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Jornalismo Contemporâneo
Influências e heranças que marcam o jornalismo atual

GOMES, Ingrid
Mestranda em Comunicação Social na Universidade Metodista de São
Bernardo do Campo e pós-graduanda em Globalização e Cultura na Fundação de
Sociologia e Política de São Paulo.

Resumo
Na presente discussão que o artigo desenvolve há apontamentos, de
menor ou maior intensidade, de heranças que marcam algumas das características centrais
do jornalismo brasileiro. No levantamento de tais heranças estão presentes as problemáticas
da real-função do jornalista, como produtor de informação e gerador de reflexão pelo
conteúdo disponibilizado, o qual se hibridiza com a produção do consenso (CHOMSKY.
2003) e da autocensura (KUCINSKI. 1998). A partir desse cenário fica mais claro a
consolidação da esfera do poder (DREIFUSS. 1981) influindo na esfera pública por meio
dos meios de comunicação tradicionais.
Para se chegar a esse possível levantamento é recortada uma época da
política social em que o Brasil viveu, a ditadura e a própria formação do Estado autoritário,
para tentar compreender algumas heranças que estão presentes no campo jornalístico
contemporâneo.

Palavras-chave
Jornalismo, heranças no campo da profissão, autocensura, esfera pública,
esfera do poder, elite conservadora.

“Não há fatos eternos,


como não há verdades absolutas.”
Friedrich Nietzsche
O jornalismo aparentemente se limita a desempenhar o papel de informar
a sociedade, sobre as notícias pertinentes do dia-a-dia. Entretanto sabe-se que esta visão
2

reducionista da profissão esconde norteamentos ideológicos que não possibilita a livre


expressão, recaindo a fazer jornalismo num tipo de autoritarismo dentro do seu próprio
mecanismo de trabalho. Esse autoritarismo aparece primeiramente, na maneira de seleção
das pautas, que são decididas por estruturas hierárquicas. Eugênio Bucci ressalta que,

“o jornalista não é escritor ou um artista entregue às suas


idiossincrasias personalíssimas, não é uma ‘alma livre’ flanando na
literatura sem nenhuma baliza que o enquadre. O jornalista é um
trabalhador intelectual a serviço da democracia e do direito à
informação”.1

Mas quase sempre este trabalhador intelectual não consegue, ao elaborar


uma matéria, utilizar-se da sua liberdade, para produzir argumentos consistentes que
abarquem todas as dimensões do acontecimento.
Nesse sentido o jornalista utiliza-se de recursos para hierarquizar as
informações qualificando, limitando, pluralizando ou quantificando-as, para que este
material seja consumido. Para isso ocorrer é necessário também lançar mão de instrumentos
que criem um cenário atrativo. Há, portanto um percurso entre objetividade do fato e a ação
humana na produção da notícia.
Nessa profissão, a característica autoritária advinda da estrutura dos
meios de comunicação limita outras possíveis visões que se poderiam angariar de uma
informação, reduzindo, muitas vezes, a capacidade do público de refletir sobre o que foi
publicado.

“(...) no Brasil a mídia desempenha papel mais ideológico do que


informativo, mais voltado à disseminação de um consenso previamente
acordado entre as elites em espaços reservados, e, em menor escala, à
difusão de proposições de grupos de pressão empresariais. Essa função

1
BUCCI Eugênio. Sobre ética e imprensa, p. 89.
3

de controle é facilitada pelo monopólio da propriedade pelas elites e por


uma cultura jornalística autoritária e acrítica”.2

Kucinski considera que o jornalismo brasileiro é o fabricante de um


“consenso” na sociedade. Cada vez mais os jornalistas formados expressam um padrão
único de pensamento, em razão dos mecanismos de pressão que existem na profissão.
Esse processo inibidor colabora com a predominância da autocensura do
jornalista, bem como da descrença na democracia por parte da população, além de
reproduzir entre as gerações de jornalistas a visão instrumentalizadora do que seja o
interesse público,3 gerando a privatização da esfera pública.
A questão da produção do consenso transcende de antemão o que é
visível para o público receptor dos veículos de comunicação. Seu processo começa nas
articulações dos interesses políticos que ocorrem na “esfera do poder”4, e que só depois,
com a finalidade de atingir e persuadir as massas com os ideais já elaborados e definidos
repassam para o público, e é nesta instrumentalização midiática que os meios de
comunicação se fazem presentes como elo de ligação entre a esfera do poder e a esfera
pública.
Entretanto, as perspectivas ideológicas decididas na esfera do poder são
impostas para a mídia retransmitir, com o objetivo de produzir consenso na esfera pública,
mesmo que para isso seja necessário manipular um fato, ou polemizar uma notícia,
desconectando estes materiais de sua essência, padronizando a própria cobertura
jornalística. Essas produções de consenso são percebidas em maior escala nos momentos
que os privilégios das oligarquias estão em perigo ou que podem causar algum conflito ou
problema para a elite conservadora, porém acontecem com freqüência.
Na produção desse consenso, o fator predominante é a inclusão ou
exclusão do que estará em ressalta na agenda midiática nacional, e umas das maneiras para
implantá-la no seio da mente da sociedade é através da repetição de crenças previamente
existentes.5

2
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro, p. 17.
3
Ibid.
4
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro.
5
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro
4

Atua em favor da construção do consenso na esfera pública no Brasil, a


monopolização dos veículos de comunicação que são hegemonizados por sete famílias:
Civita (Editora Abril), Frias (Grupo Folha de São Paulo), Mesquita (Estado de São Paulo),
Nascimento Britto (Jornal do Brasil), Saad (Bandeirantes), Sirotsky (RBS) e o sobrenome
mais influente em qualquer tipo de mídia brasileira, Marinho (Rede Globo), este último
como especifica Kucinski,

“ (...) domina a audiência e promove os candidatos de preferência das


elites desde as eleições para governadores em 1982 (as primeiras após o
fim do regime militar) até as três campanhas presidenciais, de 1989,
1994 e 1998. Essa rede tornou-se um centro das articulações políticas
das elites dominantes e de definição dos destinos do país – uma
instituinte de história”.6

Esses grupos hegemônicos de veículos de comunicação também se


mantêm financeiramente pelo apoio da publicidade diária e, coincidentemente, quem faz
parte do campo de anúncios e campanhas publicitárias é, em sua grande maioria, a classe
com maior renda econômica.
O fato do jornalismo, numa sociedade capitalista, ser um empreendimento
comercial muitas vezes sobrepõe o interesse mercadológico à real função social do
jornalismo.
Esta simplificação de valor do fazer jornalismo emprega ao jornal, revista
e demais veículos de comunicação, que devem ser instrumentos informativos à sociedade, o
peso de serem conduzidos, na sua grande maioria, pelo interesse privado.
Certamente que para se manter no mercado atual o veículo de
comunicação deve voltar-se também para a veiculação de anúncios. O problema maior
acontece quando se cortam matérias que sejam importantes à sociedade para dar mais
espaço à publicidade ou, pior, pautar as reportagens visando legitimar certos anúncios.

6
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro, p. 16.
5

A mercantilização do jornalismo chega a tal ponto que os proprietários


dos veículos de comunicação esquecem o objetivo central da atividade a fim de seu
empreendimento.
A relação entre elite dominante e empresa jornalística se dá mais
precisamente com a ascensão das empresas de jornais e o aumento de capital nesse setor,
com maior nitidez no Brasil no período da entrada do século XX, devido às melhorias
tecnológicas e a ênfase em se atingir grandes audiências e públicos. Para Chomsky, “a
expansão do mercado livre foi acompanhada por uma industrialização da imprensa”.7
Hoje, existem mais entraves para se lançar um veículo de comunicação do
que simplesmente a questão do custo inicial de investimentos, como era no começo do
século passado, pois é necessário o entendimento ideológico com os grupos políticos
dominantes, ter a confiança do público e também passar a ser visto com credibilidade pelo
poder governamental.8

Uma das heranças – a formação do Estado autoritário brasileiro

“Ou marchamos para uma democracia social mais justa,


que possibilite melhor distribuição das riquezas,
ou então amanhã muitos dos que hoje me atacam terão de chorar
a estupidez de não terem também lutado
em defesa das grandes aspirações populares (...)
as idéias de reforma que preconizo não são minhas,
mas de todos os que se interessam pela sobrevivência da democracia.”
João Goulart

Esse discurso do presidente João Goulart problematiza a situação


brasileira do início dos anos 60, um contexto em que a sociedade e outros setores
conservadores-burocráticos não percebiam as demandas necessárias por reformas políticas,

7
CHOMSKY Noam; HERMAN. Edward S. A manipulação do público, p. 64.
8
Ibid.
6

econômicas e sociais no Brasil. É pertinente resgatar desse dado histórico a importante


influência da mídia nesse mascaramento e desvio de informações.9 É mais fácil perceber
através da contextualização de um momento histórico como ocorre as relações entre Estado
autoritário e elite brasileira.
Nesse período, foi agrupado numa equipe, empresários anticomunistas,
advogados, militares entre outros intelectuais de diferentes “backgrounds ideológicos”10
para a formação do IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais). Também, nesse
período histórico a política externa brasileira oscilava entre um alinhamento aos Estados
Unidos ou aos países do Leste Europeu. A definição dessas alianças se dava
primordialmente pela identificação ideológica, respectivamente capitalismo e comunismo.
A nação estadunidense lançou-se à frente das organizações políticas
estratégicas no Brasil, desenvolvendo com o início do IPES, como menciona o historiador
René Dreifuss, uma dupla vida política. “Aos olhos de simpatizantes e defensores, a sua
fase pública mostrava uma organização de ‘respeitáveis homens de negócio’ e intelectuais,
com um número de técnicos de destaque, que advogavam ‘participação nos acontecimentos
políticos e sociais e que apoiavam a reforma moderada das instituições políticas e
econômicas existentes’”. Seu objetivo ostensivo era estudar “as reformas básicas propostas
por João Goulart e a esquerda, sob o ponto de vista de um tecno-empresário liberal” .11
Um ponto central que unia os diferentes participantes do IPES era a
“ambição de readequar e reformular o Estado.”12 Através da programação das emissoras de
rádio, jornais impressos, como “Jornal do Brasil, O Globo, o Correio da Manhã e a Última
Hora”, o IPES foi oficialmente inaugurado, com prestígio, em 29 de novembro de 1961.13
Haja vista a presença do IPES como um dos interlocutores visionários da
ideologia estadunidense na política do Brasil, havia membros dessa instituição coordenando
o parlamento brasileiro, além de influências decisivas em facções de centro-direita em
oposição ao governo e à esquerda trabalhista.14 Concordante com isto, a elite brasileira
“estabeleceu o que pode ser considerado como efetivo controle da mídia audiovisual e da

9
OLIVEIRA Maria Rosa Duarte de. João Goulart na imprensa; de personalidade a personagem.
10
DREIFUSS René. 1964: a conquista do Estado; ação política, poder e golpe de classe.
11
DREIFUSS René. 1964: a conquista do Estado; ação política, poder e golpe de classe.
12
Ibid.
13
Ibid.
14
Ibid.
7

imprensa de todo o país. No curso de sua oposição às estruturas populistas, ao Executivo


nacional-reformista e às forças sociais populares”.15 Com isso o IPES foi se tornando o
verdadeiro partido da burguesia e seu Estado-Maior para a ação ideológica, política e
militar. O IPES contava com o apoio do conservador Arcebispo do Rio de Janeiro Dom
Jayme de Barros Câmara.16
Logo, a influência do IPES estava nas mais diversas áreas de opinião
pública, um ponto que contribuiu para a deposição do Presidente João Goulart. O IPES
contava com as pressões religiosas conservadoras, com a imprensa e com outras
organizações e pessoas consideradas referências, na construção de uma imagem
empobrecida que se criou do governo em questão e que, por meio disto, levou o país ao
amargo e longo recesso democrático.
O ponto central da política de João Goulart eram as chamadas reformas
de base: a reforma agrária, a reforma do sistema bancário, do processo eleitoral, da
legislação a respeito do capital estrangeiro e da remessa de lucros das multinacionais, a
reforma do sistema tributário (para aumentar os recursos financeiros do governo). Todas
essas necessidades se chocavam com os interesses da elite orgânica17 que mediava o rumo
do país nessa época.
Usando o poder da mídia, a elite faz desta um instrumento persuasivo
sobre a mente da sociedade, referindo-se da imagem de João Goulart um comunista, pois
nesse momento histórico era forte o receio ao comunismo, o que se estende até hoje, em
menor instância. A população, na sua maioria, desconhecia a ideologia comunista, embora
fosse bombardeada pela sua criminalização. Por isto, associar Goulart e sua base de
sustentação política como comunista era a estratégia visada para isolá-lo do governo. Esse
mecanismo de associa-lo ao comunismo era ressaltado pelo diário paulista Estado de São
Paulo, que acoplava a imagem do presidente ao fiasco que seu governo estava e continuaria
mergulhado. 18

15
Ibid.
16
DREIFUSS René . 1964: a conquista do Estado; ação política, poder e golpe de classe.
17
Ibid.
18
OLIVEIRA Maria Rosa Duarte de. João Goulart na imprensa; de personalidade a personagem.
8

Já o outro jornal gaúcho, Última Hora, defendia o presidente a ponto de


compará-lo em manchetes e em longas matérias com a imagem da liberdade e da
democracia brasileira.19
A ação ideológica dos meios de comunicação não é forte suficiente por si
só para derrubar ou heroicizar o presidente João Goulart20, mas serviram para construir um
consenso a opinião pública da necessidade do golpe de Estado, vendido ilusoriamente como
uma “Revolução”.21
Ao conferir “confiabilidade” a fontes que representam a elite política e
econômica (como foi o caso do IPES) e marginalizar pensamentos e projetos ideológicos
alternativos, adjetivando-os de forma pejorativa (como é o caso de qualificar de
“comunista” qualquer projeto de inclusão social e associar tal pensamento à idéia de
“desordem”), a mídia sustenta e legitima as fontes “oficiais” da classe dominante e do
Estado, contribuindo para um engessamento da esfera pública. A esfera midiática atua,
assim, como legitimadora da esfera política junto à esfera pública que se enquadra nestes
consensos fabricados.

A política e suas interfaces na mídia brasileira

“Já somos o esquecimento que seremos,


a poeira elementar que nos ignora,
que não foi Adão e que é agora todos os homens.
Somos apenas duas datas: a do princípio e a do término.
Não sou o insensato que se aferra ao mágico som de seu próprio nome.
Penso com esperança naquele homem que não saberá
o que fui sobre a terra.
Abaixo do indiferente azul do céu, esta meditação é um consolo.”
Jorge Luiz Borges

19
Ibid.
20
Ibid.
21
DREIFUSS René. O jogo da direita.
9

Desde o planejamento do golpe de 1964, muitos proprietários de jornais


foram cúmplices modelando a opinião pública a favor da elite. Entre os seus diversos
interesses existia o objetivo de derrubar o jornal Última Hora, de grande circulação no
mercado e que era a favor da permanência de João Goulart na presidência.22
Num outro veículo, o jornal Correio da Manhã, no editorial do dia 1º de
abril, a opinião de afastar João Goulart da presidência era escancarada.23 “Não resta outra
saída ao Sr. João Goulart senão a de entregar o governo ao seu legítimo sucessor. Só há
uma coisa a dizer ao Sr. João Goulart: saia”.24
João Goulart caiu no dia 1º de abril. O regime de 1964, nos dias
seguintes. Por conta da radicalização que levara o conflito para fora do círculo estrito das
cúpulas política e militar, a vitória não podia extinguir-se com a deposição do presidente.
Logo, houveram expurgos político, militar e administrativo.25
Na sua edição de 2 de abril, de 1964, a Tribuna da Imprensa pedia a
“cassação dos direitos políticos do comando civil janguista”.26 Intensificando as propostas
de demolição das franquias constitucionais.
Com a deposição de João Goulart, o controle político do país estava nas
mãos dos militares que ocuparam os cargos centrais de poder, com Marechal Humberto de
Alencar Castelo Branco assumindo a presidência da República, logo após o decreto do Ato
Institucional nº 1.

“O controle direto do aparelho do Estado, através dele, dos outros


setores das classes dominantes e das classes dominadas da sociedade foi,
se não a forma mais completa de levar à frente os interesses do grande
capital, pelo menos a forma mais eficiente e segura à disposição dos
interesses financeiros-industriais, multinacionais e associados”27.

22
OLIVEIRA Maria Rosa Duarte de. João Goulart na imprensa; de personalidade a personagem.
23
GASPARI Elio. A ditadura envergonhada; as ilusões armadas, p. 96.
24
Ibid., p. 96.
25
Ibid., p. 121.
26
Ibid., p. 121.
27
DREIFUSS René. 1964: a conquista do Estado; ação política, poder e golpe de classe.
10

Esse ato institucional foi uma proposta vinda do jornalista Júlio de


Mesquita Filho, proprietário d’ O Estado de S. Paulo, na época.

“Redigida com a colaboração do advogado Vicente Ráo, catedrático de


Direito Civil da Universidade de São Paulo e ministro da justiça no
Estado Novo, foi a primeira a chamar-se Ato Institucional. Sugeria a
dissolução do Senado, Câmara e assembléias legislativas, anulava o
mandato dos governadores e prefeitos, suspendia o habeas corpus e
pressupunha que seria o primeiro de uma série.”28

No início da ditadura eram isolados os casos de censura entre os


jornalistas. Após o golpe, alguns jornais como a Última Hora e o Jornal do Brasil chegaram
a denunciar casos de tortura. Havia um controle, através da publicidade considerada na
teoria de Chomsky29 um dos filtros que direcionam as discussões e que permitem que o
governo e classes dominantes passem sua mensagem ao público.
O jornal Correio da Manhã se destacava nas publicações diárias de
denúncias de torturas, sempre na última página do primeiro caderno, um dos pontos mais
nobres do jornal.30
Mas logo começou a censura pesada nos veículos de comunicação. A elite
era capaz de escolher e impedir programas indesejáveis sem muitas dificuldades. Em
outubro de 1959, a Associação Brasileira de Anunciantes – ABA foi fundada com o
objetivo de reunir os principais anunciantes, estabelecer entre eles condições para a defesa
mútua de seus interesses, bem como a discussão de assuntos relacionados à publicidade e
promoção de vendas.31 Muitos membros desta associação estavam também relacionados
com o IPES.
“No Rio de Janeiro, intelectuais e jornalistas viveram um período de
grande atividade, criando suplementos subversivos dentro dos grandes jornais, publicando

28
GASPARI Elio. A ditadura envergonhada; as ilusões armadas, p. 122.
29
CHOMSKY; Noam Edward S. HERMAN. A manipulação do público.
30
GASPARI Elio. A ditadura envergonhada; as ilusões armadas, p. 143.
31
RABELO Genival, apud René DREIFUSS. 1964: a conquista do Estado; ação política, poder e golpe de
classe.
11

livros e charges de crítica ao golpe”, segundo o jornalista Bernardo Kucinski32 que


considerou o período de 1964 a 1968 da autonomia jornalística.
Apesar dos proprietários dos jornais se reunirem com dirigentes da
conspiração para planejarem o golpe, os jornalistas se expressavam de forma crítica,
produzindo reportagens sobre a repressão com grandes fotos e um estilo literário baseado
no jornalismo estadunidense. Em setembro de 1968, Mino Carta (atual proprietário da
revista CartaCapital) formou uma equipe especializada de jornalistas veteranos e jovens
talentos para lançar a revista Veja, da editora Abril e nas suas primeiras edições publicou
duas capas denunciando torturas.
Depois de diversas medidas antidemocráticas favorecendo o regime
militar foi eleito para presidente o marechal Artur da Costa e Silva, escolhido pelo Alto
Comando Militar. Neste governo cresceram as manifestações públicas pelo país.
Estudantes, operários, políticos e até sacerdotes protestaram contra o regime. Um exemplo
foi a passeata dos cem mil, realizada em junho de 1968, no Rio de Janeiro.
O regime militar também cortou o diálogo democrático com a sociedade
através da censura prévia ou outros tipos de pressão aos meios de comunicação. Surge neste
período, classificado por Kucinski de 1968 a 1972, a imprensa oficial e a imprensa
alternativa.
Diante da resistência dos “dominados”, o governo reage fechando o
Congresso e decretando o Ato Institucional nº 5, que conferia poderes ao presidente da
República de reprimir e perseguir as oposições. “Estabeleceu-se na prática a censura aos
meios de comunicação; a tortura passou a fazer parte integrante dos métodos de governo.”33
Assim, através de bilhetinhos e avisos informais os proprietários dos
jornais passaram a praticar a autocensura, legitimando ainda mais o autoritarismo.
Jornalistas críticos do regime foram demitidos, equipes de redações foram desfeitas e os
jornalistas que ousaram resistir, depois de pressões violentas ficaram desaparecidos. Na
equipe da revista Veja, os responsáveis pelas capas sobre a tortura foram demitidos e as
manchetes dos noticiários mudaram de discurso.

32
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro.
33
COTRIM Gilberto. História do Brasil; um olhar crítico.
12

Logo, a imprensa alternativa se tornou refúgio para jornalistas críticos


demitidos dos jornais convencionais. Mesmo assim era difícil exercer a liberdade de
expressão. “Os principais jornais alternativos são submetidos a uma censura prévia
substancial, que destrói proporção significativa do material de cada edição.” 34
Nessa época, diversos setores no país se concentravam nas mãos de
grupos estrangeiros. Com a TV Globo, o grupo norte-americano Time Life investiu milhões
de dólares. Esta penetração abusiva do capital estrangeiro foi ignorada pelas autoridades
nacionais da época.
A cumplicidade se tornou uma característica comum entre os
proprietários dos meios de comunicação com os dirigentes do regime. Entre 1972-1975,
considerado como terceiro período por Kucinski, a censura prévia e a autocensura eram
ferramentas eficazes para o controle das informações.
No governo Médici, foram intensas as repressões contra a sociedade. Os
direitos fundamentais do cidadão foram suspensos e os meios de comunicação timidamente
noticiavam algo sobre o autoritarismo. Para encobrir sua face terrorista, o governo investiu
muito dinheiro em propagandas para melhorar sua imagem junto ao povo. Um dos slogans
desta propaganda era: “Brasil – ame-o ou deixe-o”.
Apesar do decreto 1.077 que legalizava a censura prévia, a autocensura
foi a forma mais utilizada pelos jornais elitistas, já que não causava prejuízo às empresas. O
confisco de uma edição deveria ser evitado, para isso era melhor selecionar notícias como a
realização de obras e projetos ou a conquista do tricampeonato mundial de futebol.
A televisão, particularmente a Rede Globo, também não foi diferente. Em
sua programação desde os programas infantis, novelas e até os telejornais, a emissora
sempre foi fiel aos planos das elites fazendo da população brasileira espectadora de todo
processo. O presidente Emílio Garrastazu Médici chegou a declarar, “cada vez que ligo a
televisão no Jornal Nacional, sinto-me feliz, porque no jornal da Globo o mundo está
caótico, mas o Brasil está em paz. É como um tranqüilizante após um dia de trabalho”.
Dessa forma, o Estado não precisa admitir que controla a informação,
pois os veículos se autocensuram.

34
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro.
13

“Com as exceções dos dois jornais da família Mesquita e de Tribuna da


Imprensa, nenhum jornal da burguesia brasileira sofreu censura prévia
sistemática por períodos de tempo consideráveis. E o apoio da Rede
Globo ao projeto autoritário foi tal que o regime militar nunca precisou
criar seu veículo de persuasão. Apenas 15 jornalistas foram processados
por crimes de imprensa, a maioria por revelar casos de mandonismo ou
corrupção em jornais do interior.” 35

Mesmo com colapso do milagre brasileiro, com as oposições políticas se


organizando para exigir a volta da democracia e o governo militar sem muitos argumentos
para manter-se no poder, a mídia se autocensurou sobre tais assuntos nos noticiários.
Com Ernesto Geisel na presidência, indicado pelo Alto Comando Militar e ligado ao
ex-presidente Castelo Branco a abertura política gradual e controlada foi proposta à
sociedade. Diminuir a severa ação da censura sobre os meios de comunicação foi uma das
ações do governo. O ministro chefe da Casa Civil, general Golbery do Couto e Silva foi o
principal articulador reunindo um seleto grupo de jornalistas para participar da abertura
política. Assim, com o apoio não só dos proprietários, mas também de editores dos jornais,
muitos jornalistas de prestígio foram demitidos, pois para garantir o processo de abertura de
forma lenta, gradual e segura era preciso jornalistas com um discurso homogêneo.

Mídia Atual X Resquícios Conservadores

"Esse papo de política é fogo.


Porque quem sempre mandou no povo desde os primórdios da
história foi uma elite. Os homens carregavam pedras imensas para as
pirâmides dos faraós, esse negócio todo. Foi sempre a mesma coisa."
Raul Seixas

Os fortes emblemas que marcaram a jornada brasileira dos meios de


comunicação até o século XXI demarcaram, em boa parte, valores do processo de

35
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro.
14

comunicação. Por mais que alguns mitos éticos insistam em tratar a estrutura
comportamental da profissão jornalística como algo a-ideológica, por exemplo, na questão
que envolve a imparcialidade como o eixo norteador e condutor dos trabalhos do
jornalismo. É neste momento que a ideologia de forma silenciosa, conduz a produção
jornalística, introduzindo a parcialidade que todo comunicador possui.
Nesse sentido, o fazer política está presente diariamente na rotina de
trabalho do jornalista, mesmo que este se coloque como profissional apartidário. Ele não
deixa de estar incluso no processo dialético que envolve as ramificações para se elaborar a
informação jornalística. Portanto, impor ao jornalista o peso de mediador entre codificador
da notícia e decodificador da mesma para a sociedade, ultrapassa a linearidade aparente
desse processo, pois o jornalista terá uma percepção “cru” do fato que se transformará em
matéria. Na mesma linha de pensamento, este olhar irá conduzi-lo a um viés fundamentado
em seu repertório de mundo, o que implicará, no final deste andamento, num desfecho
político-ideológico, no sentido abrangente deste termo.
A problemática acerca destas questões quem envolvem tanto o repertório
do jornalista, como as heranças de sua influência na história, como também dos traços
conservadores que permeiam a conjuntura social brasileira, fica mais claro ao observar um
fato recente.
Há o medo enraizado na sociedade e reforçado pela mídia que o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) é o “mau”, composto de
desordeiros, “vagabundos” e demais adjetivos negativos, que invade terras produtivas de
pessoas justas e trabalhadoras, omitindo ao público receptor dessa mensagem a questão
essencial que envolve essa problemática, a Reforma Agrária. A mídia neste fato, como
explora Bernardo Kucinski,

“opera principalmente reforçando crenças previamente existentes. Um


exemplo menor mas típico desse processo foi a tentativa do governo
Fernando Henrique Cardoso, em 1997, de fazer dos esporádicos atos de
violência dos sem-terra o tema central da agenda de discussão”.36

36
KUCINSKI Bernardo. A síndrome da antena parabólica; ética no jornalismo brasileiro, p. 23.
15

O governo, então, desvia da questão central que é a necessidade de se


realizar a reforma agrária, utilizando o expediente de explorar “sentimentos latentes contra
a violência”.37
A mídia conservadora aproveita do enraizamento cultural, sem nenhum
compromisso com a complexidade das situações e conjunturas, para lançar novas idéias
com fins privados ou mesmo reforçar as já impostas também como finalidade de apoiar as
perspectivas e as projeções da elite brasileira.
René Dreifuss38 esclarece que a mesma elite que influencia as idéias
postas na mídia e transfere ao leitor a opinião ideológica da mesma é agregada ao poder
estatal. Pois, segundo Dreifuss, o Estado é uma mera simbologia em que a elite o domina e
o faz, no sentido de guiá-lo como um instrumento produtor de conceitos elitistas
conservadores. Nesse contexto a mídia, na maioria das vezes, segue complacente ao quê a
elite impõe.
Portanto o público acaba consumindo a discussão que o meio de
comunicação oferece, muitos momentos se comportando como acrítico diante do que lhe é
apresentado e ainda pode incorporar comportamentos ou simplesmente aceitar atribuições
de algo que é uma simulação do real, deixando de contemplar as dimensões da
complexidade do fato.39
Fica visível a centralização da ideologia no lapidamento midiático, o qual
ao utilizar se de sua estratégia propagandista baseada nos anseios da elite conservadora
depõe a favor da permanência, cada vez mais cíclica, do conceito autoritário de “anti-
cidadão”.
Contudo, a mídia é o expoente fomentador da doença crônica no Brasil
chamada ideologia elitista, que não abre espaço para a pluralidade democrática que seu
adjetivo carrega. Entretanto para não unilateralizar o campo jornalístico como um padrão,
há o contraponto, a existência de jornalistas que produzem seguindo a relevância do
interesse público, os quais têm como um dos meios, suas sensibilidades particularizadas,
exercendo o jornalismo como papel social.

37
Ibid., p. 24.
38
DREIFUSS René. O jogo da direita
39
Ibid.
16

BIBLIOGRAFIA

BUCCI, Eugênio. Sobre Ética e Imprensa. São Paulo: Schwarcz, 2000.


COTRIM, Gilberto. História do Brasil. Um olhar crítico. São Paulo: Saraiva, 1999.
DREIFUSS, René. O jogo da Direita. Petrópolis – RJ: Vozes, 1989.
DREIFUSS, René. 1964: A conquista do Estado. Ação política, Poder e Golpe de Classe.
Petrópolis- RJ: Vozes, 1981.
GASPARI, Elio. A ditadura envergonhada; as ilusões armadas. São Paulo-SP: Companhia
das letras, 2002.
HERMAN. E; CHOMSKY, Noam; tradução Bazán tecnologia e Lingüística. A
Manipulação do Público. São Paulo: Editora Futura, 2003.
KUCINSKI, Bernardo. A Síndrome da Antena Parabólica – ética no jornalismo brasileiro.
São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 1998.
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