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Introdução
Cidadanias
e
Diversidades
1
O
Clube
dos
Poetas
Mortos
Proposta
de
Cristina
Lema
e
Teresa
Rebelo
Este trabalho pretende analisar essas questões, apresentando a seguinte estrutura: no
primeiro capítulo proceder-se-á à apresentação de uma visão da escola tradicional, das
ideologias que lhes estão implícitas e dos procedimentos por ela utilizados, tendo em
vista a promoção de uma franja da sociedade americana dos anos 50.
Numa segunda parte, abordaremos a metodologia de Keating, aqui representativa de uma
nova forma de encarar o aluno/indivíduo, indivíduo esse que, no limite irá colocar em
causa o próprio status de que é oriundo, reapropriando-se dos seus legítimos direitos,
exercendo-os. Convém, por fim, salientar que toda esta problemática se encontra
ficcionada na obra de Peter Weir, obra que serve de pano de fundo à contextualização
das questões acima referidas.
Sinopse
O
filme
“Clube
dos
Poetas
Mortos”
relata
a
história
de
um
professor
de
literatura
e
dos
seus
alunos
num
colégio
interno
marcadamente
elitista
e
com
uma
disciplina
muito
rígida.
Nas
aulas,
Keating
adopta
uma
postura
considerada
pouco
ortodoxa
para
os
regulamentos
daquela
escola,
apelando
para
valores
como
a
liberdade
de
pensamento
e
de
expressão
que
colidem
frontalmente
com
os
que
são
defendidos
no
colégio.
Entusiasmados
com
o
lema
“Carpe
diem”
(aproveita
o
dia),
proclamado
pelo
professor,
os
alunos
ganham
coragem
para
experimentar
desafios
e
experiências
que
nunca
antes
ousariam
enfrentar.
À
semelhança
do
que
Keating
fizera
na
juventude,
sete
dos
seus
alunos
criam
o
“Clube
dos
Poetas
Mortos”
-‐
clube
que
reúne
furtivamente
à
noite,
numa
gruta,
nas
imediações
do
colégio.
O
grande
tema
é
a
poesia.
O
suicídio
de
um
jovem,
brutalmente
reprimido
pelo
pai
na
sua
vocação,
vai
desencadear
uma
situação
de
confronto
entre
a
direcção
do
colégio
e
o
professor
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Rebelo
Keating
que
é
sumariamente
acusado
de
instigar
os
seus
alunos
à
desobediência
o
que
lhe
custa
a
expulsão.
O cenário do filme é-nos introduzido por uma Cerimónia de abertura do novo ano lectivo
que se inicia : num ambiente de recriação arquitectónica neo-gótica. Somos apresentados
ao Corpo Docente da Escola , os sacerdotes do conhecimento e, na procissão que os
legitima nessa escadaria a altos patamares de sabedoria, os estandartes são o porta voz
deste ensino vetusto de gerações de academia : Tradição Honra, Disciplina e Excelência .
Os ícones desta tradição consagram o que a escola tradicional tão elitista sempre
patrocinou e defendeu : a catedral quase que hermética porque defendida o seu status de
classe elevada na misogenia de uma academia restrita .
Veiculando princípios que visavam obter a docilidade e obediência dos seus alunos, nem
que esta fosse conseguida através da violência, esta escola servia perfeitamente os
intuitos de um estado autocrático que, atravessando que estava um período conturbado –
guerra-fria – desfraldava a bandeira do anti-comunismo, como se de um estado de
excepção se tratasse no que respeitava a direitos políticos e civis, unindo assim a opinião
pública no ideal do “sonho americano”. A intenção final - evitar deste modo que os
cidadãos se fossem apercebendo das desigualdades reinantes, fruto de um capitalismo
desenfreado, sendo que toda e qualquer atitude que o negasse seria considerado “risco
para a segurança do Estado” - lei de 27 de Abril de 1953.
Numa sociedade sem liberdade, em que a cultura segue, a qualquer preço, o clamado
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progresso - que nada mais é do que a expressão desenfreada de uma expansão capitalista
- restrito é o lugar ocupado pelo indivíduo que acaba como vítima dessa "escravidão",
Na realidade, num mundo democrático, a democracia por vezes parece vir imbuída de
assimetrias que assentam em desigualdades que resultam do simples facto de uns
democratizarem e outros serem democratizados, uns comandarem e outros serem
comandados.
Parafraseando Touraine, torna -se necessário ir para além de uma mera legitimação de
“direitos” e reconhecer que o direito básico de qualquer indivíduo é ser considerado um
“sujeito de direitos”. Como um sujeito de direitos, uma pessoa (ou uma categoria) tem o
direito não apenas de defender a sua identidade – uma formulação "perigosamente"
unidimensional – mas também de ser um actor livre e responsável no seu relacionamento
com o ambiente – ambiente esse que se encontra imerso em relações de poder. Esse
“sujeito” pode ser constituído de uma forma quer negativa e destrutiva quer positiva e
inclusiva. Ele pode revestir-se de várias formas, como o representante de um Deus, de
uma elite, legitimando-se assim e destruindo dessa forma os direitos do outro.
Na realidade, tal como referência T. H. Marshall, o sistema capitalista propicía as
desigualdades resultantes das assimetrias económicas, criando um paradoxo passível
unicamente de ser resolvido “pela interacção de vários factores relacionados com as
instituições da propriedade, da educação e da estrutura da economia nacional. Neste
caso a desigualdade social considera-se necessária e útil, porque proporciona incentivos
para o esforço, e estrutura a distribuição do poder.” (Pico, 2002: 6).
Porém, como afirma Lipset (in Pico, 2002), este novo conceito de cidadania, apesar de
implicar uma nova redistribuição do poder baseada num sistema educativo meritocrático,
nada mais consegue que reproduzir desigualdades sob a falsa crença da igualdade de
oportunidades, conseguidas através de um status que essa mesma instituição lhe vai
conceder, aliás como já havia referido Touraine (1997:356) quando afirmava que esta
escola “não reduzia os indivíduos aos seus desempenhos sociais, mesmo quando era, o
que acontecia quase sempre, de um grande conformismo em relação às ideias e às forças
políticas dominantes”.
Efectivamente, o colégio Welton funciona como uma fábrica de preparação de futuras
elites, onde não há espaço para quaisquer outras actividades que possam, de alguma
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forma, fazer ruir esses objectivos: “Depois de seres médico, podes fazer o que quiseres.
Até lá, fazes o que eu disser”, nem que isso passe pela decisão unilateral de enviar o filho
para a Escola Militar – uma outra forma de adquirir o status e o poder
Embora esta escola não possa reflectir a tentativa de unificação do sistema escolar que na
época já facultava um acesso mais aberto dos indivíduos à educação, aspecto que também
é focado no filme, quando, por breves instantes, o realizador decide deixar o espaço
fechado de Welton, e retrata uma juventude muiti-racial de uma escola pública, tal facto
traduzia-se ainda por uma hierarquização crescente do sistema escolar. Este sistema
representava antes um compromisso tácito entre as forças económicas e o Estado,
porquanto as escolas públicas seriam destinadas àqueles que o mercado não estaria
interessado em absorver, visando, mais uma vez, uma formação selectiva de elites, de
modo a que esta se pudesse reproduzir em colégios como o de Welton – dando forma á
ideia apresentada por T. H Marshal (1963: 62) de que "a cidadania em si mesmo se tem
tornado, sob certos aspectos, no arquitecto de uma desigualdade social legitimada."
Quando Keating surge no colégio e incita os seus alunos a destruírem algumas folhas do
manual de literatura damo-nos conta que esse simples gesto é representativo de uma nova
visão e de um novo ideal de Educação
Touraine sublinha três pilares em que esta nova escola se definia : “A educação deve
formar e reforçar a liberdade do sujeito pessoal” de modo a que ele possa “romper com
o tema da socialização; promover uma educação centrada na “diversidade histórica e
cultural e no reconhecimento do Outro” partindo do “conhecimento de si próprio como
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sujeito livre” e, finalmente a vontade de corrigir a desigualdade das situações e das
oportunidades” introduzindo “uma visão realista e não idealizada das situações
colectivas e pessoais” (Touraine, 1997: 306) principio este basilar ao que esta escola via
como o sujeito.
Partindo de práticas a que não são alheias as pedagogias de John Dewey, Keating
consegue, dessa forma, desenvolver um certo grau de autonomia e criatividade entre os
seus alunos o que lhes permite, mais tarde, a demarcação a um processo de "modelagem"
que a sociedade lhes tenta imprimir - transgredindo assim o conformismo que a escola
tradicional defendia.(cf. Abbs, 1989: 71) :
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mesmos seres humanos sobre a sua própria natureza e, em ambas as formas de
dominação, a dominação de alguns seres humanos por outros.
Nesta dimensão, cabe aqui referir o papel da escola na construção desse cidadão que se
quer pleno e responsável, capaz de afirmar a suas escolhas numa sociedade cuja
influência hegemónica potencia a manipulação das suas escolhas.
O verdadeiro valor desta nova educação - uma educação em que a componente
emocional é valorizada - reside na capacidade de enriquecer o processo cognitivo de
modo a multiplicar factos e analisar informação concreta sob perspectivas que de outra
forma seriam imperceptíveis à maioria dos indivíduos; “ver” ou reinterpretar de outra
forma permitirá o despertar de sensações e pensamentos que de outro modo ficariam para
sempre escondidos. Para além de enriquecer a sensibilidade intelectual, a cultura estética
(consignada na obra citada por via da abordagem poética) conseguiu
Esta escola de auto-reflexão ou escola do Sujeito, como defendia Touraine, visa uma
educação que se afasta gradualmente do social. Aumentando a capacidade dos indivíduos
serem Sujeitos, "centra-se na manipulação dos instrumentos e na expressão e formação
da personalidade", aspectos que permitirão ao indivíduo “aprender a pensar por si
próprios” ou mesmo, no limite, a "exercer o direito de ser diferente". Tomar iniciativas,
afirmarem-se como únicos e individuais numa sociedade que cada vez mais promove a
massificação, ajudá-los a decifrar as "linguagens"/códigos subliminares dessa mesma
sociedade, de modo a que possam: "aprender a viver juntos, desenvolvendo o
conhecimento dos outros, da sua história, das suas tradições e da sua espiritualidade"
criando "um espírito novo que, graças a esta percepção das nossas crescentes
interdependências, a uma análise partilhada dos riscos e dos desafios do futuro, leve à
realização de projectos comuns ou a uma gestão inteligente e tranquila dos inevitáveis
conflitos." (Touraine, 1997: 372)
Bernstein (1996) refere-se a esta consciência crítica que a par de outras características
como o direito à participação e confiança deverão estar subjacentes a qualquer das suas
decisões, face às tensões inevitáveis que vão surgindo ao longo da sua vida, como
enhancement. Este mesmo enhancement esteve presente, quando Charles, uma das
personagens do filme, grita o seu "YAUP bárbaro" em plena assembleia de escola,
passando uma "chamada de Deus" ao Director, alertando-o para a questão da igualdade
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de géneros no colégio, até aí tema tabu. Esta testar dos limites, embora não apresentasse
bom-senso, como referiu Keating, revela claramente uma outra dimensão que esta nova
escola promove: a luta consciente pela participação activa em matéria de decisão sobre
direitos civis, pessoais e sociais.
Desta forma, Keating visava conseguir que este processo de massificação fosse invertido,
conseguindo assim que o indivíduo pudesse "mergulhar" no social, não significando, por
si só, que ele fosse completamente envolvido por este, mantendo sempre uma
distanciação que lhe possibilitasse as escolhas racionais do que pretendia adquirir ou,
pelo contrario, do que pretendia abandonar, dada a impossibilidade desses modelos não
serem passíveis de serem desenvolvidos de acordo com o seu próprio sistema de valores,
(HammershØj, 2006). Esta capacitação crítica remete para um ideal – universal - capaz
de fazer o individuo orientar-se na legitimação das suas próprias escolhas.
Do mesmo modo, Touraine referindo-se a democracia, afirmava que esta não se
materializava unicamente no conjunto de garantias institucionais e formais, mas sim
representava uma luta de sujeitos, na sua cultura e na sua liberdade, contra a lógica
dominadora dos sistemas sociais. Nessa concepção, seria necessário que os sujeitos
pudessem combinar o pensamento racional, a liberdade pessoal e a identidade cultural. À
escola democrática competiria, por um lado, criar espaços para a participação cada vez
mais perceptíveis e, por outro, garantir o respeito às diferenças individuais e ao
pluralismo.
Conclusão
Após a análise do enquadramento conceptual das sociedades e das suas relações com o
estado, comunidades e individuos que esta unidade curricular nos proporcionou,
julgamos impensável, no momento presente , dissociarmos a escola do discurso político
e económico da Sociedade de Informação e da Comunicação.
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transmitidas e pela capacidade que tem de dar resposta aos novos desafios da
globalização e de crise económica, parecendo, por vezes, esquecer o essencial: a escola
continua a ser um espaço educativo, pedagógico, e, acima de tudo, um local privilegiado
passível ou tendente à inclusão. A sua função é, mais do que nunca, formar "livres
pensadores", cidadãos informados cultos, em que a sua consciência crítica lhes permita
exercer uma cidadania responsável:
Uma escola que tem por missão reforçar a capacidade e a vontade dos indivíduos de
serem actores e de ensinar cada um a reconhecer no outro a mesma liberdade que em si
mesmo, o mesmo direito à individuação e à defesa de interesses sociais e de valores
culturais, é uma escola da democracia, desde que reconheça que os direitos do Sujeito
pessoal e as relações interculturais têm necessidade de garantias institucionais que só
podem ser obtidas através de um processo democrático.
(...) o objectivo da escola não é apenas preparar e formar jovens para a sociedade, ainda
menos tendo unicamente em vista a inserção económica, mas sobretudo por eles
próprios, para que se tornem seres livres capazes de encontrar e de preservar a unidade
da sua experiência através das transformações da vida e da força das pressões que se
exercem sobre eles.(Touraine, 1997: 377)
Porém, algumas décadas volvidas, a questão acima enunciada por Touraine, que tão bem
reflectia os problemas com que se dabatiam os alunos de Welton, ganha nova dimensão
e, por momentos, julgamos assistir a um revisitar desse universo quando nos damos
conta das inúmeras pressões a que os alunos de hoje estão sujeitos ao longo da sua vida
académica.
Mutatis mutandis, dificilmente podemos ignorar o valor dos discursos pedagógicos alí
idealizados que se transformaram em propostas pedagógicas capazes de inverter tal
processo, no fundo uma formação que permitiu desencadear no indivíduo processos e
atitudes face a uma realidade, capazes de o formar sob uma perspectiva holística ,
“permitindo ao homem conhecer-se melhor e de forma mais profunda” (Vygotskij,
sd :69).
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