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Portugal, 3 anos de aborto legal, seguro e gratuito

A 11 de Fevereiro de 2007 os portugueses decidiram em plebiscito que as mulheres


deveriam poder abortar, por sua opção, até à 10ª semana em condições de segurança num
estabelecimento de saúde autorizado.
Em 1998 tinha-se realizado um plebiscito sobre o mesmo tema em que
despenalização do aborto tinha sido derrotada, pelo que até 2007 o aborto, em Portugal
continuava a ser crime, com excepção dos casos em que a gravidez apresentasse perigo
de morte ou lesão grave para a saúde física e psíquica da mulher, em caso de
malformação congénita ou doença incurável do feto ou em situação de violação da
mulher. Para o plebiscito de 2007, além dos partidos politicos, organizaram-se também
diversos movimentos a favor e contra a despenalização do aborto, que realizaram
campanha na rua e na televisão (todos com igual tempo de antena) pelas suas posições. A
vitoria da posição do SIM à despenalização do aborto no plebiscito de 2007 foi, por isso,
produto de um amplo debate que atravessou a sociedade portuguesa. A igreja católica foi
um setor fundamental na campanha do Não à despenalização, que saiu fortemente
derrotada neste plebiscito.
Em Julho do mesmo ano a lei foi posta em prática. A partir daí todas as mulheres
residentes em Portugal, de nacionalidade portuguesa ou não, podem ter acesso a um
aborto seguro e gratuito no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O processo é relativamente simples, uma mulher só tem que se dirigir a um hospital
ou a um posto de saúde e dizer que quer fazer um aborto. Primeiro terá que ir a uma
consulta prévia onde fará um breve exame médico e será informada sobre os métodos de
aborto. Nessa consulta é-lhe oferecido aconselhamento psicológico que ela poderá aceitar
ou não. Depois seguem-se três dias de reflexão obrigatória após os quais o aborto poderá
ser realizado se se comprovar por ultra-som que a gravidez tem menos de 10 semanas.
As mulheres podem optar por um aborto medicamentoso ou cirúrgico. O
medicamentoso é feito com recurso a dois fármacos que em conjunto provocam e
simulam um aborto em tudo semelhante a um aborto espontâneo e têm uma eficácia de
98-99%. Para além disso este processo tem a vantagem de não necessitar de não
necessitar de internamento. Pode-se também optar pelo processo cirúrgico, feito na
maioria das vezes com anestesia geral, pelo processo de aspiração por vácuo ou
curetagem (raspagem). Duas semanas mais tarde a mulher deverá ir a uma terceira
consulta, depois de ter feito um novo ultra-som para confirmar que a gravidez terminou e
para ser aconselhada acerca do método contraceptivo que melhor se adapta a si.

A implementação da lei
Os movimentos anti-escolha argumentavam que a realização de abortos no SNS
iria trazer o caos aos serviços, que iria roubar recursos para dar às mulheres que queriam
abortar. Não se verificou nenhum caos. Segundo Mara, médica de Medicina Geral e
Familiar e Co-fundadora da Associação Médicos pela Escolha1 (MPE) “podemos afirmar
que a implantação da nova lei de IVG (interrupção voluntária da gravidez, ou aborto)
correu bem. Para isso foi fundamental a regulamentação detalhada. Quais os

1
Associação de profissionais de saúde, e colaboradores de outras áreas, que luta pela defesa dos direitos
sexuais e reprodutivos. Em 2006 criou um movimento com o mesmo nome que fez campanha para o
plebiscito, defendendo o direito ao aborto seguro e gratuito.
estabelecimentos de saúde que podem realizar IVG, o circuito da utente, estabelecer
limites no tempo máximo de espera das várias etapas, desde o primeiro contacto da
mulher até à consulta de planeamento familiar pós-aborto. Para optimizar a qualidade
dos serviços prestados foram também realizados protocolos de actuação, quer no aborto
médico como no cirúrgico”. Segundo Mara outra questão que foi muito importante para a
implementação da lei foi a regulamentação da objecção de consciência, nomeadamente
que “o direito à objecção de consciência que é um direito individual e não colectivo, isto
é, não pode haver um Serviço de saúde objector de consciência, apenas médicos
objectores. É importante também referir que os médicos objectores têm
obrigatoriamente que referenciar a utente a um médico que não seja objector.”.
A existência do aborto medicamentoso também facilitou a implementação do
aborto pois pode ser realizado em ambulatório, não necessitando de internamento ou de
tantos recursos como o aborto cirúrgico. 95,7% dos abortos feitos no SNS foi realizada
pelo método medicamentoso. Há, inclusive, postos de saúde onde é possível realizar um
aborto através do método medicamentoso. Para que estes postos o pudessem fazer foi
apenas necessário que os médicos e enfermeiras recebessem formação, e terem que ter
disponível o acesso a uma consulta de apoio psicológico.

Nem mais uma morte por aborto clandestino


Ana de 14 anos foi uma das últimas mulheres a morrer em Portugal vítima de
aborto clandestino, depois de implementada a lei que permite a interrupção da gravidez
por opção da mulher não foi registada mais nenhuma morte por aborto e as complicações
graves como perfuração do útero e sépsis tornaram-se extremamente raras.
Passados 3 anos da implementação da lei a redução do número de abortos
clandestinos foi drástica, havendo ainda um número reduzido, muito por falta de
conhecimento da nova lei e também pelos casos em que as mulheres não conseguem
fazer um aborto antes das 10 semanas. Segundo Mara dos MPE “continua a haver
circulação ilegal de “cytotec” e acredito que a grande maioria dos abortos ilegais são
medicamentosos, como já acontecia antes da legalização, e estes têm menos
complicações que os abortos cirúrgicos, daí o grande decréscimo de complicações.
Principalmente em relação a grupos mais vulneráveis (imigrantes, adolescentes)
continua a ser urgente informar todas as mulheres do “novo” direito à escolha, assim
como informar do acesso gratuito ao aborto e a confidencialidade de todo o processo”.
Para a Associação para o Planeamento da Família o prazo de 10 semanas é muito
curto e dever-se-ía alargar o prazo para as 12-14 semanas tal como na maioria dos países
europeus. Não seria o número de abortos total que iria aumentar mas sim os abortos
clandestinos que seriam ainda mais reduzidos. Mara dos MPE, defende que para além
disso “é excessivo que as adolescentes com menos de 16 anos, no novo quadro legal, só
possam realizar IVG mediante consentimento informado dos pais (ou tutor legal),
considero que qualquer mulher com uma gravidez não desejada tem autodeterminação
suficiente para tomar decisões que só a ela (e a quem cada mulher desejar
voluntariamente envolver) competem. É importante esclarecer que, por lei, todas as
mulheres (e não só as adolescentes) que desejem realizar IVG têm acesso, sempre que
desejaram, a apoio psicológico ou do serviço social, serviços que, embora não sendo
obrigatórios, têm que ser sempre obrigatoriamente oferecidos e disponibilizados.”
O direito ao aborto gratuito e seguro
A principal razão da redução drástica do aborto clandestino foi o facto deste ser
gratuito no SNS, permitindo assim às mulheres trabalhadoras, que não têm recursos para
pagar um aborto numa clínica privada, ter acesso a um aborto seguro. Estimava-se que se
realizassem por ano entre 17000 a 20000 abortos em Portugal, por opção da mulher. Em
2009 realizaram-se 18951 abortos nestas condições, destes mais de 70% foram feitos no
SNS.
Esta foi uma das grandes bandeiras dos Médicos pela Escolha que sempre
defenderam que tão ou mais importante que legalizar o aborto era garantir que este fosse
acessível às mulheres trabalhadoras com menos recursos. São estas mulheres que mais
necessidade têm de planear a sua família e mais provavelmente poderão ter que recorrer
ao aborto perante uma gravidez inesperada. 19% das mulheres que fizeram um aborto em
Portugal, em 2009, eram trabalhadoras não qualificadas, 18% eram estudantes, 17%
estavam desempregadas. Estas mulheres consideraram não ter as condições necessárias
para criar um filho e ao contrário do que acontecia antes de 2007 puderam tomar essa
decisão com dignidade, independentemente dos seus recursos económicos.

Por um aborto raro, legal e seguro


Um dos principais argumentos dos movimentos anti-escolha era que o número de
abortos iria aumentar exponencialmente porque as mulheres iram deixar de fazer
contracepção e passar a usar o aborto como único método de planeamento familiar.
Sabíamos que isto não era verdade mas apenas um atestado de imbecilidade passado às
mulheres, o mesmo que dizer que estas não têm capacidade de decidir sobre a sua vida
sexual e reprodutiva. Tal não aconteceu nos restantes países onde o aborto foi legalizado
também não iria acontecer em Portugal.
E assim foi, não houve nenhum aumento exponencial do número de abortos, as
mulheres não deixaram de fazer contracepção, aliás sabemos agora que 96% das
mulheres que fizeram um aborto estavam a usar algum método contraceptivo (60%
estavam a tomar a pílula). Um número semelhante a tantos outros países. A contracepção,
qualquer que seja, falha e uma gravidez indesejada pode acontecer a qualquer mulher.
Agora esta falha pode ser comunicada ao médico assistente que poderá ver em conjunto
com a mulher se havia algum erro no uso do método contraceptivo e/ou escolher um
método mais adequado, havendo mesmo uma consulta exclusiva para isso.
Além disso das mulheres que abortaram apenas 4% tinham feito 2 ou mais
abortos na sua vida, ou seja, tal como defendíamos as mulheres na sua grande maioria, se
tiverem acesso a métodos contraceptivos, só recorrem ao aborto quando tudo o resto
falha.

A luta não terminou aqui


A legalização do aborto e a sua realização no SNS é uma grande vitória para as
mulheres em geral e em especial para as mulheres trabalhadoras. No entanto ainda há
aborto clandestino e enquanto assim for temos que continuar a lutar para que este
desapareça por completo.
É necessário que o limite legal para a interrupção da gravidez seja alargado, não
há qualquer razão científica ou ética que justifique as 10 semanas. Na prática 10 semanas
é um prazo muito curto para permitir que as mulheres descubram que estão grávidas e
ainda consigam passar por todo o processo até à consulta de interrupção. Nos países onde
o prazo limite é maior a percentagem de abortos realizados não aumenta, apenas diminui
ainda mais o aborto clandestino.
É necessário que se desenvolvam campanhas de informação acerca da nova lei
para todas as mulheres, em especial às imigrantes, dizendo-lhes que todas têm direito a
um aborto gratuito desde que residam em Portugal.
Para além do tempo limite ter de ser alargado, a interrupção da gravidez deve ser
ainda mais acessível através do aumento da disponibilização do aborto medicamentoso
nos postos de saúde.
Não podemos esquecer que todo este processo deve ser acompanhado pela
exigência de que os métodos contraceptivos sejam gratuitos e estejam amplamente
disponíveis nos postos de saúde juntamente com a disponibilização de consultas médicas
e de enfermagem para ajudar as mulheres a estabelecer o método que mais lhes convém.
Devemos também continuar a exigir que haja educação sexual nas escolas para que os
jovens ampliem o conhecimento do seu próprio corpo e saibam como evitar uma gravidez
indesejada. Para que cada vez mais o aborto se torne raro, precoce e seguro.
No entanto, enquanto houver capitalismo o acesso gratuito a um aborto seguro
para as mulheres trabalhadoras estará sempre em causa. Neste momento Portugal está a
ser fortemente atingido pela crise económica, o governo neoliberal de serviço, do Partido
Socialista, já começou a passar a factura aos trabalhadores e entre outras medidas está a
fazer um grave ataque ao SNS com cortes gigantescos no seu orçamento. Estes ataques
ao Serviço Nacional de Saúde colocam em risco, entre outras coisa, a realização do
aborto forma ampla, segura e gratuita, e portanto o acesso ao aborto pelas mulheres
trabalhadoras. Este ano já houve sectores que falaram na necessidade de apenas o
primeiro aborto ser gratuito, tendo as mulheres que pagar pelos seguintes. Para além de
que mesmo numa perspectiva económica liberal os custos do tratamento das
complicações de aborto clandestino acabam por ser maiores, a dignidade e a vida de uma
mulher, que pode ser a nossa irmã, a nossa mãe, a nossa amiga, a nossa namorada, a mãe
dos nossos filhos, não tem preço.
Além disso, não só é necessário o acesso ao aborto para todas as mulheres como
também o acesso generalizado e gratuito a todos os métodos contraceptivos. Tal não é
possível porque as grandes empresas farmacêuticas querem manter os gigantescos lucros
deste mercado.
Lutar pelo direito a um aborto seguro e gratuito, assim como o direito ao
Planeamento Familiar, será sempre para os trabalhadores uma luta incompleta se não
estiver aliada à luta pelo fim do capitalismo.

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