objetivo é preservar a imagem e assegurar os direitos de seus membros, conforme


acordo entre os representantes das sociedades religiosas que, em novembro de 1991, com o
apoio do Confen, assinaram a seguinte carta de princípios.

1. Do preparo e do uso da Ayahuasca: A Ayahuasca é um produto da união do


Banisteriopis Caapi (mariri ou jagube) e da Psychotria Viridis (chacrona ou rainha), fervidos
em água. Seu uso, que é tradicional entre os povos da Amazônia, deve ser restrito nos centros
urbanos aos rituais religiosos autorizados pelas direções das entidades usuárias, em locais
apropriados sendo vedada a sua associação a substâncias proscritas (consideradas
alucinógenas).

2. Dos rituais religiosos: respeitada a liturgia de cada uma e tendo em vista as


peculiaridades do uso da Ayahuasca, as entidades se comprometem a zelar pela permanência
dos usuários nos locais dos templos enquanto estiverem sob o efeito do chá.

3. Do plantio e cultivo: As entidades têm direito ao plantio e cultivo dos vegetais


necessários à obtenção da bebida, em fase à depredação do habitat natural onde eles se
encontram mais acessíveis.

4. Dos cuidados e restrições:


4.1. Comercialização: As entidades comprometem-se a não comercializar a
Ayahuasca, mesmo a seus adeptos, sendo seus custos de produção, transporte,
estocagem e distribuição às filiais de responsabilidade do Centro.

4.2. Curandeirismo: A prática do curandeirismo, proibida pela legislação


brasileira, deve ser evitada pelas entidades signatárias. As propriedades curativas e
medicinais da Ayahuasca – que estas entidades conhecem e atestam – requerem uso
adequado e devem ser compreendidas do ponto de vista espiritual, evitando-se todo e
qualquer alarde publicitário que possa induzir a opinião pública e as autoridades a
equívocos.

4.3. Pessoas incapacitadas: Será vedado terminantemente a participação nos


rituais religiosos bem como o uso da Ayahuasca, às pessoas em estado de embriagues
ou sob efeito de substâncias proscritas (alucinógenas). A participação de menor de
idade só será permitida com a autorização dos pais ou responsáveis.

5. Da difusão de informações: Grande parte das controvérsias e contratempos em


torno do uso da Ayahuasca – inclusive junto às autoridades constituídas – decorre dos
equívocos difundidos pelos veículos de comunicação. Isso impõe da parte das entidades
usuárias, especial zelo no trato das informações em torno da Ayahuasca, sendo indispensável:

5.1. Que cada instituição, ao falar aos veículos de comunicação, esclareça


obrigatoriamente sua entidade, ressaltando que não fala pelas demais entidades
usuárias.

5.2. Que cada instituição restrinja a pessoas experientes de sua hierarquia o


direito de falar aos veículos de comunicação tendo em vista os riscos decorrentes da
difusão inconseqüente do tema, por parte de pessoas com ele pouco familiarizadas.

5.3. Quando estiver em pauta tema comum às instituições usuárias, deve-se


buscar entendimento prévio em torno do que será difundido, de modo a resguardar o
interesse geral e a correta compreensão dos objetivos de cada uma.

6. Da regulamentação legal: A regulamentação do uso da Ayahuasca é objetivo


prioritário das entidades signatárias desta carta de Princípios, a fim de superarem-se os
obstáculos e controvérsias quanto ao uso adequado da Ayahuasca.
6.1. Cada uma das instituições signatárias por seu dirigente ou por um
representante especialmente designado responderá, nos termos desta carta de
Princípios, perante as demais.

7. Esta Carta de Princípios está aberta à adesão por parte de outras entidades usuárias
da Ayahuasca cujo ingresso seja aprovado em reunião plenária, por maioria absoluta.

7.1. Os casos omissos serão também deliberados por maioria absoluta dos signatários da
Carta de Princípios.
ANEXO 5

REGISTRO DE PLANTIO DE B. caapi e P. viridis


ANEXO 6

AUTORIZAÇÃO PARA EXPLORAÇÃO DE PMFS


(PLANO DE MANEJO FLORESTAL SUSTENTÁVEL)
ANEXO 7
ATPF - AUTORIZAÇÃO PARA TRANSPORTE DE PRODUTO FLORESTAL
ANEXO 8

QUESTIONÁRIO APLICADO EM CAMPO

Questionário

1- Você considera a floresta sagrada ? sim não

2-Você acredita que um viver mais ligado à natureza influencia, positivamente , um contato religioso para o
ser humano ? sim não

3-Para você é possível que a religião ajude o ser humano a proteger a natureza ?
sim não

“A Consciência Ecológica é uma virtude espiritual, enraizada num sentimento vivo de amor e
respeito entre os seres humanos e a natureza e que vê estas partes intimamente ligadas
formando um só corpo: o planeta Terra.”

4-Esta é uma boa definição de consciência ecológica ? sim não

5-Você acha que a consciência ecológica pode equilibrar, beneficamente, o convívio do ser humano com a
natureza e com os povos da Terra? sim não

6- Para você, a palavra Amor pode trazer este equilíbrio ? sim não

7- Você conhece o Daime ou a Ayahuasca ? sim não

8- Você gostaria de participar de uma cerimônia que utiliza o chá, sem bebê-lo, com o intuito de conhecer este
tipo de reunião? sim não

9- Você sabia que as igrejas sérias são legalizadas e autorizadas à funcionarem pela justiça governamental
brasileira e que existem grupos nos Estados Unidos e na Europa ?
sim não

10- Você sabia que existem relatos de curas orgânicas pessoais e de toxicômanos, em níveis reconhecidos por
autoridades competentes ? sim não

Idade______Profissão_____________ Sexo M F (fazer um ‘x’)

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