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Sondagem de opinião: um novo elemento do

jornalismo político
Antonio Brotas∗

Índice sondagem ainda é recente no Brasil, apesar


desta prática ser difundida nos Estados Uni-
1 Metamorfose da noção de opinião dos desde os anos de 1960. É óbvio que os
pública . . . . . . . . . . . . . . . 2 elevados índices de popularidade de um go-
2 Opinião pública na era dos meios . 3 vernante não podem ser desconsiderados por
3 Sondagens: de elemento a síntese . 4 qualquer um que conheça a lógica do sistema
4 Jornalismo e a opinião pública . . 6 democrático, mesmo que isso não signifique,
5 Sondagens de opinião e cobertura como lembrou o jornalista Clóvis Rossi, a
das eleições de 1998 . . . . . . . . 6 garantia de um lugar na história política, que
6 Crise de credibilidade: momento o diga Carlos Menem e Alberto Fujimori,
de reflexão . . . . . . . . . . . . . 10 que conseguiram a re-eleição, mas, pouco
7 Sondagem e notícia: debatendo a tempo depois, foram sumariamente descar-
problemática . . . . . . . . . . . . 10 tados pelos argentinos e peruanos, respecti-
8 Considerações Finais . . . . . . . 14 vamente.
9 Bibliografia . . . . . . . . . . . . 15 A efemeridade das sondagens, entretanto,
não as retiram dos noticiários. Jornais e re-
vistas pautam e são pautados pelos institu-
O debate que surgiu em ralação aos nú- tos de pesquisas, por suas notas explicati-
meros da sondagem e da tendência de queda vas e percentagens. Materiais iconográficos
na confiança do governo do presidente Luís completam o arsenal que leva o leitor a pen-
Inácio Lula da Silva integra um script dese- sar a política através de dados, da competi-
nhado pelos atores políticos e pelos meios ção entre os candidatos e de um suposto es-
de comunicação que têm a divulgação das tado de opinião pública. O modelo de jor-
sondagens de opinião uma boa oportunidade nalismo que abraça as sondagens, sem qual-
para gerar fatos políticos, com altas doses quer restrição ou avaliação, revela a dificul-
de previsibilidade. Esta tentativa de legiti- dade dos veículos e dos jornalistas em per-
mação do governo através do uso regular de ceberem as diferentes, e por vezes, contradi-

Mestre em Comunicação e Cultura Contemporâ- tórias, noções da opinião pública e o lugar
neas pela Faculdade de Comunicação da UFBA e pro- dos meios de comunicação na constituição
fessor de Teorias do Jornalismo e Comunicação e Po- do espaço público no mundo contemporâ-
lítica.
2 Antonio Brotas

neo. Neste artigo pretendo levantar algumas cio do século XVIII, há uma junção dos ter-
questões sobre esta problemática fundamen- mos, como artifício para caracterizar um su-
tal à política do início do milênio, bem como jeito coletivo, o público, tão caro à burguesia
apontar como as distorções reduzem o papel da época. Mas somente no final do mesmo
dos meios enquanto instituições sociais, em século é que se forma uma entidade que se
busca de um sociedade mais democrática. opõe ao segredo, fingimento ou dissimula-
ção. Opinião pública expressa, em síntese,
a opinião dos meios parlamentares porque
1 Metamorfose da noção de
tornam públicas suas opiniões a respeito das
opinião pública questões do reino, opõe-se à política do rei,
A tentativa, por parte de políticos, partidos, rodeada de mistérios. A opinião é mais ou
cientistas políticos, marketeiros, jornalistas e menos a dos letrados, que julgam em nome
relações públicas, de imprimir um governo de uma suposta razão.
baseado nas sondagens, uma sondacracia, A história do conceito coincide, portanto,
demonstra, na realidade, uma luta, por hora com a formação do Estado moderno. A de-
ganha por esta corrente de força, que tor- fesa quase unânime dos pesquisadores é de
nar o conceito de opinião pública sinônimo que a opinião pública foi um modo de se con-
das sondagens de opinião. Estes atores tra- trapor ao segredo de Estado e por isso pode
balham com a perspectiva de que a opinião ser considerada uma “espécie de máquina de
pública pode ser reduzida a modelos quanti- guerra ideológica ‘improvisada’ pelas elites
tativos que apreendem uma opinião, através intelectuais e pela burguesia, durante o sé-
de respostas á questionários de uma determi- culo XVIII, a fim de legitimar suas reivin-
nada população. Uma perspectiva, ampla- dicações no campo político e enfraquecer o
mente difundida a partir dos anos de 1930, absolutismo”. (Champagne, 1998).
que é bastante criticada pelos teóricos da Tema espinhoso e amplamente discutido,
área - ao mesmo tempo, que consegue uma a Opinião pública já foi objeto de análise
ampla difusão nos meios profissionais - por dos maiores pensadores do mundo contem-
se impor como opinião pública, um conceito porâneo. Utilizando ‘publicidade’ ao invés
com várias vertentes, sem definição precisa, de ‘público’, Emmanuel Kant foi o autor que
mas essencial para compreender a democra- melhor sistematizou a função da opinião pú-
cia na contemporaneidade. blica no Estado liberal. Kant defende que o
Existe um paradoxo que está estreitamente uso público da razão possui duas funções:
ligado aos termos que compõem a expres-
são opinião pública. Opinião (opinion em “Por um lado se dirige ao
latim e doxa em grego) refere-se ao indivi- povo, para que se torne cada vez
dual, particular, subjetivo, enquanto público mais capaz de liberdade de agir,
apóia-se na idéia do corpo coletivo especí- enquanto da comunicação própria
fico ligado e caracterizado pelo uso da ra- se tem a confirmação da sua ver-
zão. Estes dois conceitos mantiveram-se iso- dade pelo consenso dos demais ho-
lados por muitos séculos. Somente no iní- mens. Por outro lado, se dirige ao
Estado absoluto, para lhe mostrar

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Sondagem de opinião 3

que é vantajoso tratar o homem, agrupamento social em públicos é o que ofe-


não como a máquina de acordo rece aos caracteres individuais mais marca-
com as regras do Estado de polí- dos as melhores possibilidades de se impo-
cia, mas segundo sua dignidade” rem, e às opiniões individuais originais as
(Matteucci, p.843). maiores facilidades de se difundirem” (Tarde
apud Esteves, 2003). A defesa deve-se, de
Kant propôs a institucionalização e a le- acordo com Tarde, à possibilidade do pú-
galização de um espaço organizado entre Es- blico gerar atores sociais coletivos, racional-
tado e sociedade onde o indivíduo autônomo mente orientados, tendo a imprensa como
e racional agisse, através do debate público, agente agregador, pois permite a troca de in-
em busca da autocompreensão e entendi- formações que alimenta o tecido social.
mento. Em outras palavras, Kant faz desta Tönnies, de acordo com a leitura de Sil-
esfera pública, ou melhor, deste espaço de veirinha (2002), influenciado por Tarde, es-
publicidade, uma instância crítica, que se re- tabelece três categorias de opinião pública: a
aliza pelo uso público da razão. publicada, referente à opinião publicamente
Outros pensadores liberais como Burke e expressa de um indivíduo; a pública, que se
Bentham, Constant, Guizot dão continuidade concretiza quando a opinião publicada vira a
ao debate sobre opinião pública. A novidade, opinião de muitos; e do público, concebida
de acordo com Matteucci (1999), é que estes enquanto uma concepção puramente teórica.
liberais ampliam a função política da opinião A partir desta relação, o autor defende que a
pública como instância intermediária entre o disputa política dar-se, sobretudo, pela opi-
eleitorado e o poder legislativo, permitindo nião do público, para que este abrace a opi-
aos cidadãos uma participação política ativa. nião expressa ou publica como opinião pró-
A opinião pública permitiria assim que os pria. Neste caso, os jornais são fundamen-
indivíduos discutissem em público questões tais como expressão de idéia e veículos de
referentes ao interesse geral, estendendo a comunicação, mas somente se constituiria
sabedoria política para além dos governan- enquanto tal, quando fossem separados dos
tes, o que decerto beneficiaria as discussões partidos e da publicidade. Uma posição,
do Parlamento, que se coloca como represen- mesmo que guardando certa distância, rei-
tante das discussões do público. vindica que os meios de comunicação, en-
quanto lócus da esfera pública, também es-
2 Opinião pública na era dos tejam abertos à livre participação de todos
os interessados, permitam a livre discussão
meios de temas e assuntos e ofereçam igualdade de
Gabriel Tarde indicara, desde o início do sé- estatuto dos participantes.
culo, uma posição que nos aproxima da pro- Na atualidade, pensar em fazer política
blemática da contemporaneidade quando as- (pelo menos para os cargos majoritários) sem
socia Opinião pública aos meios. Em oposi- as assessorias de comunicação, sem o mar-
ção às multidões, o autor afasta-se dos crí- keting, sem a publicidade, sem os programas
ticos da opinião pública e defende que “o de TV/Rádio é diminuir drasticamente a pos-

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sibilidade de estabelecer-se no cenário polí- No processo de declínio da esfera pública


tico. a imprensa tem papel de destaque. A im-
prensa era concebida como instrumento pri-
“A constituição e automização vilegiado da esfera pública por permitir o de-
do campo dos mídias, em verdade, bate aberto e racional de variados temas. A
configura o ponto de inflexão a sua independência frente ao poder estatal lhe
partir do qual as conexões en- garantia ainda a liberdade crítica. Habermas
tre comunicação e política aban- avalia que com os novos meios de comunica-
donam suas modalidades tradici- ção, a exemplo do rádio, cinema e televisão,
onais, inclusive aquelas adstritas ampliam a esfera pública, mas a descaracte-
a uma dimensão instrumental, e riza posto que a publicidade está muito mais
se redefinem em termos de inter- preocupada em construir consenso, de bus-
locução de campos sociais parti- car adesão, através de métodos sedutores, do
cularmente conformados”(Rubim, que ser um espaço para o exercício público
1997, p.5). da razão.
Oposta a visão de Habermas, que influen-
A apresentação/exposição da política e
ciou uma geração de autores, mesmo após a
dos políticos na televisão, rádio, internet e
revisão dos seus escritos, Dominique Wolton
nos jornais para produzir eventos, por vezes,
(1995) vê possibilidade de formação de opi-
espetaculares, que possibilitem a criação de
niões num espaço público midiatizado. Sua
imagens e cenários no espaço virtual provo-
análise pressupõe que a comunicação é uma
cou mais discordância do que se podia ima-
condição estrutural do funcionamento da de-
ginar.
mocracia e para o alargamento da esfera pú-
Habermas (1984), que situara a esfera pú-
blica.
blica burguesa como distinta do Estado, da
economia e da intimidade, destaca que a en-
trada dos trabalhadores na cena política, pro- 3 Sondagens: de elemento a
movida pela ampliação do sufrágio, força síntese
mudanças na estrutura da esfera pública,
com conseqüente diluição das fronteiras en- Os chamados institutos ou empresas de son-
tre as esferas e relegando seu aspecto argu- dagem de opinião não poupam esforços para
mentativo e racional, fator essencial à produ- se firmarem socialmente como os legítimos,
ção de opinião pública, a um plano inferior. por agregarem valor científico as técnicas de
No fundo, acredita Habermas, as discussões aferição, medidores da opinião pública. Eles
no Parlamento são uma encenação já que as garantem que das porcentagens que emer-
posições foram firmadas com antecedência e gem das aferições saem certamente um re-
os discursos não seriam capazes de demovê- sultado preciso da opinião de um determi-
las. Seria uma pseudo-esfera-pública. Im- nado público num determinado momento da
porta muito mais manipular, formar esta opi- vida social. Na realidade, os institutos fazem
nião para um público1 . figura na esfera pública manipulada é um clima de
1 opinião”. (Habermas,p.254.)
“Ao invés de uma opinião pública, o que se con-

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Sondagem de opinião 5

acreditar que a opinião pública é aquela me- atores coletivos como os partidos, movimen-
dida pelas sondagens, as quais passam a ser, tos sociais, partidos políticos e mídia, eles
num processo de mutação constante, a pró- ligavam as sondagens a o princípio democrá-
pria opinião pública. Esta posição, querendo tico do voto. Na verdade, a lógica para que
ou não os estudiosos do tema, cria, para os uma amostra estatisticamente definida pu-
estudos da opinião pública, um novo marco, desse possibilitar a medição da opinião pú-
que se faz passar pelo próprio objeto de es- blica estaria na oportunidade dada a todos os
tudo, mesmo que tenha surgido séculos de- cidadãos de expressar sua opinião já que eles
pois do nascimento do conceito. eram escolhidos por meio de sorteio a partir
A primeira iniciativa sistematizada de son- do pertencimento a grupos classificados por
dagem de opinião foi realizada pela revista sexo, idade, escolaridade, renda, etc.
americana The Literary Digest, em 1932. Mesmo sobre um bombardeio de críticas
Em 1935, George Gallup funda o American contundentes como as elaborados por Bour-
Institute of Public Opinion introduzindo mé- dieu2 , as sondagens, apesar de levar em con-
todos estatísticos nos modelos de sondagens. sideração que o conceito de opinião pública
Blanco (2000) lembra que já em 1940 Gallup advém de uma determinação histórica ligada
e Ray afirmaram que: à prática política, vingaram e ganharam um
aliado precioso: os meios de comunicação,
“la opinión pública es tangible que tiveram a capacidade de ampliar e acele-
y dinámica. Surge de muchas fu- rar sua aceitação no mundo político-social.
entes de la experiência diária de Champagne chama atenção de que nos
los indivíduos que formam el pú- anos de 1960, na França, as sondagens co-
blico político y formulan sus opi- meçam a disputar o lugar, antes tomado pe-
nionnes como guía de trabajo para las manifestações e pelos jornais, na disputa
sus representantes. Esta opinión pela expressão da opinião. Posteriormente,
pública escucha muchas propagan- esta disputa vira parceria. Jornais e políti-
das, la mayoría contradictorias. In- cos assumem a técnica porque a metodologia
tenta contrastar y enfrentar argu- das sondagens se aproxima dos procedimen-
mentos y debates para separar a tos eleitorais tradicionais, permitindo a pro-
la verdad de la mentira (...) Cree dução de uma vontade geral abstrata e apa-
en el valor de la contribuición de rentemente consensual. Para Champagne, as
cada indivíduo a la vida política”. sondagens transformaram o que antes eram
(p.92). 2
Bourdieu vai ao âmago da problemática ao ques-
tionar, o que ele considera, os três postulados básicos
Os institutos seriam, neste caso, os tec- de qualquer sondagem de opinião: a) a suposição de
nicamente habilitados a medir esta opinião que todos podem ter uma opinião, ou seja, de que to-
pública tangível, sendo necessário fazer isso das pessoas são capazes de produzir uma opinião so-
várias vezes por ser esta também dinâmica. bre determinado assunto; b) de que estas opiniões se
Por trabalharem com idéia de opinião pú- equivalem; c) de que existe um consenso sobre os pro-
blemas relevantes e perguntas que devem ser feitas.
blica centrada apenas na participação dos in-
divíduos, desconsiderando a importância dos

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definições concorrentes numa definição uní- sondagens a possibilidade de diálogo mais


voca e universal. autônomo no diálogo com o campo político.

4 Jornalismo e a opinião pública 5 Sondagens de opinião e


O uso de sondagens de opinião pelo jorna- cobertura das eleições de 1998
lismo brasileiro foi iniciado, com a publica- A fragilidade das sondagens como única
ção de uma sondagem do Ibope, no jornal forma de conhecimento de realidade para o
Diário da Noite, na edição de 17 de maio jornalismo e síntese da opinião pública de-
de 1945. Nesta sondagem histórica, reali- monstrou seu limite, por exemplo, nas elei-
zada cinco meses antes da deposição de Ge- ções presidenciais de 1998. Com esfria-
túlio Vargas, com amostra de mil pessoas, mento da campanha e esvaziamento do de-
em São Paulo, Brigadeiro Eduardo Gomes, bate, num movimento articulado pelo go-
candidato da UDN aparece como franco fa- verno de Fernando Henrique Cardoso, a mí-
vorito. O resultado, entretanto, não se confir- dia passa a tratar a campanha apenas como
mou. General Eurico Gaspar Dutra, do PSD uma corrida presidencial. Se as sondagens já
e apoiado pelo então presidente-ditador Ge- eram utilizadas como peças fundamentais na
túlio Vargas acabou ganhando com 20% de cobertura eleitoral3 , em 1998, elas ditaram
diferença. Fonte de informação indispensá- praticamente o ritmo da campanha, mesmo
vel para a organização e execução de cam-
3
panhas políticas e para monitoramento de “A cobertura do Jornal Nacional, por exemplo,
praticamente se limitou aos números das pesquisas de
imagem pública de políticos e candidatos, as intenção de voto, enquanto que os dois jornais (O Es-
sondagens somente ganham lugar de desta- tado de São Paulo e Folha de São Paulo) transforma-
que no mundo político, quando esta impor- ram as sondagens eleitorais nas grandes vedetes de
tância é reconhecida também pelos meios, suas coberturas” (Azevedo, 2000, p.31). O jornalista
espaço que rapidamente transforma as son- Bob Fernandes (editor da revista Carta Capital) afir-
mou que o silencio em relação à campanha eleitoral
dagens em armas políticas. A divulgação dos foi orquestrada pelos principais meios em conformi-
percentuais, que atinge o ápice nos períodos dade com o governo em função dos interesses que en-
eleitorais, segue com avaliação dos governos volviam a privatização do Sistema Telebrás. A denún-
e aprovação dos governantes. cia: “Houve, de fato, uma sofisticação, mas eu temo
Os jornalistas, profissionais que sempre que o papel das emissoras de televisão e da imprensa
tenha sido talvez até pior do que em 1989, porque a
falam em nome da opinião pública, pouco conspiração do silêncio é pior porque ela nada pro-
a pouco, combinam acontecimentos dos es- voca. É pior porque em 1989 você teve reação. As
paços tradicionais da política, como o Parla- pessoas perceberam claramente. A ordem agora é não
mento, com a abordagem das sondagens, tor- dá nada. Tem um documento interno, assinado pelo
Roberto Marinho, que é uma piada. Diz o seguinte:
nando os veículos clientes permanentes dos
como existem vários candidatos a governadores que
institutos, como os partidos políticos. Seja são candidatos à reeleição e o presidente também à
por considerar a informação das sondagens reeleição, então vamos nos limitar a cobrir as obras e
como síntese da opinião pública ou pensa- não as pessoas. Aí eu pergunto: oposição tem obra?
la enquanto elemento que permite a venda (...) O que eu ouvi de reclamação de colegas em todos
os jornais, revistas sobre a pressão e censura é algo
de jornais, os profissionais têm também nas

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Sondagem de opinião 7

antes do seu começo oficial. Observando as gem que apontava Itamar, com 10%, como
sondagens publicadas nas revistas Veja e Isto o terceiro colocado na disputa, atrás de FHC
É, além do acompanhamento do jornal Fo- (37%), Lula (22%) e à frente de Ciro Gomes
lha de São Paulo, podemos perceber que, ao (6%). Enquanto em Minas, ele ficaria com
contrário do que aconteceu em 1994, quando 31% da preferência dos entrevistados, tecni-
elas foram instrumentos para apresentar os camente empatado com o então governador
candidatos anti-Lula, as sondagens, ou a di- Eduardo Azeredo, com 32%.
vulgação dos seus resultados, foram utiliza- As sondagens que ofereciam elementos
das para barrar a entrada de novos concorren- para a montagem de discursos desqualifi-
tes na corrida presidencial de modo a manter cando a entrada de novos atores na disputa
o cenário eleitoral elaborado pela equipe do também ajudaram a construir a imagem de
governo que preferia a repetição da disputa um presidente/candidato imbatível, princi-
FHC X Lula. palmente pela Veja. Talvez o melhor exem-
A matéria da revista Veja (PALANQUE plo dessa operação pode ser identificado na
encantado. Veja. No 1511, p.35, 08.out.97) é matéria Um começo diferente (Veja. No
bastante esclarecedora neste sentido. Depois 1527, p.23-25, 07.jan.98). Para Veja, FHC
de apresentar um Ciro Gomes como “mais entra na disputa “com robustos índices de
perdido que a cabra-cega” por ter entrado popularidade, bem diferente do que aconte-
no PPS, “herdeiro do PCB stalinista de Luís ceu com Collor, Sarney”. E para que nin-
Carlos Prestes” e um Itamar Franco como guém tenha dúvida da vantagem, um gráfico
um político “adormecido profundamente”, de barra baseada numa sondagem do Vox Po-
que “fez chapa com Fernando Collor em puli estampa que FHC tem 36% das inten-
1989”, a matéria adianta a um ano da eleição ções de voto, contra 22% de Lula e 14% de
que “boa parte das candidaturas de hoje irá José Sarney.
bater em retirada antes de a disputa começar Além de conceder autoridade para a for-
para valer”. E para legitimar este discurso, mulação das proposições, as sondagens pas-
utiliza uma sondagem do Ibope que garante sam a ser elemento balizador, que tenta apre-
a FHC 33% das intenções de votos, contra sentar um presidente/candidato forte, prepa-
15% do seu adversário preferido, Lula. rado para vencer uma eleição sem muito es-
Pouco meses depois, Veja repete a dose. forço. Com os outros atores “impedidos” de
Desta vez, para descredenciar Itamar Franco. participar do pleito, as sondagens passaram
Na matéria Você acredita que este senhor é a demonstrar que o outro candidato aceito,
candidato a PRESIDENTE? (Veja. No 1532, Lula, estava condenado a perder. O “eterno
p.34, 11.fev.98) os jornalistas Daniela Pi- presidenciável do PT” - como destaca a re-
nheiro e Expedito Filho tentam convencer pórter Thaís Oyama (ENTRE o ser e o não
o leitor (eleitor) que Itamar deveria desistir ser. Veja. No 1536, p.21-23, 11.mar.98) - es-
desta idéia intempestiva e concorrer mesmo tava desanimado com a candidatura, reflexo
ao governo de Minas. A fonte é uma sonda- do baixo de intenção de votos revelado nas
sondagens eleitorais.
que eu não tinha visto, ao longo desses vinte anos”
depoimento registrado em Rubim, 2000, p.307. As sondagens, portanto, foram utilizadas
no período pré-eleitoral tanto para afirmar a

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invencibilidade de FHC, quanto para desqua- opinião e lança, talvez, a capa mais emble-
lificar a entrada de novos adversários, evi- mática da eleição. A revista reforça a re-
denciando a fraqueza da candidatura Lula. portagem de Isto É exibindo a manchete em
Ao mesmo tempo, elas ofereceram aos jor- sua capa: Lula entra no jogo: mas será que
nalistas a possibilidade da previsão, garan- ele tem chances de vencer a eleição? No
tem as projeções futuristas, e legitimam um corpo do semanário, nas páginas dedicadas
discurso que não poderia ser feito pelo jor- à política, temos o título Cabeça a Cabeça
nalismo de forma tão contundente, caso não (Veja. No 1550, p.42-48, 10.jun.98). Re-
existisse este procedimento de aferição. pleta de gráficos, com resultados anteriores e
Mas a entrada de temas sociais na agenda curvas de desempenho, a matéria, de acordo
da campanha como a seca do Nordeste, que com Vox Populi, aponta o empate técnico
foi manchete da Veja, Isto É, Jornal Nacio- entre FHC e Lula (31% X 30%). A maté-
nal, Folha de São Paulo geraram críticas de ria de Veja demarca também uma mudança
grande parte da imprensa ao governo pela de comportamento da imprensa em relação à
lentidão em oferecer respostas aos proble- Lula. De eterno presidencial fadado a mais
mas nacionais. O novo momento na co- uma derrota, Lula passa a ser tratado como
bertura é ensaiado por Veja. A matéria candidato que tem uma estratégia para ven-
Procura-se um candidato (Veja. 1547, p.44- cer o pleito. A equipe do petista é apresen-
47, 20.mai.98) sugere que o eleitor brasileiro tada, assim como os acordos políticos esta-
gostaria de votar num candidato de oposi- belecidos. A sondagem foca a atenção em
ção para Presidência da República, de acordo Lula, que deixa de ser apenas um apêndice,
com as sondagens de opinião. A matéria um elemento garantidor da vitória de FHC,
se refere às sondagens do Vox Populi que mesmo que isso, de acordo com a matéria,
identificou que 66% dos entrevistados prefe- não seja por mérito da oposição. Era muito
riam um candidato que traga mudanças, con- mais conseqüência dos erros do presidente.
tra 44% que optaram pela manutenção da es- Mas o que permitiu Veja chegar a esta con-
tabilidade. Na semana seguinte, entretanto, clusão de que Lula entrara na disputa na-
é publicada a matéria Fogo em Gêmeos (Isto quele momento? Pelo que se anunciou, a
É. No 1495, p.28-33, 27.mai.98) feita a par- campanha de Lula ainda não havia decolado4
tir de uma sondagem também do Vox Populi, de fato. Sabia-se apenas que havia um mal
sobre a rejeição de FHC, que ultrapassou a estar na sociedade em função dos erros co-
de Lula (17% x 15%). Isto É repete a dose metidos pelo presidente/candidato em fun-
ao trazer uma reportagem sobre o assunto na ção da seca do Nordeste, por exemplo. Isto,
edição seguinte (DE CRISTA baixa. Isto É. no entanto, não leva a concluir, de antemão,
No 1496, p.30-35 03.jun.98) que anuncia a que Lula estava no páreo novamente, ou de
desvantagem de FHC em nove estados brasi- que já não estivesse de fato competindo. A
leiros, o aumento da sua rejeição e a queda 4
A própria matéria de Veja revela que os resulta-
da diferença dele para Lula reduzida a 6,6 dos pegaram os oposicionistas de surpresa. “O PT foi
pontos. apanhado de surpresa tanto quanto o Palácio do Pla-
Uma semana depois, Veja se convence de nalto”, diz os repórteres para algo que, pelo que diz
que Lula estava crescendo nas sondagens de os institutos de opinião, já é publico.

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Sondagem de opinião 9

única fonte que legitima as afirmações dos mentos apenas sacramentaram as tendências
jornalistas é as sondagens. apresentadas: Medo da crise favorece FHC é
No dia 24 de junho, (LEONEL e o poste. a manchete do caderno.
Veja. No 1552, p.40-44, 24.jun.98) uma son- Talvez os jornalistas nem dêem conta da
dagem do Vox Populi é publicada para anun- influência que as sondagens de opinião pas-
ciar a recuperação de FHC, que sobe de 31% saram a ter na cobertura jornalística da polí-
para 36%, enquanto Lula cai de 30% para tica. Além de oferecerem um farto material
29%. A diferença, desta forma, sobe de de trabalho para o jornalista potencializado
1% para 7%, excluindo votos brancos, nulos, seu poder enquanto enunciador, elas tendem
indecisos e candidatos com menos de 1%. a influenciar a seleção dos acontecimentos
Logo no início de julho os números do Ibope políticos, organização interna da notícia e hi-
indicaram novo crescimento de FHC, que re- erarquização dos candidatos.
cupera terreno ao subir três pontos, atingir Certamente, os jornalistas tinham os
36% e se distanciar oito pontos de Lula, que meios de fazer a seleção dos candidatos antes
permanecia com 28%. das sondagens, quer através das alianças po-
Depois de passar a impressão de que a líticas que sustentavam as candidaturas, das
eleição estava mesmo liquidada no primeiro manifestações de apoio de setores represen-
turno, com FHC contabilizando mais de 6% tativos da sociedade como movimentos so-
acima da soma dos outros candidatos, se- ciais e empresariais. A participação popular
gundo todas as sondagens de opinião, um nos comícios também era um dos fatores de
fato novo toma conta da campanha e tornasse seleção dos candidatos que teriam destaque
assunto obrigatório em todos os jornais e re- na mídia.
vistas: a crise econômica5 , deflagrada com a Em 1998, observou-se que a apresentação
moratória na Rússia, no dia 17 de agosto de dos candidatos no jogo sucessório obedeceu
1998, passou pela Venezuela e desembarcou à hierarquia indicada nas sondagens. Isto
no Brasil, no dia 21, quando a Bolsa de Valo- pode ser percebido na estrutura interna das
res de São Paulo registrou queda de 10,4%, notícias, como na própria organização das
provocando a interrupção do pregão. A pu- matérias na diagramação dos jornais. O que
blicação de uma sondagem sobre FHC e a é mais importante, mais relevante foi indi-
crise, no caderno Eleições da Folha de São cado pelas sondagens.
Paulo no dia 06 de setembro encerrou a dis- Até maio, as matérias e a diagramação dos
cussão sobre a possibilidade de mudança na jornais e revista, seguiam sempre esta ordem
“corrida eleitoral”, posto que os desdobra- – FHC, Lula e raramente incluía Ciro Go-
5
mes. Nesta época, as sondagens indicavam
Num levantamento sobre os dez principais temas
e sub-temas que aparecem nos principais jornais, re- que FHC venceria facilmente no primeiro
vistas, através das manchetes de primeira página, cha- turno, com ampla vantagem de votos. Em
madas iniciais e títulos, editoriais e colunas, a crise junho, quando as sondagens identificam uma
financeira fica em terceiro lugar mesmo só ganhando ascensão de Lula, o candidato começa a apa-
destaque no final de agosto de 98. Azevedo (2000)
recer com mais freqüência nos jornais. Veja
também percebe que é neste momento que a cober-
tura do presidente/candidato cresce. e a Isto É, por exemplo, dão capa ao candi-
dato petista que também passa a ter matérias

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sobre a sua candidatura publicada com maior tícia justamente pela suspeita que se levan-
freqüência. taram contra seus resultados, contra a meto-
Sem conflito, a cobertura da sucessão pre- dologia aplicada pelos institutos de opinião
sidencial não apresentou publicamente as di- e contra ao modelo de comercialização. A
ferenças políticas entre os postulantes ao desconfiança generalizada e inédita uniu jor-
cargo. As divergências, críticas, contesta- nalistas e políticos de direita, centro e de
ções e foram sufocadas pelas sondagens que esquerda. As dúvidas em relação ao traba-
conseguiram transformar a sucessão apenas lho dos institutos de opinião e as disparida-
numa “corrida presidencial”. As polêmicas des dos resultados obtidos nas sondagens em
também foram sufocadas e talvez seja por contraposição aos revelados pelas urnas cul-
isso que os erros cometidos pelos institutos minou com uma proposta de criação de uma
tiveram uma repercussão tão forte nos pró- Comissão Parlamentar de Inquérito Mista,
prios meios, pois eles não foram capazes (ou que mesmo sendo arquivada, demonstrou o
não quiseram) de ouvir outras expressões da grau de insatisfação dos seus usuários.
opinião pública. Entidades não governamen- Na realidade, o agendamento do tema “er-
tais, partidos políticos, o cidadão comum, to- ros das pesquisas de opinião” aponta para vá-
das estas forças foram reduzidas a uma só: rias polêmicas que emergiram e ou se conso-
sondagens de opinião lidaram nas eleições 98. A saber: a relação
dos institutos de pesquisas com os políticos
e meios de comunicação, a divulgação das
6 Crise de credibilidade:
sondagens pela mídia e a metodologia em-
momento de reflexão pregada por estas empresas a fim de identifi-
A total harmonia que existia entre estes as car uma tendência de opinião na sociedade.
empresas de comunicação, políticos e insti-
tutos de opinião em torno dos resultados das 7 Sondagem e notícia:
sondagens foi rompida. Denuncias de mani-
debatendo a problemática
pulação dos resultados das sondagens não é
algo novo novas, mas em momento algum se O debate travado após os sucessivos erros co-
viu surgirem vozes contrárias às formas de metidos pelos institutos de opinião nas elei-
utilização e divulgação das sondagens. Mais ções de 1998 pôs em cheque justamente esta
do que a denuncia, a eleição precipitou uma relação com os meios de comunicação. De-
crise de credibilidade dos institutos que fo- nunciado por jornalistas, políticos e repre-
ram forçados a admitir erros e, numa postura sentantes da sociedade civil, este episódio
inédita, lançar campanhas publicitárias para singular da política contemporânea midiá-
informar à sociedade que falavam a verdade, tica fez com que nos deparemos com uma
algo impensado há 10 anos. O problema ga- questão básica: os resultados das sonda-
nhou as páginas dos jornais e revistas, além gens podem realmente ser aceitos pelos jor-
do noticiário da televisão. nais como um acontecimento político? A
De elemento balizador dos textos jornalís- nossa posição aqui vai de encontro aqueles
ticos, as sondagens se transformam em no- que são contra a divulgação das sondagens

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Sondagem de opinião 11

nos meios. Na realidade, como outros se- critérios não justificam a totalidade da con-
tores da sociedade, os institutos de opinião versão das sondagens em acontecimento jor-
adaptaram-se perfeitamente à mídia e con- nalístico.
seguiram fazer com que seus produtos (as Nas eleições de 1998 e nos pleitos de
sondagens de opinião) fossem previamente 1994 e 1989, a divulgação das sondagens
preparadas para se transformar em aconteci- não estava simplesmente atrelada a rupturas
mento político-midiático. de regularidades. Pelo contrário, percebe-
Esta manobra pode ser percebido, com se uma continuidade de conversão que obe-
clareza, na eleição presidencial de 1998. deceu, praticamente, a própria realização da
Apesar da cobertura de Veja ser, na maio- sondagem para fins de divulgação. A dife-
ria das vezes, tendenciosa é preciso ponde- rença é que nos momentos em que são reve-
rar a relevância do paradigma da manipula- ladas novidades como o súbito crescimento
ção deliberada dos meios enquanto modelo de Lula nos meses de maio e junho, as son-
explicativo desta tendência do jornalismo. dagens ganham mais destaques nas páginas
Sair desta perspectiva nos permitiria enten- dos jornais e revistas atendendo ao critério
der melhor o papel das sondagens na co- da novidade, do inusitado, posto que a pró-
bertura da política nas eleições presidenciais pria imprensa criou e também passou a acre-
de 1998, já que nos oferece a possibilidade ditar que FHC seria invencível.
de indicar porque foi possível optar esta e Na sua versão atual, pelo menos, as
não por outras formas de trabalho. Obser- que são divulgadas na mídia, as sonda-
vando as particularidades das sondagens de gens podem ser classificadas como meta-
opinião, podemos identificar alguns elemen- acontecimento, em que o real é um referente
tos que permitiram sua adoção pelos mídia, vago, ganhando forma apenas ao ser enunci-
mesmo que isto cause alguns constrangimen- ado. Desta forma, o meta-acontecimento não
tos e alterações na cobertura política. é regido pelas regras do estado das coisas, ele
O acontecimento seria então o princípio acontece ao serem e pelo fato de serem enun-
da cobertura jornalística. Mas o que dirige ciados. Realizam aquilo que anunciam pelo
a transformação do acontecimento em notí- fato de enunciar.
cia? Quais os critérios que regulam esta se- Não que as percentagens publicadas não
leção? Que características o acontecimento estabeleçam relação com a realidade, afinal,
teria de demonstrar para ser alçado à con- as sondagens representam uma tentativa de
dição de notícia. Geralmente, os aconteci- síntese das opiniões disponíveis na socie-
mentos que indicam desvios das normas e de dade num determinado período. Queremos
comportamentos de pessoas alcançam a con- destacar, entretanto, que as sondagens, nesta
dição de notícia. È o que Adriano Duarte perspectiva, acontecem realmente na mídia,
Rodrigues (1993) chama de “ponto zero da neste âmbito da sociabilidade contemporâ-
significação”. Oposto à racionalidade, que nea. Acontecem porque ganham significado
é da “ordem do previsível, da sucessão mo- na mídia, produzem significados no campo
nótona das causas”, o acontecimento jorna- político, além de produzirem outros aconte-
lístico é identificado pelo excesso, falha ou cimentos a partir da sua enunciação.
inversão, por Rodrigues. Certamente, estes Parece-nos que os jornalistas encontraram

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12 Antonio Brotas

nas sondagens alguns elementos que permiti- fonte política nas eleições, eliminando o po-
ram a sua adoção sem grandes controvérsias. tencial informativo das demais, a “surpresa”
As sondagens teriam em si alguns valores não seria tão grande.
que os profissionais deste campo social pro- Discursos que levam a pensar que sabe-
curam nos acontecimentos que pretendem ou mos o que ocorrerá e, portanto, nos prepara
são levados a converter em notícia. Ou seja, para o que vai ocorrer para que não fique-
nas eleições de 1998, o uso das sondagens mos desprevenidos. As sondagens de al-
como acontecimento político por excelência guma forma ajudam os meios a criar este
só foi possível porque, além de um possí- presente contínuo já que eles “actúan me-
vel direcionamento político, fruto de uma fiel nos como historiadores que como presenta-
adesão dos meios de comunicação à lógica dores, cuando no profetas” (p.32). Nesta ta-
neoliberal do governo FHC, elas puderam, refa de mediar/presentificar o passado e o fu-
de alguma forma, sustentar o discurso legiti- turo, convertendo todos os tempos em pre-
mador dos meios: o da visibilidade pública, sente, aberto ao porvir, a notícia das sonda-
posição que surge do equívoco de tomar as gens admitem comentários futuristas que fo-
sondagens enquanto a forma de representa- ram articulados politicamente, posto que
ção da opinião pública.
“el público que sigue los mé-
A atualidade do acontecimento sondagem
dios de comunicación de uma zona
seria reconhecida pela função dos meios em
dispone de uma referencia comum,
criar um “presente social” contínuo que ser-
el presente que los médios comu-
viria de referência para a coletividade. Ga-
nican y explican y esse presente
mes (1991) aponta a utilização de previsões
se compone basicamente de he-
como uma estratégia dos meios para am-
chos pasados, sucesos de um pa-
pliar o presente social. A este presente am-
sado inmediato que impresionam
plo, no qual são desenvolvidas várias ações
las imaginaciones de los lectores
em simultaneidade, está agregado um futuro
y oyentes como si fueran el pre-
enquanto capacidade de previsão efetivada
sente” (p.33).
tanto pelos experts quanto pelos políticos
através das suas promessas. A possibilidade A novidade talvez seja a forma de repre-
de prevê um resultado futuro, de antecipar sentação do presente, de atualidade, mais
fatos e conseqüências é um dos motivos que marcante. No caso das sondagens, o va-
torna as sondagens extremamente atraentes lor notícia novidade não se caracteriza pela
para os jornalistas. Ao autorizar (legitimar) ruptura radical. Sua característica principal
discursos que previam a vitória de FHC há é um singular estatisticamente, esperado se-
vários meses da eleição, amplamente difun- melhante ao ato de um governante ou a deci-
didos na imprensa, as sondagens eleitorais são econômica. Nas eleições de 98, elas aju-
dão poder aos profissionais de, na prática, se- daram a compor o cenário político-midiático
dimentarem opiniões momentâneas como se de uma vitória tranqüila e inevitável de FHC.
fossem certezas, daí o abalo provocado pelos A rigor a divulgação da sondagem e sua co-
erros dos institutos. Se jornais, revistas e te- nexão com os temas do presente, que ocu-
lejornais não elegessem as sondagens como a pam a agenda pública, é que determinam sua

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Sondagem de opinião 13

atualidade. Sondagens realizadas há uma se- mentos que seriam transformados em notícia
mana, ou um mês, foram divulgadas e pron- no jornalismo contemporâneo. Podemos su-
tamente aceitas pela mídia como se o “mo- por que as sondagens pela facilidade, apesar
vimento de opinião” registrado naquele mo- do alto custo, se adequaram perfeitamente
mento ainda estivesse presente tal qual fora as rotinas produtivas dos jornais e revistas.
registrado antes. Veja, Isto É e Folha de São Como acontecimento previamente definido,
Paulo utilizaram estes expedientes como ro- com data e hora marcada para existir, elas
tina. Na revista devido à periodicidade, a não alteram a rotina dos meios e ainda tra-
divulgação das sondagens ocorre com atraso zem a vantagem de gerar notícias difíceis de
de, pelo menos, cinco dias. E mesmo em edi- rebater e fáceis de compreender, sendo muito
ções posteriores, até a divulgação de outros mais simples e econômico.
resultados, eles são utilizados como se não O grande problema então das eleições de
pudessem mudar porque o jornalista atualiza 1998, não foi a adoção das sondagens en-
estes resultados todas as vezes que divulga quanto acontecimento, mas como o majori-
notícias que foram desdobramentos destas tário e hegemônico, sem levar em considera-
sondagens no campo político. Foi o que ção outras forças expressivas da sociedade.
ocorreu durante o período de ascensão dos Em harmonia com a estratégia de silenciar
números percentuais de Lula em junho, le- a eleição, as sondagens cumpriram um pa-
vando a reação governista. pel fundamental para que a população ficasse
A segurança conclusiva das matérias so- com a impressão de que havia uma cobertura
bre as eleições e sobre o embate político política. Parece-nos que o debate em torno
durante a crise financeira demonstra tam- das sondagens, depois da perda da aura de
bém que as sondagens foram utilizadas pe- infalível, pode dar à sociedade brasileira a
los jornalistas como informação proveniente possibilidade de avaliar melhor a relação vi-
de uma fonte aparentemente neutra, impar- tal que os institutos mantém com os meios
cial e segura, e por isso, com credibilidade. de comunicação.
Foi um acontecimento selecionado em fun- A eleição de 1998 expôs todo as facetas
ção da sua aparente ausência de ambigüida- da relação entre os institutos de opinião e os
des e pela redução dos embates políticos em mídias. Ficou evidente que as sondagens po-
frias percentagens (Galtung e Ruge apud Al- dem sim ser admitidas como uma das fontes
sina, 1996, p.111). Melhor, uma “opinião de informações do campo político, pois elas,
do público para o próprio público”, como além de oferecerem um conhecimento singu-
propagam os institutos de opinião, portanto, lar de realidade, possuem características que
uma opinião supostamente legitima e repre- permitem a sua adoção tanto pelos meios de
sentativa. E como conclui Alsina (1996), comunicação quanto pelos políticos. Ora, se
“quanto más factores noticiosos están asoci- esta posição é passível de entendimento, fica
ados a um acontecimiento más propabilida- claro também que a eliminação das outras
des tienen de ser noticia” (p.112). expressões dos sentimentos e desejos de uma
Portanto, a adoção das sondagens pelos população causa prejuízos irreparáveis para
meios não representava uma agressão aos pa- o jornalismo e para a sociedade.
drões que norteiam a seleção dos aconteci-

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14 Antonio Brotas

8 Considerações Finais O uso indiscriminado das sondagens de


opinião, a ostentação de seus números como
Uma cobertura jornalística guiada pelas son-
símbolos da verdade e o silenciamento de
dagens de opinião tem como resultado a
outras expressões da opinião pública pelos
redução drástica da discussão dos proble-
meios noticiosos oferece a impressão que vi-
mas políticos existentes num dado momento.
vemos numa sociedade com conflitos apazi-
Numa eleição, por exemplo, a frieza dos
guados, uma sociedade com consensos ex-
números transforma o processo sucessório,
tensos, sem tensões já que as preferências
numa corrida presidencial, cuja preocupação
são vagas e simplificadas. Algo muito dis-
última é saber quem está ganhando, quem
tante da realidade, principalmente durante
avançou nas pesquisas. Nesta disputa, o
uma sucessão presidencial.
jornal pode ajudar a acelerar a construção
Esta adequação, que distorce as normas
de candidaturas, ofuscando oponentes ou até
básicas do jornalismo, ao ser efetivada pro-
mesmo indicar para a população que a elei-
voca mudanças na forma da mídia perceber
ção findou-se muito antes votação. Posicio-
a política, uma mudança com prejuízos para
namento, que não corrobora com a participa-
outros acontecimentos políticos. O jorna-
ção dos cidadão nas atividades e discussões
lismo moderno pressupõe relativa autonomia
públicas.
em relação ao sistema político e outros auto-
Não estamos falando em manipulações
res sociais poderoso. A utilização, sem mai-
deliberadas, ainda que sejam possíveis e fa-
ores critérios, e a fé cega nos números difi-
cilitadas pela falta de uma legislação mais rí-
cultam a perspectiva, nascida na sua origem,
gida e eficaz. A preocupação que trazemos
de que o jornalismo é fundamental à vida pú-
diz respeito muito mais à relação que o jor-
blica em qualquer sociedade, oferecendo ele-
nalismo deve ter com a sociedade e a demo-
mentos para a discussão pública dos acon-
cracia, tendo a opinião pública como um dos
tecimentos que atingem os seus membros
fatores de mediação. Discutimos ao longo
concernidos. Parece-nos que é completa-
deste artigo à problemática que cerca o con-
mente descabida de sentido qualquer propo-
ceito, suas variações, interpretações. Mos-
sição que tenha por objeto a proibição da di-
tramos como as sondagens aparecem com
vulgação das sondagens de opinião. Mesmo
um dos elementos deste processo e a im-
partindo do pressuposto de que as opiniões
portância de incluir os meios de comunica-
em disputa no espaço público são individuais
ção, em especial o jornalismo, nesta discus-
e estão dispostas em pé de igualdade, des-
são. Apontamos, entretanto, que a redução
considerando a presença dos atores coleti-
da opinião pública à estatística dos institutos
vos, a metodologia das sondagens de opinião
de opinião pelos meios de comunicação não
acaba formulando uma voz coletiva legítima
contribui para melhor conhecimento da rea-
a partir de opiniões dispersas, juízos de valor
lidade. Serviu muito mais aos interesses dos
e predisposições racionais e emotivas, que
candidatos, partidos. As sondagens, como
podem estar latentes na população.
ocorreu nas eleições presidenciais de 1998,
Evidenciamos nas eleições de 1998, que
foram armas políticas, que os jornais brasi-
esta “voz coletiva” foi privatizada inúme-
leiros ajudaram a potencializar.
ras vezes, atendendo muito mais aos inte-

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Sondagem de opinião 15

resses dos atores que encomendam as son- BOURDIEU, Pierre. A Opinião Pública
dagens, dos próprios institutos de opinião, Não Existe. In: THIOLLENT, Michel
enquanto lucrativas empresas, dos profissio- (org.). Crítica Metodológica, Investi-
nais do marketing e das empresas de comu- gação Social & Enquete Operária. São
nicação. As sondagens, neste aspecto, de- Paulo: Editora Polis, 1985.
vem ser pensadas e trabalhadas pelos jorna-
listas num quadro em que a sociedade civil BROTAS, Antonio. Sondagem de Opi-
e suas instituições sejam consideradas fun- nião. Informação, Interferência e Dú-
damentais para uma progressiva democrati- vidas nas Eleições 98. In: RU-
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nião pública a este novo elemento da política Mídia e Eleições. João Pessoa:
contemporânea aceita pelos jornalistas criou UFPB/Universitária. 2000.
a falsa ilusão de que os representantes da po- CHAMPAGNE, Patrick. Formar a opinião –
pulação estão sendo permanentemente vigi- o novo jogo político. Petrópolis: Vozes,
ados e avaliados, elevou as possibilidades de 1998.
manipulação e dificultou o surgimento de no-
vas propostas para o uso da metodologia a ESTEVES, João Pissara. Espaço Público e
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