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A busca pela geometrização da matéria

Por Adílio Jorge Marques em 09/03/2011

Os gregos antigos, em contraposição a outras


culturas, fizeram uma notável descoberta: a natureza obedece a leis universais e eternas,
que podem ser investigadas pelos homens. Assim, uma pedra cai não porque uma
divindade o ordena ou deseja, mas sim porque existe uma lei natural da qual depende o
comportamento da pedra, e à qual os próprios deuses estão sujeitos. Esta descoberta foi
uma ruptura notável com os padrões de pensamento vigentes nas outras civilizações da
antiguidade, e introduziu uma nova forma de pensar o mundo. Mesmo que as leis do
movimento expressas pelos filósofos gregos se tenham mostrado equivocadas, a
descoberta da regularidade da natureza e da possibilidade de que os homens possam
penetrar seus segredos foram descobertas monumentais, cuja importância, num mundo
como o de hoje, em que isso é considerado corriqueiro, nunca é demais enfatizar.

Dentre as muitas cogitações dos gregos sobre o mundo natural, uma das mais
importantes foi aquela da constituição da matéria, sobre a qual inúmeros filósofos
tiveram algo a dizer, muitos dos quais com profundas implicações sobre a ciência de
nosso tempo. Talvez o mais profundo deles tenha sido Platão de Atenas (428-347 a.C.).
O filósofo grego buscava estabelecer uma cosmologia que partia da distinção entre dois
mundos: o mundo mutável do devir (baseado no vir-a-ser), e as formas que existiriam
de maneira eterna. Reconheceu a mudança constante do mundo sensível em oposição ao
Mundo das Idéias, este estabelecido na permanência e na estabilidade.

Em sua teoria sobre a constituição da matéria, formulada na obra “Timeu” (ou


“Diálogo sobre a natureza”), Platão utilizou os quatro elementos propostos antes por
Empédocles de Agrigento (495-435 a.C.). São eles, a saber: terra, água, ar e fogo.
Depois, os associou a sólidos geométricos constituídos por faces de polígonos regulares.
Quatro desses sólidos têm faces triangulares ou derivadas de triângulos. De faces
triangulares são o tetraedro, o octaedro e o icosaedro.

O elemento fogo corresponde ao tetraedro, correlacionado à forma da chama; o ar ao


octaedro, com a possibilidade do movimento ascendente e descendente; a água,
moldável e fluida, corresponde ao icosaedro. E a terra, com sua noção de solidez e
estabilidade, se relacionou ao sólido de faces quadradas, o cubo, cujas faces, por sua
vez, podem ser consideradas como a justaposição de dois triângulos retângulos.

Havia um quinto sólido platônico, o dodecaedro, com doze faces pentagonais. Ligava-se
à quintessência, ou elemento celeste(1 e 2). A razão de só existirem cinco poliedros
regulares pode ser vista em várias obras de geometria(3), e esta limitação leva à
chamada Fórmula de Euler(4):

Os cinco sólidos platônicos estão mostrados na Figura 1 abaixo.

Há uma interessante relação geométrica dual entre os poliedros propostos por Platão, e
a que pode ser verificada na substituição de faces por vértices e de vértices por faces
(como na Tabela 1). Por exemplo, as 12 faces e os 20 vértices do dodecaedro são
transformados nas 20 faces e 12 vértices do icosaedro. O mesmo pode ser verificado nos
outros casos, com exceção do tetraedro, poliedro no qual faces e vértices se mostram de
mesmo número (quatro).

A tentativa de estabelecer uma correspondência entre a forma, as propriedades e a


estrutura da matéria persistiu ao longo do tempo, a partir da premissa de que na natureza
as formas complexas se originam de entidades simples (mesmo princípio da ideia de
átomos e moléculas). Esta questão está relacionada à busca pela ordem imanente na
natureza, na qual o caos aparente das formas macroscópicas na verdade encobre o
cosmos, ou organização, existente em micro-escala. É proposital o uso dessas duas
palavras de origem grega, que são antônimas em sua acepção de origem.
Os estudos de simetria se mostraram cruciais na ciência moderna, começando com uma
visão macroscópica desde o estabelecimento da nova mineralogia na virada do século
XIX. Aqueles estudos ganharam muita força após o estabelecimento da teoria do
carbono tetraédrico por Jacobus Van’t Hoff e Achille Le Bel(6).

As propostas sobre a simetria surgiram no mundo antigo também em relação ao estudo


da harmonia desse mesmo mundo. Modernamente, a teoria de simetria surge na
Química e na Álgebra, neste último caso depois do desenvolvimento da teoria dos
grupos. Diz-se que um objeto é simétrico se consiste de partes iguais física e
geometricamente, apropriadamente dispostas, umas em ralação às outras. Um exemplo
físico da simetria na natureza são os cristais que se agrupam seguindo as sempre
mesmas arrumações em suas moléculas. Ao longo do recente século XX, a
espectroscopia e a cristalografia por difração de raios X consagraram definitivamente o
papel fundamental dessa simetria no entendimento da constituição da matéria. Nos
estudos de espectroscopia os cinco sólidos platônicos também podem ser descritos
como pertencentes a grupos químicos, por exemplo. Contudo, durante a maior parte do
século XX, a preocupação primordial dos investigadores da estrutura dos materiais foi,
sobretudo, a geometria de moléculas individuais. Ultimamente, inclusive, os estudos se
ampliaram consideravelmente no sentido de que, para se conhecer a estrutura de uma
substância molecular é necessário estudar não só a estrutura da molécula individual,
mas também aquela do conjunto das moléculas que formam a rede cristalina do sólido.

Esta geometrização mais ampla, com todas as suas conseqüências, faz-nos refletir sobre
a profundidade da intuição platônica ao querer descobrir os segredos da estrutura íntima
da matéria a partir da geometria. A abordagem atual leva-nos a considerar todo o
retículo cristalino de um sólido molecular e das celas vizinhas, da mesma maneira como
há muito se procede com os sólidos iônicos, covalentes e metálicos. Em outras palavras,
o conhecimento da estrutura de uma molécula é importante, mas está longe de ser
suficiente para descrever o sólido formado por aquelas moléculas. Quando se estudam
os sólidos iônicos, covalentes e metálicos, isto é, aqueles em que os átomos ou
partículas estão unidos uns aos outros por forças iguais, obtêm-se em geral estruturas
para os conjuntos de partículas que se repetem, correspondendo frequentemente aos
sólidos platônicos, ou a eles relacionados.

A descrição da estrutura de sólidos moleculares, contudo, teve um tratamento diverso.


Tradicionalmente se dava uma ênfase muito maior à estrutura da molécula, ficando a
estrutura do cristal, de que a molécula é o bloco fundamental, em segundo plano. Nos
últimos anos, todavia, percebeu-se que ambos os aspectos têm peso considerável no
entendimento dos sólidos moleculares. É necessário conhecer a estrutura da molécula
individual, mas também a maneira em que as várias moléculas se agrupam formando o
retículo cristalino do sólido. Isto é importante não só do ponto de vista estrutural, como
também para o entendimento das interações intermoleculares, cujo papel é crucial para
o conhecimento das propriedades das substâncias.
Ao fazer um estudo da estrutura cristalina dos sólidos moleculares, curiosamente
retornam com grande frequência aos sólidos platônicos, e outros deles derivados. Pode-
se dizer que essas estruturas possuem enorme importância para o estado sólido em
geral, qualquer que seja a forma de ligação entre os átomos que constituem o sólido.
Alguns exemplos são as estruturas de algumas espécies contendo carbono: o metano,
CH4; o tetraedrano, C4H4; o cubano, C8H8; e o fulereno, C60.

Platão, desta maneira, deu um passo a mais no atomismo antigo, introduzindo uma
descrição geométrica precisa dos átomos, descrevendo as mudanças por meio da
geometrização. Tal idéia foi, e permanece, muito importante, pois levou a maior
desenvolvimento do estudo e sistematização do pensamento científico ocidental,
originante das ciências atuais, como a Física e mesmo a Astronomia.

Notas:
1 - Plato, Timaeus and Critias, Penguin Classics, Londres: Penguin Books, 1977.
2 - Marques, A. J. Senra, A. V. D. Ciência em Platão: os sólidos geométricos e o
Timeu. Scientiarum Historia, Livro de Anais. Rio de Janeiro: UFRJ, 2008, p. 725-730.
3 - Huntley, H. E. The Divine Proportion. N. York: Dover, 1970, p. 31.
4 - Trinastic, N., Nikolic, S., Mihalic, Z., Bull. Chem. and Technol. Macedonia, v. 13,
1994, p. 61-68.
5 - Platão. Timeu e Crítias, ou A Atlântida. São Paulo: Ed. Hemus, 1990, p. 49.
6 - van´t Hoff, J. H. Stéréochimie. Nouvelle édition de dix années dans l’histoire d’une
théorie. Paris: Georges Carré Éditeur, 1892.

*Adílio Jorge Marques é professor de Física e História da Ciência da rede pública e


particular de ensino do Rio de Janeiro. Pesquisador em História da Ciência luso-
brasileira e história das Tradições.

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