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Mestre em Educação: Distúrbios da Comunicação pela PUCSP, Graduada em Fonoaudiologia na
PUCSP
A definição mais referida atualmente é a usada na América do Norte pelo
comitê da American Speech and Hearring Association (ASHA, 1991, p. 8, apud Panhan,
2001, p.13):
Outros autores trazem definições, como Grycman (2001), que diz que a “CSA é
um caminho individual, impossível de copiar, dependente de muitas condições. Não há
soluções prontas. Compreendo como sendo a maneira de alguém significar mais do que
uma receita pronta”, ou Panhan (2001) que define a CSA como um conjunto de técnicas
que reúne materiais gráficos organizados que permitam a interlocução além da fala.
Há muitas outras definições e discussões acerca delas. Trago somente uma
reflexão de Duarte (2005) feita à definição da ASHA (citada acima) como forma de
apresentar algumas diferenças posturais perante a CSA. A autora apresenta que, nesta
definição, é colocada lado a lado a dimensão clínica e educacional, sem diferenças entre
elas. Assim, nesta perspectiva, o fazer clínico assemelha-se ao pedagógico: tem como
característica o treino das habilidades, uso dos símbolos para garantir maior eficácia
comunicativa e desenvolvimento estratégico para o ensino. A dimensão da escuta e da
intervenção aos aspectos singulares da linguagem e seus transtornos não é considerada.
A reflexão traz em seu bojo a dualidade entre compreender linguagem enquanto
comunicação, que prioriza os aspectos formais, normativos e utilitários da linguagem e
compreendê-la enquanto “produção de sentido, operando no âmbito da intersubjetividade
e da interdiscursividade” (Duarte 2005, p.5).
A criança e a CSA.
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Neste texto uso expressões como: falta de oralidade, não falante, sem fala, para designar o
sujeito que não expressa sons orais articulados e com sentido (fala funcional), sendo esta
impossibilidade total ou parcial, ou ainda a apresentação de uma fala tão ininteligível que elas não
Entretanto se pensarmos que é pela fala (própria e do outro) que a criança se desloca e
ressignifica o mundo (De Lemos, 1995) e é pela fala egocêntrica (Lier-De Vitto, 1997) que
a criança pode exercer um controle social (externo) e psicológico (interno) e também se
constituir no plano cognitivo, vemos que não falar pode ir além de uma simples falta.
Desta forma, o trabalho com formas alternativas de comunicação não pode ser entendido
como somente a apresentação de símbolos para que a criança possa se expressar, mas
como a possibilidade alternativa para a construção de sua linguagem, e de sua
constituição enquanto sujeito.
Duarte contribui ao dizer que compreender a linguagem como não transparente é
entender que
(...) Os enunciados não possuem sentidos fixos e únicos; eles são inantecipáveis e
acontecem em ato. Se se pensa em linguagem (...) como sistema de signos socialmente
codificados e dependente de um emissor, um receptor e uma mensagem a ser codificada,
o foco recai em apenas uma das funções da linguagem: a comunicação (Duarte 2005 p.
29).
Com isso, a criança que não desenvolveu fala, muitas vezes pode apresentar
dificuldades específicas de linguagem. Moreira e Chun (1991) afirmam que a linguagem
dos sujeitos de sua pesquisa, anterior à introdução de comunicação alternativa, era
restrita, pouco eficiente, gerando insatisfação na relação dialógica. É comum no início de
um trabalho com comunicação alternativa que as pessoas próximas à criança (pais,
professores, familiares) esperem que ao apresentar símbolos ou imagens a estas
crianças, a comunicação já será efetivada. É preciso que estes símbolos gráficos façam
sentido, que lhes dê alguma intenção. Somente quando um símbolo faz sentido no seu
contexto cultural é que a criança se apropriará daquele recurso lingüístico. Neste
caminho, Von Tetzchner et al (2005, p.155) diz que
(...) Se você quer saber como se sente quem é incapaz de falar, há uma forma de saber.
Vá a uma festa e não fale. Mantenha-se mudo. Use suas mãos se desejar, mas não utilize
papel ou lápis. Papel e lápis não estão sempre à mão de uma pessoa que não fala. Neste
ponto, você irá descobrir: as pessoas conversam. Conversam atrás, ao lado, em volta,
acima, abaixo de você, entre si e, até mesmo sobre você. Mas nunca com você. Você é
ignorado até se sentir como uma peça de mobília” (Musselwrite& St.Louis, 1988, apud
Beukelman & Mirenda, 1988, p.6, apud Silva, 2006, tradução Silva.)
(...) Nesta sessão estava presente a minha filha J., amiga de G. desde seu nascimento.
Por vezes os movimentos estereotipados de cabeça de G. nos dão a sensação de
ausência. Logo no início da sessão, ele e sua mãe sentaram-se no sofá onde estava a
menina e G. inicia os movimentos estereotipados de cabeça. A mãe dele neste momento
faz o seguinte comentário:
“- Nossa J., você cortou o cabelo, como ficou bonito!” imediatamente G. cessou o
movimento, endireitou-se no sofá, girou a cabeça em direção à menina e observou seu
cabelo. Diante de nosso comentário sobre o fato (-nossa, como você está atento...), ele
riu.
Seus movimentos estereotipados, bruscamente cessados por ele durante o diálogo
mostram-nos que ele alçou sentido no meio de um discurso externo, de falas que não lhe
diziam respeito, de diálogos que ele estava acostumado a não ser incorporado.
Mastrascusa (2005) em seu trabalho diz que uma das funções da fala é a de conferir ao
mundo em que vivemos uma estrutura simbólica, uma unidade de sentido.
No seguimento do trabalho foi possível introduzir a prancha de comunicação e G.
começou a perceber as possibilidades que ele pode ter agora com a prancha,
principalmente de satisfazer suas vontades, mas parece que sua auto-imagem de não
falante é mais forte. É comum ver G. em situações onde ele pode dizer o que quer e não
o faz. Presenciei a seguinte cena na escola: G. deitado no colchonete na sala de aula
durante a hora de aula. Pergunto à professora o que aconteceu. Ela me diz que ele está
bravo e não quer fazer nada, e principalmente, que não responde suas indagações pela
prancha, empurrando-a com o pé. Com a prancha em mãos, pergunto a ele o que ele tem
a me dizer sobre o assunto, ele empurra a prancha e após a minha insistência ele me dá
duas respostas: quero ir para casa e mais tarde, quarto da mãe. Penso que G. me
escolheu como interlocutora naquele momento, e que poderia aliviar seu sofrimento se
estabelecesse o diálogo com a professora, mas porque não o fez? Friedman (1994, p.27)
ao falar da imagem estigmatizada de falante ressalta:
“Da análise que realizamos da estreita relação que existe entre o desenvolvimento da
consciência e da linguagem que se produz no contexto das relações sociais do grupo a
que cada indivíduo pertence, entendemos a determinação ideológica deste
desenvolvimento. Consideremos, agora, a construção da identidade, entendendo-a como
parte desse processo, o que significa que essa construção também está sujeita à
determinação dos conteúdos das crenças e dos valores veiculados nas relações
interpessoais, através das atividades práticas e verbais. Nesse sentido, a identidade é um
processo de construção de si que se desdobra a partir da rede cognitiva ou de
representações formadas nas relações sociais práticas e de comunicação.”
Conclusão:
O processo terapêutico contribuiu para que G. e sua família pudessem ter novas
possibilidades comunicativas, gerou novas atitudes de ambas as partes. Tanto a família
quanto G. estão construindo uma nova imagem. Ele sutilmente vem se apresentando
como interlocutor, e quanto mais o faz, mais é visto como sujeito, podendo dizer de suas
vontades, necessidades e sentimentos, podendo transformar e ser transformado por esse
falar.
Para atuar no mundo como um ser comunicativo, G. precisa ser visto e ver-se
como tal. Em um ano de terapia fonoaudiológica, G. e sua família vêm quebrando uma
imagem que vinha sendo formada há 11 anos: a imagem de não falante.
Bibliografia: