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O mundo partido em imagens

Para Jameson (1996), marxista norte-americano proveniente da crítica literária nas


universidades de Yale e Duke, pós-modernismo e "capitalismo da mídia" são
sinônimos. A transformação de objetos de todo tipo em mercadorias (sejam estrelas de
cinema, automóveis, sentimentos ou experiência política) enseja vidas dedicadas ao
consumo e desejos suscitados e inculcados pelos meios de comunicação de massa. Suas
variadas formas podem ser a compra de sofisticação comportamental, os muitos milhões
de dólares movimentados na curta vida musical das Spice Girls, o heroin-look das top-
models internacionais, a tentativa de transformar Fábio Junior (não o cantor e ator, mas
o jovem centroavante do Cruzeiro de Belo Horizonte recentemente vendido ao Roma
por 15 milhões de dólares) num clone de Ronaldinho, ou o jeito ‘livre’ de jovens que se
divertem a bordo de uma caminhonete Cherokee último tipo. Sem esquecer também a
maternidade midiática de Xuxa. Parece o velho e podre capitalismo com roupa nova,
mas não é.
A sociedade da imagem e a indispensável onipresença da mídia é o ambiente em que
se processa uma nova expansão do capitalismo. Segundo Jameson, assim como a
industrialização e a urbanização mudaram o ritmo e as feições da vida no século XIX, as
linguagens midiáticas alteraram decisivamente os modos de vida atuais. A cultura
baseada na imagem, dispondo de meios como a televisão, os computadores, a
publicidade etc., suplantou a cultura literária anteriormente predominante. O que se vê é
a "estetização da realidade" (expressão que Jameson toma emprestado de Walter
Benjamin) em que a arte se mistura indissoluvelmente à compra e venda de produtos
através da criação de narrativas que favorecem investimentos imaginários e libidinais
dos consumidores em torno das mercadorias. Nas palavras de Guy Debord (1997),
proferidas há trinta anos, "a imagem é a forma final da reificação" ou derradeira
realização do capital, fundamento da sociedade da imagem ou do espetáculo. A
estetização da realidade promove a colonização do inconsciente e da natureza pelo
mercado, processo indissociado do pós-modernismo considerado por Jameson a lógica
cultural do capitalismo tardio. Enquanto o modernismo e suas vanguardas exprimiam a
ambigüidade da exaltação da novidade permanente e do desconforto com relação ao
mundo das mercadorias, o pós-modernismo revela uma nova dinâmica da sociedade:

O que "tardio" geralmente transmite é mais um sentido de que as coisas são diferentes,
que passamos por uma transformação de vida que é de algum modo decisiva, ainda que
incomparável com as mudanças mais antigas da modernização e da industrialização,
menos perceptíveis e menos dramáticas porém mais permanentes, precisamente por
serem mais abrangentes e difusas.
Isso significa que a expressão capitalismo tardio traz embutida também a outra metade,
a cultural, de meu título; essa expressão é não só uma tradução quase literal da outra
expressão, pós-modernismo, mas também seu índice temporal parece já chamar a
atenção para mudanças nas esferas do cotidiano e da cultura. Dizer que meus dois
termos, o cultural e o econômico, se fundem desse modo um no outro e significam a
mesma coisa, eclipsando a distinção entre base e superestrutura, o que em si mesmo
sempre pareceu a muitos ser uma característica significativa do pós-moderno, é o
mesmo que sugerir que a base, no terceiro estágio do capitalismo, gera a sua
superestrutura, através de um novo tipo de dinâmica (Jameson, op. cit., pp. 24, 25).

As transformações no sistema, que se estendem à cultura e ao cotidiano, são


mudanças no âmbito do próprio modo de produção. O imaginário, as pulsões da
intimidade, as maneiras de ser e os sentimentos foram incorporados ao universo das
mercadorias através de narrativas estéticas e da cultura. A utilização dos termos "fusão"
e "eclipse" para tratar da relação entre a base e as superestruturas busca ressaltar que,
mesmo que não tenham sido quebradas as relações sociais que constituíram o
capitalismo e a modernidade, a cultura atual faz mover o capitalismo segundo padrões
não observados anteriormente na história. A dilatação da esfera da mercadoria, na qual a
mídia é imprescindível, evidencia uma "desdiferenciação" (o termo é de Jameson) entre
a economia e a cultura que acompanha o pós-modernismo enquanto atmosfera cultural
do capitalismo tardio. Ou ainda, segundo outra expressão utilizada por Jameson, uma
"revolução cultural" no próprio modo de produção.
O fluxo ininterrupto de imagens está em todo lugar e os enredos dos meios de
comunicação de massa produzem um "real" (ou hiper-real) que substitui a vida pelo que
ocorre a partir dos monitores. Em A rosa púrpura do Cairo, de Woody Allen,
personagens entram e saem da tela na busca louca de satisfação de seus desejos de
romance. O "filme" da sociedade contemporânea talvez seja ainda mais fantasioso.
Jameson (assim como Debord, Baudrillard e outros) sugere que as multidões entraram
na tela e de lá não mais saíram. Nessa mesma linha de reflexão, Umberto Eco salienta, a
propósito da Disneylândia, que o "Falso Absoluto" lá canonizado é uma metáfora de
toda a América, cheia de cidades que imitam cidades.
Uma publicidade recente de um aparelho de televisão de tela plana mostra uma cena
em que, pela absoluta indistinção entre imagem e realidade, animais da selva africana
entram dentro do monitor e lá são aprisionados pelos componentes de uma tribo através
do controle remoto. Ao final, vê-se o televisor suspenso numa vara apoiada nos ombros
de seus ‘caçadores’, como estes habitualmente carregam suas presas. Em outro
exemplo, no enredo do filme publicitário do mesmo produto de uma firma concorrente,
vê-se pela janela do interior de uma casa um trem aproximando-se em alta velocidade
enquanto uma mulher arruma a sala ajudada por sua filhinha. No momento
imediatamente anterior ao choque do trem com a casa, a moça desliga o ‘monitor-
janela’ e rende o espectador à indistinção entre a imagem e o real pela ‘perfeição’
tecnológica. Essas peças publicitárias são extremamente expressivas dos mecanismos
vigentes na sociedade do espetáculo. A cultura pós-moderna, segundo Jameson,
interfere profundamente na cognição e na constituição da subjetividade: produz-se
assim "tipos de pessoas" que incorporam em seu cotidiano a substituição da realidade
pelo espetáculo. Fábulas e oferendas midiáticas como essas compõem a colonização do
inconsciente. Teleassistir passivamente é preciso, viver não é preciso.
Jameson (op. cit., p. 18) remonta à Ética protestante e o espírito do capitalismo, de
Max Weber, para dar conta das reestruturações sistêmicas do capitalismo tardio e da
importância do pós-modernismo na adaptação de indivíduos à "hiper-realidade":

A tarefa ideológica do novo conceito, entretanto, deve continuar a ser a de coordenar as


novas formas de prática e de hábitos sociais e mentais (penso que é isso, em última
análise, que Williams queria dizer com a noção de "estrutura de sentimento") e as novas
formas de organização e de produção econômica que vêm com a modificação do
capitalismo — a nova divisão global do trabalho — nos últimos anos... Mas, assim
como (para Weber) os novos valores religiosos mais ascéticos e dirigidos à vida interior
acabaram por produzir um "povo novo", capaz de florescer em meio à gratificação
retardada característica do processo moderno de trabalho que surgia então, assim
também o "pós-moderno" deve ser visto como a produção de pessoas pós-modernas,
capazes de funcionar em um mundo sócio-econômico muito peculiar, um mundo cujas
estruturas, características e demandas objetivas — se dispuséssemos de uma exposição
adequada delas — constituiriam a situação para a qual o "pós-modernismo" é a resposta
e nos dariam algo mais decisivo do que uma mera teoria do pós-modernismo.
A sublimação, a gratificação retardada ou o ascetismo propagado na ética protestante
eram componentes subjetivos indispensáveis à acumulação primitiva de capital. Os
indivíduos que levaram o capitalismo adiante, com a abnegação e as barbaridades que
foram capazes de cometer, eram dotados de uma dada constituição subjetiva
impregnada de uma ética (protestante) que os habilitava ao trabalho árduo e ao
adiamento permanente do prazer em uma agregação de vidinhas que produziu uma
gigantesca guinada histórica. Para os tempos atuais, Jameson sugere que o pós-
modernismo impele à constituição de uma nova subjetividade em sentido análogo
àquele observado para a acumulação primitiva de capital. O "povo novo" da pós-
modernidade é aquele que se ambienta no mundo das imagens, do simulacro, do falso
absoluto e do ilusório, devidamente colonizado em seus hábitos, fantasias e aspirações.
Pode ser uma gente que está à vontade se não viver, se estiver destinada apenas a
assistir, consumir, adorar e se projetar em relatos suspeitos da vida dos notáveis. Em
suma, mentes invadidas por imagens e que prescindem da experiência. É claro que
ninguém é assim permanentemente nem o sistema é uma rocha granítica sem fissuras ou
eclosões, mas se está diante de uma poderosa configuração institucional de
conseqüências bastante perversas. É possível que muitos não sintam um terrível mal-
estar nessas circunstâncias, mas o diagnóstico da "estrutura de sentimentos" daí
proveniente é o pior possível: fragmentação do sujeito. Um pouco mais da condição
subjetiva na sociedade da imagem ou do espetáculo quando se vê televisão:

Pois parece-me plausível que, em uma situação de fluxo total, o conteúdo da tela
passando diante de nós o dia inteiro, sem interrupção (ou cujas interrupções —
chamadas de comerciais — são menos intervalos do que oportunidades fortuitas para ir
ao banheiro ou para fazer um sanduíche), o que se costuma chamar de distância crítica
parece se tornar obsoleto. Desligar a televisão tem muito pouco a ver com o intervalo
de uma peça de teatro ou de uma ópera, ou com o grand finale de um filme de cinema,
as luzes se acendendo lentamente e a memória começando o seu trabalho misterioso.
De fato, se alguma distância crítica ainda é possível, ela está certamente ligada ao
trabalho da memória. Mas esta parece não desempenhar nenhum papel na televisão,
seja ela comercial ou não (ou, sinto-me tentado a dizer, no próprio pós-modernismo em
geral): nada aqui nos assombra a mente e nos faz conservar imagens como nos grandes
momentos do cinema (os quais, é claro, não ocorrem necessariamente nos "grandes
filmes") (op. cit., p. 94).

A linguagem ou a estética televisivas favorecem o cancelamento da memória e da


distância crítica, com danos à subjetividade que não são pequenos. Bourdieu (1997)
mostra como essa linguagem torna o mundo indiferenciado e seus procedimentos
interrompem os discursos em nome do "tempo da televisão", a cronometragem
estipulada em nome do "interesse" e da "curiosidade" do espectador. Em uma
interpretação sumária mas esclarecedora desse registro midiático, Bourdieu ressalta que
a televisão fala o tempo todo de si mesma através de imagens tomadas do mundo.
Nenhuma argumentação se aprofunda, nenhum trabalho da memória é assim reativado,
abrevia-se o sentimento e a reflexão. Quando um anúncio de sabão em pó segue as
imagens do massacre de milhares de pessoas em Ruanda o mundo torna-se
indistinguível. Nessa profusão de cancelamentos, Bourdieu está interessado em discutir
as semelhanças entre o fast thinking televisivo com o fast food das lanchonetes globais,
enquanto Jameson, em interpretação diversa, vê aí um sintoma fundamental da cultura
pós-moderna que coloniza o inconsciente e promove a fragmentação do espectador.
Bourdieu cita Jean-Luc Godard, Jameson cita Lacan.
Jameson aponta na televisão e nos vídeo-clipes a analogia de linguagem mais
evidente com a condição pós-moderna. As imagens aí se encadeiam através da rotação
incessante dos elementos em que tudo é desalojado no momento seguinte, "puro jogo
aleatório dos significantes" — na expressão de Iná Camargo Costa — que é sintoma
desse Zeitgeist (a coerência de um tempo) onde se observa o desmonte das grandes
narrativas e a suspensão da historicidade nas representações que saturam os meios de
comunicação. Essa linguagem composta de uma série de puros presentes remonta à
ruptura na cadeia dos significantes que, segundo Lacan, cerca a condição do
esquizofrênico, onde a incapacidade de unificar passado, presente e futuro da sentença
remete à incapacidade de associar passado, presente e futuro da vida psíquica. Segundo
Jameson, a alienação do sujeito desloca-se para a sua fragmentação e as psicopatologias
do ego de tempos burgueses industriais dão lugar a distúrbios mentais associados à
autodestruição, às drogas e à esquizofrenia. O "eterno presente" tem um custo enorme e
assim o "povo novo" da sociedade da imagem padece de outras dores, algumas mais
assustadoras do que as dos histéricos e neuróticos analisados por Freud. O mundo do
simulacro desvanece o estilo, enquanto sentido do único e da pincelada individual
distinta; se o referente vivido desapareceu, substituído pelas narrativas fragmentadas de
uma cultura eminentemente visual, a singularidade se constitui no emaranhado das
emanações midiáticas que desfazem trajetos historicamente encadeados.
Assim, segundo a vertente que trata o mundo social atual como sociedade da
imagem, a fragmentação das linguagens, do sujeito e a ausência de historicidade
acompanham a revolução tecnológica, a informatização e a nova divisão internacional
do trabalho a que se dá a designação genérica de pós-modernidade. É uma visão atenta à
espiral do ilusório, às vertigens da estetização da realidade e à mercantilização intensiva
de dimensões da existência anteriormente preservadas desse ataque/circunstância. Mais
uma vez, como tantas vezes ocorreu na história, não há volta. Trata-se de devassar esse
mundo e resgatar forças aparentemente à deriva que podem aproximar os homens de si
mesmos e habilitar o "povo novo" a transitar no espetáculo sem perder a alma, ou,
ainda, de desmontar a ‘nitidez’ da imagem através dos chuviscos e fantasmas do vivido.

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