Вы находитесь на странице: 1из 23

A TEORIA DA REGULAÇÃO: UMA REVISÃO

Alinne Alvim Franchini, doutoranda UFV/MG


Gilmar Pinheiro Cunha Castro, doutorando UFV/MG

Resumo: Para os idealizadores da teoria da Regulação, a teoria econômica


padrão deve ser superada em alguns pontos, na medida em que parte de suas
análises e preposições apresenta falha. A minoração dos elementos coletivos da
vida econômica e a rejeição à história e às transformações estruturais em nome
do fechamento da economia, que não se preocupa com os movimentos sociais ou
com a complexidade dos processos políticos fazem da teoria econômica padrão
uma disciplina prescritiva e inoperante em termos de análise do que de fato
ocorre na economia. Neste contexto, a Teoria da Regulação se dedicou a elaborar
um conjunto de conceitos que pretendiam analisar as transformações estruturais
como os períodos de crescimento significativo e mais ou menos regular. Para este
fim, o programa da escola regulacionista partiu de “quatro hipóteses
fundadoras”1. Em primeiro lugar destacou-se a importância das questões políticas
e sociais integrando a lógica econômica, dado o grande número de conflitos de
ordem socioeconômica. Em segundo lugar, a Escola da Regulação considerou
importante delimitar com precisão o espaço e o período durante os quais é
legitimo uma certa adequação entre seus conceitos de base e os fenômenos dos
quais devem dar esclarecimentos. Em seguida, uma outra hipótese trata da
historicidade do processo de desenvolvimento das economias capitalistas, ou
seja, no universo deste modo de produção, as inovações organizacional, social e
tecnológica tornam-se permanente e acionam um processo no qual as relações
socioeconômicas passam por transformações ora lenta e controlada, ora bruta e
fugindo ao controle e à análise. Por fim, a Teoria da Regulação tinha por ambição
explicar com o mesmo conjunto de hipóteses o maior número possível de fatos
observados dos anos 50 até os dias de hoje.

Palavras-chave: fordismo, crise do fordismo, teoria da regulação.

1- INTRODUÇÃO
1.1- Fordismo e a crise do Fordismo

A progressiva difusão da idéia de intervenção do Estado na economia


afirmou-se historicamente no período entre as duas guerras, nos Estados Unidos,
e na Europa Ocidental a partir do segundo pós-guerra. Nas décadas de 20 e 30, a
crise emergiu como horizonte imanente da regulação pelo mercado das dinâmicas
econômicas. Na realidade, a crise do liberalismo, do laissez faire e de seu sistema

1
Para melhor detalhamento acerca destas hipóteses consultar BOYER e SAILLARD (1995).

1
de governança internacional acabaram culminando na grande depressão. Assim, a
partir dos anos 35, afirmam-se, nos Estados Unidos, a heterodoxia econômica
keynesiana e os compromissos sociais dinâmicos da administração do então
presidente americano Roosvelt. Com a derrota da Alemanha, o modelo
americano torna-se o paradigma de referência de um processo de reconstrução
das economias européias fortemente marcado pela ativa intervenção do Estado na
regulação econômica. O capitalismo implanta então, embora de modo
diferenciado segundo os países, toda uma institucionalização salarial, incluindo o
desenvolvimento do direito de trabalho e da previdência social (COCCO, 1999).
Deste modo, uma nova forma de Estado – a intervencionista- ganha corpo
nas economias capitalistas. É um momento em que novas normas de produção e
consumo se generalizam. A organização e os contratos de trabalho asseguram,
respectivamente, a demanda permanente para o crescimento da produção (e
sobretudo da produtividade nos diversos ramos da economia) e a distribuição de
renda entre a massa de trabalhadores (NASCIMENTO, 1993).
A principal característica deste período foi o que ficou conhecido como
“fordismo”2, isto é, um regime de acumulação intensivo, com consumo em
massa e produção voltada basicamente para consumo interno, sob regulação
monopolista, que teve sua origem nos Estados Unidos, sendo que no pós- guerra
irradiou-se para Europa e Japão. Destaca-se que como regime de acumulação, o
fordismo baseou-se numa organização do trabalho que combinava os princípios
“tayloristas” (divisão do trabalho manual e intelectual) à mecanização, à pesquisa
e desenvolvimento e à organização racional do trabalho. Contudo, o mais

2
HARVEY (1992) situa hipoteticamente o início do fordismo na fábrica de Henry Ford em Michigan. O
ano seria 1914, quando Ford estabelece o dia de trabalho em 8 horas e a recompensa de cinco dólares para
os trabalhadores de sua linha de montagem automática. O fordismo consolida-se e o que Ford propunha
era uma sociedade baseada no consumo de massa e para isso, deveria haver condições para tal. A linha de
montagem automática facilitaria o aumento da produtividade, do lazer e consequentemente o consumo.
Ford acreditava em um poder corporativo poderia regulamentar a economia como um todo. Com essas
características amplas o fordismo proporcionou uma rápida elevação do investimento e do consumo per
capita.
Ainda segundo HARVEY (1992), O fordismo enquanto modo de regulação tem as seguintes
características: estabilidade nas relações de trabalho: convenções coletivas, o Welfare State, a legislação;
relações entre bancos e firmas amenas: subcontratações de empresas para tarefas especializadas; controle
da moeda pelo Banco Central e participação importante do Estado na regulação econômica.

2
importante é que os ganhos de produtividade são distribuídos entre o crescimento
do capital e o salário real. Pode-se observar, assim, que a regulação desse regime
de acumulação baseia-se na própria regulação da relação salarial. Em outras
palavras, trata-se da existência de forças que controlam o crescimento simultâneo
da demanda dos assalariados e da produção capitalista.
Salienta-se que tal “modelo” só pôde afirmar-se naqueles países que
conseguiram se dotar de condições sócio-políticas bem determinadas. Com
efeito, o fator decisivo foi a emergência de uma dinâmica, alimentada pelos
modos de repartição dos ganhos de produtividade, entre acumulação e salários
reais. Na relação salarial é que este modo de repartição do ganhos de
produtividade entre capital e trabalho se afirmou, permitindo a recomposição
dinâmica de produção e consumo de massa. Assim pode-se dizer que o fordismo,
mais de que sobre as próprias políticas econômicas, baseou sua força
homogeneizadora nas novas caraterísticas da relação salarial. É por isso que o
período de difusão das políticas econômicas de inspiração keynesiana e por fortes
e regulares taxas de crescimento, foi o da vigência da relação salarial fordista.
Todos os outros elementos (concorrência monopolista, mercado auto-centrado,
economias de escala) aparecem tão importantes quanto determinados, em ultima
instância, pela relação salarial fordista (BODDY, 1990).
A regulação fordista implicou, no âmbito de mercado fundamentalmente
auto-centrados, na emergência de formas adequadas de representação política e
integração social dos atores estratégicos do novo modo de produção. Assim
como aconteceu nos primeiros anos do New Deal Roosveltiano, a rearticulação
keynesiana do papel do Estado e a organização sindical dos trabalhadores
constituíram os eixos fundamentais de legitimação da nova forma-Estado. Isto é,
a expansão do papel do Estado e em particular de sua intervenção direta na
regulação do mercado e no controle de segmentos importantes do aparelho
produtivo, teve como condição necessária a recomposição política, em sujeitos
coletivos, das elites empresariais e dos trabalhadores ao mesmo tempo. Com
outras palavras, pode-se afirmar que o Estado-Planejador (fordista-keynesiano)
afirmou-se como dispositivo de integração do conflito social.

3
O fordismo caracterizou-se, portanto, pela articulação entre um ‘regime de
acumulação’ (taylorista) e um modo de regulação da repartição dos ganhos de
produtividade. Este último é que explícita e valoriza a ambivalência dos salários
em quantos ‘fatores’ de custo e ‘vetores’ da demanda. As formas institucionais
que regulam a relação salarial são as que qualificam as tarefas do Estado
regulador-intervencionista.
De acordo com BODDY (1990), pode-se apontar uma indicação mais
geral sobre a forma do Estado keynesiano-fordista. Esta não pode ser pensada
como a própria de um período de estabilidade política e de regularidades
econômicas. Ressalta-se que, o Estado Planejador (o Estado-Plano) é na realidade
um Estado-Crise, um Estado produto da crise cuja caraterística fundamental é a
de conseguir integrar o conflito reconhecendo-o e transformando-o no próprio
vetor do crescimento econômico. Nesta perspectiva, o “modo de regulação
fordista” emerge como um dispositivo endógeno à relação salarial onde as regras
institucionais só têm um papel na medida que elas reconhecem e generalizam as
relações de força que nesta se determinam. Produção e consumo de massa se
alimentam reciprocamente pelas reivindicações salariais e pelo incremento da
composição orgânica do capital.
Deste modo, as características do período de ‘ouro’ do intervencionismo
estatal podem ser resumidas como uma época caracterizada, por um lado, pelo
motor ‘ganhos de produtividade-salários reais’ e, por outro lado, pela afirmação
de mercados autocentrados. Para definir este período, falou-se de regulação
fordista, isto é de uma regulação das forças do mercado pela própria
institucionalização da relação salarial (também fordista). Na relação salarial e nas
suas formas institucionais acontecia esse processo de repartição dos ganhos de
produtividade que permitia, ao mesmo tempo, de induzir o consumo pelos
salários reais e, por outro lado, de sustentar - pela acumulação - a racionalização
da organização taylorista do trabalho. Lembrar tais elementos, próprios ao
período de afirmação da forma-Estado intervencionista nos países centrais é
particularmente interessante a fim de problematizar a crise do Estado Fordisa-
Keynesiano. A “primeira” forma de intervenção do Estado ‘fordista’ é uma forma

4
institucional, isto é a própria relação salarial fordista. O segundo redonda no
esclarecimento do fato que o Estado fordista-keynesiano não fundou-se nas
dimensões instrumentais da racionalidade (econômica, sistêmica) e nem na
antecipação e ‘eliminação’ das dimensões conflituais. Por consequência, o
terceiro, aponta como o ‘estado planejador’ nasce do reconhecimento da crise
como horizonte cotidiano do mercado. Nota-se que o fordismo regulou-se na
integração e não na redução do conflito. Desta maneira, o Estado-Planejador não
foi o resultado de um período de prosperidade que teria se fundada na ausência
do conflito, mas um modo bem preciso de fazer da crise o motor do
desenvolvimento.
Passado o período de "ouro" do intervencionismo estatal, a crise do
sistema fordista de produção inicia-se no final dos anos 60. O fordismo passa a
criar ganhos de produtividade decrescentes, com uma composição técnica de
trabalho crescente. Portanto, naquele momento, surgem os primeiros sinais da
queda de rentabilidade do capital industrial e da diminuição da capacidade de
acumulação, com decréscimo na criação de novos empregos. Paralelamente,
afirma-se a incapacidade do Estado em obter recursos para o financiamento de
suas funções previdenciárias, que cresciam ainda mais com a redução do ritmo de
acumulação de capital. Desta maneira, conforme COCCO (1999), no que diz
respeito à crise do regime de acumulação fordista, os seguintes pontos podem ser
destacados:
a) Num primeiro nível, aponta-se como questão central o enfraquecimento
da dinâmica dos ganhos de produtividade. A regulação fordista teria assim
perdido seu apoio fundamental no regime de acumulação taylorista e tornou-se
cada vez menos capaz de integrar o conflito sem repassar suas tensões nas
dinâmicas dos preços. Os salários reais começaram assim a não crescer mais no
mesmo ritmo e, sobretudo, a reverter os grandes processos de convergência e
redução das desigualdades produzidos pelas grandes ofensivas operarias dos anos
60 e 70.
b) A crise do fordismo determinou-se pela obsolescência de um regime de
acumulação substancialmente auto-centrado. Espaço nacional e espaços

5
econômicos tenderam a não coincidir mais. As políticas econômicas e monetárias
de regulação, por definição de caráter nacional, não alcançam mais dinâmicas de
produção e consumo incontornavelmente internacionalizadas. Na crise, as
economias centrais começaram a procurar um nível cada vez maior de
‘extraversão’ e os mercados tenderam a internacionalizar-se. Na realidade, a
primeira reação dos empresários com a crise do fordismo, foi a de implantar
atividades do tipo de exportação e deslocamento de capital para os novos países
industrializados, configurando o que LIPIETZ (1986) apud NASCIMENTO
(1993) caracterizou como fordismo periférico.
c) Os efeitos desestabilizadores ligados à internacionalização dos
mercados (dos insumos e dos produtos) e, portanto, os processo de
desterritorialização encontraram os determinados pelo duplo movimento de
saturação dos tradicionais mercados dos bens de consumo de massa e de
sofisticação das escolhas aquisitivas. Nos diferentes segmentos, os mercados de
consumo de bens, não-duráveis e duráveis se tornam cada vez mais
concurrenciais e instáveis. Um nível crescente de volatilidade dos mercados é
alcançado e as antecipações de investimento se tornam por conseqüência mais
diferenciadas e impermeáveis às políticas de sustentação da demanda efetiva.
d) Conseqüentemente, o aprofundamento da organização produtiva for-
dista (uso intensivo dos critérios científicos de organização do trabalho e das
economias de escala para uma produção em massa de produtos) ao invés de
permitir a superação da crise (determinada pela queda da dinâmica dos ganhos
salariais) explicitou-se como um obstáculo a ser superado. O taylorismo, seus
mecanismos de alcançar os ganhos de produtividade pela rigidez explícita de
uma organização produtiva fortemente verticalizada e pela rigidez implícita no
controle quase-monopolista de vastos mercados de massa, chega à sua definitiva
maturidade.
e) As organizações produtivas que conseguem manter-se no contexto da
nova competição são as que alcançam um certo nível de flexibilidade, ao mesmo
tempo, nas qualidades e nas quantidades produzidas. Os tradicionais fenômenos

6
de externalização dos custos e dos riscos encontram a emergência de novas
formas de empresa organizadas em redes.
f) Por fim, enfoca-se a própria transformação do regime de acumulação
como elemento decisivo. A verdadeira mudança encontra-se na nova composição
orgânica do capital e em particular na “queda da demanda relativa de
trabalhadores menos qualificados. A mudança tecnológica, sobretudo, o uso
crescente de computadores (constituem com certeza a causa principal destas
tendências onde) a globalização não pode ter desempenhado o papel principal”.
Por conseqüência, as fontes das dificuldades norte-americanas são
predominantemente internas, e os problemas da nação seriam praticamente os
mesmos ainda que os mercados mundiais não tivessem se tornado tão integrados.
Em outras palavras, os salários estagnaram porque a taxa de crescimento da
produtividade da economia como um todo diminuiu e trabalhadores menos
qualificados em particular estão sofrendo porque uma economia de alta
tecnologia demanda cada vez menos seus serviços.
Deste modo, segundo COCCO (1999), pode-se afirmar que a saturação
dos mercados domésticos de primeiro consumo, a abertura de mercados
internacional teria progressivamente reduzido, para em seguida anular, a eficácia
das políticas econômicas keynesianas de estimulo à demanda. De modo
concomitante, a inovação tecnológica (com a difusão da robótica primeiro e
depois da informática) teria permitido o acontecimento de um processo cada vez
mais rápido de indiferenciação espacial. Neste nível, a reorientação das políticas
econômicas numa direção marcada pela desregulamentação das formas
institucionais próprias do fordismo e pela redução de todo tipo de interferência
direta do Estado nas dinâmicas do mercado aparece mais como o resultado de
uma nova orientação ideológica de que como a incontornável evolução deter-
minada por um regime de acumulação cuja mecânica esta longe de ser
explicitada e analisada.
Em suma, a crise do fordismo desenrolou-se no fim dos anos 60, por o que
NASCIMENTO (1993) definiu como “deformação progressiva da estrutura
econômica”, isto é, diminuição dos ganhos de produtividade e crescente

7
internacionalização do processo produtivo, acirrando a luta entre os atores
sociais. De um lado, os sindicatos os sindicatos querendo impor aumentos
automáticos, enquanto os trabalhadores resistiam às mudanças tecnológicas; de
outro, os empresários buscando aumentar a automação e ampliar a escala de
produção e ampliar a escala de produção, deslocando-a para países com
regulações mais favoráveis. Surgem então, os impasses do Estado- previdência,
impotente em face do não funcionamento dos mecanismos de regulação, que
acabaram por alimentar o desenvolvimento da ideologia neoliberal moderna, na
defesa do “enxugamento” do Estado na economia.

1.2- Pós- Fordismo

Até a denominada crise do fordismo, ocorrida no final dos anos 60 e início


dos anos 70, era comum tratar-se crescimento econômico como fruto da
acumulação de capital, induzida pelo progresso técnológico. A família de
modelos de crescimento, assim concebidos, quer de natureza neokeynesiana, quer
neoclássicos, permitiram avanços na tentativa de explicar analiticamente como se
desenvolvia tal processo ao longo do tempo. Entretanto, pela própria natureza de
sua formulação teórica, desconsideraram alguns aspectos fundamentais à
compreensão da “dinâmica” do crescimento, a saber: em todos eles as inovações
tecnológicas e o ambiente institucional eram tidos como componentes exógenos.
Por esta razão, a herança de tais modelos de crescimento é de sempre alcançar
uma situação de equilíbrio, invalidando qualquer possibilidade de mudanças
estruturais nos parâmetros dos modelos. E ainda, mesmo reconhecendo a
importância dos mesmos na definição de uma trajetória de crescimento, inexiste a
possibilidade de fazê-los variar ao longo do tempo (CONCEIÇÃO, 2001).
A partir dos anos 70, o agravamento dos indicadores de atividade
econômica nos principais centros desenvolvidos - onde se constatou retração nos
índices de lucratividade das grandes empresas e queda nos níveis de
produtividade das mesmas -, revelou a extrema complexidade e profundidade da
crise então emergente. O diagnóstico da retração econômica como fruto da

8
desaceleração no ritmo de crescimento do PIB ecoava como uma explicação
tautológica e óbvia, além de não avançar em nada no sentido de se compreender
a série de transformações sociais, institucionais, tecnológicas e econômicas que
seriam deflagradas.
Na realidade, a internacionalização do sistema produtivo a partir dos anos
70, ao redefinir o lugar do comércio exterior no regime de acumulação, retirou
dos Estados- Nações a margem de manobra monetária de que dispunham antes
para sustentar uma política expansionista, que financiava a progressão do
investimento produtivo e do gasto social, validada pelo pleno emprego da
população ativa promovido pelo Estado do Bem- Estar. A internacionalização,
acelerada pela liberalização do comércio e dos mercados financeiros acabou por
solapar os fundamentos econômicos da sociedade salarial. A remuneração do
trabalho se torna de novo um custo a ser contido na busca de ganhos de
competitividade, com implicações na reorganização do trabalho e da produção
visando aumentar a produtividade sem mais ter que oferecer uma melhor
remuneração do trabalho (MARQUES-PEREIRA, 1998).
Observa-se, assim, que a redefinição das relações internacionais, a qual
levou o esgotamento do potencial de crescimento econômico da regulação
fordista, rompeu com a complementaridade funcional que havia se estabelecido
entre o capitalismo e o Estado do Bem- Estar.
Dentro deste novo cenário, assistiu-se ao esvaziamento progressivo dos
modelos de crescimento como fonte explicativa da nova crise capitalista mundial.
Outras abordagens se desenvolveram e todas elas, em maior ou menor grau,
buscavam contemplar os fatores estruturais, sociais e institucionais capazes de
dar conta das mudanças decorrentes da crise. Em outros termos, aqueles fatores
que os tradicionais modelos de crescimento mantinham restritos à cláusula de
“ceteris paribus” pareciam conter importantes explicações à reversão do
crescimento econômico do pós-guerra.
Diversas abordagens procuraram preencher parte deste chamado “vazio
teórico”. Foi o caso da abordagem Neo-Institucionalista, dos Neo-
Schumpeterianos, da Nova Economia Industrial, da Economia das Convenções,

9
dos radicais norte-americanos da Estrutura Social da Acumulação e, por fim, da
Teoria da Regulação, a qual é o objeto de estudo do presente trabalho.
Em termos de introdução ao tema, MARQUES-PEREIRA (1998) salienta
que a Teoria da Regulação destacou-se no pensamento econômico
institucionalista como um dispositivo conceitual mais particularmente adequado
pela formalização que produziu do quadro de compromissos institucionalizados,
sendo que foi a partir deste ponto que tal teoria procurou explicar a estabilização
do crescimento econômico alcançado pelos países desenvolvidos nos chamados
"trinta anos gloriosos". Assim, a teoria regulacionista delimitou um quadro de
análise de mudanças que define a regulação econômica como uma interação
sistêmica entre cinco campos de interesses onde se institucionalizam
compromissos sociais, isto é, a relação salarial, a concorrência, a moeda, o estado
e a inserção internacional, pontos que serão mais detalhadamente abordados no
desenvolvimento do presente estudo.
De uma maneira geral, a teoria da Regulação, ao argumentar que as
condições de uso e remuneração do trabalho fixadas pelo fordismo na
organização da cadeia de produção, na produtividade e no desenvolvimento das
despesas sociais foram a base da adequação entre as dinâmicas de oferta e de
demanda que levaram ao crescimento econômico, inferiu que os compromissos
institucionalizados na relação salarial e no regime de proteção social
sobredeterminaram o regime de crédito, conformando conjuntamente com o
regime de concorrência oligopolística, uma regulação econômica estabilizadora
do regime de acumulação. Tudo indica que devido ao peso das restrições
externas que passaram a limitar as margens de decisão de política monetária, a
relação salarial acabou perdendo o lugar predominante da época do fordismo.

2 – O Contexto do Nascimento da Teoria da Regulação

O contexto do nascimento da teoria da regulação foi marcado,


fundamentalmente, pelo surgimento de uma crise econômica, em que se assistiu
uma ruptura do vertiginoso crescimento econômico observado nos anos 60. As

10
transformações das estruturas produtivas e das formas de organização e,
sobretudo, as respostas para a crise das diversas correntes do pensamento
econômico modelaram uma nova configuração em termos de teoria econômica.
Na realidade, a crise deflagrada nas economias capitalistas avançadas a
partir do início dos anos setenta teve uma correspondência ao nível do
pensamento econômico. De um lado, a ortodoxia neoclássica buscava refúgio nas
“expectativas adaptativas” do monetarismo, evoluindo até as “expectativas
racionais”. De outra parte, a ortodoxia marxista não conseguia ir além de apontar
“leis inexoráveis e invariantes” como explicação para a passagem do crescimento
forte e regular do pós-guerra à crise.
Do lado neoclássico, a partir de R.E. Lucas e T.J. Sargent, a “Teoria das
expectativas racionais”4 trouxe a hipótese e otimização individual para explicar a
formação das antecipações. Ou seja, num universo marcado por relações estáveis,
os agentes econômicos acabavam comportando-se racionalmente, sendo que seus
erros de previsão ocorreriam somente em função de “surpresas” e, assim mesmo,
a curto prazo. Assim, a médio e longo prazo, preços e quantidades se ajustariam
nos diversos mercados, de modo a permitir que todos os recursos fossem
plenamente utilizados.
Em outras palavras, a escola das expectativas racionais negava a
existência de um subemprego durável, considerando que toda transação vantajosa
a nível microeconômico era igualmente vantajosa para toda a economia.
Conseqüentemente, o pleno emprego poderia ser atingido, sem necessitar de
nenhum outro procedimento que não fosse o de mercado (Boyer, 1980).
Já na fronteira de duas correntes teóricas (neoclássica, pelo uso do
mecanismo geral, e Keynesiana, pela possibilidade de um subemprego durável)
tem-se o ponto de partida da teoria do desequilíbrio de J.P. Benassy. Considera-
se que o desemprego pode ser clássico, se o salário real for maior do que a
produção ou Keynesiano, se o salário é baixo em relação à produtividade. A
partir daí, a teoria do desequilíbrio é capaz de distinguir diferentes tipos de crise

3
Segundo Boyer (1990), em francês, a Teoria das Expectativas Racionais (Rational Expectation Theory)
é designada pela expressão “Théorie das Anticipations Rationelles”, isto é, Teoria das Antecipações
Racionais.

11
e interpretar as razões para as mudanças de uma situação de um quase pleno
emprego para uma de constante desemprego (Boyer, 1980).
Por fim, as análises pós-keynesianas de H.P. Minsky consideravam a
instabilidade financeira como principal causa para os movimentos econômicos.
De uma maneira simplificada, dentro desta lógica, nas economias modernas, as
escolhas seriam feitas entre investimentos produtivos e financeiros de acordo
com o valor atual da taxa de juros e da taxa esperada de lucro. No curto prazo, a
melhor estratégia seria aproveitar as baixas taxas para se endividar e investir.
Contudo, à medida que a economia crescesse e se dinamizasse, as empresas
aceitariam planos de financiamento cada vez mais arriscados. A partir daí, o
menor choque (mesmo que acidental) revelaria um desequilíbrio latente entre
rendimento financeiro e do capital produtivo, desencadeando uma crise (Boyer,
1980).
Deste modo, é exatamente dentro deste contexto, em que se busca
interpretar a crise econômica a partir de meados de 70, que se desenvolve a
Escola de Regulação. A partir de uma crítica do marxismo ortodoxo4, mas
reconhecendo que o ponto de partida deve ser exatamente o impacto das relações
sociais sobre as regularidades econômicas, os regulacionistas franceses rejeitam
qualquer possibilidade de equilíbrio. Segundo BOYER (1990), “(esta escola)
parte fundamentalmente da tradição marxista, alimenta-se de referências

4
Para SABÓIA (1987), uma das críticas feitas pelos teóricos da regulação aos marxistas ortodoxos
refere-se ao questionamento do caráter definitivo da obra de Marx em relação à descoberta de leis
imutáveis para a dinâmica de longo prazo do capitalismo, entre as quais destaca-se a tendência à queda da
taxa de lucro. A insistência sobre a invariância do modo de produção capitalista teria induzido estes
teóricos marxistas a minimizarem as transformações ocorridas neste século. Coerentes com sua visão, os
regulacionistas buscam a caracterização de diferentes modos de regulação e o estabelecimento de regimes
de acumulação distintos para o capitalismo, opondo-se às concepções marxistas e estruturalistas de
reprodução.
Na concepção de NASCIMENTO (1993), a Teoria da Regulação nasce da recusa de determinadas
concepções e formulações teóricas marxistas, mas por elas extremamente influenciada, a ponto de alguns
a situarem com uma teoria compatível com o marxismo. Ressalta-se que a Teoria da Regulação recusa
aquelas concepções marxistas sustentadas na existência de leis gerais que seriam determinantes e
explicativas do crescimento e das crises do capitalismo. Para os regulacionistas, a ênfase teórica recai
sobre as formas particulares que assumem as relações sociais, sem qualquer predeterminação que
explique por que as relações do capitalismo assumem tal forma. Deste modo, trata-se de uma oposição à
idéia de leis regentes dos comportamentos sociais acima das subjetividades e à noção de equilíbrio geral
própria dos neoclássicos.

12
Keynesianas e de trabalhos de história econômica, para renovar as interrogações
dos institucionalistas e chegar a uma construção original”.
A crise atual é vista pela escola da regulação como um esgotamento do
modo de regulação criado quando da superação da crise dos anos trinta, devendo
ser interpretada a partir de suas características específicas. Cada crise è encarada
em seu próprio contexto, considerando-se as formas institucionais em vigor. Sua
superação exigiria, portanto, a emergência de um novo modo de regulação para a
economia.
O enfoque da regulação pretende ainda lançar as bases para uma nova
macroeconomia, caracterizando diversos regimes de acumulação. Segundo
Boyer, esta macroeconomia seria mais Kaleckiana do que Keynesiana5, não
apenas em sua representação do circuito econômico, mas também por sua ótica
dinâmica e a preocupação com os movimentos cíclicos da economia.
Dentro deste contexto, o trabalho pioneiro da escola de regulação é de
autoria de Michael Aglietta6. Segundo SABOIA (1987), embora não tenha sido o
primeiro a utilizar o termo “regulação” nas ciências sociais, foi a partir de seu
trabalho que se desenvolveu o principal corpo teórico dentro da Escola Francesa
da Regulação. Para CONCEIÇÃO (2001), ao desenvolver tal estudo, Aglietta
tinha por principal objetivo compreender as transformações do capitalismo no
século XX através de duas separações, a saber: mercadoria e assalariamento. Tais
fatores do sistema econômico produtivo produzem formas sociais que se
entrelaçam e geram, transitoriamente, uma série de regularidades, designadas
“regime de crescimento”.
De acordo com BOYER e SAILLARD (1995) apud THERET (1998), para
a Teoria da Regulação, três níveis de análise podem ser diferenciados segundo
um nível de abstração decrescente. Primeiramente, no nível maior de abstração, a
Teoria da Regulação analisa os modos de produção e sua articulação. Neste
ponto, a aproximação com as relações de produção de Marx é clara. Contudo, a

5
Contudo NASCIMENTO (1993) ressalta que, os regulacionistas tem uma proximidade com a idéia
keynesiana de que o capitalismo e seu crescimento são intrinsecamente instáveis.
6
AGLIETTA, Michael (1976), “Regulation et Crises du Capitalisme – L’Experience des Etats Unis”,
Calmann-Lévy. Este livro é uma versão de sua tese de doutorado.

13
correspondência entre as relações de produção e o Estado não é considerada,
assim como a dicotomia entre a estrutura econômica e estrutura jurídica e
política. No modo de produção capitalista, a forma das relações de produção e de
troca impõe o primado do valor de troca sobre o valor de uso e faz da
acumulação um imperativo do sistema.
Em um segundo nível de abstração, a Teoria da Regulação identifica e
caracteriza as regularidades sociais à acumulação desenvolver-se no longo prazo,
entre duas crises estruturais. O conjunto destas regularidades é, então, resumido
pela noção de regime de acumulação. Neste nível, identificar as as regularidades
não significa excluir as crises; a caraterização dos regimes de acumulação é
também a de sua evolução e das possíveis crises. De acordo com TRERET
(1998), onde os neoclássicos e pós- keynesianos procuram um modelo geral, os
regulacionistas encontram uma variedade de regimes de acumulação, de acordo
com a intensidade das transformações tecnológicas, volume e composição da
demanda, e o modo de vida do assalariado. Para os mesmos, as relações
capitalistas serão compatíveis com regimes de acumulação que se transformam
no longo prazo.
Por fim, o terceiro nível de análise trata das configurações específicas das
relações sociais para uma determinada época e um conjunto geográfico dado.
Neste sentido, as formas institucionais ou estruturais definem a origem das
regularidades sociais e econômicas observadas, sendo que a Teoria da Regulação
caracteriza estas formas institucionais, como também analisa suas transformações
permanentes. E ainda, a Teoria da regulação estabelece uma hierarquia entre
estas formas institucionais, conforme o modo de regulação em vigor na época e o
país em questão.

14
3 – Conceitos dentro da Teoria da Regulação

No que diz respeito à Escola Francesa da Regulação, um dos conceitos


mais visíveis e fundamentais é o de regulação7. De acordo com BOYER (1990),
a origem deste conceito encontra-se na definição proposta pelo filósofo G.
Canguilhem, para o qual regulação é o “ajustamento, de acordo com certas regras
ou normas, de uma infinidade de movimentos ou de atos e de seus efeitos, que
sua diversidade ou sucessão tornam-os estranhos uns aos outros”. Mais tarde, G.
Destanne de Bernis e um grupo de pesquisas sobre a regulação da economia
capitalista buscaram definir as normas e as diferentes variáveis de ajustamento
próprias às economias capitalistas.
Segundo CANUTO (1988), o conceito de regulação social utilizado pelos
autores ligados à Escola Francesa de Regulação é diretamente remetido à noção
de reprodução de Marx. Para LIPIETZ (1979), apud BOYER (1990), regulação é
o modo pelo qual as relações sociais se reproduzem apesar de seu caráter
conflitual. Já AGLIETTA (1976) apud BOYER (1990), em suas primeiras
formulações, irá definir regulação como o que é necessário para que a reprodução
se realize apesar de tudo. Nas palavras de BOYER (1990), “a finalidade da noção
de regulação é justamente a de promover esta passagem de um conjunto de
racionalidades limitadas referentes às decisões múltiplas e descentralizadas de
produção e de troca à possibilidade de coerência dinâmica do sistema como um
todo. Por um lado, ao contrário das teorias tradicionais do equilíbrio, a
convergência para um equilíbrio estático é altamente improvável nas condições
das economias concretas. Por outro lado, a própria lógica das instituições (formas
de organização no interior da empresa e do contrato de trabalho etc.) promove
ajustamentos fundamentalmente diferentes daqueles de mercado de concorrência
pura e perfeita.

7
Conforme BOYER (1990), chama-se atenção para o fato de que o termo regulação pode assumir
sentidos completamente distintos. De um lado, a regulação pode ser interpretada como uma intervenção
ativa e consciente do Estado ou de outras organizações coletivas. Neste caso, toda discussão ficaria
reduzida a uma variante das questões Keynesianas. Por outro lado, regulação pode ser entendida como
uma conjunção dos mecanismos que promovem a reprodução geral, em função de estruturas econômicas
e formas sociais vigentes, conceito este relacionado ao presente estudo.

15
Deste modo, na opinião de ROMEIRO e SILVEIRA (1997), o objetivo do
conceito de regulação é o de chamar a atenção para as formas que a sociedade
cria para superar a natureza contraditória de suas relações sociais, isto é, o modo,
os mecanismos, os instrumentos e as instituições capazes de assegurar a
continuidade do sistema.
Dentro deste contexto, a fim de que a teoria possa ser confrontada com o
mundo real, a Teoria da Regulação propõe mais alguns conceitos básicos.
Primeiramente, o próprio conceito de regulação conduzirá ao conceito de
modo de regulação, entendido como o conjunto de procedimentos e de
comportamentos individuais e coletivos, que possuem, de acordo com
NASCIMENTO (1993) três propriedades básicas:
i) reproduzir as relações sociais fundamentais através de um conjunto de
formas institucionais determinadas;
ii) sustentar e dirigir o regime de acumulação, conceito este que será definido
logo a seguir;
iii) assegurar a compatibilidade dinâmica de um conjunto de decisões
descentralizadas.
Desta forma, para a Escola da Regulação, o ajuste entre as decisões dos
agentes econômicos, múltiplos e descentralizados, e cuja racionalidade é
limitada, opera-se pela conjunção de procedimentos e comportamentos efetivos a
partir do modo de regulação. No que diz respeito ao neoclassicismo, trata-se
primeiro de substituir um equilíbrio estático pela análise dos processos dinâmicos
de solução dos desequilíbrios que a acumulação gera permanentemente.
Posteriormente, os mercados são inseridos em uma série de dispositivos
institucionais que socializam tanto a informação quanto os comportamentos, isto
é, restringem-se a racionalidade dos agentes às informações e a capacidade dos
mesmos em adotar uma racionalidade localizada. Neste ponto, abre-se a
possibilidade de que o modo de regulação diferencie significativamente segundo
a época e o lugar, não refletindo apenas a projeção de um mesmo modelo de
equilíbrio geral, uma vez que as imperfeições são introduzidas pelas
“especificidades nacionais” (PETIT e AMABLE, 1998).

16
Uma vez que a alternância de períodos de estabilidade e ruptura também é
estabelecida para a reprodução econômica como um todo (acumulação do capital
social global) torna-se indispensável a definição de um outro conceito, a saber:
regime de acumulação. Trata-se, ainda na opinião de BOYER (1995), citado por
SABÓIA (1987) e CANUTO (1988), de um “conjunto de regularidades que
asseguram uma progressão geral e relativamente coerente da acumulação de
capital, permitindo absorver ou distribuir ao longo do tempo as distorções e
desequilíbrios que nascem permanentemente do próprio processo”. Desta
maneira, nota-se que a noção de regime de acumulação refere-se às formas de
acumulação do capital ou, em outras palavras, à maneira pela qual se dá o
processo de crescimento econômico capitalista.
Na concepção de LIPIETZ (1988) apud GREMAUD e PORTELA (1990),
chama-se de regime de acumulação aquele modo de realocamento sistemático do
produto que rege, num longo prazo, uma certa adequação entre as transformações
das condições de produção e de consumo. Portanto, um regime de acumulação é
dado por um esquema de reprodução que descreve, período a período, a alocação
de trabalho social entre os diferentes departamentos de produção.
A acumulação traduz uma tendência inerente ao capitalismo, que se
realiza sob formas ou regimes distintos. Assim, compreender as formas que um
regime de acumulação assume significa estudar formas institucionais
particulares. Sob essa perspectiva, torna-se importante analisar as formas
concretas que assume um regime de acumulação, assim como as contradições
que o mesmo cria. Em termos concretos, isto se traduz em:
i) analisar a evolução da organização da produção e as relações dos
assalariados com os meios de produção;
ii) definir um horizonte temporal de valorização do capital;
iii) identificar como se processa a distribuição do valor, possibilitando a
reprodução do sistema;
iv) determinar a composição da demanda social.
Assim, no que diz respeito às diversas formas institucionais (estruturais)
que compõem o modo de regulação, os teóricos da Escola da Regulação

17
identificam cinco formas estruturais, a saber: a relação salarial; a forma
monetária; a concorrência; a adesão ao regime internacional; e, a organização do
Estado.
De acordo com BOYER (1979), apud SABÓIA (1987), a relação salarial é
entendida como o conjunto de condições que regem o uso e a reprodução da
força de trabalho. Deste modo, a relação salarial (capital/trabalho) diz respeito ao
contrato salarial, advindo da separação dos produtores dos meios de produção,
que se estabelece entre empregadores e trabalhadores no processo produtivo. Tal
relação capital/trabalho pode ser decomposta em cinco componentes básicas, a
saber: o tipo dos meios de produção; a forma da divisão social e técnica do
trabalho; a modalidade de mobilização e vinculação do assalariado à empresa; os
determinantes diversos do salário real; e finalmente, o modo de vida dos
assalariados, isto é, as formas de aquisição de mercadorias e a utilização de
serviços coletivos.
Conforme THERET (1998), o lugar privilegiado da relação salarial entre
as formas institucionais definidas pela Teoria da Regulação está ligado ao fato
dela caracterizar o tipo de apropriação do lucro no modo de produção capitalista.
As análises históricas e as comparações internacionais permitiram destinguir as
diversas formas de relação salarial, dentre as quais destaca-se: concorrencial,
quando o consumo dos trabalhadores está inserido na produção capitalista;
taylorista, quando a organização do trabalho permite uma produção de massa,
sem o modo de vida dos assalariados seja profundamente mudado; Fordista, que
conjuga o desenvolvimento de normas de consumo e de normas de produção.
A forma monetária é outra forma institucional considerada importante
para os regulacionistas, uma vez que a mesma define um modo de conexão entre
as unidades econômicas, servindo para interrelacionar os centros de acumulação,
os assalariados e outros agentes econômicos. O maior ou menor desenvolvimento
das diversas funções que ela preenche impõe limites em termos de restrição
orçamentária. Dito de outra forma, a importância da forma institucional moeda
está ligada a seu papel de equivalente geral, isto é, de modo de conexão entre as
unidades econômicas. Muitas modalidades de forma de limitação monetária são

18
possíveis. Existem a priori tantos regimes monetários quantos modos de
compensar déficits e excedentes entre atores econômicos. Esta forma
institucional supera os limites nacionais para tratar também das relações com os
espaços de circulação e de trocas mais amplas.
O entendimento das formas de concorrência também é um fator relevante
tendo em vista que, de acordo com AGLIETTA (1976) apud SABÓIA (1987),
estudar a articulação entre as leis de acumulação do capital e as leis da
concorrência é procurar colocar em evidência o processo contraditório de
generalização da relação salarial e da estratificação de duas classes sociais
opostas (burguesia x proletariado). Para THERET (1998), as formas de
concorrência indicam como se organizam as relações entre produtores. A Teoria
da Regulação está mais ligada particularmente à análise das formas da
concorrência passíveis de acarretar a transformação dos regimes de acumulação.
A modalidade adesão ao regime internacional que reflete a configuração
dos espaços econômicos e suas conexões, introduz a configuração dos espaços
econômicos e suas conexões, introduz a noção de áreas estratégicas que reflete as
potencialidades oferecidas e restrições impostas pela economia dominante ao
conjunto da economia mundial. Neste ponto, os estudiosos da teoria da
Regulação destacam que a forma em que se dá a adesão de cada país ao regime
internacional é fundamental na divisão internacional do trabalho.
Ainda na concepção de THERET (1998), as formas de adesão ao regime
internacional caracterizam as relações entre o Estado- Nação e o espaço
internacional. Está na própria definição do Estado exercer sua soberania política
sobre um território precisamente delimitado, de sorte que as relações de cada
Estado- Nação com o resto do mundo resultam raramente de relações de mercado
puro e sim de escolhas políticas operadas durante períodos críticos, ou seja,
escolha de um regime comercial, de uma gestão de câmbio, de um abertura aos
capitais estrangeiros, opções que definem a modalidade de inserção, e por
extensão, a viabilidade de um regime internacional. A Teoria da Regulação tenta
evitar as aposições simples entre economia aberta e economia fechada,

19
autonomia e limite externo, e propõe noções intermediarias como a de área
estratégica para definir os tipos de estruturação do espaço internacional.
Assim, um regime internacional não determina sozinho o modo de
crescimento de um país. Tudo depende das coerências estabelecidas entre este
regime e outras formas institucionais do país. A idéia de regime internacional
ressalta que a multiplicidade dos arranjos internacionais que regem o comércio, o
investimento direto, os fluxos financeiros e a organização das trocas não
poderiam reduzir apenas ajustes de mercado.
Por fim, a organização do Estado é concebida como a totalização de um
conjunto de compromissos institucionalizados, que estabelecem regras e
regularidades na sociedade. Nas palavras de AGLIETTA (1982) apud CANUTO
(1988), o Estado é o depositário de molde das diferenciações sociais esboçadas
pelas formas estruturais estabelecidas; ele resume as normas sociais.
As formas do Estado mostram como a organização das autoridades
públicas se inserem no dinamismo econômico. A complexidade dos
compromissos na origem das intervenções públicas exclui as interpretações
funcionalistas das ações do Estado. A configuração do Estado é dotada de uma
autonomia bastante ampla em termos de codificação do regime monetário, das
formas de concorrência e da relação salarial. Além disso, as relações entre
sujeitos políticos e agentes econômicos introduzem várias diferenças, em termos
de taxação, de acesso aos serviços coletivos produzidos ou organizados sob a
égide do Estado (THERET, 1998).

4 – Observações Finais

A análise retrospectiva do capitalismo evidencia o quanto o mesmo esteve


sujeito a transformações, utilizando-se de esquemas de crescimento (regimes de
acumulação) e formas de controle desses esquemas (modo de regulação) para
tentar resolver, mesmo que parcialmente e não-definitivamente, suas
contradições.

20
No âmbito da Teoria da Regulação, os períodos de crescimento são
concebidos como etapas marcadas por regimes e acumulação que asseguram a
concordância entre as normas de produção e consumo, permitindo acumulação de
capital. Contudo, uma vez que o regime de acumulação não se sustenta sozinho,
são necessárias normas institucionalizadas que o assegurem. Em outras palavras,
é a articulação de tais formas parciais de regulação, tais como a relação salarial, a
gestão da moeda, a intervenção do estado, a adesão ao regime internacional e a
concorrência, que possibilitam a permanência e a continuidade do regime de
acumulação.
Deste modo, a Teoria da Regulação é uma tentativa de responder algumas
das questões centrais do pensamento social e econômico, a saber: a coesão social,
crise e crescimento econômico. Para os regulacionistas, o entendimento de tais
questões passa pelo conceito de modo de regulação, que possibilita fazer a
mediação entre a macroestrutura do regime de acumulação e os comportamentos
dos indivíduos. Neste ponto, afirmar que o modo de regulação surge de forma
natural, como um “achado histórico” parece uma idéia questionável. Faz-se
necessário explicar como e por que surgiu um modo de regulação e não outro.
Dito de outra forma, deve-se explicar como os agentes econômicos e suas
práticas sociais moldam um modo de regulação.
Qual a saída para a uma crise econômica? As pressuposições da Escola da
Regulação não são suficientemente completas para responder tal indagação. Uma
teoria que tem como ponto central de sua análise a reprodução do sistema
capitalista deve responder, não apenas quais as regras institucionais mínimas
deve ter uma sociedade para se reproduzir, mas também qual a razão destas
regras. No entanto, a Teoria da Regulação tem por mérito sinalizar alguns
problemas em termos de relações sociais e econômicas para os quais necessita-se
encontrar respostas, além de ter conseguido reagrupar uma série de conceitos
sociais, muitos destes desconsiderados pelas demais teorias econômicas.

21
5- Referências Bibliográficas

AMABLE, B., PETIT, P. Ajustamento estrutural e política industrial: uma


abordagem regulacionista. In: Regulação Econômica e Globalização (org.),
Campinas: UNICAMP, 1998.

BODDY, M. Reestruturação Industrial, Pós-Fordismo e Novos Espaços


Industriais. In: Reestruturação Urbana-Tendências e Desafios (org.), Rio de
Janeiro: Nobel/IU PERJ, 1990.

BOYER, R. A Teoria da Regulação: Uma análise Crítica. São Paulo: Nobel,


1990.

CANUTO, O. O aporte da regulação à crise capitalista. In: Anais do Encontro


Nacional de Economia-ANPEC, 1988.

COCCO, G. Trabalho e cidadania: produção e custos na era da globalização.


São Paulo: Editora Cortez, 1999.

CONCEIÇÃO, O.A.C. Instituição, crescimento e mudança na ótica


institucionalista. Porto Alegre: Fundação de Economia e Estatística Siefgried
Emanual Heuser, 2001, 228p. (tese FEE, n.1).

GREMAUD, A.P., PORTELA, A. A teoria da regulação e o problema da ordem:


a tensão indivíduo-estrutura. In: Anais do Encontro Nacional de Economia -
ANPEC, 1990.

HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1992.

MARQUES-PEREIRA, J. Trabalho, cidadania e eficiência da regulação


econômica. In: Regulação Econômica e Globalização (org.), Campinas:
UNICAMP, 1998.

NASCIMENTO, E. P. Notas a respeito da Escola Francesa de Regulação. In:


Revista de Economia Política, v.13,n.12, abril-junho, 1993.

ROMEIRO. A.R., SILVEIRA, J.M.J. A teoria da regulação e o enfoque setorial:


o papel de destaque da agricultura. In: Estudos Econômicos. São Paulo: USP,
vol.27, n.3, 1997.

SABOIA, J. Teoria da Regulação e “Rapport Salarial” no Brasil. In: Anais do


XV Encontro Nacional de Economia-ANPEC, 1987.

22
THERET, B. A teoria da regulação e as transformações contemporâneas do
sistema internacional dos Estados e da Economia mundial. In: Regulação
Econômica e Globalização (org.), Campinas: UNICAMP, 1998.

23

Вам также может понравиться