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1
2
Vera Pinto
PALAVRAS
Cruzeiro–SP
2019
3
Capa e Projeto Gráfico Paulo Gaia
Produção Editorial Sílvio Ferreira Leite
4
Apresentação
ÀS VEZES OUVIMOS DIZER QUE NÃO EXISTEM COINCIDÊNCIAS. MUITA GENTE AFIRMA
que tudo acontece por uma determinação superior. Por esse ponto de
vista, fica descartada qualquer obra do acaso. Há um planejamento,
digamos assim, que conduz os acontecimentos de forma a proporcionar
um final feliz, provavelmente devido a um merecimento. Quem sabe?
Pode parecer credulidade ingênua aceitar que nada acontece por acaso.
Sendo assim, o que seria o acaso? Uma ocorrência banal? Um fato incerto?
Um evento que por si só não se reveste de importância? Nesses casos, seria
mesmo necessário atrelar ao imprevisível a interferência de uma inteligência,
para que a coincidência deixe de existir e ceda espaço ao grandioso.
Se o grandioso não for invocado, o fenômeno da coincidência passa a
ser visto como manifestação espontânea e pode ser tratado com desdém.
Em todo caso, deixando de lado o que chamamos determinação superior,
podemos ainda pedir socorro a um estudioso notável.
Analisando o fenômeno da coincidência, Carl Jung lhe deu o nome de
sincronismo. Perceba que agora há mais inteligência no ar. E embora Jung
tenha feito apenas a abordagem psíquica, relacionando o que acontece
dentro e fora da pessoa, para determinar bons encontros e grandes
oportunidades, a coincidência ganhou importância científica.
Considerações à parte, o que nos levou a esse devaneio sobre causa e
efeito, eventualidade e destino, foi um fato incomum relacionando duas
mulheres com o mesmo talento: Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas,
conhecida como Cora Coralina, e Vera Lúcia Pinto da Costa ou Vera Pinto.
Excluindo o fato de serem mulheres, elas estão unidas por algumas
coincidências. Ambas nasceram em 20 de agosto. Ambas escrevem poesia
desde garotas. Ambas publicaram suas criações já na idade madura.
O primeiro livro de Cora Coralina foi “Poemas dos Becos de Goiás e
estórias mais”, lançado pela Editora José Olympio em 1965. Ela estava
com 75 anos. O primeiro livro de Vera Pinto é este que está em suas
mãos, uma obra de grande beleza e sensibilidade, que temos o prazer de
colocar na estante das coincidências. Vera acaba de completar 75 anos.
Pelas mãos do sincronismo, nos invade a imensa satisfação de participar
desse evento único, repleto de palavras, de pensamentos, de
sensibilidade, de emoções, de poesia. Com vocês, “Palavras”.
5
Não morre
aquele que deixou na Terra
a melodia de seu cântico
na música de seus versos.
Cora Coralina
Agradecimentos
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SOMENTE PALAVRAS
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SIMPLES ASSIM
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OUSAR VIVER
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SIMPLESMENTE AMOR
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INDOLÊNCIAS
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QUEM NÃO?
Realidade consome.
Horas de agora assustam.
Quero escapar − vazia
e sem combustível,
abastecer-me no ilimitado.
Quero cobrir o impossível com pano,
por ser possível tê-lo.
Sob sombras benditas,
parar de batalhar comigo.
Em insólito lugar, sei da felicidade
e para ela cavalgo horas de recreio
sem hoje e amanhã.
Nada se compara ao repouso,
onde alguém, ao bem-me-ver,
gorjeia palavras doces.
Me chama para dançar.
Bem normal meu jejuar do resto do mundo,
o circular por minha veias
− encolhida e suspensa como fruto verdolengo
com medo de cair −
Dias de pão, dias de sonhos.
Em dias de mais fome,
nutro-me da fala do olhar,
do marulho da voz,
do ausente par.
Em dias anormais a vida segue...
Você sabe como é!
Quem não?
12
R
REVIRAVOLTA
Assim...
Sem coragem de viver personagens e profecias.
(Sem voar pelo encerado da vida,
como saber o rosto do destino
a cada quina além soleira?)
Assim − sisudez de entardecer nublado,
olhar de janela sem visão para a dança dos ventos,
barco desalentado sem ilha de mistérios.
Surdez aos adágios de Vivaldi.
Assim − buscando saídas,
porém mais frágil do que manuscritos perdidos
nos bolsos das grutas.
Assim, assim − até ajeitar o nó das ideias urgentes.
Até o amor vesti-lo com capa de herói
e fazê-lo sobrevoar castelos
e campos desmesurados.
Levá-lo a conhecer a incrível voz rouca dos cometas
num infinito impensável.
E no mais extremo dos limites −
a divisória que separa o escuro
do clarão das estrelas matutinas.
13
A
ATRAÇÃO
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FUTURO DO PRETÉRITO DO INDICATIVO
Vasculharia a madrugada.
Sondaria suas entranhas.
Circularia em suas veias,
Se pudesse descobrir,
no sangue nobre circulante,
pistas...
Para onde vai?
O que faz?
Com quem fica?
(Mas ela não deixa marcas!)
Quando segue itinerário do silêncio,
para trocar verbos com silhueta do amanhã,
em algum momento vacila, estremece?
Lágrimas lhe caem dos olhos jabuticabas,
ao subir degraus da escadaria?
(Será que busca a luz ou adormece em si?)
Diante do ter de ir sem escolha,
penso se descrê, titubeia, duvida de não voltar.
Esquadrinharia milímetros de sua pele.
Revolveria chãos de terra negra.
Esmiuçaria pensamentos.
Seguiria igual viagem para desconhecido tempo
construído no ar
− entre camadas de mistérios −
não fosse a óbvia certeza de que morreria de saudades,
caso o veludo azul-marinho deixasse de cobrir meus sonhos.
Iria com ela, não fosse a aurora que me chama.
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ENTREMOMENTOS
Deslize mortal...
De repente, ponteiros zonzos
descompreendem as horas.
Fio fugido da agulha para de tecer.
Água da mina, num gole sufocante,
bebe o mar.
(Quem nunca, quem não?)
Súbito − porque raios foscos não devem
desanimar as manhãs,
surgem flautas, despontam luzes
em agradeceres ao amor inserido
− tantas vezes despercebido −
entre casca e fruta,
entre claridade vazada dos verões
pelos galhos do limoeiro.
Súbito − antes que memória embote,
eis reconhecimento por felicidade desvista,
sempre encantada e florida,
a passear por corpo insensível.
(Quem nunca, quem não?)
Entre momentos de mãos esvaziadas
de flores, velas, luas, estrelas,
(Absoluto vazio.)
oferto coleção de nadas.
Poesia sem palavras.
Palavras sem palavras.
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ADIAMENTOS
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PEDIDOS
Meio a meio.
Da santidade dos santos.
Da insanidade dos loucos.
O todo de tudo que foi prometido
− céu, mar, terra.
Chegou em miúdos
e não saciou fome e sede.
Preciso hoje da água contínua,
enxurrada de vogais,
enchente de consoantes,
palavras ainda por conhecer.
Mar onde possa mergulhar
em êxtase.
Nele, ilhas de versos e rimas.
Preciso dos ventos bons,
Que envergam bambus.
E da brisa, que leva a neblina
para perto, para longe...
Não importa.
Um lugar onde possam viver comigo
outras aventuras.
Preciso, agora, de um corpo tranquilo,
braços abertos em cama quente,
sonhos em asas diáfanas.
Do fruto proibido.
Do exótico e da flor mais simples,
que nem nome tem.
Do cristalino.
Um gole do diabólico.
(Talvez mais do que um gole...)
É muito!
Pode ser mais do que pardais
voltando ao entardecer.
Preciso da loucura dos santos
e da santidade dos loucos.
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DE REPENTE
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AVALIANDO
E se nossos sonhos
morrerem de frio por falta do agasalho
de outros corpos?
Por jejum de beijos, fenecerem
Esquálidos?
E, se em dado momento,
voarem além do que suportam?
E se forem ridículos,
a ponto de nos jogarem do alto das nuvens?
E se brigarem entre si,
todos querendo o primeiro lugar,
a primeira fileira do transe?
E se uns amadurecerem,
outros morrerem mangas verdolengas?
E se a vida só nos der sonhos
em preto e branco?
E se forem eróticos...
Comprometem?
Vale sonhar sonhos sem nexo.
Sem significado.
Rasos. (Rasos têm mais luz?)
Absurdos?
Conscientes?
Inconscientes?
Indiferentes?
Vale tudo...
Sem sonhos, sobra a realidade pesada
De sermos corpos com asas trincadas.
20
POETA
Quem se explica.
Quem não pode ser explicado.
Quem é movido a música.
Quem se alimenta de silêncio.
Quem colhe o único fruto.
Quem prefere todo o pomar.
Quem busca poesia na pele.
Quem a procura dentro, lá dentro de si.
Quem guerreia pelo pão do dia
e depois sai a cantarolar cigarras,
há de eternamente poetar.
Quem fica, poetisa o ficar.
Poeta é quem emudece
e quem grita para relampejar ideias.
É o santo habitante das esquinas
e o louco que se desabita.
O que se encontra,
se desencontra,
se constrói,
se desmorona...
Poeta− Quem vive agarrado a um fio!
(Vale a paixão por uma saída.)
Poeta− Quem se embriaga com o viver
e sobrevive às tediosas horas monocromáticas.
Poetas somos todos!
Inteiros versos.
Versos em pedaços.
Rimas grafitadas nos muros
e no avesso de nós mesmos.
(Mesmo sendo poeta de temporadas
alternadas de seca e cio!)
21
REALIDADE FAZ DE CONTA
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FUGA
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SEMEANDO ILUSÕES
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AMBÍGUOS
Um toque sutil.
O mais leve.
Apenas um roçar de cílios
na capa do travesseiro.
E o silêncio vai embora!
Receio que volte em ruídos
de agulhas, fogo, esporas.
Ou com olhar sonolento
− mormaço e preguiça −
roube minhas visões
do verde mar e suas dunas.
Ambiguidade...
Traço comum nos une. Engole.
Não! Não corro riscos!
Acenei bandeira branca.
Jurei viagem sem turbilhões
que nos convulsionam.
Infartam.
Hoje, quero descompreender
nossos desencontros.
Ao silêncio lá de fora
e ao meu silêncio... Trégua!
Seremos duas vozes amigas
falando em uníssono.
Não! Por hoje, não corremos riscos.
25
ALTERNÂNCIAS
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TURQUESA
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VIDA NOVA
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DUVIDOU
29
EXATIDÃO
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QUANDO?
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ORAÇÃO
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VÉSPER
Conte
por onde perambulas à noite
com asas de gaivotas brancas,
sem hora de partir,
sem horário de voltar.
Diga
até onde arriscas chegar,
até onde atreves subir
sem cordames e andaimes.
Um artista circense.
Um marinheiro.
Um músico.
Um cínico.
Um ser ausente.
Até um fugitivo de si mesmo podes ser,
desde que dividas comigo
o que te surpreende e arrebata.
Eu falo.
Consigo revelar.
Uma escalada noturna me deixa em êxtase.
Leva a tristeza embora,
enche meus olhos de brisa,
me dissolve em encantos,
me contamina de amor.
Não me inveje. Vou onde estás.
Toda noite subo até Vésper,
− a primeira estrela −
para me encontrar contigo.
33
ATO CONTÍNUO
Empresto-me a mim,
ao primeiro pingo de luz
caído de céu bocejante.
Desembrulho-me aos poucos.
É lento o pousar no tempo.
Lenta a rendição ao sol abrasador.
Lenta é a marcha.
Mas segue o rufar dos tambores
na cidade repleta de nãos
salpicados no asfalto.
34
OLHARES
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PERDÃO
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TUDO COMO DANTES
O que te prometo?
Mãos cheias de estrelas,
sóis e sonhos acesos.
Crianças, florestas, água, vinho.
Auroras e poentes intercalados
por solidão.
Casa e alma cheias de alegria.
Bonança e tempestade.
A flor seca do campo, a bem cuidada,
que será levada na enchente.
Da primeira à última gota do tempo,
te darei a porta certa e a outra,
que não vale a pena ser aberta.
No calendário novo,
pelos homens inventado,
sons afinados de orquestras
e ruídos de terras ácidas.
Nele, um Cristo crucificado agoniza.
Ou...
Eternamente Vivo, regará teu chão
e a grama dos verdes mugidos.
Nas horas novas, cheirando a leite,
escreverei − em amorês legível −
o que supões estar em aramaico.
Em papel alegria,
ou na folha sem cor dos ares,
prometo a ti,
nas primeiras horas do ano chegante,
(de tenra carne e sentimentos puros)
unicamente o possível.
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EXIGÊNCIAS
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CONVITE
Passe em casa.
A saudade é tanta, tanta,
que emergências se escrevem
nas paredes do tempo insano.
O café esperou, para servir cafeína
aos seus risos floridos.
Para balançar seus balanços,
a rede não trocou de paisagem
e o velho saveiro está aportado
nas frases sem letras do quarto.
A varanda, de costas para equações
irresolúveis,
é a mesma que vê folhas farfalhando
e não desistiu da sua volta.
(Aliás, fez mil planos para se amarrar
aos seus galhos, de setembro a setembros.)
Passe em casa!
O Sol − fome do pão das manhãs perfumadas −
esperou por tantos meses sua volta,
que escorre do telhado, aos gritos!
Passe hoje?
Relógio medroso dos invernos
quer abelhas passeando açúcar
pelos ponteiros solitários.
Passe agora!
A saudade é tanta, tanta...
Ah! Tamanha é a saudade,
que deixei a porta aberta para a histórica visita.
Vou até a esquina buscar mais sonhos.
Me espere. Fique!
Pode ser?
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SONHO?
40
AO LADO
41
SOLSTÍCIOS
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ALVARÁ
Pediu licença
para matar o choro,
adoçar a vida
e fixar estrelas cadentes
meio gastas, meio bambas,
de sonhos que já nem eram tantos.
Estendeu a mão,
apaziguou revoltas,
assoprou machucados −
vagalumes
que voaram acesos
para viagem sem volta.
Licença mais sem sentido!
O amor tem autorização,
mesmo séculos atrasado,
para entrar e ficar.
Tomar posse dos corações
por herança ou usucapião.
Da última hora fará hora primeira.
Da página em branco, um clássico.
Cem Anos de Solidão − de Marques,
cem anos de amores
noites adentro.
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DESAPRESSADA
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INQUIETAÇÕES
45
PARADEIRO
46
RESPOSTA
47
RELÓGIO DE DALÍ
Bem sei.
Quando clarear o amanhã,
nada será igual ao agora.
Os sonhos já terão ido embora,
quando as horas acordarem
para o abrir de novas flores.
Não mais o mesmo viço
ou a cor deste momento.
Serão outros os azuis
e outros os zumbidos dos besouros.
No afã de viver,
pouco sei dos meus passos.
Terei visto lágrimas enxugadas
em olhos que miravam o nada?
Minha urgência e a do relógio
− idêntica fúria tresloucada −
escorreram pelas paredes,
enquanto apressávamos
a tessitura da teia da vida.
Ah, nosso agir sem calma
registrou poucas minúcias...
Sei bem o que perdi.
Perdi o canto da cigarra,
a florescência do cacto,
o beijo do colibri na flor.
Perdi a flor...
48
ASSIM SERÁ
49
INSIGHT EGOÍSTA
50
INDEFINIÇÃO
51
ESCOLHAS
52
MISTURA PERFEITA
53
TURISTA
54
DIA DE SOBREVIVER
55
INFINITO?
56
PERGUNTAS DEMAIS
57
ATÉ QUANDO?
58
EXISTE
Removo montanhas.
Afasto espelhos e altares.
Eu sei... O que busco, existe!
E não virá numa estrela azul
ou no vento sul,
que passou zunindo
e nenhuma pista deixou
sobre o branco papel dos muros.
Tanta esperança...
Por vezes, parece vazar
e inundar a alma.
Noutras, transmite a calma
das planícies que aguardam
a bênção das chuvas.
Não posso me render
e deixar a desesperança incendiar
projetos e planos otimistas.
Eles não são palha seca de celeiro.
O que sonho, existe!
Talvez esteja escondido
no deslizar das horas,
na quietude das paredes,
naquilo que olho e não vejo
por trás das venezianas...
Existe!
O Criador não falha.
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SEI... NÃO SEI
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Sou peixe de aquário.
Sufoco com zero oxigênio de liberdade.
(Ah, o bem que faz a aragem
açoitando asas.)
Sou antiquada e futurista.
A que envelhece a cada dia
e a cada dia se renova.
O esperançar alimenta a alma
indignada com pó e ferragens
machucando o mundo.
Sei e não sei quem sou.
Creio ser normal ninguém saber
quem foi, quem é, se será...
Portanto, nem estranhe se
ordinariamente me ausento,
me desconecto,
me desinstalo de mim.
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FLORES PERPÉTUAS
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SE SOUBER
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LÁGRIMAS
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QUASE PÁSSARO
Por sobrevivência,
− acomodada nas torres de intermináveis fios −
ando a caçar nuvens.
Tenho dias de ir.
O silêncio traça as rotas.
Ora arrisco viagens longas,
ora sobrevoo terras minhas
de línguas desconhecidas.
Tenho dias de me esconder.
Por ares infindos,
sigo sem deixar rastros,
ocultando-me nos vazios.
Em meio a sonhos e planos
− planos e sonhos −
amo quem quero e...
sequer respiro!
Tenho dias de devanear.
A intervalos de vertigens,
tenho tempo de segurar o sereno nas garras,
bicar os insetos das paixões,
ouvir o zum-zum dos desejos junto às minhas penas.
Dias de ver do alto. Ver do alto...
Linhas do amanhã. Linhas de Nazca.
Linhas que se enrolam sem fim
no carretel dos anseios.
Deuses!
A liberdade confunde ideias.
Traz névoa aos mapas migratórios
e granizo aos sentimentos.
Tenho dias de não saber.
Fico (e me engano!) neste insólito céu inventado
ou despenco serena e lúcida
para a realidade dos naufrágios?
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PASÁRGADA PARTICULAR
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DE ENLOUQUECER
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FORJAR ROSAS
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AMANHÃ
Amanhã
a chuva lavará os lírios.
Momentos de segredos
continuarão como dantes.
Som dos pianos, guizos,
violinos...
O grito estridente do telefone.
Mesmo que o tempo mude,
uivos de lobos e homens serão idênticos.
A rosa será rosa no reflexo
dos cristais e vidros.
Ao raiar do dia, confraria de estrelas
repousará depois da lida.
Amanhã, reprise de lendas,
conversas e ladainhas.
Amanhã,
ao arrumarmos nossa cama,
tudo será como sempre foi.
Embora não sejamos mais
os mesmos.
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À DERIVA
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URGÊNCIA
71
SEM PERGUNTAS
SEM RESPOSTAS
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O QUE SE FOI
Para trás...
Canções que não cantamos.
Cansaço.
Sorrisos esquecidos.
O flamboaiã floriu. Não vimos.
Perdemos luas e vertigens!
Nas terras do ontem,
Deixamos sonhos e veredas,
pedaços de coração e alma.
A palavra que vibrava na garganta,
caída ficou sobre a língua.
Sai... Não sai...
73
FRAGILIDADES
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TRANSPOSICÃO
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PRETENSÕES
Cavalgar tigres.
Cultivar porcelana.
Escrever na água dos regatos.
Usinar lembranças de vidro.
(Encharcar-me ao sol,
secar-me à sombra da chuva.)
Quero o improvável: colher voos,
semear sereno que lave lágrima
por lágrima.
Ouvir cantatas que, riscando céus,
arrastem contendas,
amansem loucos.
Obrigatoriedade para esquecer
tudo que mereça ser esquecido.
O que desalma a alma seja
abandonado
em local
onde não possa mais brotar.
Talvez jogado ao fogo das feitiçarias,
talvez submerso em horizontes
perdidos.
Ser de argila e aço.
Ambiciosa?
Do possível eu tenho!
Deem-me o impossível.
Fibra viável – fio invisível –
Que una meu mundo de quimeras
ad finem
mundo das impossibilidades.
76
ALTO-FORNO
Quem dera
o coração se alimentasse
apenas de sonhos dourados.
Involuntárias são as pedras
vindas na esteira dos dias
até tão exíguo quarto.
Indesejável lava ardente
ocupando espaço,
incômoda e pontiaguda farpa
perfurando sentimentos.
Borbulhante ferro gusa
queimando o inconsciente...
Quem dera
o coração não fosse alto-forno
a engolir o imperfeito,
o inconsequente, o impuro...
Quem dera se trancasse para tudo que leva
a riqueza dos sorrisos...
E se abrisse − escancaradamente se abrisse −
unicamente
para a entrada dos pássaros.
77
ALICE
Adormeça o despertador.
Sem pudores, sem temores,
embarque e seja a menina pura
de flor nas tranças.
Ou melhor, seja você
em nave estelar
− pirotecnias pelos ares.
A bailarina, a amante,
a gueixa, a santa, a nem tanto...
(Ao acordar, desista de buscar simbologias
do que há por trás de insólitas figuras...)
O amor será seu guia por locais
distantes das indiscrições.
Aliás, e é fato,
jornada de visionário
nenhum marisco delata.
Bem-te-vis são surdos-mudos!
Com transparência de água,
atravesse vales únicos.
Incógnita, durma nas praias,
cartões-postais
que submergirem da memória.
Embriague-se.
Embrenhe-se na mata e mate horas erradas.
Exilada em si − deixe o sopro da claridade
durar o tempo do sempre.
Sonhar é deixar o coração livre
para reconstruir as horas.
Assombre-se.
Viva a lógica do absurdo de Alice.
Sonhe até perder o fôlego!
78
CLICHÊS
Tudo igual.
O som da água na pia.
Incredulidade no espelho.
O gosto do creme dental.
A falta de rostos à mesa.
Café e pão.
Café e pão.
Café e pão.
Tudo exatamente igual...
Na tarde quente, o sono do cão.
Nuvens carrancudas prevendo
temporal assustador de árvores.
De árvores e gentes!
Café e pão.
Café e pão.
Café e pão.
Cai a noite...
Em algum lugar sobe a febre dos amantes.
No cio do silêncio caio em mim.
Insônia.
Insônia.
Insônia.
A mente um isqueiro!
E o relógio insensível
a soletrar coisas ininteligíveis.
E uma voz em impossível dialética
soprando o que não posso repetir.
− Hipnose, por favor.
79
ALIENÍGENAS
Ponto final.
Reticências...
Seguiremos assim.
Como ontem soubemos.
Como se não soubéssemos
que hoje somos
meio inteiros.
Inteiros falhos.
Folhas trêmulas.
Flores acesas entre ramos
de insensatez e devaneios.
Somos amor.
Somos tóxicos.
Somos secos.
Parimos poemas!
(Confissão desnecessária, mas que acalma
a alma em dias de céu opaco...)
Ainda ousamos − ímpar atrevimento −
a consistência nos solos insólitos das nossas luas.
80
INTERVALO
81
ESTRATÉGIA
82
MAS VENHA!
Se não hoje...
Amanhã, talvez?
Porta aberta, sempre aberta,
espera por você com ansiedade.
Serei eu, totalmente eu e completa,
se no verão das mangas,
na época das monções,
do plantio, da colheita do trigo,
você chegar com passos encharcados,
ou desorientado pelo calor
a derretê-lo de cansaço.
Se não for pós-amanhã,
ou depois do depois sem data,
me contentarei em vê-lo.
Quando branquearem as árvores.
Quando eu já não for a mesma.
Quando você for outro.
Até quando a memória recordar
que jamais deixamos de ser um do outro,
esperarei seus abraços.
Chegue em dias pares, ímpares,
dias de Lua, noites de Sol a pino...
Se não hoje,
− neste agora em que morre o velho ano −
que seja então a qualquer momento
de qualquer momento dos novos anos.
Mas venha!
Desenhei porta de giz.
Abra-a! Não há tranca.
Entre de repente.
E ceie comigo na noite sem meia-noite.
83
TIMIDEZ
84
DESILUSÃO
85
DESCAMINHOS
Rota 66 da felicidade.
Miragem...
Entendo agora quem sabe das estradas
e feito concha fechada e muda
nada diz.
Se cala...
Somente eu, andando por descaminhos,
encontrarei caminhos que não sei.
Volto ao espaço.
E que não seja inútil
a busca por um chão de palavras.
Talvez me veja próxima à fronteira
onde verbo sem nome − ou uma seta −
me oriente a me encontrar comigo.
86
SIM OU NÃO
O galope do amanhã,
tão perto que se faz ouvir,
vem pronto para ultrapassar a barreira das horas.
Quem há de ignorar... Virá, é certo!
Mas é necessário exercitar a surdez,
ficar um pouco mais preso ao ontem,
aninhado em tempos de enlaces.
Desse tempo de agora, que hipnotiza.
E dele não abrimos mão.
Faltam luzes que iluminavam caminhos.
(Não?)
87
SOBREAMOR
88
BRAILLE
89
PROCURA-SE
90
O QUE É MEU
91
92
ÍNDICE
SOMENTE PALAVRAS 7
SIMPLESASSIM 8
OUSAR VIVER 9
SIMPLESMENTE AMOR 10
INDOLÊNCIAS 11
QUEM NÃO? 12
REVIRAVOLTA 13
ATRAÇÃO 14
FUTURO DO PRETÉRITO DO INDICATIVO 15
ENTREMOMENTOS 16
ADIAMENTOS 17
PEDIDOS 18
DE REPENTE 19
AVALIANDO 20
POETA 21
REALIDADE FAZ DE CONTA 22
FUGA 23
SEMEANDO ILUSÕES 24
AMBÍGUOS 25
ALTERNÂNCIAS 26
TURQUESA 27
VIDA NOVA 28
DUVIDOU 29
EXATIDÃO 30
QUANDO? 31
ORAÇÃO 32
VÉSPER 33
ATO CONTÍNUO 34
OLHARES 35
PERDÃO 36
TUDO COMO DANTES 37
EXIGÊNCIAS 38
CONVITE 39
SONHO? 40
AO LADO 41
SOLSTÍCIOS 42
ALVARÁ 43
DESAPRESSADA 44
INQUIETAÇÕES 45
PARADEIRO 46
RESPOSTA 47
93
RELÓGIO DE DALÍ 48
ASSIM SERÁ 49
INSIGHT EGOÍSTA 50
INDEFINIÇÃO 51
ESCOLHAS 52
MISTURA PERFEITA 53
TURISTA 54
DIA DE SOBREVIVER 55
INFINITO? 56
PERGUNTAS DEMAIS 57
ATÉ QUANDO? 58
EXISTE 59
SEI... NÃO SEI 60
FLORES PERPÉTUAS 62
SE SOUBER 63
LÁGRIMAS 64
QUASE PÁSSARO 65
PASÁRGADA PARTICULAR 66
DE ENLOUQUECER 67
FORJAR ROSAS 68
AMANHÃ 69
À DERIVA 70
URGÊNCIA 71
SEM PERGUNTAS SEM RESPOSTAS 72
O QUE SE FOI 73
FRAGILIDADES 74
TRANSPOSICÃO 75
PRETENSÕES 76
ALTO-FORNO 77
ALICE 78
CLICHÊS 79
ALIENÍGENAS 80
INTERVALO 81
ESTRATÉGIA 82
MAS VENHA! 83
TIMIDEZ 84
DESILUSÃO 85
DESCAMINHOS 86
SIM OU NÃO 87
SOBREAMOR 88
BRAILLE 89
PROCURA-SE 90
O QUE É MEU 91
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Este livro foi impresso
na Gráfica Allcor
em outubro de 2019.
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