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A Internet como Memória

João Messias Canavilhas


Universidade da Beira Interior

Índice jecto, desenvolvido pelo Media Presence Re-


search Group, recupera uma ideia de Van-
1 Introdução 2 nevar Bush que, num artigo3 publicado em
2 A Memória no Homem e na Internet 2 1945, introduziu o termo “Memex”4 para de-
3 Arquivo e Memória social 5 signar um equipamento digital que permitiria
4 Jornalismo e memória na Internet (+ arquivar livros, mensagens, gravações e co-
sobre jornalismo digital) 6 municações pessoais, dispondo ainda de um
5 Conclusão 7 sistema de pesquisa rápido e flexível.
6 Bibliografia 8 Um e outro caso são exemplos que se jun-
tam às dezenas de fóruns de discussão, às
Abstract: No dia em que a British Pathe1 centenas de bibliotecas e museus on-line e
colocou todo o seu arquivo na World Wide aos milhares de mass media que todos os
Web foi dado mais um importante passo no dias colocam na web informações sobre os
sentido da afirmação da Internet como me- acontecimentos mais marcantes do dia. Mas
mória colectiva da Humanidade. Cerca de esta enorme quantidade de informação dis-
quatro horas depois do lançamento do site já ponível não é, só por si, uma marca distintiva
se registavam cerca de 15 mil acessos e 3500
downloads de filmes. gação) uma base de dados pessoal de memórias digi-
Outro projecto que revela a importância da tais que pretendem “arquivar” conversas telefónicas,
mensagens de correio electrónico, páginas web visi-
Internet como memória é o projecto MyLi- tadas, fotografias digitais, compras on-line, vídeos ou
feBits2 , liderado por Gordon Bell. Este pro- músicas.
1
3
Artigo publicado na Atlantic Monthly no 176
A British Pathe é uma das mais antigas empresas /Julho de 1945 e mais tarde desenvolvido no livro
de media e as suas raízes remontam a 1902. Em 1910, As we may think, Endless Horizons, Washington DC,
a Pathe iniciou a produção da Pathe Gazette, um bo- Public Affairs Press, 1946. O livro inspirou persona-
letim informativo em película que era transmitido nos gens míticas como Douglas Engelbart (o inventor do
cinemas antes dos filmes. Até 1970, data em que a rato e dos interfaces amigáveis, por exemplo) ou Ted
empresa abandonou a actividade, a Pathe acumulou Nelson, que introduziu palavra "hipertexto"no mundo
cerca de cem mil histórias que em conjunto perfazem científico em 1965.
cerca de 3500 horas de história do século XX. Este 4
O Memex era um dispositivo baseado em tecno-
espólio foi colocado online no dia 19 de Novembro logia microfilme que nunca chegou a ser construído.
de 2002. É unanimemente considerado o avô analógico dos ac-
2
A ideia do projecto MyLifeBits é alojar num ser- tuais hipertextos digitais.
vidor da Microsoft (a empresa que financia a investi-
2 João Messias Canavilhas

da Internet em relação aos outros mass me- cura de fotos, por exemplo, está sujeita ao
dia. O que a distingue é a possibilidade desse sistema de indexação estabelecido pelo ar-
arquivo ser imediato e global, reduzindo o quivista. O que pesquisa é o nome do fi-
espaço e o tempo a um momento. cheiro e não o conteúdo dele.
No caso imagens em movimento a
questão ainda é mais pertinente na medida
1 Introdução
em que vários segundos de imagem estão
Apesar da inegável possibilidade da Internet catalogados numa tipologia genérica sendo
funcionar como uma memória colectiva de impossível referir todos os pormenores
cariz global e imediato, há pelo menos qua- década frame do bloco de imagens.
tro características identificadas por Gordon
Bell [cf. B ELL, s/d] que podem constituir Usabilidade – É essencial que as mensa-
um obstáculo à utilização da Internet como gens visuais guiem o utilizador na procura
memória. de informação. Uma base de dados digital
deve responder a quatro perguntas funda-
Longevidade do suporte – Se o papel mentais: Onde estou? Até onde posso ir?
pode resistir séculos e a película décadas, Como chego lá? Como regresso a um ponto
os formatos digitais deixarão de ser legíveis anterior?
dentro de 10 ou 20 anos. Não está em causa
a qualidade dos suportes de armazenamento Estas quatro questões são de ordem téc-
mas as tecnologias que, ao ritmo actual, den- nica, mas têm repercussões na arquitectura
tro de duas décadas estarão completamente e sintaxe5 dos sistemas. Pouco adianta que
obsoletas. Os conteúdos digitais obrigam a base de dados contenha muita informação
conversões para novos formatos porque se o utilizador não conseguir aceder a ela de
os antigos formatos desaparecem muito uma forma amigável. O objectivo de qual-
rapidamente. As disquetes, por exemplo, quer sistema é permitir que o indivíduo cum-
são hoje um suporte obsoleto para quem tem pra um processo interactivo completo sem
um Macintosh. que se registe qualquer breakdown6 .

Acesso – O acesso à informação pessoal


2 A Memória no Homem e na
deve ser rápido e confidencial. No caso das
informações pessoais exige-se privacidade. Internet
No que concerne à produção intelectual é Ao analisarmos a memória devemos sepa-
importante que se consiga manter algum rar dois aspectos distintos: por um lado a
controlo sobre o acesso e utilização dos memória-arquivo, por outro o mecanismo –
conteúdos disponíveis nas bases de dados.
5
Por sintaxe entende-se a sequência de acções que
o utilizador da Internet deve executar para atingir o
Ferramentas de pesquisa para informa- seu objectivo.
ção não textual – Um dos problemas que 6
Sequência de acções incorrecta.
ainda se tenta resolver neste momento é a
pesquisa de informação não textual. A pro-

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fisiológico ou numérico – que permite a pes- morta, isto é, uma página web que aparece
quisa. referenciada pelo motor de busca mas que
i. Hardware: na internet entende-se por depois não está disponível naquele endereço.
hardware o conjunto de todos os componen- Esta situação é semelhante ao funcio-
tes informáticos do servidor, com particular namento da memória humana descrito por
destaque para os discos onde se estão aloja- Santo Agostinho nas Confissões. [cf. S.
das as páginas web. No caso do corpo hu- AGOSTINHO 20018 ]
mano entende-se por hardware o cérebro por “Se, por acaso, alguma coisa, como qual-
ser esta a estrutura que guarda a informação. quer corpo visível, desaparece da vista, não
ii. Software. Na internet, o browser e a da memória, conserva-se interiormente a sua
base de dados são os softwares que permi- imagem e, procura-se, até que seja resti-
tem a navegação e a pesquisa de informação, tuída à vista. Logo que for encontrada, é re-
respectivamente. No corpo humano os senti- conhecida pela imagem que está dentro de
dos funcionam como browser e a recordação nós. Não dizemos que encontrámos o que
como base de dados que organiza na memó- estava perdido, se não o reconhecemos, nem
ria as imagens das coisas. o podemos reconhecer, se não nos lembrar-
Esta analogia entre hardware e o software mos: mas aquilo que, de facto, estava per-
dos seres de carbono e os de silício pode ser dido para os olhos, conserva-se na memória.”
estendida a outros campos. Na verdade é [S. AGOSTINHO 2001; 253]
possível verificar a existência de semelhan- A memória, tal como a web, perde in-
ças e dissemelhanças entre o funcionamento formação, embora acabe por manter sempre
da memória no homem e na internet. uma ténue ligação que poderá, em determi-
nadas situações, permitir a recuperação da
2.1 Semelhanças informação. No caso do Google, essa liga-
ção é a referência que nos é oferecida na pes-
Uma das semelhanças relaciona-se com o
esquecimento, considerada como a forma usado actualmente. Os criadores do Google introduzi-
ram o conceito de PageRank para hierarquizarem os
fisiológica da memória apagar dados. Na
resultados de uma procura. O princípio utilizado é
web o esquecimento está geralmente relaci- simples: quanto mais ligações houver para uma de-
onado com a quebra das hiperligações. A terminada página, mais importante deve ser. Assim,
frase “The page cannot be displayed” signi- quando alguém faz uma pesquisa no Google recebe
fica que uma determinada porção de infor- um conjunto de páginas onde a palavra procurada (na
url, título, texto, etc) aparece, sendo que a primeira
mação, isto é, uma parte da memória, não referência é a página com mais links apontados. O
está disponível porque mudou de local ou Google tem um robot que pesquisa continuamente a
porque o servidor onde se encontra guardada web à procura de novas páginas fazendo o download
está desactivado. Uma situação muito ha- parcial (web crawling) para os servidores. Nos servi-
bitual quando se faz uma procura num mo- dores essas páginas são comprimidas e indexadas para
que a resposta a uma pesquisa tenha uma duração en-
tor de busca7 é encontrar uma hiperligação tre 1 e 10 segundos).
8
7
Para este estudo tomámos o motor de busca Goo- 2001 é o ano da tradução para português da obra
gle como referência. Para isso vamos explicar, de uma Confissões.
forma simplificada, como funciona este motor, o mais

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quisa, que prova a existência da página, mas Na web a representação espacial da


não nos permite recuperar a informação. temporalidade assume contornos diferentes:
A catalogação é outro ponto em comum passado e presente passam a compartilhar a
entre a memória na web e a memória hu- mesma natureza, pois o passado assume tam-
mana. No caso da web a organização - cata- bém uma das propriedades do presente ao es-
logação - é feita por palavras-chave. A pes- tar disponível na memória da web. Podemos
quisa da informação é efectuada por compa- assim dizer que passamos a ter um passado-
ração entre a palavra introduzida no campo presente e um presente-presente.
da procura e a existência dessa palavra num Isto quer dizer que a web, mais do que ne-
dos ampos definidos para pesquisa: url, nhum outro meio, comprime o tempo. Não o
texto, título, domínio, etc. tempo que mede o espaço entre a emissão e
No caso da memória humana a cataloga- a recepção da mensagem, tal como acontece
ção é feita a partir da informação recolhida em qualquer media, mas o tempo memória,
pelos sentidos que funcionam como inter- o espaço existente entre o momento do acon-
face. “Ali (na memória) estão arquivadas, de tecimento e o momento da pesquisa.
forma distinta e classificada, todas as coisas Outro ponto de afastamento entre a me-
que foram introduzidas cada uma pela sua mória humana e a memória na web é a re-
entrada: a luz e todas as cores e formas pelos lação importância/duração de um aconte-
olhos; todas as espécies de sons pelos ouvi- cimento. A memória humana retém sobre-
dos; todos os odores, pela entrada do nariz; tudo o momento do acontecimento. Quando
todos os sabores, pela entrada da boca; e, nos recordamos de algo não temos imedia-
pelo sentido de todo o corpo, o que é duro, tamente presente a duração desse aconteci-
o que é mole, o que é quente ou frio, o que mento mas sim o acontecimento em si. Se
é macio ou áspero, pesado ou leve, quer ex- tivermos um acidente de viação, o que rete-
terior, quer interior do corpo.” [S. AGOSTI - mos na memória é o momento do acidente e
NHO 2001; 242] as suas consequências, não o tempo em que
toda a acção decorreu. Este facto marca uma
2.2 Diferenças diferença fundamental em relação à memó-
ria na web. Tomemos como exemplo o de-
Há, no entanto, vários aspectos em que a me- sastre do Prestige. Se procurarmos na nossa
mória na internet se afasta do esquema de memória marcas desse acidente destacamos
funcionamento da mente humana. dois momentos: um primeiro marcado pelo
Ao imaginarmos a representação espa- afundamento do navio e um segundo assina-
cial de linha do tempo conseguimos per- lado pela chegada do fuelóleo às praias da
ceber que passado e futuro compartilham a Galiza. Eventualmente estes dois momen-
mesma natureza. Os extremos da linha – tos podem ser completados com algumas re-
direita e esquerda – são dois infinitos ma- miniscências das notícias lidas, escutadas ou
temáticos. Já o presente tem uma essência vistas.
completamente diferente pois para o Homem Vejamos agora a memória na web: escre-
existe apenas como um ponto, o exacto mo- vendo a expressão “petrolero Prestige” no
mento em que vivemos.

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A Internet como Memória 5

pesquisador Google obtemos 9.1709 referên- seu cariz técnico. A memória começa a
cias. Estas referências reportam-nos para exteriorizar-se e a autonomizar-se do ho-
cada momento dos acontecimentos, emer- mem, materializando-se em suportes manus-
gindo um fenómeno contínuo. (+) critos e inscrições em monumentos. Estas
Esta continuidade marca uma ruptura em inscrições em lugares públicos de alto valor
relação à memória humana, caracterizada simbólico a que Pierre Nora [1992] chamou
por dois pontos, eventualmente ligados por “lugares de memória” tornaram-se na base
outros pontos, mas sem pontos de união (+) das identidades sociais, políticas e culturais,
entre si. Já a memória na web poderá ser constituindo-se como a memória social está-
representada por uma sequência ininterrupta tica e impossibilitada de ser organizada.
não cronológica. Os livros, por seu lado, continuaram du-
rante muito tempo a servir apenas como
apoio mnemotécnico. Só a invenção da
3 Arquivo e Memória social
imprensa de Gutemberg permitiu o acrés-
Durante muito tempo o conceito de memória cimo do número de livros em circulação,
esteve ligado ao campo da psicologia indivi- libertando-os da sua simples função de
dual. No entanto alguns autores, como Paul apoio. A partir do séc. XVIII surgem os di-
Ricoeur [cit. VARELA 2000; 5], referem que cionários e enciclopédias através das quais
as nossas recordações são, presumivelmente, o conhecimento começa a surgir organizado
relatos que nos foram contados por outras por tópicos, facilitando as pesquisas de in-
pessoas. O recurso de um indivíduo às re- formação. O livro passa a desempenhar tam-
cordações de outros faz com que a memória bém o papel de memória colectiva, organi-
individual seja, também, uma memória co- zada, pesquisável e dotada de mobilidade.
lectiva na medida em que se alicerça num O crescimento exponencial do número de
conjunto de memórias que passam de gera- livros vai também incrementar o apareci-
ção e geração, sendo compartilhadas por vá- mento de bibliotecas e arquivos o que contri-
rios indivíduos que tomam contacto com elas bui decisivamente para a sedimentação desta
através da escrita ou da oralidade. memória social de grande dimensão. Mónica
Nas sociedades sem escrita, a memória era Nunes diz que “o arquivo, inegavelmente,
fundamental na transmissão dos saberes. A representa o conhecimento que está organi-
memória colectiva dependia do processo bi- zado em memórias fora do corpo do homem
ológico interno de determinados indivíduos em forma de técnicas e tecnologias, das nar-
que, que por serem detentores de um deter- rativas míticas às bibliotecas digitais. E, em-
minado dom, funcionavam como guardiães bora se reconheça na cultura dos media os
da memória social do grupo. avatares da paixão arquivista, não será este o
Com a passagem a oralidade à escrita, fulcro da discussão para tratarmos das ope-
dá-se a dessacralização da memória, en- rações da memória nos media.” [N UNES
quanto processo biológico, acentuando-se o 2001;21]
9
É essa mesma dimensão que vai obrigar
Pesquisa efectuada no dia 15 de Abril de de 2004
no motor GOOGLE. à implementação de sistemas de catalogação
e pesquisa que facilitam a vida dos utiliza-

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dores destas bibliotecas: primeiro através de por causar alguma entropia no sistema, le-
fichas em papel, mais tarde através de sis- vando à dissociação destes dois conceitos.
temas electrónicos, mas sempre sujeitos ao Como refere Dominique Wolton [cf. W OL -
constrangimento do espaço e do tempo. A TON 2000], a difusão deixou de ser uma con-
procura de informação implicava a presença dição natural de partilha já que a comunica-
física no local do arquivo e o processo de ção funcional passou a remeter mais para a
pesquisa era moroso. troca de informação no seio de sociedades
O nascimento da internet veio facilitar o complexas e para a divisão do trabalho. Esta
acesso à informação ao rebater em simultâ- especialização, se assim lhe quisermos cha-
neo as barreiras do espaço e do tempo. Por mar, contraria o conceito de partilha, associ-
um lado o acesso passa a ser global na me- ado à universalidade da comunicação.
dida em que a informação está disponível na De certa a forma a web vem relançar a li-
web. Por outro lado as bases de dado permi- gação ontológica entre os sentidos normativo
tem que os processos de pesquisa acelerem e funcional da comunicação pela necessi-
e se refinem: de uma assentada passa a ser dade de organizar a grande quantidade de in-
mais rápido e mais preciso conseguir aceder formação disponível. Os portais, por exem-
à informação disponível nos milhões de pá- plo, são uma tentativa de associar o conceito
ginas web. Este manancial de informação re- de partilha ao de difusão. Motores de busca,
presenta uma memória social, dinâmica, or- como o Yahoo ou o Altavista, permitem a
ganizada e navegável que nos remete para os pesquisa por palavra mas também por tema,
dois sentidos fundamentais da palavra “co- oferendo uma organização vertical que su-
municação”: blinha o sentido normativo da comunicação.
i. por um lado o sentido normativo associ- A organização temática simplifica o acesso
ado à ideia de comunhão e de partilha. É esta a quem procura aquela informação e facilita
a noção imediata da palavra comunicação já a navegação para os que só acidentalmente
que a associamos a uma partilha de informa- passam pela página auxiliando assim a parti-
ção entre o emissor e o(s) receptor(es). A lha com elementos externos ao grupo sócio-
ideia de partilha torna-se ainda mais funda- profissional ao qual se destinava.
mental quando o número de receptores au-
menta significativamente, tal como sucede
4 Jornalismo e memória na
na internet.
ii. por outro lado, este aumento do uni- Internet (+ sobre jornalismo
verso de receptores está intimamente ligado digital)
ao sentido funcional da comunicação, que
O jornalismo10 na internet pode ser analisado
por seu lado está associado aos conceitos de
em dois planos distintos:
transmissão e difusão. O desenvolvimento
10
dos meios mecânicos de reprodução veio su- Por jornalismo na Internet entende-se todo o tipo
blinhar o sentido funcional da comunicação, de informação jornalística que circula na web, inde-
pendentemente de tirar partido das características do
pois permitiu uma difusão maior do livro
meio (webjornalismo) ou utilizá-lo apenas como su-
e, posteriormente, da imprensa. Mas o au- porte.
mento da informação em circulação acabou

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A Internet como Memória 7

i. Por um lado alimenta a memória da temas de busca, que os dados aflorem rapi-
web graças ao arquivo das notícias que di- damente à superfície. É isto que faz com que
ariamente são colocadas on-line. se possa manejar com celeridade e segurança
ii. Por outro recorre a alguns dos serviços uma quantidade de informação impensável
da internet como apoio: o mail para efectuar de ser oferecida por um meio convencional.
contactos e a web como background para a É justamente nesta terceira característica
contextualização e actualização das notícias, que a internet mais se distingue dos outros
são dois exemplos. media. Luís Nogueira [2002; 15] refere que
A questão da contextualização assume “em relação aos media tradicionais, em que o
particular importância na medida em que a arquivo não estava disponível em tempo real,
natureza hipertextual da internet lhe permite a grande vantagem da internet é que a capaci-
o enriquecimento das notícias, contrariando dade de indexação, aliada ao poder de com-
assim um dos problemas do jornalismo ac- putação e de armazenamento da informação,
tual: a compatibilização da velocidade da in- torna toda a informação virtualmente imedi-
formação, com o espaço disponível e com ata.” Marcos Palácios [cf.2002] chama a esta
a riqueza das informações disponibilizadas. possibilidade de acesso imediato à informa-
Numa entrevista recente Mário Mesquita11 ção “memória múltipla, instantânea e cumu-
defendia que “falta à imprensa uma certa lativa” sublinhando ainda com esta expres-
memória”, alertando ainda para o perigo de são o carácter “arquivista” resultante da acu-
“um jornalismo descontextualizado facilitar mulação de informação na web. A referida
o aparecimento de um jornalismo de esta- acumulação confere à informação um carác-
dos de alma”. Esta imprensa com memó- ter perene. “Se antes o destino do trabalho
ria não exige, evidentemente, a web como jornalístico se jogava ao nível do efémero (o
apoio, mas é certo que facilita na medida em curto prazo de validade do conteúdo do jor-
que o acesso à informação é imediato. nal, a irreversibilidade do noticiário televi-
Campbell y Goodman [cit. N OCI 2001; sivo ou radiofónico), agora a informação en-
114], referem que um meio de comunicação trou no regime do presente contínuo poten-
electrónico pode oferecer até três níveis: cial.” [N OGUEIRA 2002; 15]
1. Nível de apresentação ou interface do A notícia perde a sua natureza perecível
utilizador – o que aflora à superfície, com- e ganha uma segunda vida, afastando-se do
posto pelo sistema de navegação, incluindo conceito base que levou à sua produção: a
as metáforas do sistema, cursores, botões, novidade. Feita história, a notícia ganha no-
mapas, etc. vas propriedades e passa a constituir uma
2. Nível estrutural – É o que determina o unidade de memória.
esquema de união dos nós mediante ligações
e as suas múltiplas relações
5 Conclusão
3. Nível de base de dados – o que se en-
contra oculto mas que permite, mediante sis- Do que foi escrito depreende-se que a inter-
11
net surge, naturalmente, como uma exten-
Em entrevista ao Diário de Notícias de 5 de Ja-
neiro de 2003 são da memória. Esta constatação não acres-
centa nada de novo já que a ligação entre os

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mass media e a memória é um dado adqui- terfaces nunca morrem, metamorfoseiam-se


rido. Desde sempre os media se têm assu- e ligam-se com outras interfaces: este texto
mido como um elemento de interpretação e “desenrola-se” nos monitores como um pa-
contextualização da realidade, constituindo- piro vertical; clicando em alguns dos seus
se ainda como repositório de informação, em links passamos a uma nova página (web),
paralelo com as bibliotecas, videotecas e mu- como num velho "codex"medieval. Nos
seus. actuais documentos hipermédia – tal como
Embora a análise dos conteúdos mediá- em qualquer outra inovação tecnológica –
ticos sirva como elemento de interpretação concentra-se uma boa parte das interfaces
para muitas áreas de investigação, os pro- precedentes, provenientes não só do mundo
cessos de pesquisa nos arquivos dos media do livro, como de uma multiplicidade de ob-
tradicionais são morosos, falíveis e limitam jectos de uso quotidiano (por ex. alavan-
o pesquisador pela obrigação de se deslocar cas, botões, luzes, etc.). Esta espécie de me-
para o local onde o material está arquivado. tástases das interfaces constitui um dos as-
Na verdade a lógica de um armazena- pectos mais interessantes das tecnologias.”
mento em condições óptimas de acesso, no- [S COLARI 1998]
meadamente no campo da facilidade de pes- O desafio que se coloca à internet é aper-
quisa e da rapidez na obtenção de dados, feiçoar as suas capacidades como memória,
nunca foi uma preocupação dos media até ao desenvolvendo bases de dados e interfaces de
aparecimento da internet. pesquisa que se aproximem dos modelos já
Com ela surgiram as edições on-line e utilizados pelo homem no seu contacto diá-
a sua disponibilização na internet acabou rio com a realidade. Mantendo uma sintaxe
por permitir uma acumulação de informação de utilização semelhante à que é utilizada
passível de ser consultada. noutras estruturas presentes no dia a dia, a
E nem só os media digitalizaram os seus absorção da tecnologia será mais natural. É
arquivos. Livros, vídeos, músicas, e imagens verdade que as interfaces nunca são próteses
de obras de arte estão agora acessíveis a nível neutras mas o sucesso da utilização da inter-
universal. net como memória dependerá em muito da
As novas tecnologias, e a internet em par- capacidade de integrar como uma extensão
ticular, expandiram os nossos sentidos, a mais congénita do que adquirida.
nossa capacidade para comunicar a larga es-
cala com mais rapidez, eficiência e flexibi-
6 Bibliografia
lidade. Um dos grandes desafios do futuro
é compreender a internet e a forma como se B ELL, C.G. [s/d] “CyberAll: A Personal
pode tirar partido das suas características de Store for Everything”, in Gordon Bell’s
uma forma eficiente. Books, Videos, and Papers & Talks in
A história social de uma tecnologia não se http://research.microsoft.com/users/GB
reduz apenas aos seus aspectos de ruptura, ell/CyberAll.htm vista em 6 de Janeiro
já que em todo o processo de transforma- de 2003
ção existem também elementos de continui-
dade. Como refere Carlos Scolari, “os in-

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