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Neuroética

Era uma vez, há muito muito tempo (como tantas vezes O Contexto Social
começam os contos de fada), havia uma distinção marcada
entre ciência e tecnologia. Os cientistas procuravam Só muito raramente a investigação em neurociências está
desenfreadamente chegar à verdade, sem estarem certos divorciada da realidade social. No século XVII, Descartes
das conclusões a que chegariam, sem outra recompensa usou uma metáfora hidráulica para explicar como os
além do “enorme prazer da descoberta”. Os engenheiros e “humores” cerebrais movimentavam os músculos – uma ideia
os tecnólogos aplicavam os frutos da descoberta científica que ele imitou dos sistemas de engenharia usados para
para modificar o mundo. No entanto, esta visão pode movimentação da água nos jardins do “Chateaux de France”.
parecer enganadora, é e sempre foi um conto de fadas. Nos Por volta do século XX, de acordo com o espírito da Era
nossos dias, os cientistas estão mais alerta do que nunca ao Indústrial, os neurofisiologistas descreviam a rede intrincada
contexto social em que trabalham, e como esse contexto do cérebro como “um tear encantado” ou mais tarde como
pode afectar o seu objecto de estudo. uma “caixa de distribuição telefónica gigante”. Agora, no
início do século XXI, abundam as comparações
As questões relativas ao impacto da neurociência na sociedade computacionais - tais como a curiosa comparação do “córtex
pertencem ao domínio geral da neuroética – a intersecção cerebral a uma rede de internet privada”. Estas comparações
entre a neurociência, a filosofia e a ética. Este domínio do não são mais do que simplificações para nos ajudar a
saber inclui o estudo das implicações que têm as descobertas compreender ideias muito complexas, mas também
sobre o cérebro na interpretação de nós próprios como seres constituem conceitos que são construídos sobre teorias
humanos (incluindo as bases neurais da moral). Debruça-se cerebrais sofisticadas.
sobre as implicações da descoberta para políticas sociais (tais
Os neurocientistas podem encarar os problemas científicos
como o potencial educacional das crianças) e como a própria
em divórcio com o mundo real. Muitas vezes escapam para
investigação é conduzida (a ética da experimentação animal,
um mundo abstracto e utilizam uma linguagem muito própria
ou a decepção do insucesso). Também se preocupa com as
e incompreensível. Um mundo muito próximo de uma
parcerias entre os neurocientistas e o público, e com a troca de
realidade em sistema monástico. Como é que funcionam os
ideias sobre aquilo que os cientistas fazem e o que deveriam
mecanismos das correntes iónicas na propagação dos
fazer.
potenciais de acção? Como se libertam e como actuam os
mensageiros químicos? Ou como é que o disparo das células
do córtex visual representa aspectos do mundo visual? Estes
são alguns dos muitos problemas, em neurociências, que
podem ser colocados de um modo isolado mas
compreensível.
No entanto, o mundo real nunca está muito distante. Assim que
compreendermos como os transmissores químicos funcionam,
é natural imaginarmos “fármacos inteligentes” que nos
ajudem a memorizar e recordar melhor. Outros poderão pensar
em inventar neurotoxinas (agentes que afectam os nervos) que
impedem este processo crítico para a vida - incluindo
inibidores enzimáticos que estão a um passo de distância dos
agentes utilizáveis em guerra biológica.

Se um fármaco que nos ajudasse a passar em exames


estivesse disponível, iria tomá-lo? Existe alguma diferença
entre estas acções e o consumo de esteróides por atletas para
aumentar o seu rendimento? E que tal as pessoas que tomam
antidepressivos?
“PENSAR ACERCA DO CÉREBRO TOCA-NOS A
TODOS, É LITERALMENTE UM ASSUNTO DA Para o futuro da imagiologia cerebral levantam-se outros
dilemas éticos bastante sérios. Por exemplo, técnicas de
CABEÇA”
imagiologia cerebral, em conjunto com testes apropriados de
Zach Hall, Universidade da Califórnia desempenho, poderão vir a permitir a distinção entre o que é
informação real de memórias, daquilo que é informação falsa.

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Por enquanto a variabilidade nas respostas é demasiado grande, os familiares poderão não estar em estado de espírito capaz de
mas um dia os tribunais poderão ter sistemas de imagiologia assumir a responsabilidade de assinar o consentimento, no período
cerebral à sua disposição – uma espécie de “marcadores em que é necessário tomar a decisão. Será que deveremos abandonar
cerebrais” que ajudarão a estabelecer a veracidade dos o consentimento informado e introduzir uma estratégia de
testemunhos. Isto levanta questões interessantes sobre aquilo a desistência? Ou será esta uma manobra manhosa em terreno
que se chama a privacidade cognitiva. perigoso?

Os novos dados que se vão obtendo sobre as funções cerebrais Outro assunto importante da neuroética é a experimentação animal.
vão promovendo constantemente a revisão o “sentimento de Os animais não têm oportunidade de consentir que os sujeitem a
nós próprios”. Novas ideias influentes sobre a evolução do experimentação invasiva nos seus cérebros. Para algumas pessoas,
cérebro incluem muitos conceitos relacionados com a cognição este tipo de trabalho é bastante perturbador. Para outros, a
social. Existe uma consciência crescente de que a moral e a oportunidade que este tipo de investigação oferece para o avanço da
consciência estão intimamente associadas ao cérebro das nossa compreensão sobre o sistema nervoso, tanto na saúde como na
emoções, que processa sinais de recompensa e de castigo – uma doença, é tal que não realizar estas investigações é um acto
possibilidade que alguns consideram na rubrica da ética irracional. Estes temas não são simples de tratar e de debater
evolucionária. O aumento do conhecimento nesta área pode ser desapaixonadamente, mas é importante que isto se faça – e que se
muito positivo e ajudar a compreender melhor os sentimentos. A faça com o maior respeito.
edificação destas ideias, sobre os nossos actuais conhecimentos
primitivos no que diz respeito à plasticidade sináptica, pode ter Na maior parte dos países europeus a experimentação animal está
um impacto na educação da sociedade além dos objectivos sujeita a regulamentos bem rigorosos. Os investigadores são
académicos imediatos, que são muitas vezes os únicos assuntos obrigados a frequentar cursos e a passar em exames, que testam os
de discussão. seus conhecimentos sobre a legislação e que asseguram que estão
tecnicamente preparados para não causar sofrimento desnecessário
Há que reconhecer que os neurocientistas não estão todos de nos animais. São geralmente aceites três princípios – redução,
acordo em relação à evolução que deve ter a investigação nesta eficiência e substituição – são boas directrizes para os
área. Para alguns neurobiologistas moleculares, a verdade investigadores em biomedicina. Os investigadores seguem estes
encontra-se nos constituintes moleculares do sistema nervoso – princípios por convicção, dentro dos parâmetros definidos pela
as tecnologias para o estudo do DNA e da proteómica prometem legislação, e normalmente com ampla aceitação da opinião pública.
ajudar a encontrar explicações elegantes para problemas com Modelos alternativos de substituição à experimentação animal têm
que se deparam os neurocientistas. Esta é uma agenda fornecido muitos conhecimentos inovadores à Neurociência,
reducionista, cheia de floreados filosóficos e tecnológicos, incluindo o uso de culturas de tecidos e o recurso a modelação
tantas vezes destacada pela comunicação social. Mas será esta computacional. Apesar da grande utilidade destes modelos, não é
confiança reducionista justificada? Ou haverá outros níveis possível substituir todos os estudos no cérebro vivo, que continuam e
superiores importantes na explicação do cérebro e da mente que continuarão a fornecer elementos indispensáveis para o tratamento
não podem ser reduzidos desta maneira? Haverá propriedades de doenças psiquiátricas e neurológicas. Por exemplo, o uso de L-
emergentes que resultam da organização do cérebro? Os DOPA para tratar a doença de Parkinson resultou de trabalho
neurocientistas interaccionistas acreditam firmemente numa desenvolvido em cérebro de rato e que esteve na base da atribuição
agenda diferente. Lutam por uma aproximação à neurociência do prémio Nobel. O desenvolvimento de novas técnicas continua a
moderna mais ecléctica, uma aproximação que também explora oferecer novas oportunidades para permitir a ajuda a pessoas e a
interacções com ciências sociais. Estes não são normalmente animais doentes.
assuntos discutíveis no âmbito do grande público, mas as
questões sobre as grandes linhas da investigação a desenvolver Somente comunicar…
são assuntos para os quais a sociedade deve ser consultada. É espantoso verificar que nos países em que os cientistas fazem mais
Afinal de contas, as pessoas é que pagam a investigação com os esforço para comunicar com o público são os mesmos em que em há
seus impostos. menor confiança nos cientistas. Mas não é plausível que neste caso
Neuroética – alguns exemplos haja uma correlação causa-efeito. Não é lógico pensar que o esforço
que os cientistas fazem em comunicar e discutir o impacto da ciência
concretos na sociedade – e o sentimento crescente de que isto é um dever –
Alguns assuntos da neuroética residem quase no domínio do seja a causa deste divórcio. É mais provável que isto se deva a uma
senso-comum. Suponha que um “scan” cerebral num voluntário maior sofisticação das pessoas, mais cépticas relativamente ao
revela uma anomalia cerebral – tal como um tumor cerebral. Ou aparecimento de fármacos “milagrosos”, e provavelmente mais
imagine que, num rastreio de neurogenética se determina que conscientes da lentidão e incerteza do progresso científico. A
um indivíduo é portador de uma mutação que o torna susceptível vontade em diminuir as opiniões contrárias não é motivo para
a doenças neurodegenerativas. Em ambos os casos – deve o desejar voltar à época da ignorância cega.
indivíduo ser informado? O senso-comum sugeriria que a
responsabilidade desta decisão fosse imputada ao voluntário. Existem bons motivos para envolver os cientistas com os jovens e
Este deveria previamente assinar um consentimento informado, com o público interessado em neurociências e isto inclui a promoção
indicando que qualquer informação médica relevante que fosse da discussão sobre muitos dos dogmas “discutíveis” que também
descoberta no decurso do procedimento lhe fosse transmitida. existem em neurociência. Estranhamente, por vezes, os órgãos de
comunicação social dificultam a comunicação com a sociedade, pois
No entanto, o consentimento informado é um processo muitas vezes têm uma tendência em centrar a atenção em
curioso. Suponha que um neurocientista está a desenvolver um descobertas isoladas, em vez de pensarem na ciência como um
ensaio clínico para um novo tratamento contra AVC, em que processo integrado. Um processo misterioso, cheio de incertezas e
tanto o fármaco como o placebo devem ser administrados de debate.
durante um período máximo de poucas horas após ocorrer o
AVC. Parece haver excelentes motivos para desenvolver este Neuroética é um novo campo de pesquisa. Richard Feynman, um
estudo. Mas nós não podemos antecipar quem é que irá sofrer físico teórico, descreveu a sua razão para fazer ciência como sendo o
um AVC, e assim será impossível obter o consentimento “prazer da descoberta”. Existe aqui uma certa ironia, pois foi
informado do paciente. Se isto impede a participação do Feynman que se atirou de cabeça ao trabalho de descobrir porque é
paciente, ele próprio poderá ser prejudicado no futuro, bem que o Space Shuttle, Challenger, explodiu pouco depois de levantar.
como outros pacientes que venham a ter um AVC. Além disso, O impacto da ciência na sociedade causa arrepios em todos nós.

Locais de internet relacionados: http://www.stanford.edu/dept/news/report/news/may22/neuroethics.html


http://www.dana.org/books/press/neuroethics/ 53

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