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1

SOU FELIZ SOZINHO? A importância do outro na minha vida

Alfonso Garcia Rubio

Introdução-

Aconteceu há cinco anos atrás, aproximadamente. Eu estava conversando com um rapaz, na


casa dos trinta anos, filho de um casal amigo, de profunda formação religiosa. A certa
altura, o jovem confidenciou-me: na religião, eu escolho os aspectos que respondem à
minha necessidade do momento. E não tenho problema algum em mudar de denominação
religiosa, sempre que julgo conveniente para mim. Religião boa é aquela que responde às
minhas necessidades. E acrescentou, referindo-se então às relações com as outras pessoas:
sou amigo de quem está em sintonia comigo e gosta de mim. Os outros eu deixo de lado...

Bem, alguém dirá, com razão, que se trata de um caso extremo de individualismo e de
vivência fechada da própria subjetividade. Mesmo assim, não há dúvida de que constitui
um sintoma da mudança cultural descrita pelo Pe. Joel Amado no capítulo 1 desta obra. Ele
mostra o quanto a volatilidade com que são vividos tanto o tempo como espaço, em
conexão com a mobilidade e a transitoriedade das relações e das opções, está a configurar
um novo tipo de crente: avesso à lei, a normas fixas e à institucionalização da experiência
religiosa. Daí decorre o grave questionamento sobre o que isto significa para os modos
tradicionais de transmitir a fé cristã1.

Essa mudança cultural manifesta-se de maneira muito clara nas relações inter-pessoais. O
cristão, como qualquer outra pessoa, experimenta a tentação de viver relações pautadas pela
transitoriedade, pelo escasso nível de compromisso e por um subjetivismo individualista.
Acresce que a forte tendência à comercialização e ao consumo afeta todos os aspectos da
vida, também a qualidade das relações entre as pessoas. Em conseqüência, parece
necessário e urgente fazer uma revisão do sentido e do fundamento das nossas relações
inter-pessoais.

Antes de iniciar essa revisão, convém fazer uma advertência prévia: importa muito não
demonizar, de saída, o individualismo e o subjetivismo atuais. G. Lipovestky faz a seguinte
observação a respeito do mais recente estágio da modernidade (que ele chama de
hipermoderna): no individualismo atual nem tudo é fechamento narcisista alheio a todo
compromisso social e ecológico. De fato, conforme este autor, a hipermodernidade está se
revelando muito mais complexa e ambígua do que poderia parecer numa primeira
impressão. Certamente, existe um individualismo a-social, fechado no próprio eu,
fortemente consumista e narcisista. Esta é uma atitude individualista irresponsável que
procura a felicidade particular a todo custo. Mas, no interior da hipermodernidade,

1
Cf. nesta obra, o cap. I.
2

encontramos, igualmente, um individualismo que, partindo do próprio sujeito e dos seus


interesses, preocupa-se também com a problemática social e com o desafio ambiental2.

Neste trabalho, a preocupação está centrada na qualidade das relações das pessoas cristãs,
influenciadas pelas tendências unilateralmente individualistas e subjetivistas. A reflexão
feita aqui pode servir também de fundamentação para o diálogo com pessoas não cristãs
que vivem um individualismo responsável. O que se pretende é mostrar que as relações
inter-humanas, realmente humanas e humanizadoras, entendidas sempre de maneira
dinâmica, são constitutivas do sujeito (indivíduo) humano. Dou por suposta aqui a
afirmação bíblico-cristã sobre a união inseparável entre a experiência do amor ao Deus da
revelação bíblico-cristã e o amor concreto ao próximo3. A minha intenção, neste trabalho, é
focalizar brevemente o alicerce antropológico necessário para poder vivenciar esse amor
em resposta ao amor incondicional e gratuito do Deus que é Amor, do Deus de Jesus Cristo
e nosso Deus.

No desenrolar da reflexão, tenho sempre como referência básica o projeto bíblico-cristão de


humanização em conexão com a visão integrada do ser humano. Abordarei, primeiramente,
o caráter relacional da pessoa. Os temas da subjetividade (aberta ou fechada) e da
maturidade afetiva serão focalizados, a seguir. Não posso deixar de acenar para a
vinculação existente entre os encontros inter-pessoais e as relações com o mundo macro-
social e ecológico bem como para o desafio proveniente da realidade da nossa ambigüidade
radical. Finalizarei a reflexão, apontando para a importância do tema da felicidade em
conexão com a qualidade das relações inter-humanas.

I. O caráter relacional da pessoa

O conteúdo da mensagem bíblica a respeito do ser humano criado à imagem de Deus (cf.
Gn 1, 26ss.) foi traduzido pela Igreja, na cultura ocidental, mediante o conceito de pessoa.
Todo ser humano é uma pessoa, sendo chamado a desenvolver a riqueza de dimensões que
a constituem. Focalizamos, a seguir, duas delas.

Primeiramente, encontramos na pessoa humana uma dimensão que podemos chamar de


interiorização.

É uma dimensão que implica a exigência de a pessoa ir desenvolvendo a capacidade de ser


senhora da própria vida (auto-possessão), rejeitando todo tipo de escravidão. Inclui,
concomitantemente, a exigência de desenvolver a capacidade de escolher por ela mesma
(liberdade e responsabilidade), rejeitando a manipulação. Compreende, igualmente, a
exigência de a pessoa desenvolver o seu modo próprio de ser pessoa (auto-finalidade), sua
vocação pessoal, rejeitando toda tentativa de reduzi-la a mero instrumento.

2
Cf. LIPOVETSKY, G., Os tempos hipermodernos. São Paulo, Barcarola, 2004; Id., Metamoforses da
cultura liberal: ética, mídia, empresa. Porto alegre, Sulina, 2004.
3
O tema da relação entre o amor a Deus e ao próximo tem sido bastante estudado teologicamente. Tem sido
também trabalhado, freqûentemente, na ação pastoral e na espiritualidade cristã. Apenas como um exemplo,
pode-se consultar: GARCÍA RUBIO, A., Unidade na pluralidade. O ser humano à luz de revelação e da
reflexão cristãs. São Paulo, Paulus, 2006, 4 ed., cap. 3 e 4.
3

Em segundo lugar, existe na pessoa, junto com a interiorização, a dimensão de abertura.

Abertura ao Deus da criação-salvação, mediante a confiança, a fé, o amor, a obediência.


Abertura ao mundo criado pelo amor do Deus da Vida, mediante a ação de graças, a
comunhão e a responsabilidade face ao meio ambiente. Abertura aos outros seres humanos,
mediante o diálogo, a amizade, o amor, a colaboração, a justiça, o perdão, a confrontação
leal etc. Esta abertura se vive tanto nas relações inter-humanas pessoa-pessoa quanto nas
relações comunitárias, sócio-políticas, econômicas etc. E no nível especificamente cristão,
abertura às relações comunitárias eclesiais, mediante a comunhão fraterna.

Convém frisar bem que a dimensão de interiorização deveria estar sempre relacionada, de
maneira inclusiva, com a dimensão de abertura. E vice-versa. São dimensões da pessoa que
se implicam mutuamente. Podemos falar de circularidade, de realimentação mútua entre
ambas dimensões. É no encontro pessoal com os outros que a nossa identidade pessoal vai
sendo descoberta e desenvolvida enquanto que o aprofundamento da própria identidade vai
enriquecendo a relação com os outros.

Obviamente, isto só é possível numa perspectiva de integração do ser humano, longe de


toda visão dualista mutiladora da complexa riqueza própria da pessoa.

Podemos perguntar ainda: será que a dimensão de interiorização não deveria ser
considerada também numa perspectiva relacional? A resposta parece que deve ser
afirmativa. De fato, a interiorização é a relação do eu, da pessoa com ela mesma. O termo
interiorização lembra-nos que a relação não se dá apenas para fora do sujeito, para a
exterioridade. Há também um movimento relacional do eu com a própria interioridade
pessoal.

Assim, pois, não é exagerado afirmar que a pessoa é toda ela relacional. E só pode se
realizar como pessoa (vocação pessoal) quando desenvolve, dinamicamente, a riqueza toda
de relações acima indicadas. O ser humano, nos diz a ciência atual, é fruto da evolução e
vive um processo evolutivo. É um ser inacabado, chamado a atualizar as potencialidades do
ser pessoa4. E as desenvolve, na história concreta, aprendendo a lidar com os
determinismos biológicos, psicológicos e sociais e a escolher entre as várias possibilidades
(indeterminismos) com as quais se defronta e com as que deve interagir. É como pessoa que
o ser humano vai exercitando a sua liberdade, condicionada e limitada, mas real. E, assim, a
pessoa se faz a si mesma, na medida em que aprende a optar com liberdade no concreto das
situações, assumindo as conseqüências de suas escolhas. É, também mediante o exercício
da liberdade, que a pessoa dá sentido à própria vida.

4
Não é este o lugar para tratar o tema da possível articulação entre a fé cristã em Deus criador e a visão
evolutiva da vida. Basta lembrar aqui que a teologia cristã, ao menos aquela mais atualizada, não vê
dificuldade para expressar a fé na ação criadora divina, utilizando a mediação da visão evolutiva da vida e,
especialmente, do ser humano. No interior do dinamismo evolutivo, a reflexão teológica situa a ação
transcendental criadora divina. A bibliografia sobre este tema é extensa. Para uma visão sintética, cf. Ibid.,
cap. 9.
4

Vejamos, a seguir, de maneira mais concreta como podemos caracterizar as relações


desumanas e as relações realmente humanas. A caracterização será feita a partir da
realidade da subjetividade, tema central na modernidade/pós-modernidade.

II. A pessoa: sujeito de relações inter-humanas

Por subjetividade, entende-se a auto-percepção do ser humano como um indivíduo


autônomo e independente, dotado de razão e capaz de decisões, de opções e de ações
vividas precisamente de maneira autônoma e independente5. Como é sabido, na
modernidade, a subjetividade tem sido desenvolvida, sobretudo, como racionalidade
instrumental e como autonomia e liberdade do sujeito. No chamado mundo pós-moderno
(ou, conforme outros, modernidade tardia, hipermodernidade...) também predomina muito
fortemente a subjetividade, só que agora é a afetividade e não mais a razão a que se
encontra no centro da perspectiva. Em ambos os casos, a tendência para o individualismo é
muito acentuada.

Para nós, cristãos, também a subjetividade deveria ser uma realidade muito valorizada.
Somos pessoas, criadas à imagem de Deus, chamadas a nos desenvolver como sujeitos
livres e responsáveis, capazes de amar. O cristão não tem porque desconfiar da
subjetividade. Esta só é criticada na medida em que, fechando-se nela mesma, nega a outra
pessoa na sua novidade própria. De fato, temos experiência de que a subjetividade pode ser
vivida de dois modos muito distintos e até opostos: de maneira fechada ou de maneira
aberta6.

2.1. Características das relações desumanas (subjetividade desumana ou fechada)

Comecemos pela subjetividade fechada. Como se trata de uma realidade muito presente em
todos nós, é fácil identificá-la. Sou guiado por uma subjetividade fechada sempre que
rejeito o “outro” precisamente como outro, como um ser pessoal distinto de mim. A outra
pessoa só é aceita na medida em que se ajusta ao que eu espero dela, que corresponde à
minha expectativa.

Vejamos um exemplo. Como se desenvolvem as relações entre homem e mulher? Com


freqüência parece que são impulsionadas por uma acentuada subjetividade fechada. Assim,
o homem pode fazer belas juras de amor, promessas de “eterna” dedicação e cuidado, mas,
está claro, sempre que ela se ajuste à expectativa dele, sempre que ela se mostre adequada
aos desejos e necessidades dele. Pouco ou nada interessam o ser feminino dela, a vocação
pessoal, a sensibilidade dela. Certamente, a mulher pode ter a mesma atitude em relação ao
seu homem.

E como são vividas as relações entre pais e filhos, entre professor e alunos, entre o padre ou
o pastor e os fiéis, entre os membros de uma comunidade, entre colegas de trabalho etc.?
Isso sem falar das relações entre pessoas de distintas religiões, culturas, sexo etc. Com
quanta freqüência, é necessário admitir, são relações vividas na subjetividade fechada: o
5
Cf. Id., Elementos de Antropologia Teológica. Salvação cristã: salvos de quê e para quê?, Petrópolis, Vozes,
2007, 4 ed., p. 147.
6
Cf. ibid., p. 147-148.
5

outro não interessa na sua “novidade”. A pessoa só é aceita e estimada quando coincide
com aquilo que se ajusta ao que se espera dela.

Certamente, é fácil perceber que, levados pela subjetividade fechada, acabamos vivendo
relações desumanizadoras, relações que coisificam e instrumentalizam a outra pessoa,
impedindo ou obstaculizando que ela seja fiel à sua identidade pessoal.

Obviamente, quando a pessoa é dominada pela subjetividade fechada deturpa as relações


com o mundo da natureza, o mundo criado pelo amor de Deus. O grave desafio ambiental
que hoje lamentamos é conseqüência da subjetividade fechada. O mundo não é respeitado
nem valorizado no seu rico simbolismo, como expressão do amor de Deus. Só interessa o
proveito que pode ser tirado dele.

E nem é preciso falar que a relação com Deus é também gravemente deturpada. A pessoa
religiosa, quando guiada pela subjetividade fechada, tende a manipular e instrumentalizar o
divino a serviço do próprio interesse e da satisfação das próprias necessidades. Deus não é
aceito na sua novidade e transcendência, mas somente na medida em que responde aos
desejos e necessidades da pessoa religiosa.

2.2. Características das relações humanas (subjetividade humana/humanizadora ou


aberta).

Conhecida a subjetividade fechada, é fácil saber em que consiste a subjetividade aberta.


Quando guiada pela subjetividade aberta, a pessoa vai aprendendo a respeitar e valorizar a
outra pessoa como outra. Vai superando o medo diante da novidade que é a outra pessoa,
sendo capaz de acolhê-la desarmada, deixando de lado apriorismos e preconceitos (de sexo,
de cultura, de raça, de religião...). Mais ainda, procura ajudá-la a ser fiel à própria
identidade pessoal. No encontro pessoal, o prioritário serão, então, o respeito, a aceitação e
a valorização da outra pessoa, superando a tentação de instrumentalizá-la e coisificá-la. Não
negamos a necessidade, tão humana, que todos temos de encontrar uma resposta acolhedora
nos outros. Somos carentes, posto que criaturas conscientes da nossa carência. Mas, mesmo
experimentando essa necessidade de resposta, o que caracteriza a subjetividade aberta é a
prioridade concedida à aceitação e à valorização da outra pessoa.

Por isso, a pessoa sendo guiada por uma subjetividade aberta, mesmo quando não encontra
a receptividade esperada, continua o caminho do amor-serviço, embora com o coração
sofrido. Jesus de Nazaré, no Horto das Oliveiras, vive em profundidade este tipo de
experiência. Angustiado, aflito, procura a companhia dos três mais amigos. É tão grande
sua necessidade de companhia, de experimentar algo de solidariedade, que os acorda uma e
outra vez. Infelizmente, eles não se mostram disponíveis. Contudo, a decepção não faz com
que Jesus volte atrás no caminho do serviço. Continua firme na sua missão, embora
sofrendo(cf. Mc 14,32-42).

E na relação com Deus, a pessoa vai aprendendo a aceitar Deus como Deus, na sua
transcendência, superando a tentação da manipulá-lo a serviço dos próprios interesses e
necessidades. Pode aceitar Deus que irrompe na vida humana, freqüentemente, de maneira
desconcertante e imprevisível. Certamente, no encontro com Deus, o ser humano pode
6

encontrar respostas aos seus problemas, só que se trata de respostas dadas conforme os
critérios de Deus. Em poucas palavras, na subjetividade aberta, Deus é respeitado, aceito e
valorizado como Deus. E, acolhendo Deus como Deus, aceita-se a interpelação e os
compromissos que o dom de Deus leva consigo.

A repercussão no relacionamento com o meio ambiente é fácil de ser constatada. Só a


pessoa que vive a subjetividade aberta sabe unir, de maneira integrada, a utilização
responsável dos recursos da natureza com a perspectiva contemplativa e com a atitude
agradecida de quem consegue ver no mundo criado a expressão do amor do Deus salvador-
criador (dimensão simbólico-sacramental do cosmo)7.

Voltando às relações inter-humanas, podemos perguntar: como exercitar a liberdade


relacionada, no dia-a-dia, vivendo encontros realmente humanos? De maneira muito
sumária, podemos responder que se trata de praticar8:

- o “olhar” humano, pois o encontro humano começa com o “olhar”: ver e ser visto como
pessoa concreta. “Ver” humanamente e permitir que me vejam também humanamente.
Olhar penetrado de respeito e de reconhecimento, como Jesus fez (cf.

- a palavra humana, aquela que expressa algo da própria interioridade pessoal. Falar
humanamente e não de maneira meramente utilitária. E ouvir humanamente, acolhendo
com hospitalidade real a palavra que revela a intimidade da outra pessoa.

- o agir realizado junto com outras pessoas, oferecendo e recebendo ajuda, como
corresponde à realidade de nosso ser de criaturas e, assim, radicalmente carentes.

- tudo isto realizado na liberdade, assumindo, como uma verdade antropológica básica, que
existir junto e com os outros seres humanos faz parte da nossa humanização.

Aqui, convém chamar a atenção para o fato de que pessoas religiosas, comprometidas em
importantes trabalhos pastorais, têm a tentação de, sob o pretexto da urgência desses
trabalhos e compromissos, descuidarem o encontro interpessoal, que começa com o olhar
humano. E, assim, o trabalho pastoral, infelizmente, pode ser desumano, burocratizado,
impessoal.

Sim, é verdade que o outro pode ser um inferno (Sartre), mas só quando as relações são
desumanas, de dominação e de manipulação.

2.3. Relações humanas/humanizadoras e afetividade amadurecida

A vivência de relações humanas e humanizadoras supõe que a pessoa esteja em processo de


amadurecimento da sua afetividade. Sabemos que é justamente no nível da afetividade onde
se encontram as maiores dificuldades para a vivência de relações inter-humanas. De
7
Cf. ibid., p. 151-153.
8
Estas indicações foram retiradas do teólogo calvinista K. BARTH, em: Id., Dogmatique, III/2, Genebra,
1961, p. 240-307. Para uma visão sintética desta temática, cf. GARCÍA RUBIO, A., Unidade na pluralidade,
p. 447-456.
7

maneira bem simplificada, entendemos aqui por afetividade o rico e variado mundo das
nossas emoções e dos nossos sentimentos9.

Não podemos abordar aqui o tema sobre a importância da primeira infância na evolução
psico-afetiva da criança. É um tema bastante conhecido, que tem sido objeto de freqüentes
estudos10. Para a finalidade prática da nossa reflexão, contentar-nos-emos com ressaltar,
primeiramente, que o caminho para ir amadurecendo a nossa afetividade passa,
necessariamente, pela expressão/recepção sincera de sentimentos. E, em segundo lugar,
importa sublinhar a importância que tem, para o desenvolvimento da afetividade, uma
autêntica experiência comunitária.

2.3.1. O caminho para a maturidade afetiva

Ninguém pode desenvolver uma afetividade sadia, se ficar trancado na própria


interioridade, incapaz de expressar o que está sentindo.O amor que não se expressa fica
inexpressivo! Assim, para amadurecer afetivamente, afirma J. Dominian 11, todos
precisamos saber expressar sentimentos sinceros de aprovação, estima e louvor.
Precisamos também saber acolher, com naturalidade e gratidão, os sentimentos de
aprovação, manifestados sinceramente pelas outras pessoas.

A necessidade da manifestação de sentimentos positivos se compreende facilmente, quando


lembramos que todos somos radicalmente carentes, criaturas, necessitadas do apoio, da
ajuda e do estímulo das outras pessoas. Acresce que, com freqüência, é pequena a nossa
auto-estima e percebemos melhor as nossas falhas, limitações e deficiências do que as
nossas qualidades e potencialidades.

Por isso, no concreto da nossa vida, amar as outras pessoas consistirá, sobretudo, em ajudá-
las a perceber e a desenvolver as qualidades e potencialidades que elas possuem, mas que
têm dificuldade para enxergar em si próprias. Assim, nossa afetividade amadurece, na
medida em que expressamos sentimentos sinceros de aprovação e de estímulo.

Não menos necessário é saber acolher, receber os sentimentos de aprovação e de estímulo


que outros manifestam a nosso respeito. Cuidado aqui com uma falsa modéstia, que rejeita
a aprovação e o louvor dos outros. Digo falsa modéstia, porque, no fundo, a pessoa que
rejeita o louvor e a aprovação dos outros está muito contente com esse reconhecimento.

E os sentimentos de desaprovação? Certamente, eles também devem ser expressados. Só


que, na realidade, essa expressão só ajuda mesmo, quando o clima predominante é de
aceitação e de estima. A interpelação, nesse clima, não é percebida como agressão. E, ao
contrário, quando predomina um clima de suspeitas, receios e recriminações, até mesmo a
possível boa vontade da pessoa que se aproxima de nós acaba sendo interpretada como
agressão ou como fingimento.

9
Sobre a origem da afetividade humana e sobre a distinção entre emoção e sentimento, cf. GARCÍA RUBIO,
A., Evangelização e maturidade afetiva, São Paulo, Paulinas, 2006, 3 ed., p. 64 -74.
10
Cf. ibid., p. cap. 4.
11
Cf. DOMINIAN, J., Maturité affective et vie chrétienne, Paris, Cerf, 1977, p. 70 ss.
8

Finalmente, convém ressaltar que, na caminhada para a maturidade afetiva, é indispensável


saber cuidar das relações no nível simbólico. Ou seja, é necessário encontrar um tempo e
um espaço reservados para a expressão dos sentimentos de amizade, de apreço, amor. É o
que chamamos de “tempo e espaço simbólicos”12.

2.3.2. A afetividade na vida comunitária.

A comunidade é um espaço privilegiado para a vivência de relações humanas e


humanizadoras. Ora, para que exista realmente uma comunidade, do ponto de vista
antropológico, é necessário que se desenvolva entre os membros dela ao menos um pouco
de comunicação pela sensibilidade, pelo afeto. Convém sublinhar que é insuficiente para
formar uma comunidade o interesse comum, meramente racional.

Certamente que, no início da experiência comunitária, a comunicação afetiva é apenas


incipiente. Mas, ela tende a se desenvolver, na medida em que se aprofundam os vínculos
inter-pessoais, percorrendo o caminho que leva à subjetividade aberta (ver acima item
2.1.2). Concomitantemente, desenvolve-se a experiência comunitária. É nessa genuína
experiência que se vive a existência cristã e pode ser encontrada uma felicidade real.

Não, o outro não tem porque ser o “inferno” e a experiência comunitária não tem porque
ser uma dura penitência. Antes, pode e deve ser o meio para o desabrochar da
personalidade, para oferecer apoio mútuo bem como para curar algumas deficiências e
feridas do passado13.

Numa genuína experiência comunitária, encontramos o ambiente adequado para viver a


resposta ao amor incondicional e totalmente gratuito de Deus: o amor concreto aos irmãos e
irmãs (cf. 1Jo 4, 10-12; 3, 14-18). Simultaneamente, cria-se um clima comunitário de
liberdade (cf. Gl 5,1) e de alegria (cf. At 2,46). Tudo isto de maneira realista, longe dos
idealismos irrealistas e das tendências perfeccionistas, ilusórias e neurotizantes. Voltaremos
mais adiante sobre este ponto.

2.3.3. A afetividade na vivência da sexualidade

Em outro capítulo desta obra, é focalizado o tema da vivência humana libertadora da


sexualidade14. Não é o caso de repetir aqui a reflexão lá desenvolvida. Para o nosso
objetivo, basta ressaltar que a relação mediada pela sexualidade é chamada a ser um
encontro inter-humano de grande profundidade e riqueza. Encontro, fonte de felicidade,
vivido no prazer e na alegria, encontro humanizador que pode ser expressão da experiência
de Deus.

12
Cf. GARCÍA RUBIO, A., Unidade na pluralidade, cap. 15.
13
Digo algumas, porque, evidentemente, as feridas mais graves não podem ser curadas na experiência
comunitária. Elas exigem uma ajuda especializada. Seria grave engano esperar que a vida comunitária
religiosa (ou o casamento) fosse capaz de superar problemas mais graves de tipo psíquico.
14
Cf., nesta mesma obra, o capítulo de Maria Joaquina Fernandes Pinto. .
9

Claro está que isto só é possível, quando se vive a sexualidade numa subjetividade em
processo de abertura e numa afetividade a caminho do amadurecimento. Evidentemente,
será desumanizadora a vivência da sexualidade auto-erótica ou vivida de maneira
coisificadora da outra ou outras pessoas. Obviamente, tudo quanto foi dito anteriormente
sobre a subjetividade aberta e sobre a maturidade afetiva tem aplicação direta à vivência da
sexualidade humanizadora.

III. E o mundo social, econômico, político e ecológico?

A pergunta é oportuna, pois as considerações feitas neste capítulo poderiam ser entendidas
de maneira intimista, como uma fuga da dureza apresentada pelos graves desafios
apresentados pelo mundo macro-social e pelo meio ambiente. De fato, ouve-se falar com
certa freqüência, também no âmbito das Igrejas: vamos cuidar das relações humanas na
família, no pequeno grupo de vivência, na comunidade eclesial e deixemos de lado, para
os especialistas, a preocupação com os desafios sociais, econômicos e políticos!

Certamente, uma visão dicotômica do ser humano está presente nesse tipo de atitude. Nessa
perspectiva dualista, as relações em tensão são vividas de maneira predominantemente
exclusiva. Assim, a dimensão das relações inter-humanas, no âmbito do encontro pessoa-
pessoa, tende a descuidar ou deixar de lado os desafios provenientes do âmbito macro-
social e ecológico. Ou vice-versa, a preocupação e o empenho com o mundo macro-social e
ecológico leva a descuidar as relações inter-pessoais.

Numa perspectiva de integração, ao contrário, as dimensões do humano e da vida cristã que


aparecem em tensão são relacionadas de maneira inclusiva. Assim, o desenvolvimento das
relações inter-humanas está aberto à complementação crítica dos compromissos com o
mundo macro-social, incluindo a ecologia. E vice-versa. Podemos falar aqui também de
uma certa circularidade entre o pessoal e o social-estrutural, entre as relações afetuosas, no
âmbito pessoa-pessoa, e o empenho e a luta para concretizar modos de vida e estruturas
capazes de ajudar na humanização de todos. São dimensões em tensão, mas mutuamente
abertas, de maneira inclusiva, uma complementando e corrigindo a outra.

Com outras palavras, a co-humanidade, constitutiva do ser humano, inclui, também de


maneira fundamental, a abertura e o compromisso com o mundo macro-social. Implica,
inseparavelmente, as relações responsáveis com o meio ambiente comum a todos os seres
vivos.

IV. As relações inter-humanas vividas no coração da nossa ambigüidade radical.

Uma pergunta pode ser levantada neste momento: todo esse discurso sobre o valor
humanizador das relações inter-humanas e da experiência comunitária, não será uma ilusão,
quando consideramos como são, de fato, muitas das relações entre os seres humanos? A
pergunta é procedente. Devemos reconhecer que a relação com as outras pessoas pode ser
experimentada como uma fonte quase inesgotável de mal-entendidos e sofrimentos.

Por isso, é importante frisar bem que todo encontro inter-humano está perpassado de
ambigüidade, que não existe relação humana em estado puro nem encontro humano vivido
10

numa alteridade total e perfeita. A presença, misturada, do joio e do trigo de que nos fala o
Senhor Jesus (cf. Mt 13, 24-30) é uma realidade presente em cada um de nós. Nossas
relações, como o conjunto da nossa vida, estão penetradas de ambigüidade. A luz e a
sombra, o “homem velho” e o “homem novo”, a abertura e o fechamento coexistem na vida
de cada ser humano.

Aceitar esta realidade não tem porque levar à passividade. Ao contrário, constitui o alicerce
e a rocha firme, sobre os quais podemos edificar uma casa sólida, capaz de enfrentar a fúria
dos elementos.

Com realismo, vamos assumindo a realidade da nossa ambigüidade radical e vamos,


diligentemente, apostando no “novo”, na abertura vivida na subjetividade aberta, no amor
concreto, enquanto vigiamos o “velho”, a tendência para o fechamento, que, devemos
reconhecer, constitui uma poderosa força em cada um de nós. Evidentemente, sem esquecer
da força condicionante da cultura, do ambiente e das estruturas sociais, políticas e
econômicas.

É preciso ter cuidado com a tentação do perfeccionismo. Este constitui um engano, uma
maléfica ilusão. As relações humanas e humanizadoras não são “puras” nem perfeitas, mas
isto não significa que não sejam reais e valiosas. São as relações possíveis para seres
carentes e ambíguos, em evolução, a caminho de uma perfeição maior e tentados pela
realidade do pecado.

Certamente, o ideal deve ser apresentado de maneira fascinante, bela, perfeita como é a
bondade de Deus (cf. Mt 5,48). Só que, ato seguido, devemos assumir pessoalmente e
mostrar aos outros que esse ideal é vivido na ambigüidade inerente à caminhada atual, com
altos e baixos, com avanços e recuos, submetidos ao tempo e ao espaço bem como aos
muitos condicionamentos e determinismos, dentro e fora de nós, que afetam o nosso viver.
De modo especial, é preciso estar atentos ao peso que significa a realidade do pecado, tanto
pessoal como social. Assumida nossa ambigüidade, podemos e devemos caminhar no
processo de maior abertura e de um maior acolhimento dos outros como outros. Na
linguagem paulina, somos convidados a crescer, a amadurecer na existência do homem e da
mulher novos (cf. Col 3,9-10; Ef 4,23-24), passo a passo, cada um conforme o seu ritmo e
sua capacidade.

Elimina-se, assim, a dialética de tudo ou nada, profundamente desumana. Cada passo dado
na abertura aos outros é motivo de alegria e de ação de graças. E cada recuo ou fracasso,
embora dolorosos, não levam ao desespero, à depressão ou à angústia existencial. São
encarados com sentido do humor, talvez rindo entre lágrimas, como uma expressão da
realidade da nossa ambigüidade radical e das ambigüidade dos outros. E como novo
impulso para continuarmos o processo de amadurecimento da “nova criatura”(cf. 2Cor
5,17; Gl 6,15).

V. E quanto à felicidade?

A busca da felicidade sempre motivou a caminhada do ser humano. Na cultura atual,


conforme G. Lipovestky, dois caminhos estão sendo seguidos na procura da felicidade: o
11

primeiro, amplamente predominante, situa a felicidade na obtenção de mais e mais bens


materiais, num consumismo exacerbado, em conexão com um acentuado individualismo. O
segundo caminho busca a felicidade na auto-realização interior, na reconciliação do sujeito
com ele mesmo, na expansão da própria consciência, na paz e no equilíbrio interior, na
harmonia entre corpo e espírito bem como entre o ser humano e o cosmos.

Para este pesquisador, esses dois caminhos que, em outras épocas, pareciam opostos,
apresentam-se estreitamente relacionados, na hipermodernidade. Com efeito, observa-se
que, na procura da realização interior, de experiências espirituais e religiosas, de novas
formas de aprofundamento da consciência individual, o sujeito é levado, com muita
freqüência, a mudar de método, de orientação espiritual, de mestres etc. Quer dizer,
também nesse caminho espiritual, deparamo-nos com a tentação do mercado e do
consumismo. Aqui também os produtos são descartáveis, dependendo de que se mostrem
mais ou menos eficazes15.

O que dizer destes caminhos seguidos na procura da felicidade?

Primeiramente, é necessário afirmar claramente: o desejo de felicidade existente no coração


humano não é eliminado, antes é plenificado pelo amor e pela felicidade de Deus. Só é
criticado na medida em que se desvia para a satisfação enganosa própria do pecado. É
verdade que o desejo humano de felicidade é infinito e, assim, nada finito poderá saciá-lo.
Só na plenitude do Reino de Deus, encontrará satisfação adequada. Mas, essa verdade
fundamental não tem porque levar ao desprezo da felicidade relativa possível, na vida atual.
Assim, não há porque desprezar o desejo de bens materiais ou o desejo de aprofundar e
expandir a própria consciência. Do ponto de vista bíblico-cristão, o que se critica é a
absolutização desses desejos. Na perspectiva cristã, o decisivo e prioritário é a opção pelo
Reinado de Deus (Mt 6,33). A felicidade possível é dada por acréscimo, ou melhor, está
incluída já nessa opção.

Em segundo lugar, importa muito superar um certo receio que se tem desenvolvido em
ambientes cristãos em relação à felicidade e ao prazer. Trata-se de uma conseqüência do
dualismo e do seu companheiro, o pessimismo antropológico. O sofrimento e a dor
pareciam ser os caminhos mais adequados para o encontro com Deus. A alegria e a
felicidade eram reservadas para a outra vida, para a pátria eterna, enquanto se desenvolvia
um acentuado desprezo das realidades do mundo atual, especialmente do corpo e da
sexualidade.

Certamente, este é um clima pouco sadio que não corresponde à revelação de uma Deus
criador-salvador que nos ama de maneira incondicional e quer a nossa realização e a nossa
felicidade. E não corresponde ao Evangelho de Jesus Cristo, uma Boa Nova, exigente, sim,
mas alegre e libertadora. Boa Nova que, quando vivida, conduz, já no hoje, à bem-
aventurança, a uma felicidade real (Cf. Mt 5, 3.10; 13,16; 16,17; Lc 1,45.47; 10,23; 11,28;
12,37-38; Jo 13,17;20,29 ; At 20,35; Fil 4,4; Tg1,25; Ap 1,3...).

15
Cf. LIPOVESTSKY, G., A felicidade paradoxal. Ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo,
Companhia das Letras, 2007, p. 333-370.
12

Uma outra conseqüência do dualismo é o racionalismo, que tem levado a privilegiar a via
da razão, no encontro com Deus, deixando muito em segundo plano o caminho do amor e
da felicidade. Urge redescobrir, hoje, este segundo caminho (já percorrido especialmente
pelos místicos), contemplando a alegria e a felicidade de Deus na criação, vendo a ação
criadora de Deus como um belo jogo. Isto não é uma perspectiva superficial ou banal. Pelo
contrário, tem uma base bíblica sólida, que o nosso racionalismo não soube perceber 16. E a
salvação, por sua vez, consiste fundamentalmente na auto-comunicação do amor e da
felicidade de Deus.

Não, o cristão não tem por que ter medo de ser feliz! O cristão “sabe” que o ser humano é
um ser para a vida e para a felicidade, não para a morte e a desgraça. Em conseqüência, não
deve se “auto-desprezar” para amar os outros e a Deus. É justamente o contrário: o amor de
si próprio é o único caminho que permite o amor genuíno aos outros e a Deus. O amor a si
próprio nunca deveria ser confundido com egoísmo e/ou narcisismo. Este consiste no auto-
fechamento da pessoa (subjetividade fechada). Já o amor a si próprio é um aspecto
fundamental do genuíno amor. Não é possível um autêntico amor aos demais, sem a pessoa
se amar a si própria. Isto é um engano psicológico e, igualmente, uma ilusão teológica.
Esquece-se facilmente a recomendação de Jesus Cristo: trata-se de amor ao próximo como
a si próprio(cf. Mt 22,39).

Sim, o cristão procura também a felicidade. Ora, “sabe” que o caminho para a vivência da
felicidade inclui, de maneira fundamental, a abertura aos outros como outros(subjetividade
aberta).

Assim, podemos afirmar: a pessoa só poderá ser feliz e encontrar sua realização como
pessoa, como sujeito humano, quando aceitar e desenvolver, sadiamente, o seu dinamismo
relacional.

Conclusão.

Na perspectiva escolhida neste capítulo, deve ter ficado claro que a auto-afirmação do eu
separada das relações com os outros seres humanos leva à desumanização. É verdade,
vimos acima, que somos chamados a sermos senhores de nós mesmos. Entretanto, o
caminho para concretizar isso não transita pelo fechamento arrogante e depreciador dos
outros. O verdadeiro é o oposto: é na abertura acolhedora da novidade da outra pessoa e no
serviço concreto ao crescimento dela em humanidade, que vamos descobrindo e
desenvolvendo a nossa identidade e confirmando quem somos realmente! Ora, como poderá
consistir a realização do ser humano e a vivência da felicidade, justamente, na rejeição
daquilo que é o ser mesmo da pessoa, a experiência relacional? Pois, conforme foi visto
acima, o ser com e junto aos outros seres humanos é constitutivo da pessoa.

A importância concedida, na cultura atual, ao indivíduo, ao sujeito humano é compartida


pela fé cristã. Esta só rejeita, como desumano, o individualismo e a subjetividade fechadas.
Não aceita a mercantilização, o consumismo e a transitoriedade nas relações humanas que

16
Sobre este tema, ver o importante trabalho do teólogo G. GESCHÉ, O Mal, em: Id., Deus para pensar, vol.
1, São Paulo, Paulinas, 2003, p. 49ss. .
13

levam a descartar o outro quando perde a sua utilidade. Esse tipo de relações desumanizam,
porque o ser humano não é levado a sério, não é respeitado nem valorizado como pessoa.
Quando isto acontece, o sujeito trai a sua vocação mais profunda. A fé cristã, pelo
contrário, dialoga com a subjetividade e com o individualismo na medida em que
vivenciam uma certa abertura à novidade do outro e que vão assumindo responsabilidades
face ao mundo do social e do ecológico.

Contudo, pouco ou nada adianta falar ou escrever belas palavras sobre a dignidade da
pessoa humana, se estiver ausente ou fracamente presente a experiência vivida de relações
humanas e humanizadoras, no interior das comunidades eclesiais. Nunca será demais
lembrar que a comunidade eclesial deveria ser um espaço privilegiado para essa experiência
de encontros realmente humanos, com as características acima apontadas. Sabemos que
uma das dimensões fundamentais do viver eclesial é a koinonia (comunhão fraterna).
Entretanto, como viver, com autenticidade, essas relações fraternas, se falha a base
antropológica, se esse estar junto e com os outros resulta gravemente deficiente?

O que foi apontada acima sobre a necessidade de comunidades reais, exige uma séria
revisão das prioridades pastorais. Não será uma delas precisamente o desenvolvimento de
comunidades onde a personalização de cada membro possa, de fato, vir a acontecer e onde
possam se desenvolver relações realmente humanas e humanizadoras?

Alguém poderá ainda perguntar: que garantia temos de que a abertura-acolhimento dos
outros seres humanos, da maneira aqui apresentada, é o caminho para a auto-realização da
pessoa e para a vivência de uma felicidade limitada, mas real? A melhor resposta é esta: a
verdade dessa caminhada só pode ser verificada na medida em que for vivida. “Faze isso e
viverás” (cf. Lc 10, 28).

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