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1 NITRINI, 1998, p. 19
Villemain, Jean-Jacques Ampère e Philarète Chasles. Este último define em sua aula inaugural o
que seria o comparativismo naquela época.
Deixe-nos avaliar a influência de pensamento sobre pensamento, a maneira pela qual povos
transformam-se mutuamente, o que cada um deles deu e o que cada um deles recebeu; deixe-
nos avaliar também o efeito deste perpétuo intercâmbio entre nacionalidades individuais (…)2
Pode-se perceber que a palavra que traduz a concepção comparativista do século XIX é
“influência”, havendo uma forte razão para sê-lo, uma vez que foi justamente nesse período que
muitos países europeus se firmaram como nações e buscavam identificar suas raízes culturais.
Com o alvo no estudo de fontes e influências, estabelecendo, portanto, filiações, isto é, uma
relação de paternidade entre obras literárias, ou desviando um pouco o foco de atenção para
vinculação dos estudos comparados com uma perspectiva histórica, a Literatura Comparada
seguiu através de inúmeras vozes como de Gustave Lanson e de Emile Fauguet até a década de
1930, quando entrou em cena Paul Van Tieghem.
Em 1931, ele publicou La littérature comparée, revelando sua tradição historicista nos
estudos comparados e estabelecendo a Literatura Comparada tanto como ramo da Literatura
Geral quanto da historiografia literária. Paul Van Tieghem tem como objeto o estudo das
diversas literaturas em suas relações entre si, como se ligam umas às outras na forma, no
conteúdo, no estilo. Criando uma tríade, ele estabeleceu diferenças entre Literatura Nacional,
Literatura Comparada e Literatura Geral.
Paul Van Tieghem foi o precursor da “escola francesa”, cuja metodologia baseia-se em
três elementos: o emissor (ponto de partida da passagem de influência), o receptor (ponto de
chegada) e o transmissor (intermediário entre o emissor e o receptor). Essa tendência mostrou-se
muito contextualista uma vez que sua preocupação primordial não é a estrutura interna do texto,
e sim o contexto que o envolve. Em Crítica Literária, História Literária, Literatura Comparada,
Van Tieghem revela a pertinência que tem o contexto, no caso o emissor, em uma análise
comparativista:
Aquela obra, aquele conjunto de obras que você leu com interesse, examinou e julgou, qual
foi a sua origem, o que as ocasionou, qual o seu destino, em resumo, sua história? Este
escritor que lhe agrada, como foi sua carreira, breve ou longa, brilhante ou obscura, abundante
em publicações ou marcada por um único livro que é uma obra-prima? Sob que influências se
formou, como se desenvolveu seu talento, que relações manteve com alguns de seus
contemporâneos dos quais você leu certas produções? 3
No início do século XX, o poeta francês Paul Valéry deu cara nova ao conceito de
influência literária, renovando as definições do comparativismo. Para ele, a dependência entre
autores se dá como fonte de originalidade e não como imitação, sendo uma “intrusão do novo na
criação”4. Valer-se-á diretamente de sua formulação sobre a influência para melhor compreendê-
la: “ocorre que a obra de um recebe no ser do outro um valor totalmente singular, engendrando
conseqüências atuantes, impossíveis de serem previstas e, com freqüência, impossíveis de serem
desvendadas”5.
Valéry explica a influência recorrendo à psicologia, uma vez que o método objetivo de
pesquisa de filiações e de causalidade por ele é abandonado, atribuindo ao conceito em questão
um caráter emocional. Suas idéias sobre originalidade também são muito interessantes, pois isso
se trata de assimilação, ou “caso de estômago”, segundo suas próprias palavras. A fronteira entre
originalidade e plágio pode ser estabelecia através de como se digeriu a influência exercida por
2 CHASLES apud NITRINI, 1998, p. 20
3 VAN TIEGHEM in CARVALHAL e COUTINHO, 1994, p. 90
4 NITRINI, 1998, p. 90
5 VALÉRY apud NITRINI, 1998, p. 132
outros, sendo definida a partir da ação de uma obra sobre o escritor que a ela está exposto.
Resumindo, a influência é um dos princípios fundamentais para a gênese de uma obra literária.
Na Inglaterra, T. S. Eliot também refletiu sobre os conceitos de influência e
originalidade, gerando seu ensaio “Tradição e talento individual” e introduzindo conceitos que
repercutiram nos estudos de Literatura Comparada. Segundo Eliot, tradição não é reprodução, e
sim uma representacão dialética que envolve um senso histórico que permeia pelo passado e
presente.
Nenhum poeta, nenhum artista, tem sua significação completa sozinho. Seu significado e a
apreciação que deles fazemos constituem a apreciação de sua relação com os poetas e os
artistas mortos. Não se pode estimá-lo em si; é preciso situá-lo, para contraste e comparação,
entre os mortos. Entendo isso como um princípio de estética, não apenas histórica, mas no
sentido crítico. É necessário que ele seja harmônico, coeso, e não unilateral6.
Originalidade seria, para este poeta, algo capaz de modificar a ordem existente, pois uma
obra inovadora possibilitaria uma visão distinta até mesmo das outras obras que a precederam,
renovando a tradição.
Também indo contra a concepção de influência e a superioridade da literatura de países
da Europa Ocidental que esse vocábulo denotava, René Etimble critica a postura chauvinista e
nacionalista da Literatura Comparada estabelecida pela “escola francesa”, inclinando-se para as
idéias de René Wellek, que tem outra concepção de comparativismo como ver-se-á no próximo
item. Etimble defende uma tendência anti-historicista e propõe que dois métodos
tradicionalmente incompatíveis _ a investigação histórica e a reflexão crítica _ sejam
combinados a fim de desenvolver uma poética comparada. Sua grande contribuição está na
crítica que faz da hegemonia de países como França e Inglaterra, garantindo igual importância às
“pequenas literaturas”, como a asiática, pois, para esse estudioso francês, qualquer literatura
pode influenciar ou ser influenciada.
A partir da década de 1960, estudiosos do Leste Europeu ganharam voz e passaram a
propagar suas idéias acerca da Literatura Comparada. Surge então Victor M. Zhirmunsky, que
passou a considerar fatos literários independentemente de sua gênese e de seu contexto histórico,
encarando a literatura a partir de um sistema de analogias tipológicas, ou importações culturais,
que nada mais eram que outra forma de designar influência.
Este item se encerra com uma breve alusão à teoria da intertextualidade formulada por
Julia Kristeva em cima da teoria do dialogismo concebida pelo formalista russo Bakhtin e à
Estética da Recepção, dos alemães Iser e Jauss. A pertinência desses estudiosos se dá pelo fato
de que, a partir de suas concepções, os conceitos de fonte, influência e originalidade se
renovaram.
Bakhtin se preocupa com a idéia de que o texto literário não possui apenas uma voz. Na
verdade, o texto é atravessado por diversas vozes, tanto direta quanto indiretamente, o que gera
pontos de vista diferentes. A partir dessa idéia, Julia Kristeva cunha o termo intertextualidade,
que seria o dialogismo aplicado em relação a textos diferentes. Aqui, a palavra-chave passa de
influência para referência, uma vez que todo texto faz referências literárias e tem uma matriz que
o precede. Portanto, usando as palavras de Kristeva, todo texto é um “mosaico de citações”, isto
é, “o texto literário é uma rede de conexões” 7. A importância da intertextualiade para a
Literatura Comparada encontra-se na questão que o intertexto é inerente à obra e não um
processo genético.
6 ELIOT, 1989, p. 39
7 NITRINI, 1998, p. 162
A estética da recepção também é uma teoria literária absorvida pelos comparatistas. Nos
anos 60, Wolfgang Iser e Robert Jauss restituíram ao leitor individuale coletivo, seu papel ativo
em um texto literário. Contribuindo para a renovação dos estudos de influência
com seu objetivo de substituir a historiografia literária substancialista, fundada no estudo da
obra e do autor, por uma historiografia voltada para o leitor, a estética da recepção abre
perspectivas para que a influência já não se explique mais causal e geneticamente de obra a
obra, de autor a autor, de nação a nação, mas como resultado complexo da recepção8.
O continente europeu foi o berço da Literatura Comparada, sendo também cenário para
sua evolução. Por toda sua extensão, verificaram-se tentativas de defini-la, compreendê-la e
estruturá-la. O continente americano também foi sede para importantes lutas para a definição de
uma crítica comparatista. Portanto, nos próximos itens, observar-se-á a repercussão e os
desdobramentos da Literatura Comparada nos Estados Unidos, assim como na América Latina.
3. A Literatura Comparada nos Estados Unidos
O 2º Congresso da Associação Internacional de Literatura Comparada, realizado em
Chapel Hill, em 1958, colocou em xeque a hegemonia francesa nos estudos comparatistas e foi
um marco da ascensão dos Estados Unidos nesse campo.
Uma das pronunciações mais importantes, feita contra a chamada “escola francesa”, foi a
do tcheco radicado nos EUA, René Wellek, segundo o qual os antigos mestres como Van
Tighem falharam por não estabelecer um objeto de estudo e uma metodologia específicos e por
ficar preso a um factualismo, a um cientificismo e a um relativismo histórico do século XIX.
Wellek também critica a tentativa de Van Tieghem de distinguir a Literatura Comparada da
Literatura Geral, pois
a literatura “comparada” restringe-se ao estudo das inter-relações entre duas literaturas,
enquanto a literatura “geral” se preocupa com os movimentos e estilos que abrangem várias
literaturas. Esta distinção, sem dúvida, é insustentável e impraticável. (…) Por que
deveríamos distinguir um estudo sobre a influência de Byron em Heine de um estudo do
byronismo na Alemanha? A tentativa de restringir a “literatura comparada” a um estudo de
“comércio exterior” entre literaturas é certamente infeliz. A literatura comparada seria, em seu
objeto de estudo, um conjunto incoerente de fragmentos não relacionados: uma rede de
relações constantemente interrompidas e separadas dos conjuntos significativos. O
comparatista qua comparatista, neste sentido limitado, só poderia estudar fontes e influências,
causas e efeitos, e seria impedido, até mesmo, de investigar uma única obra de arte em sua
totalidade, uma vez que nenhuma obra pode ser inteiramente reduzida a influências externas
ou considerada um ponto irradiador de influência sobre países estrangeiros apenas9.
Pode-se perceber que Wellek censura o estudo de fonte e influência, propondo uma
análise centrada no texto, sem deixar de lado a relação entre texto e contexto, segundo ele um
complemento fundamental. Influenciado pelo Formalismo Russo, pela Fenomenologia e pelo
New Cristicism, nota-se que ele não se apóia somente na postura imanentista dessas correntes,
buscando um equilíbrio entre a análise crítica do texto, o que a ele está intrínseco, e o elemento
histórico, o qual, de maneira alguma, pode prescindir aquele.
Henry H. H. Remak também contribuiu muito para a Literatura Comparada, definindo o
que seria a “escola americana”. O conceito que propôs, frisando uma variedade de abordagem e
interdiscilpinaridade, não ajudou a estabelecer uma metodologia. No entanto, ele soube definir o
objeto de trabalho, ampliando a definição de Literatura Comparada feita pela tradição francesa e
frontalmente opondo-se a ela.
Remak passou a considerar, além do estudo comparado entre obras literárias, o estudo
das relações entre literatura e outras artes, como, por exemplo, a pintura, a filosofia e a história.
8 Ibidem, p. 181
9 WELLEK in CARVALHAL e COUTINHO, 1994, p. 109
O que também cria um confronto entre os americanos e os franceses é a abolição de métodos
rigorosamente históricos no novo continente e a admissão de estudos comparativos entre autores
de uma mesma literatura nacional.
Apesar da origem espanhola, Claudio Guillén pode ser inserido no contexto norte-
americano por ter atuado por muito tempo em universidades dos Estados Unidos. Ele contribuiu
para a ampliação universal nos estudos comparatistas, estendendo seu foco de atenção a obras de
diferentes procedências. Deslocando o significado de influência para uma perspectiva estética,
Guillén conectou esse vocábulo ao processo criativo de composição, banindo sua concepção
tradicional. A metodologia que o estudioso espanhol propõe critica a idéia de “transmissão” e
mostra uma necessidade de comprovação de influência.
O método comparativo é insuficiente. A questão de possível influência de A sobre B não pode
ser resolvida por uma simples comparação entre A e B. Cada estudo de influência é
inicialmente um estudo da gênese de uma obra de arte e deve ser baseado no conhecimento e
na interpretação dos componentes desta gênese.
Estabelecer uma influência é fazer um juízo de valor, não é medir um fato. O crítico é
obrigado a avaliar a função ou abrangência do efeito de A na formação de B, porque não
estará fazendo uma lista da soma total desses efeitos,que são inúmeros;estará ordenando-os10.
O crítico literário Harold Bloom exerceu e ainda exerce um papel importante nos estudos
de Literatura Comparada, principalmente pelo que postulou em seu livro The Anxiety of
Influence. O defensor do cânone universal procurou desmistificar o processo pelo qual um poeta
ajuda a formar outro poeta e delineou uma teoria para uma crítica literária. Há duas palavras-
chave para seu postulado: “poeta forte” e “desleitura”, pois “os grandes poetas fizeram história
deslendo outros, de maneira a criar espaço imaginativo para si próprios”11. Através de uma
interpretação psicologizante, Bloom caracteriza o processo de desleitura, o qual envolve várias
modalidades de apropriação, fazendo uso de seis termos clássicos: clinamen, que corresponde à
desleitura, a partir da qual o poeta desvia-se de seu precursor; tessera, o processo através do qual
o poeta completa o poema que o antecede, conservando seus termos, mas alterando seu
significado; kenosis, isto é, marca de ruptura com o “poema-pai”, gerando seu esvaziamento;
demonization, que significa uma abertura a algo que subjaz no poema antecedente; askesis, uma
mutilação do “poema-pai” através do poeta que o esvazia, sendo uma forma de purgação;
apophrades, correspondente a um retorno ao ponto inicial, pois “os poetas mortos voltam, mas
voltam com as cores e as vozes dos poetas posteriores”12.
A proposta de Harold Bloom se estabelece apenas na relação entre grandes poetas,
partindo do pressuposto de que tal relação seja fruto somente de influências poéticas. Em busca
do poeta no poeta, Bloom não considera os aspectos formais em uma obra para fazer um estudo
comparativo, contrapondo-se à teoria da intertextualidade proposta por Kristeva, que enfatiza o
texto. Para Cláudio Guillén, até certo ponto um entusiasta da teoria de Kristeva, Bloom peca do
mesmo modo que os comparatistas tradicionais ao cair em um biografismo que psicologiza a
intertextualidade, criando relações psíquicas entre escritores.
Nos últimos anos, em confronto direto com Harold Bloom, os estudos culturais foram
adicionados à Literatura Comparada, tornando o campo de estudo em questão interdisciplinar, ou
seja, comum tanto ao comparativismo quanto ao multiculturalismo. No entanto, é importante
frisar que a Literatura Comparada atual nada se assemelha às mais antigas propostas de
comparativismo. Hoje, seu objeto de estudo foi ampliado, não sendo mais o mero confronto de