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Índice

Introdução
Objectivos, Âmbito, Metodologia

Capitulo I
Singularidade da arquitectura portuguesa, Diacronia da história.
Da tradição à contemporaneidade.

1. Românico Português (inicio do século XII até finais do séc. XIII)


2. Arte Gótica em Portugal
3. Florescimento do gótico Nacional (século XV)
3.1 A Arquitectura Militar e civil
4. Arte Manuelina entre 1490 e 1540.
5. A Arte Renascimento
6. Maneirismo
7. A Arte do Barroco em Portugal
7.1 Urbanismo
8. A arte Portuguesa entre o Neoclassicismo e o Naturalismo
9. Arte Neoclássica
10. Arte do Romantismo
11. A Arte Portuguesa: Da permanência do Naturalismo ao Modernismo (1980-1930)
12. Portugal arquitectura do séc. xx
A “casa portuguesa” e os novos programas (1900-1921)
13. O efémero modernismo (1922-1938)
14. Arquitectura do regime (1938-1948)
15. Ruptura moderna e questionamento do estilo internacional (1948-1961)
16. A pluralidade dos anos 60 (1961-1974)
17. Os anos da revolução (1974-1976)
18. De 1976 ao fim do século
19. Álvaro Joaquim de Melo Siza Vieira, o MESTRE.
Capitulo II
Mentalidade e Meio

Capitulo III
Experimentação (inovação)

Bibliografia
Bibliografia

Arquitectura Moderna Portuguesa (1920.1970), coord. Ed. Ana Tostões e Sandra Vaz Costa, Lisboa,
IPPAR, 2004.

Arquitectura Popular em Portugal, coord. Ed. João Afonso, Fernando Martins, Cristina Meneses,
Lisboa, Centro Editor Livreiro da Ordem dos Arquitectos, 2004.

BENEVOLO, Leonardo, História de la arquitectura moderna, Barcelona, GG, 2002 (8ª edición).

COSTA, Alexandre Alves, Introdução à arquitectura portuguesa, Porto, FAUP.

CHUECA GOITIA, Fernando, Invariantes Castizos de la arquitectura Espanola, Madrid, Editorial


Dossat, 1979.

ECO, Umberto, O Signo, Lisboa, edit. Presença, 1989

El croquis 95, Álvaro Siza 1995 1999, coord. Ed. Richard C. Leneve e Fernando Marquez Cecília,
Madrid, 1999.

FERNANDES, José Manuel, Arquitectura Portuguesa, uma síntese, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa
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FERNANDES, José Manuel, Arquitectura Modernista em Portugal, Lisboa, Gradiva, 2005.

FERREIRA, Alfredo Durão de Matos, Aspectos da Organização do espaço Português, Lisboa, FAUP,
1995.

KUBLER, George, A Arquitectura Portuguesa Chã, Entre as Especiarias e os Diamantes (1521-1706),


Lisboa, Nova Vega, 2005 (2ªedição).

KUBLER, George, A forma do tempo, Lisboa, Veja, 2004 (4ª edição)

METAFLUX, duas gerações na arquitectura portuguesa recente, coord. Ed. Manuel Henriques e
Alexandra Cruz, Barcelos, Editora Civilização, 2004.

PORTAS, Nuno, A arquitectura para hoje seguido de Evolução da Arquitectura Moderna, Lisboa, livros
horizonte, 2007.
PORTAS, Nuno, Arquitectura (s), Teoria e desenho, Investigação e Projecto, Porto, FAUP, 2005.

PORTAS, Nuno, Arquitectura (s), História e Crítica, Ensino e Projecto, Porto, FAUP, 2005.

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PINTO, Ana Lídia; MEIRELES, Fernanda; CAMBOTAS, Manuela Cernadas; Historia de Arte,
ocidental e portuguesa das origens ao final do século XX, Porto, Porto Editora, 2006.

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RODRIGUES, António Jacinto, O projecto como processo integral na arquitectura de Álvaro Siza,
Porto, FAUP, 1996.

TÁVORA, Fernando, Da organização do espaço, Porto, FAUP, 2007 (7ª edição).


O símbolo arquitectónico português: tradição e inovação

Introdução

Objectivos, Âmbito, Metodologia

Procuramos sistematizar, neste estudo, elaborado como dissertação de mestrado em


Arquitectura na Escola Universitária Vasco das Gama, uma investigação sobre um tema que,
afigurando-se na sua complexidade, pretende questionar e tentar perceber a actual sociedade
portuguesa, na sua relação diacrónica e sincrónica com a sua arquitectura.

Assiste-se a uma substituição progressiva de uma cultura artística integrada no seu contexto,
em que a arquitectura, nas suas múltiplas influências, é descaracterizada pelo recurso a materiais
indiferenciados e a diversos modos de construir, abstractos, anónimos e banais, sem coerência com o
espaço construído e o espaço natural.
A par do desaparecimento de artistas nos meios rurais e mesmo urbanos, conhecedores do seu
ofício e integrados no seu contexto que articulavam com lógica o modo de construir e os materiais
disponíveis e criavam assim espaços de coerência, aparecem novas relações de produção
arquitectónica. O pequeno e médio empreiteiro, com frequência antigo trabalhador no estrangeiro, os
novos materiais de construção, provenientes da sua prática lá fora, vão consolidando a desarticulação
entre modos de construir e usos e costumes, entre construção arquitectónica e meio ambiente, entre
espaço natural e espaço construído.
A consequente perturbação de uma imagem até então coerente vai sendo cada vez mais
consolidada por uma mentalidade de massas, homogénea e sem referências culturais. Surgem, em
vez destas, novas referências, veiculadas, não só pelos diversos agentes na construção, mas por
novas imagens produzidas pelos media e progressiva globalização. O resultado é: a pobreza e falta
de qualidade das novas construções e dos novos espaços, numa linguagem arquitectónica que é,
simultaneamente incoerente e limitada; a degradação das técnicas construtivas e uma genérica
inadequação de edifícios e espaços ao meio e aos usos.
A esta consciência de crise, acresce ainda uma incapacidade de controlo das transformações
do território nacional pelos métodos correntes de planeamento.
Como âmbito, uma reflexão de toda esta problemática, em termos simbólicos de idiossincrasia
de todo um povo.
As dificuldades do tema escolhido - não sem a consciência da sua utilidade - , levam-nos a ter
como objectivo principal, compreender, em termos arquitectónicos, a actual sociedade portuguesa.

A crescente complexidade dos problemas, neste domínio, levanta um conjunto muito vasto de
questões que se pretende apreender, por vezes, e caracterizar, na medida do possível, na sua
especificidade, com exemplos claros e legíveis - o processo de urbanização e a perda progressiva da
qualidade do meio ambiente - a que a crise civilizacional globalizada conduziu – serem motivados,
essencialmente, por uma crise de cultura e de valores.
Não sem razão, Eduardo Prado Coelho, ao ser interrogado sobre quem seria, em seu entender,
o principal símbolo da cultura nacional, sem hesitar, responde:

«O Siza Vieira, por exemplo. Ele tem uma dimensão marcante. Tem um estilo absolutamente
definido. Tem uma relação com um o ambiente e com o espaço muito forte, e é reconhecidamente um
grande nome da arquitectura contemporânea.».1

A metodologia adoptada neste nossa busca apoia-se assim, fundamentalmente, em estudos de


base teórica, de carácter interdisciplinar, em obras de natureza gráfica e ainda no deambular pela
realidade nacional, valorizando as intervenções que deixaram marcas visíveis no território, onde se
podem colher ensinamentos empíricos e dados sensoriais e, adquirir conhecimentos coordenados e
com sistematização.

Eduardo Prado Coelho, in Jornal de Notícias (30 de Setembro de 2007).


Capitulo I
Singularidade da arquitectura portuguesa, Diacronia da história.
Da tradição à contemporaneidade.
O estudo seguinte refere-se à diacronia da História da Arquitectura Portuguesa e sua singularidade.
Conceptualmente, o período histórico materializado neste primeiro capítulo, faz-se coincidir com o
início da nacionalidade portuguesa.
Remontando à época da reconquista, o Estilo Românico em Portugal prospera, tendo-se
disseminado em tempo de cruzadas, em que os principais caminhos peregrinos se tornaram
referências. Deles traziam consigo novos modus operandi, na arte de conceber e de construir, bem
como todo o seu ideário simbólico.

1. Românico Português (inicio do século XII até finais do séc. XIII)


“A força que anima o violento ímpeto das suas seivas múltiplas empurra e agita as velhas
heranças e consente a sua utilização apenas para forjar uma força nova, modelá-las como oleiro faz
argila inerte, imprimindo-lhes esta vida e este encanto rejuvenescido que os homens desta época
sentiram fremir nas suas artérias.”
Raymond Oursel

O Românico, símbolo da espiritualidade da época, é sentido na Europa ocidental como o


primeiro estilo internacional da Idade Média. Esta internacionalidade, numa época de fronteiras
efémeras e instáveis, o tempo das cruzadas, é sobretudo decorrente das grandes rotas de
peregrinações que permitem a disseminação das novas linguagens estética e técnica. A arte serviu a
majestade do poder, temporal ou religioso, e foi feita para a glória de ambos2.
O estilo Românico nasceu assim da recriação e reelaboração de variadas fontes artísticas. As
da Antiguidade clássica, designadamente romana, que subsistiram da romanização - a queda do
Império Romano do Ocidente ocorre em 476 - e nunca se apagaram por completo com as invasões
bárbaras, designadamente nos redutos conventuais e suas dependências. No Oriente – já que a
queda do Império Romano do Oriente, ou Império Bizantino, se dá apenas no século XV (1453),
soçobrando sob o domínio do turco-otomano - há todo o esplendor da arte Bizantina que resistiu aos
povos bárbaros invasores e que os cruzados puderam admirar, contemplar e, na medida do possível
assimilar e representar simbólica e artisticamente.

Ultrapassando fronteiras, o românico fez-se sentir em Portugal, tardiamente3, com o atraso de


cem anos, em relação ao resto da Europa. Iniciando-se no inicio do século XII, prolongou-se até aos
finais do séc. XIII. O românico português estendeu-se de norte a sul do país, devido à mobilidade dos
romeiros e sobretudo dos artesãos que difundiram as técnicas de construção, as formas e sobretudo
o ideário simbólico e formal da sua arte plástica.
Embora esteja presente em grandes igrejas, à semelhança das suas congéneres europeias,
nas principais cidades do território, a singularidade do estilo românico português manifesta-se a uma
escala muito popular, com um carácter fortemente rural. Esta ruralidade estava dependente da
riqueza dos seus patronos e riqueza das dádivas disponíveis, sendo visível no revestimento de maior
ou menor qualidade técnica, exuberância formal e decorativa, mas também na disponibilidade de
materiais locais. Essa disponibilidade dos materiais locais originou uma curiosa regionalização de
singulares técnicas construtivas e plasticidade dos diversos materiais. Na zona norte, o material
preponderante é o granito, no centro do território os calcários e a sul as taipas e os mármores.

Vide PINTO, Ana Lídia; MEIRELES, Fernanda; CAMBOTAS, Manuela Cernadas; Historia de Arte, ocidental e portuguesa das
origens ao final do século XX, Porto, Porto Editora, 2006, p. 310-332.
Será uma constante através da diacronia da história.
O Estilo Românico entre nós vai assim caracterizar-se pela sábia combinação de volumes,
pelas estreitas relações existentes entre a planta e a estrutura, entre a planta e as massas, e pelo
equilíbrio entre as massas e os efeitos luminosos.

Construtivamente, a arquitectura religiosa, é definida pela sua robustez definida por paredes
grossas e pelos contrafortes salientes, pelo emprego da pedra aparelhada, pela utilização do arco de
volta inteira, pelos relevos decorativos (e também didácticos) no interior e exterior do edifício, e pela
aplicação de cachorros nas cornijas.
A igreja românica portuguesa é composta por um espaço homogéneo interno, em que as
massas e os vãos, que se organizam e definem tendo em vista o ritual religioso, são claramente lidos
no exterior do edifício. O seu conjunto é o resultado de um programa funcional, físico e simbólico, em
que a forma da planta em cruz latina era associada à imagem de Cristo na cruz. Toda esta descrição
atribui a todos os espaços da igreja uma importância e um significado simbólicos bem definidos.
Em época de reconquista e de formação da nacionalidade, toda a arquitectura civil e militar se
caracteriza por fortes redutos defensivos. Destacam-se os castelos com residência ou alcáçova, os
castelos refúgio e as torres de atalaia ou de protecção. Todos eles eram implantados em locais
estrategicamente propícios para defesa, atestando o poder senhorial. Aliás, dentro de uma
arquitectura defensiva militar, embora anterior ao nascimento da nacionalidade, é de salientar, nos
castelos com residência, a genuína estrutura sólida castrense, com aparelho de cantaria lavrado.

Poderemos concluir, no entanto, que em época de reconquista, com sua grande instabilidade, o
poder religioso, pedra basilar dos espíritos guerreiros lusitanos, pela sua arquitectura colonizadora,
caracteriza-se como elemento de propaganda da fé cristã. Assim se poderá afirmar que quase se
sobrepôs ao poder feudal
O estilo Românico foi mais do que um estilo de sobremaneira marcante da sociedade. Foi ele
próprio a representação da sociedade…

1. Sé Velha de Coimbra (Românico urbano) 2. Igreja de São Pedro de Roriz (Românico rural)
2. Arte Gótica em Portugal
A Arte Gótica surgiu em Portugal, em época final da reconquista, acompanhando a
consolidação da monarquia e o seu tão auspicioso reconhecimento papal. A arquitectura gótica em
Portugal instalou-se, tardiamente, em relação aos países europeus, devido a variadas
particularidades contemporâneas. O forte enraizamento da arte Românica nas tradições
arquitectónicas do nosso território originaram singularmente uma avulta quantidade de igrejas
portuguesas em que dois estilos, Românico e Gótico, se misturavam e confundiam. Teoricamente os
dois estilos não possuíam muitas soluções de continuidade entre si - Em Portugal, a arquitectura
gótica foi introduzida e adossada às inúmeras Igrejas Românicas. Contrariamente ao românico, uma
arquitectura defensiva e introvertida, o gótico ao resultar, também, de alguma trégua militar e social,
renasce a sua verticalidade perseguindo o divino.
A sua arquitectura é a imagem e alma do povo, de novos tempos de acalmia que se
aproximavam. Com maior segurança a sociedade, ainda debilitada, goza então uma liberdade
operativa, fora de portas, onde foi fomentado a sedimentação dos povoamentos, da economia interna,
a agricultura, e o comércio externo foi sendo desenvolvido.
Mais uma vez e ao contrário do gótico do norte europeu, uma arte episcopal e urbana, o Gótico
Português permanecia uma arte monástica e rural. A situação nacional instável, sobretudo de guerra,
e os parcos recursos que o reino dispunha, investir numa arte tão cara e sofisticada como a arte
gótica impediu também o seu aparecimento mais cedo. Os primeiros reis, carecidos de recursos
materiais e de gentes recorreram com frequência às ordens religioso-militares para defesa do
território, desenvolvimento agrícola, recebendo amplos poderes administrativos judiciais e fiscais pelo
papel de elevado valor no território e grande papel colonizador. Foi a mando dos abades e monges
das ordens mendicantes que se construíram os primeiros edifícios góticos do território – as igrejas
monásticas que serviam os seus mosteiros e conventos.
Os primeiros edifícios góticos, seguindo os princípios técnicos e estéticos internacionais,
caracteristicamente, registam uma maior simplicidade e pobreza. Apresentam-se sempre com
dimensões mais modestas, onde a verticalidade é menos acentuada. Com estruturas planimétricas e
volumétricas mais simples, muitas vezes aproveitadas do românico devido à lentidão dos processos
construtivos e ao modo de financiamento das obras, que tal como o românico dependia de doações.
As janelas apresentam-se mais pequenas e em menor numero (tanto mais que a pequenez das
dimensões e a prática das coberturas em madeira, mais baratas, tornaram inúteis os arcobotantes,
mantendo-se, quase sempre os contrafortes românicos. A aberta oposição ao simbolismo figurativo
da decoração escultórica do período românico, a arquitectura gótica apresenta uma menor
ostentação de uma decoração menos rica e exuberante remetida aos interiores (capiteis das arcadas
das naves).

A Arquitectura Religiosa de gótico inicial (séc. XIII-XIV), em Portugal, à semelhança do resto da


Europa, revelou-se desde o início o mais rico de toda a época. Em Portugal as primeiras edificações
totalmente góticas surgiram, foram erigidas, entre os finais do século séc. XII e os inícios do séc. XIII.
A presença de construtores de origens estrangeira confere às obras alta qualidade técnica.
Estas primeiras obras sob ponto de vista formal e plástico correspondiam a um mimetismo do gótico
europeu. O exemplo mais antigo é o da Igreja do Abacial do Mosteiro de Alcobaça num estilo
depurado e ascético muito semelhante à casa-mãe dos cistercienses, a abadia de Claraval, em
França. Um segundo exemplo, notável também, é o claustro da sé velha de Coimbra, sob direcção de
mestres castelhanos ou leoneses (Oriundos de áreas estilísticas mais avançadas). Este claustro é
muito semelhante ao claustro do Mosteiro de Iranzu, na Catalunha.

Os mestres de Alcobaça e de Coimbra devem ter deixado influências entre os pedreiros e


artífices nacionais com que eles trabalhavam.

Após meados séc. XIII, nos reinados de D. Afonso III e D. Dinis Portugal vivia tempos de
estabilidade militar (conseguida pela conquista do Algarve, pela paz com Castela e pela fixação das
fronteiras no tratado de Alcanizes- 1297). Nesta altura as ordens mendicantes ou militares começam
a erguer igrejas conventuais góticas de criação inteiramente local. Contudo temos uma excepção
notável como é o caso da Sé de Évora, uma das poucas igrejas catedrais do gótico português.
Construtivamente, a arquitectura religiosa, é definida genericamente, até finais do séc. XIV, por
uma planta basilical em cruz latina com transepto saliente. O corpo principal dividido em 3 naves de 5
tramos cobertas por armação de madeira e separadas por arcadas de arco quebrado apoiado em
pilares finos. Nas naves centrais é sentido um sentido de verticalidade, onde os espaços interiores se
caracterizavam como mais amplos e melhor iluminados. Exteriormente a peculiaridade dos exteriores
compactos onde ainda predomina a horizontalidade e os contrafortes românicos, sem arcobotantes.
Plasticamente o estilo gótico português era muito depurado, com pouca decoração, predominando as
formas naturalistas e genéricas. As fachadas austeras do corpo central elevado e rosácea aberta
sobre o portal, onde os portais surgiam singelos com arquivoltas de arco ogival.

3. Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça.


3. Florescimento do gótico Nacional (século XV)

A partir do séc. XV, o rei D. João I mandou erguer o Mosteiro de Santa Maria da Vitória
(mosteiro da Batalha), como símbolo de afirmação da independência portuguesa perante Castela e
legitimação da nova dinastia. Um verdadeiro instrumento de propaganda régia e símbolo de
esplendor do novo reino. Este mosteiro nasceu, também, de um resultado de um voto feito a quando
da batalha de Aljubarrota e entregue, pelo mesmo rei, aos monges dominicanos que tão bem
assumiram a defesa da sua causa nas cortes de 1385. Este grandioso mosteiro, pela fundação,
também, da sua grande escola de mestres pedreiros, teve uma grande influência nas novas obras
góticas nacionais precedentes e inclusivamente em Portugal insular, Arquipélago dos Açores e da
Madeira. A norte de Portugal, devemos realçar a Colegiada de nossa senhora da Oliveira (iniciada em
1397), em Guimarães (uma construção de carácter tradicional onde se destaca a decoração mural
figurativa e simbólica, sobretudo no portal de autoria de João Garcia) a restauração da sé da Guarda
(finais do séc. XIV tendo sido terminada no séc. XVI). No centro de Portugal realçamos a Igreja da
nossa senhora da graça, em Santarém e em Lisboa a igreja do convento do Carmo. A sul é de notar o
exemplo da restauração da sé de Silves, cujas abobadas, central e da abside, denotam influências
batalhinas. O estilo gótico ao ser um estilo global de todo o território é também de notar os exemplos
insulares nomeadamente na Igreja Matriz de Vila franca do Campo, na Ilha de São Miguel, Açores, e
a Igreja Matriz de Machico, na ilha da Madeira.
Genericamente podemos caracterizar o estilo gótico português nomeadamente no
aperfeiçoamento das coberturas abobadadas, que agora apresentam complexos sistemas de
nervuras com perfis variados dando-se também, o achatamento das abobadas. O refinamento dos
pilares de suporte, cada vez mais finos e desmultiplicados. O aparecimento do arco contracurvado,
sobretudo como decoração. A simplificação estrutural dos alçados. A acentuação da decoração mural
queque dos portais e capiteis, passa agora em finos rendilhados de recorte flamejante, para os
botaréus, cornijas, pináculos, flechas e outros elementos estruturais exteriores.

4. Mosteiro de Santa Maria da Vitória, Batalha.


O Alastramento da decoração vegetalista concentrada, que nos capiteis se torna carnuda e
envolvente. O retorno à figuração alegórica e narrativa, em zonas concentradas como portais
(tímpanos, colunelos e capiteis) arcadas interiores e claustros. A acentuação do uso da heráldica (real
e nobiliárquica) com elemento decorativo.
3.1 A Arquitectura Militar e civil

Em Portugal, o período da arte gótica continuou a ser tempos difíceis de reconquista e contra
Castela onde as construções defensivas de todo o território eram de máxima importância. Até ao séc.
XIII a arquitectura militar portuguesa (castelos cercas e simples torres) estava grandemente enraizada
às tradições românicas de defesa passiva sem registarem grandes alterações. No reinado de D. Dinis
houve as primeiras remodelações de variadíssimas fortificações (maioritariamente nas zonas raianas
e no sul) reflectindo a arte gótica na arquitectura militar. Com a descoberta da pólvora e a introdução
dos batalhões de besteiros, as fortalezas tiveram que se adaptar às novas formas de fazer guerra. Foi
já no tempo do reinado de D. Fernando que foi sentido um grande impulso nomeadamente nas
construções de novas muralhas do Porto e de Lisboa, o reforço da cerca de Braga e a reconstrução
da torre de menagem do castelo de Beja. Construtivamente as muralhas tornaram-se mais altas, com
plantas quadradas ou poligonais, com vários andares (com pisos de madeira e coberturas
abobadadas em arco quebrado ou com nervuras ogivais - zonas nobres). Fundamentalmente é
notória a crescente preocupação com o conforto nomeadamente num maior número de divisões
internas, lareiras de aquecimento, um aumento de equipamento de mobiliário, já que muitas das
torres serviam como habitações dos alcaides e respectivas famílias. Alguns castelos transformam-se
mesmo em residências senhoriais ou reais apalaçadas provando as alterações sociais ocorridas
entretanto no seio da nobreza guerreira. Como exemplos mais identificativos temos os castelos do
Norte do território como o castelo de chaves e Bragança (Implantados em regiões mais acidentadas
com muralhas e barbaças dispostas em forma circulares e ovalada). No Centro podemos encontrar
os castelos da Amieira, Leiria, Ourém e Porto de Mós. Já no Sul, há variadíssimos castelos militares
como o de Lisboa, Estremoz, Serpa, Mourão, Elvas, Mértola e Beja…

5. Castelo de Leiria
Fundamentalmente estão situados em zonas de planícies em volta da menagem, com cintas
regulares, quadrangulares ou poligonais com os torreões arredondados para vigia nos ângulos. Ainda
neste período a arquitectura militar traduziu-se também ainda em pontes fortificadas com torreões
para defesa dos rios controlo das entradas pela cobrança de portagens. Neste sentido temos três
exemplos documentados, as já extintas Ponte da Barca e Ponte de Lima e a ainda existente Ponte da
Ucanha.
A singularidade da arquitectura portuguesa até então, ao se resumir num complexo
palimpsesto, difícil de resumir quais as épocas em que a arquitectura se situa, mesmo que o estilo
românico não tenha teoricamente afinidades formais e plásticas, é difícil caracterizar a arquitectura
civil desta época. Havendo referencias escassas devido às sucessivas reformas, nomeadamente em
casas de habitação comum e moradias mais aprimoradas de nobres ou burgueses dentro das
cidades. Neste sentido no território português e com alguma fidelidade à construção primitiva
podemos encontrar o Palácio Real de Estremoz, o Paço Episcopal de Braga, e os Paços Ducais de
Barcelos e Guimarães.

6. Torre de menagem do Castelo de Beja 7. Ponte de Ucanha 8. Paço dos Duques de Bragança, Guimarães.

4. Arte Manuelina entre 1490 e 1540.

A arte manuelina desenvolveu-se em Portugal entre finais do séc. XV, ainda no reinado de D.
João II e início do séc. XVI sobretudo durante os reinados de D. Manuel I (que lhe deu o nome) e D.
João III. Este período é amplamente considerado por muitos como genuinamente nacional, expressão
do apogeu marítimo – comercial e político – económico então atingido pelo reino e fruto dos
descobrimentos geográficos levados a cabo pelos portugueses, ao longo do séc. XVI. Na realidade e
segundo consenso dos modernos especialistas trata-se não de um estilo na total acepção da palavra
mas de uma arte feita de elementos de muitos estilos – Góticos flamejantes, uns platerescos e
mudéjares – outros conjugados com novas influências locais e novos gostos que traduziram,
sobretudo, num original sentido de ornamentação e numa imaginativa gramática decorativa onde os
elementos da heráldica régia e da imagética da pátria se aliaram a formas naturalistas, retiradas
principalmente da fauna e da flora marítimas e das novas experiências de vida, à escala planetária. A
arte manuelina é, conceptualmente e formalmente, uma arte ornamentativa, uma arte que se serve
das estruturas góticas para realçar e demonstrar as vivências ultramarinas do espírito aventureiro e
conquistador do povo lusitano. Na arquitectura as construções deste período encontram a sua
expressão comum em algumas características dominantes. Nomeadamente, a já referida
manutenção das estruturas góticas essenciais (sistemas de sustentação, plantas, composição de
alçados, combinação dos alçados, combinação das volumetrias…), aliadas, contudo, a novos
conceitos de espaço e iluminação já por vezes, renascentista, os quais determinaram a preferência,
típica do Manuelino, por igrejas de naves todas à mesma altura ou pelas igrejas salão de origem
alemã; Numa nova gramática formal recorre a elementos, estruturais ou decorativos, inovadores. São
exemplo, os muitos tipos de arcos, de abobadas e de portais, imaginativamente decorados que este
estilo utilizou. No gosto pela ornamentação profusa, exuberante e exagerada, colocada sobre certos
suportes arquitectónicos de forma concentrada, antecipando um certo barroquismo. Essa exuberância
decorativa vive essencialmente do trabalho escultórico, com relevos de finos cinzelados e
rendilhados. Na temática decorativa evidenciaram-se os motivos naturalistas, de influencia marinha e
a simbologia ligada à exaltação da pátria e à heráldica régia.
Relativamente à arquitectura religiosa, surgiram novas tipologias nomeadamente as igrejas de
nave única, de espaço amplo e de preferência quadrangular (as chamadas de igrejas salão). É
também fácil de encontrar as igrejas de corpo rectangular divididas em naves de 5 tramos, sem
transepto e cabeceiras rectas, com um ou dois tramos, ladeadas ou não por capelas menores. Neste
caso, as arcadas das naves são em arco quebrado ou de volta inteira e os pilares que os suportam
tendem a simplificar-se, sendo substituídos por colunas circulares ou octogonais.
As obras mais significativas foram concebidas por 5 arquitectos notáveis no panorama artístico
nacional deste período. Os Portugueses, Mateus Fernandes, Diogo Arruda, Francisco Arruda. Embora
dois não sejam portugueses, como o francês Diogo Boitaca, e o espanhol João de Castilho, de
Cantábrica, ambos sentiram bem o espírito nacional pela sua longa permanência em território
português. É imperativo atribuir as grandes obras manuelinas aos seus criadores, nomeadamente o
traçado completo do Mosteiro dos Jerónimos, por Diogo Boitaca, O portal das capelas imperfeitas, do
mosteiro de Santa Maria da Vitória (Batalha), por Mateus Fernandes, As obras manuelinas do
Convento de Tomar, por Diogo de Arruda.
Em relação à arquitectura civil a previsível adição a estruturas anteriores já se fazia sentir,
nomeadamente em influências mouriscas presentes em janelas de aximez, arcadas de arcos
ultrapassados, telhadinhos cónicos e torreões cilíndricos, nas antigas estruturas góticas. Estes
aspectos de uma ornamentação mais cuidada iam demonstrando o novo refinamento da vida familiar
e social nas altas classes. Este período apresenta alguns exemplos notáveis como o Palácio Real de
Sintra, o Palácio Real de Alvito, os Paços de D. Manuel de Évora, o Solar da Sempre Noiva e o Solar
de água dos Peixes.
A arquitectura militar deste período traduzida em fortalezas defensivas e ofensivas tiveram de
se adaptar às armas de fogo, algo que o Arquitecto Francisco de Arruda “concebeu uma das mais
belas e originais construções militares manuelinas” – A Torre de Belém. Esta torre foi erguida entre
1515 e 1547, para a defesa do rio Tejo. Esta notável torre foi concebida conceptualmente de
influências orientais onde se podem encontrar como exemplo as cúpulas de gomos nas guaritas.
Outras obras de referência como a Fortaleza de Tomar, o Castelo de Évora Monte são traduzidas
conceptualmente em influências mouriscas e renascentistas.
Como o estilo manuelino é um estilo ornamental4 é de valor realçar a escultura deste período. A
Gradual evolução do Gótico para o Manuelino fez-se com a ajuda da essência da arte nacional
(Românico e Gótico), das reminiscências mouriscas e mudéjares, dos contactos europeus (com
Espanha, Inglaterra e Flandres) e das influências “de retorno” (indianas e magrebinas). Todos estes
saberes foram integrados no contexto da escultura do gótico final português e europeu, num tempo
de riquezas, de descobertas e impérios.

9. Portal das Capelas Imperfeitas, Mosteiro da Batalha. 10. Torre de Belém 11. Mosteiro dos Jerónimos, portal sul.
O Manuelino5 é uma arte eclética nas influências, nos artistas e até nas definições da sua
origem, justificação e simbologia. A decoração arquitectónica caracteriza o próprio estilo. Os
arquitectos portugueses, os irmãos Arruda, tiveram um papel preponderante ao criarem um modo
próprio, e singular, baseado na natureza e na heráldica, sendo a base das linhas mestras deste
género de arte. A aliança entre o naturalismo e o simbolismo e a fantasia originou um extravagante
decorativismo hiper-realista de variadas formas. Este decorativismo espalhou-se pelo mundo
português sendo caracterizadamente afirmada por diversos motivos como símbolos do poder real, do

“Produção artística diferente centrada no domínio da decoração.” Mário Chico


“Formas sólidas, robustas e sensuais, fortemente escultóricas e de grande fôlego decorativo antecipando o Barroco”. Nelson
di Maggio
império e da afirmação do direito do direito divino do poder do rei como os motivos emblemáticos e
heráldicos materializados na Cruz de Cristo, Esfera Armilar e escudo régio. Outros motivos estavam
presentes, nomeadamente vegetais (troncos nodosos e entrelaçados, alcachofras, rosas, maçarocas,
romãs, entre outras plantas tropicais), marinhos (Naus, corais, algas, os nós, as conchas, ancoras) e
também animais fantásticos (dragões, basiliscos, sereias, rinoceronte como animal exótico, homens
selvagens com vários significados, bons e maus; mas também figuras complexas em ambientes
sarcásticos que provocam o riso, a critica e a moralização; Animais músicos e vestidos de monges).
Toda esta simbologia de formas dificilmente será explicada na sua totalidade, diversificada uma
diversidade de justificações, todas elas fantásticas…

12. Janelas Manuelinas, Convento de Cristo, Tomar. 13. Elementos Marinhos 14. Rinoceronte, Pormenor da torre de Belém.

5. A Arte Renascimento

O Quattrocento português continuou a pensar e a construir em Gótico. Em meados do Século


XV, no tempo de D. Afonso V e D. João II juntou-se à arte Gótica algumas influências italianizantes e
flamengas especialmente na decoração devido à importação de artistas e de obras de arte. Só no
reinado de D. João III (1521-57) que os modelos clássicos se fixaram em Portugal. A área de
influência dominante foi sentida no centro e sul do território, embora pouco consistente de 1950-60,
altura em que o maneirismo precocemente cá se instalou e dominou. A arquitectura renascentista
portuguesa é bastante “sui generis” de âmbito predominantemente religioso. As igrejas e claustros
são a sua maior produção, mas relativamente simples, devido à contenção de despesas à
continuidade da tradicional arquitectura portuguesa de estruturas simples que originou o Estilo-Chão
ou Maneirismo Português, o austero espírito da contra reforma que D. João III personificou. É
sensível caracterizar as influências ou contribuições da arte Manuelina na arquitectura renascentista e
nomeadamente no Estilo-Chão. A utilização da Igreja-Salão, preferência pelas construções
horizontais, e também, o uso de abobadas assentes sobre os arcos abatidos e redes de nervuras. A
arquitectura renascentista e nomeadamente a decoração renascentista surgiram essencialmente de
intensos contactos de Portugal com Itália com a permanência de artistas italianos como Sansovino
mas também devido à presença de mestres galegos e biscainhos em Portugal. Predominam então os
elementos platerescos e ainda os elementos predominantemente renascentistas (colunas dóricas,
jónicas, coríntias e compósitas; Frontões rectos e curvos; entablamentos com arquitraves simples ou
de três bandas, friso e cornija; pilastras caneladas ou lisas). A decoração renascentista como “arte
cosmopolita” reflecte várias influências da Europa e das colónias ultramarinas, em especial da índia,
reflexo dos contactos multiculturais neste período. A arte do Renascimento foi discretamente evolutiva
e eclética quanto a estruturas, plantas e alçados. A arquitectura religiosa foi fundamentalmente
definida em três tipos fundamentais de igrejas. Em Igrejas de três naves com cabeceira rectangular e
cobertura de madeira. As igrejas Salão com abobada de berço, arco redondos, contrafortes
transformados em pilares laterais, com pouca ornamentação (essencialmente no portal) - como
exemplos notáveis de Afonso Alvares podemos aferir a Catedral de Miranda do Douro, a Catedral de
Leiria e a Catedral de Portalegre.

15. Interior da Igreja Velha de S. João da Foz, Porto. 16. Sé de Leiria.


O terceiro tipo de igrejas, segundo influências de Sérlio e Palladio, Igrejas de estrutura geométrica
centrada ou quadrada e com alguma decoração maneirista – Igreja do Bom Jesus de Valverde, Évora
e a Capela da Conceição em Tomar. Neste período os arquitectos que se notabilizaram durante a
primeira metade do século XVI sobressaíram alguns nomes como os irmãos Arruda, que fizeram um
variado percurso, do Manuelino para o Renascimento – e. g.: o Aqueduto da Agua da Prata e a Igreja
e o Mosteiro de Nossa senhora da Graça, em Évora. Outros mestres se notabilizaram neste período,
João de Castilho e Diogo de Castilho – por João de Castilho, a capela da Conceição em Tomar.
Projecto do claustro principal de D. João III no convento de Cristo em Tomar.
A arquitectura civil renascentista portuguesa não foi muito próspera havendo poucas
construções régias. Conhecemos o exemplo do Palácio Real de Sintra, sendo caracterizado numa
amálgama de Manuelino, Mudejarismo e Renascimento. Quanto a Solares e palácios particulares
encontram-se predominantemente no sul do país tendo presente uma decoração mudéjar e
renascentista. Os variados exemplos como o Minarete da casa de Cordovil em Évora, a Villa rústica
da Bacalhoa em Azeitão e a casa da Ribafria em Sintra. Todas estas obras são valorizadas pelos
jardins, lagos, tanques, miradouros, grutas e laranjais. No período do renascimento, os solares-
fortaleza eram muito comuns no império português, sendo caracterizados por um misto de
arquitectura civil e militar espalhados pelas costas africanas e pelo oriente – nas rotas de descoberta
e exploração ultramarina. A arquitectura renascentista portuguesa foi apurada pelos irmãos Arruda
através das influências italiana e pela moda criada por eles durante o reinado de D. João III.

17. Claustro do Convento de Cristo, Tomar. 18. Quinta da Bacalhoa, Azeitão.


6. Maneirismo

A nossa arquitectura do renascimento esteve ligada a mestres estrangeiros, ou (a) influência


directa das obras de Sérlio e Palladio; […] mas nós nunca sentimos nem o verdadeiro espírito do
Gótico nem da Renascença. Fomos Românicos durante dois séculos e vamos ser Barrocos durante
outros dois… De permeio, está o “duradoiro” Maneirismo.6

A arquitectura portuguesa Chã corresponde à atitude experimental dos arquitectos formados na


teoria do Renascimento, que se atreveram a desrespeitar os seus preceitos a fim de obterem uma
construção útil e económica. As suas primeiras manifestações surgem associadas à arquitectura
militar e ligadas aos movimentos religiosos de Religiosos de Reforma, que se opunha ao declínio da
vida monástica. O Racionalismo e a austeridade foram as linhas-mestras iniciais, persistindo mesmo

Santos, Reynaldo, Oito séculos de arte Portuguesa, 2, Lisboa, edição notícias, s. d.


através dos reinados financeiramente desequilibrados de D. Sebastião e do Cardeal-Rei, numa
arquitectura que antecipa o «estilo desornamentado» espanhol, mas à qual faltava a enorme riqueza
americana de Espanha. Difere das obras espanholas anteriores a 1580 não só pela sua pequena
escala e dimensões modestas, mas sobretudo pela composição celular da parede e pela clareza
funcional dos volumes. Estas características não se inspiram nos tratados italianos: encontram-se
vinculadas a um mais amplo complexo de tradições portuguesas de carácter militar e comercial,
baseadas noutras realizações europeias para a integração dos interesses lusitanos no mundo pós-
medieval.7

A arquitectura religiosa representou para o maneirismo português as construções mais


importantes pelo fim doutrinal que representava, por isso era uma arte essencialmente cosmopolita,
localizada nos grandes centros como o Porto, Coimbra e Évora.

19. Jardim da Manga 20. Catedral da Velha Goa, Índia 21. Porta da Fortaleza portuguesa da Ilha de Moçambique
A arquitectura portuguesa maneirista, ou estilo chão, apresenta genericamente um exterior com
sobriedade contrapondo-se a um interior extravagante decorado com azulejos, talha dourada em
escultóricos altares, enormes quadros a óleo, no caso das igrejas, e completado, nos palácios, por
baixelas, fianças porcelanas e mobiliário.
A estrutura e a decoração são as mesmas do Maneirismo em geral, mas pode considerar-se
que há uma arquitectura religiosa maneirista portuguesa, resultante da manutenção de algumas
tradições e da assimilação de influências e artistas de diferentes origens. Estas influências criaram
diferentes tipos de igrejas. A igreja à “Romana” patente na igreja de S. Vicente de Fora, em Lisboa, de
Juan de Herrera, Filipe Terzi e Baltazar Alvares e ainda na fachada da Igreja da Graça, em Évora, de
raiz Serliana e Palladiana. A igreja Jesuítica, como a igreja do Espírito Santo, em Évora, de Manuel
Pires (1566), Igreja dos Grilos ou Colégio de S. Lourenço, da Companhia de Jesus, no Porto, ambas
de Baltasar Alvares, Igreja de S. Roque em Lisboa que, devido ao facto de Portugal ter seguido as
indicações da contra reforma e do tribunal do Santo Oficio, serão o modelo da “Arte Jesuítica” que se
manterá até ao século XVIII – uma só nave com um ou mais púlpitos. A Igreja de “Tipo Flamengo” que
apresenta uma maior diversidade decorativa, como é o caso das igrejas da Serra do Pilar e de S.

KUBLER, George, A Arquitectura Portuguesa Chã, Entre as Especiarias e os Diamantes (1521-1706), Lisboa, Nova Vega,
2005 (2ªedição).
Salvador de Grijó, em Gaia. Outro tipo que se pode afirmar é a “Igreja à Espanhola” tendo como
exemplo Santiago de Compostela, Salamanca e valladolid, onde a estrutura arquitectónica é quase
toda tapada pela ornamentação, como a nova frontaria da Sé de Viseu (1635).
A consciência da liberdade do artista e a afirmação do seu espírito criativo, que caracterizam
o Maneirismo, não são de um modo geral, vividos tão intensamente em Portugal por causa das
directrizes da contra reforma que coarctavam qualquer “ousadia”. Tal aconteceu na arquitectura, na
pintura, na escultura e na literatura.

22. Igreja da Graça, Évora. (Romana) 23. Igreja dos Grilos, Porto. (Jesuítica) 24. Igreja S. Salvador de Grijó, Gaia (Flamengo)
7. A Arte do Barroco em Portugal

O Barroco português durou cerca de dois séculos, finais do séc. XVII a séc. XVIII. Este período
coincidiu em tempos difíceis de domínio filipino, à perda de algumas colónias, às guerras da
Restauração, e fundamentalmente uma difícil situação politico-economico-social, cultural e artística.
Sentiu-se também a crise dinástica de D. Afonso VI/ D. Pedro II e ao controlo de Santo Ofício.
No entanto, acompanhou, também, os reinados de D. João V (1706-50) e de D. José (1750-77),
tempos de esplendor em consequência das importações de ouro e de diamantes do Brasil e das
políticas absolutistas dos dois monarcas.
Artisticamente o barroco português definiu-se como prolongamento de um maneirismo tardio,
seguindo as orientações do concilio de Trento, via Espanha, prevalecendo essencialmente a
arquitectura religiosa – Barroco Severo. A arquitectura religiosa deste período inicial, as igrejas
apresentavam genericamente forma rectangular, fachadas simples e regulares, duas torres,
sobriedade decorativa (com excepção do altar-mor). A falta de programa construtivo régio, a falta de
meios materiais, resultou numa arquitectura moderada com reminiscências ao espírito tradicional
austero. Ainda neste período inicial os arquitectos João Nunes Tinoco e João Antunes, criaram uma
das primeiras igrejas considerada como Barroco Pleno – A Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa. Esta
obra representa uma requintada tentativa de fugir à tradicional formula seca, cuja composição
volumétrica resultava da justaposição caligráfica, em planta de rectângulos, segundo os seus eixos
longitudinais. O conceito ondulante do espaço é então introduzido, de planta centrada e da fachada, o
movimento da cornija e especialmente, o rico revestimento interior de mármore policromado. Na
primeira metade do século XVIII anote-se ainda uma série de pequenas capelas e ermidas
espalhadas pelo litoral e interior do país. Estas capelas apresentam singulares formas hexagonais ou
octogonais. Estas, longe das grandes cidades, são a expressão de uma certa autenticidade do
barroco português, prestes a aceitar a arte rococó. Em muitas zonas de Portugal, a arte de construir
passou do maneirismo, dada a sua permanência, directamente para o Rococó e daí, o uso destes
tipos de planta. O século XVII, estruturalmente viveu duas tendências diferentes.

25. Igreja de Santa Engrácia, Lisboa. 26. Igreja do Bom Jesus da Cruz, Barcelos.
A primeira é caracterizada pelos edifícios ao gosto maneirista de planta rectangular e simples. A
segunda tendência é sentida nas construções centradas e mais decoradas interiormente,
prenunciando o Barroco Pleno. Como exemplos de arquitectura religiosa do séc. XVII, podemos
realçar a Igreja do Bom Jesus da Cruz, Barcelos (1705-1710) – O plano central combina a cruz grega
com o cilindro que ascende a uma cúpula baixa; A Igreja de S. Gonçalo de Amarante e a Igreja do
Senhor da Pedra.
A partir do final do séc. XVII, e sobretudo no reinado de D. João V sentiu-se a revitalização
artística do país. O rei encomendou livros, tratados, desenhos e mesmo decoração de capelas
inteiras como a de S. João Batista para a Igreja de S. Roque de Lisboa. O poder régio apoiou muitas
construções e não só as religiosas, em dois séculos o número de conventos de Lisboa aumentou
trezentos por cento. Promoveu também a transformação e o alargamento do paço da Ribeira,
destruído posteriormente ao terramoto de 1755. Num período de grandes construções onde o
mimetismo dos modelos europeus estava instituído, o barroco português passou a ser traduzido
numa amálgama de elementos nacionais e de influências barrocas internacionais8 que se
interpenetram. Neste sentido a feição nacional caracterizou-se especialmente na decoração de

A presença de vários artistas estrangeiros convidados pelo reino nomeadamente italianos, franceses e alemães.
interiores, onde se salienta a talha dourada das paredes e dos retábulos 9, o revestimento de Azulejos,
a sobriedade estrutural e também pela discreta procura de movimento, que se revela nas plantas
circulares e depois, nas poligonais.
O expoente máximo deste ecletismo europeu e português materializou-se no grandioso
Mosteiro, Palácio, Igreja de Mafra. O criador, João Ludovice, fundamentou-se em influências
internacionais, nomeadamente nas cúpulas dos torreões laterais de inspiração alemã, e o tratamento
da cúpula e do portal de intenções romanas. Na sua construção conjugaram-se as influências
clássicas com o desejo do espectacular, como se constata na janela do rei, no primeiro andar da
fachada da igreja, símbolo do absolutismo.

27. Mosteiro de Mafra.


O Barroco Português desenvolveu-se no norte do país com Nicolau Nazoni, que sendo italiano,
soube conjugar de uma forma muito própria o barroco italiano e o gosto português. As suas
construções adaptaram-se bem ao terreno, algumas vezes em declive, ao material, o granito, à luz
ambiente e à sensibilidade portuguesa, tudo explorado com movimento e expressividade. A obra mais
notável, o ícone de Nicolau Nazoni10, foi a construção da primeira Igreja de estilo barroco da cidade
do porto – Torre e Igreja dos Clérigos.
Ainda no mesmo período, fez-se sentir no norte a arte decorativa do Rococó de influência
alemã. Este movimento materializou-se em Braga com o seu expoente máximo da Capela de Santa
Madalena da Falperra. Considerado o maior símbolo do Rococó11 em Portugal a capela, de uma
ornamentação excessiva e flamejante, com conchas e vegetações fantásticas. No interior e exterior é
sentido um enquadramento perfeito na natureza, onde o principal acesso era conseguido em grandes
escadarias peregrinas.
A arquitectura religiosa Barroca em Portugal12 foi sentida de diferentes formas ao longo do
território. Neste sentido e em jeito de sistematização, considera-se oportuno definir as áreas de

São ocultadas quase totalmente as estruturas arquitectónicas das igrejas novas e antigas. Como resultado exemplificativo
temos a Igreja de S. Francisco e a Igreja de S. Clara, ambas no Porto.
Outras obras: Restauro da igreja do Bom Jesus de Matosinhos e autor da fachada, Fachada e restauro da Igreja de Bom
Jesus de Matosinhos; Fachada da Igreja da Misericórdia do Paço episcopal e da loggia da Sé, Porto.
Outras obras: Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, Lamego.
Barroco do Norte vive da ornamentação e o sul da estrutura.
influência barroca em Portugal. A Norte conhecem-se dois centros principais, um no Porto,
caracterizado pelo exuberante decorativismo e pelas influências italianizantes trazidas por Nazoni,
com fachadas movimentadas e uma ornamentação fantástica em granito, sobre grandes superfícies
caiadas como a Igreja dos Clérigos e a Igreja do Bom Jesus de Matosinhos. O outro centro definido
no norte foi a zona de Braga, Minho e Douro, com o sentido decorativo do românico e do manuelino
com influências barrocas, Rococó e orientais, criando assim estruturas seguras e pesadas com uma
exótica decoração de movimentos ondulantes, como por exemplo as Igrejas de S. Vicente de Braga e
de Santa Madalena de Falperra.

28. Igreja dos Clérigos 29. Igreja do Senhor de Matosinhos. 30. Igreja de Nossa Senhora dos Remédios. 31. Capela de Santa
Madalena, Falperra, Braga.
A sul de Portugal, e novamente foram contextualizados mais dois centros, um em Lisboa, influenciado
pela arquitectura alemã de Luduvice13, com estruturas barrocas e decoração Rococó, como o Palácio
de Queluz. E por ultimo, em Vila Viçosa, foi encontrado vestígio, no alto Alentejo.
O Barroco evoluiu, discretamente para o Neoclassicismo, com composições simples e
regulares como o exemplo da Igreja da Nossa Senhora da Lapa.

O Barroco como arte do Império foi difundida rapidamente pelos Açores, Índia, radicou-se no
Brasil seguindo bem de perto a arquitectura do continente. São visivelmente notórias as relações
formais e plásticas do Santuário do Bom Jesus em Congonhas do Campo no Brasil e o Santuário da
Nossa Senhora dos Remédios em Lamego e do Bom Jesus do Monte em Braga.

Na Arquitectura Civil é de destacar os palácios e os solares de particulares seguindo princípios


renascentistas e da arquitectura chã, com plantas regulares. Genericamente os palácios14 são
caracterizados em forma de U, com dois pisos envolvendo um pátio, com escadarias, jardins à
italiana com fontes, compartimentação confortável, individualizada e funcional e uma delicada
decoração, imitando os palácios franceses.

Influências do Mosteiro, Palácio, Igreja de Mafra.


Exemplos notáveis: Lisboa. Palácio Fronteira, S. Domingos de Benfica; Porto (Nicolau Nazoni). Palácio do Freixo, Quinta da
Prelada; Braga (André Soares). Edifício da Câmara e a Casa do Raio ou do Mexicano.
Dado o terramoto de 1755, surgiu a necessidade de reconstruir com rapidez, economia e pouca
mão-de-obra originando um modo de construir mais sóbrio, de linhas direitas, apelidado como “Estilo
Pombalino”.

32. Palácio de Queluz 33. Igreja do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Brasil.
7.1 Urbanismo

A história do Urbanismo em Portugal começou de um modo muito simples, no Renascimento.


Mas só o terramoto de 1755 e as suas amplas destruições, sobretudo em Lisboa, impôs ema
verdadeira, rápida e cuidada planificação. Foi proposta a reedificação da parte baixa da cidade, de
um modo dinâmico e funcional, com cruzamento de largas ruas em rectícula geométrica. Os prédios
deviam ter todos a mesma altura, com telhados de duas águas sobrepostas e usando a mesma
simetria nas portas e janelas, sem pormenores, sem faustos nem grandes diferenças, pois até as
igrejas tinham mesmo alinhamento dos prédios embora gozassem de alguma liberdade decorativa
nas fachadas. Assim, o estilo pombalino combinava a severidade maneirista e a frieza do
Neopalladanismo, suavizadas pelos elementos decorativos do barroco e do Rococó. Este modelo foi
usado noutras pequenas localidades do litoral também devastadas pela catástrofe como a cidade de
Espinho, Óbidos, Vila Real de Santo António.
34. Palácio de Mateus, Vila Real. 35. Intervenção Pombalina da Baixa da Cidade de Lisboa.

Depois de Pombal e até ao fim de oitocentos (período de cerca de 150 anos) a produção
arquitectónica em Portugal não teve um papel relevante na vida cultural portuguesa enquanto
movimento renovador. Acabada a linhagem da arquitectura, ou engenharia militar, que teve na
renovação pombalina o seu movimento mais alto. Foi ao mesmo tempo, como que o canto do cisne
da política e das artes urbanas neste país – a produção de arquitectura torna-se uma actividade
menor, de modas estilísticas superficiais ou subsidiária da «construção». Construção entendida como
actividade económica impulsionada por proprietários de terrenos e capitalistas – Expansão burguesa
(ultimas décadas de oitocentos e primeiras de novecentos). Ainda assim, apesar de ser um período
particularmente incaracterístico, sob ponto de vista das obras realizadas mas também da presença
cultural e social dos profissionais envolvidos, tal não significa deixar de compreender a produção
urbanística e arquitectónica que acompanhou a industrialização portuguesa até à tentativa de ruptura
cultural, modernista, dos anos 20-30 do século XX.

8. A arte Portuguesa entre o Neoclassicismo e o Naturalismo

“O Barroco tinha levado o sentido das formas ao extremo do seu dinamismo, gerando, como o
Gótico XV, um novo flamejante. A reacção a essa exuberância foi o neoclássico […] Entre nós, se o
Rococó fora sobretudo o estilo do reinado de D. José, o neoclássico tornou-se o estilo do reinado de
D. Maria I, embora, por vezes, com sobrevivências de Barroquismo.15”

Ao contrário da Europa a realidade de Portugal foi ligeiramente diferente na segunda metade do


séc. XVIIII. Portugal permaneceu até muito tarde, avesso aos ideais iluministas. A primeira metade do
século XIX foi, foi adversa para o desenvolvimento das artes e cultura de Portugal. As invasões
francesas, a fuga da família real para o Brasil, dominação inglesa, a revolução liberal em 1820, a
perda do Brasil e do monopólio do comercio colonial. Contra-revolução absolutista e lutas entre as
facções liberais. Todas estas adversidades só foram possíveis ser restabelecidas após o governo da
regeneração em 1851. Sendo assim, as tendências artísticas anteriores – Barrocas e Rococó –
prolongaram-se no tempo, atrasando a entrada das novas correntes.

9. Arte Neoclássica

O Neoclassicismo arquitectónico português foi introduzido em Portugal no último quartel do


século XVIII e nas primeiras décadas do século XIX. O neoclassicismo, embora ter entrado no séc.

Santos, Reynaldo, Oito séculos de arte Portuguesa, 2, Lisboa, edição notícias, s. d.


XX como arte pública, edifícios públicos, recebeu fundamentalmente duas influências principais. No
Porto16 foi sentida essencialmente a corrente Neopalladiana, trazida de Inglaterra por intermédio da
colónia inglesa residente no porto e ligada ao vinho do douro. A cidade invicta, como primeira cidade,
centro da arquitectura Neoclássica, foi a obra do arquitecto Carlos Amarante17 que mais se
notabilizou. A primeira grande obra portuense foi o Hospital de Santo António de influencia palladiana.
Projecto elaborado por John Carr e iniciado em 1770. Esta obra, devido à sua pureza das linhas foi
considerada um ícone da época a seguir. É em Lisboa, trazida pelos bolseiros de Roma e de artistas
residentes italianos a trabalhar em Portugal. Lisboa18, o neoclassicismo foi mais tardio devido ao clima
cultural da corte e à influência da “escola” de Mafra, ainda tardo-barroca e Rococó.

10. Arte do Romantismo

A Arquitectura portuguesa do período romântico iniciou-se a meados do século XIX. Em


Portugal, os revivalismos históricos tiveram um carácter marcadamente nacionalista, evocando
principalmente nos edifícios públicos, as épocas históricas de maior fulgor: o período áureo dos
descobrimentos através do Neomanuelino19. No mesmo período os revivalismos derivaram em
diversas ordens artísticas e temporais como é o caso do edifício da Câmara Municipal de Sintra, um
Neo-Românico interpretado pelo arquitecto Adães Bermudes. Outros exotismos evadiram o país na
segunda metade do século XIX nomeadamente o Neo-Árabe, influências orientais, etc. Pelo final do
século XIX e em inícios dos século XX aparece o ecletismo, que deixou marcas na arquitectura
privada e publica, nomeadamente na Basílica de Santa Luzia em Viana do Castelo, havendo uma
descontrolada mistura de influencias Neo-românicas, Neo-bizantinas e outras fazendo que o edifício
se assemelhe, vagamente, ao da Igreja do Sacré-Coeur em Paris.

11. A Arte Portuguesa: Da permanência do Naturalismo ao Modernismo (1980-1930)

Após um período de estabilidade trazida pela regeneração (1851-1890) Portugal sofre novas
perturbações que causaram alterações na vida dos portugueses. Marcadas pela ditadura de João
Franco, pela contestação republicana, pelo regicídio, implantação da Republica, pela intervenção na
primeira guerra Mundial e também pela instauração do estado novo. As artes foram das actividades
mais prejudicadas, como se constata pelo desfasamento cronológico entre os diferentes movimentos
europeus e o conhecimento que deles tiveram os nossos artistas.
Projectos urbanísticos: Praça da Ribeira e Praça dos Almadas.
Obras: Igreja da ordem da trindade, Academia real da Marinha e Ciências.
Exemplos: Teatro de S. Carlos (1972) onde o português José da Costa foi inspirado pela Scala de Milão; palácio da Ajuda
(1795-1860), criado pelo italiano Francisco Xavier Fabri;
Exemplos: Palácio do Buçaco, Estação do Rossio; Palácio da Regaleira.
O tipo de obras produzidas, conservadoramente ligadas “aos esquemas naturalistas nas artes
figurativas, a uma mentalidade historicista e eclética na arquitectura e a um gosto e cultura
arcaizantes nos métodos de produção e nas suas possibilidades de consumo” 20 e pelo próprio publico
comprador que era pouco conhecedor.
Com esta situação os autores portugueses tiveram pouca projecção nacional e europeia. A
modernidade era impedida também por um ensino anquilosado submetido à tradição e ao respeito
pela experiência. Apesar disso, houve alguma contestação nos vários domínios da arte de alguns
inconformistas. No campo literário foi sentido amplamente em Eça de Queiroz, António Nobre, e
Fernando Pessoa; Nas artes, Pousão, António Carneiro, Almada Negreiros; Na Arquitectura Ventura
terra, Marques Silva e até na música como Viana da Mota, Alfredo Keil, Luís de Freitas Branco, e
Fernando Lopes Graça. Foi pela acção destes inconformistas, que a partir de 1915 na pintura e cerca
de 1925-30, na arquitectura se começou a falar de Modernismo. Este movimento apareceu ligado a
uma série de eventos artísticos importantes, ocorridos a partir de 1900, entre muitos, o concurso do
pavilhão de Portugal para a exposição internacional de Paris em 1900, a publicação de importantes
revistas como a construção moderna, no mesmo ano. A criação da sociedade dos arquitectos
Portugueses, 1902, que defendeu um espaço para esta profissão, cada vez mais ameaçada pelos
mestres-de-obras e pelos engenheiros. Para isso a criação do prémio Valmor de arquitectura no
mesmo ano. Foi fundado também o primeiro salão de humoristas em 1912 e depois Exposição dos
Humoristas e dos Modernistas em 1905 (onde é usada pela primeira vez a palavra “modernista”). A
presença dos Delaunay em Portugal (a partir de 1915) e da sua influencia sobre os nossos artistas. A
Exposição livre, em 1911, organizado por um grupo de pintores, que ao terem estado em paris,
vieram com bastantes influencias cubistas, mas, no entanto, fiéis ao Naturalismo. A introdução do
modernismo surgiu pela introdução das novidades tecnológicas ligadas ao uso do ferro, do vidro e do
betão armado, aplicados em projectos de vanguarda.

Se estas novas tecnologias permitiram o aparecimento da arquitectura do ferro e do vidro, de


seguida, da arte nova, a continuidade da mentalidade historicista e eclética proporcionou a criação da
“casa à portuguesa” reforçada com a instauração do Estado Novo e a “nacionalização” da arte
proposta por este.

José Augusto França.


12. Modernismo em Portugal
Breve Contexto histórico

Portugal, em meados do século XX, o classicismo racionalista e naturalista regulava toda e


qualquer produção literárias e plásticas. Manifestações apáticas e decadentes que evidenciavam forte
resistência à inovação. À decadente e constante alteração politica traduzia a uma não menos
constante e decadente produção intelectual. Os interesses culturais eram abandonados em proveito
dos interesses materiais dos burgueses regulando a liberdade de expressão.
Uma situação incomportável para alguns grupos de intelectuais portugueses. Organizaram-se
então em círculos de contestação da velha e instituída ordem. Recorrendo a estratégias
provocatórias, por vezes, duras em relação às formas politicas e culturais conservadoras e
reaccionárias à modernidade. É o modernismo, enquanto movimento estético e literário de ruptura
com a apatia intelectual, que imerge unanimemente com a arte e a literatura mais progressivas da
Europa, sem perda, porém, da originalidade nacional.

Surgiram lançamentos de revistas, conferências e exposições de iniciativa privada. Numa


tentativa autónoma ao apoio estatal, as opções culturais eram divulgadas e demonstradas. No
Entanto, o baixo nível de alfabetização da população portuguesa e o conservadorismo dos contextos
urbanos, onde as novidades intelectuais têm maior presença, não cultivaram grande afinidade das
populações aos novos eventos culturais.

A arquitectura não registou grande evolução neste período. Época politicamente difícil vivida
durante a I República, adicionando grandes dificuldades e financeiras, não fomentou os
empreendimentos arquitectónicos, geralmente dispendiosos. Neste sentido os investimentos
urbanísticos construídos neste tempo permaneceram fechados à inovação revelando a persistência
dos esquemas arquitectónicos clássicos.

Durante o Estado Novo, no final dos anos 20, é que surgem as primeiras preocupações em
conjugar formas do modernismo europeu com o nacionalismo Salazarista. Os melhores exemplos
foram sentidos no pavilhão de Cotinelli Telmo para a Exposição do Mundo Português, a Igreja de
Nossa Senhora de Fátima de Pardal Monteiro com vitrais de Almada Negreiros e um friso na entrada
de Francisco Franco, constituem as manifestações mais relevantes do modernismo arquitectónico
português.

No Porto, alguns arquitectos, como Morais Soares e cunha Leão, iniciaram um movimento de
renovação a caminho da modernidade. Este movimento, como movimento revelador e impulsionador
foi mais enérgico na obra de Carlos Ramos, quando esteve à frente da Escola de Belas-Artes do
Porto. Em meados da década de 50, este movimento de renovação viria a ser marcado pelas obras
do arquitecto Siza Vieira.
12. 1.Arquitectura Portuguesa do séc. XX

A Arquitectura em Portugal, a partir de 1900, viveu três tendências artísticas sequenciais e


complementares. A primeira seguindo os esquemas académicos, ecléticos e formais da arquitectura e
da decoração oitocentista que se mantiveram devido à constante presença dos “Neos”
nomeadamente em grandes palácios, palacetes e até solares. Em segundo lugar visão romântica
denominada de “construir à portuguesa” defendida por Álvaro Machado e Raul Lino. Por ultimo a
introdução de tendências internacionais, em Lisboa e Porto, que viriam originar a Arquitectura
Modernista Portuguesa após 1925-1930. O Modernismo nasceu como uma reacção de uma acção
difícil urbana onde é de salientar a Construção de prédios de arrendamento e de novos bairros sem
grandes preocupações estéticas (mas com bons materiais) – as fachadas com alguns elementos arte
nova e nas traseiras, ferro e vidro. A construção de bairros sociais 21 para as classes populares
(processos técnicos muito débeis, devido ao atraso da industrialização)22 que rapidamente cresceram.
A edificação de bairros operários com a proliferação das “ilhas operárias”, na cidade do Porto, e as
vilas e pátios operários23 de Lisboa.

E. g. os bairros de Andrade, da Estefânia, do Monte à Graça e de Santo Amaro.


‘Um casario reles, espalhafatoso, sem carácter, também, sem estilo e elegância, sem conforto nem luz.’ In, PINTO, Ana Lídia;
MEIRELES, Fernanda; CAMBOTAS, Manuela Cernadas; Historia de Arte, ocidental e portuguesa das origens ao final do
século XX, Porto, Porto Editora, 2006, pág. 814.
Constituídos por pequenos fogos que cresceram na vertical, devido às estruturas de ferro e apresentavam varandas e
galerias do mesmo metal.
36. Implantação da República
A “casa portuguesa” e os novos programas (1900-1921)

«Período de transição hesitante entre a valorização culturalista das especificidades nacionais e


a adesão aos modelos progressistas europeus, em acelerada transformação técnica, conceptual e
ideológica -, os limites da produção definem-se entre uma aproximação de acento racionalista, que
ainda não é capaz de integrar o potencial contido nos novos materiais, e um gosto que se adapta
cenograficamente ao programa pelo estilo.»24

O início do século é, simultaneamente, tempo de continuidade e emancipação. O gosto


revivalista, fixado na adequação dos estilos históricos às novas necessidades programáticas, coloca a
questão da funcionalidade e das tecnologias construtivas em desenvolvimento nesse período, assim
como dilema da “casa portuguesa”. O País oscila entre o gosto cosmopolita e francês de Ventura
Terra e a busca de raízes nacionais que Raul Lino protagoniza. Neste âmbito, é paradigmático o
concurso do pavilhão de Portugal para a exposição de Paris (1900), que Ventura Terra vence. Ernesto
Korrodi desenha o edifício da rua Ferreira Borges, em Lisboa (1900). O projecto vive do compromisso
compositivo entre o ecletismo oitocentista (ao nível da decoração das fachadas) e a interpretação da
situação de gaveto (esquina), numa clara exploração de sentido urbano justificado pela localização.
No Porto, Marques da Silva ensaia no Teatro de S. João (1910-1918), o uso de betão sob uma massa
ornamental ainda de referencia beauxartiana.

13. O efémero modernismo (1922-1938)

«O novo sistema construtivo baseado no betão armado começava gradualmente a ser


assumido pelos arquitectos que o passavam a reconhecer como feito cultural significativo. Isto é,
assiste-se ao progressivo desenvolvimento da ideia de tecnologia como padrão cultural, atribuindo-se

Arquitectura Moderna Portuguesa (1920.1970), coord. Ed. Ana Tostões e Sandra Vaz Costa, p.105
à racionalidade da construção o papel eminente de “gramática” da linguagem que se procura. Assim
se constituindo como elemento “moderador” da forma e nessa medida dotado de uma autonomia
estética própria.»25

O fascínio pelo moderno de inspiração alemã e italiana, que se reinventa a partir do


entendimento português da Art Deco, mais eficaz na inclusão ornamental do que no tratamento do
espaço. O modernismo é ainda um estilo, expressão linguista que o Estado Novo apadrinha nas
ambiciosas obras públicas, sob encomenda de Duarte Pacheco. Pardal Monteiro concretiza um
conjunto memorável de edifícios: Instituto superior técnico, Igreja de Nossa senhora de Fátima e
gares marítimas de Alcântara e Rocha de Conde de Óbidos (Lisboa). No Parque Mayer, em Lisboa,
Cristino da Silva expõe a sua formação parisiense, desenhando o Capitólio-Music-Hall, objecto puro,
despejado de qualquer elemento decorativo. Os equipamentos integram propositadamente uma
escala monumental e digna do programa albergado, caso do trabalho de Monteiro ou de Cotinelli
Telmo. O momento efémero, como comprova o percurso moderno de Cristino da Silva, suspenso com
a praça do Areeiro, num período posterior) ou de Rogério de Azevedo, através do edifício da garagem
do jornal “O comércio do Porto” (1928-1932). Cassiano Branco produz a série de prédios de
rendimento, cuja imagem é facilmente repetida e imitada em obras menores.

14. Arquitectura do regime (1938-1948)

«Com o final da década de 30 o acento monumentalista exposto no programa das obras


públicas do regime aproxima-se de um vocabulário de novo historicista e regionalista, apostado numa
narrativa de raiz clássica próxima dos modelos nazis e fascistas da época.»26

Designação polémica para um curto período, em que o estado Novo procurou fixar uma
expressão gramatical apropriada à representação do regime. Os modelos afirmam-se entre a escala
monumental influenciada pela moderna arquitectura alemã (mostrada numa exposição realizada em
1941) e a inclusão de temas “regionais”, numa releitura historicista que vê na produção joanina (D.
João V) uma abundante fonte de inspiração, ou então privilegia o que entende ser uma raiz
“ruralizante”. A Exposição do Mundo Português (1940) pretendeu ensaiar estes imaginários que
progressivamente encontram os seus programas funcionais. O Areeiro de Cristino da Silva revelou-se
a melhor concretização no âmbito de um ideário simbólico que recupera os modelos habitacionais da
aristocracia setecentista portuguesa e os projecta como a imagem do Estado Novo. Como
representantes de uma terceira via, pode citar-se o caso de Francisco Keil do Amaral (Escolas para a
Fábrica Secil, 1938-1940, e Clube de Ténis de Monsanto, 1947-1950) ou a casa de Honório de Lima
(Porto, 1939) de Viana de Lima, aproximação inequívoca a Le Corbusier.

Arquitectura Moderna Portuguesa (1920.1970), coord. Ed. Ana Tostões e Sandra Vaz Costa, p.106
Arquitectura Moderna Portuguesa (1920.1970), coord. Ed. Ana Tostões e Sandra Vaz Costa, p.118
15. Ruptura moderna e questionamento do estilo internacional (1948-1961)

«O pós-guerra marca o fim das obras públicas e o início de uma nova etapa na política
económica do Estado Novo. Se o primeiro, que designámos também como o primeiro período do
ciclo do betão, foi dominado pela figura tutelar de Duarte Pacheco, a segunda etapa que em
paralelismo usamos a imagem do segundo período do ciclo do betão seria referida à influência de
Ferreira Dias. Este segundo ciclo caracteriza-se pela alteração profunda nas estruturas da economia
pautada pelo arranque da electrificação e da moderna industrialização do país a partir do final dos
anos 40.
Anos de ruptura, mas também de charneira, os anos 50 são particularmente importantes para
entender o tempo de “longa duração” do século, e fundamentais para clarificar a situação da própria
contemporaneidade. Depois de um hiato de tendência nacionalista-fascizante, monumental ou
ruralizante, reflectindo numa produção arquitectónica estruturalmente cenográfica, a ruptura entende-
se como momento de dar atenção ao interrompido projecto moderno.»27

Este período denuncia as realizações do ambiente vivido na pós-guerra e incentivado pelo I


Congresso Nacional de Arquitectura (1948) onde os profissionais portugueses manifestam a sua
adesão aos princípios do Estilo Internacional. Renova-se, ainda, a compreensão dos esquemas
funcionais que definem a elaboração de equipamentos públicos, como na Escola do Vale Escuro
(Victor Palla e Bento de Almeida) ou na Associação Académica de Coimbra (Abel Manta e Alberto
Pessoa). O Espaço urbano é igualmente, tema em reformulação (bairro das estacas em Lisboa, de
Ruy de d’Atoguia e Formosinho Sanchez). Keil do Amaral projecta a feira das Industrias (1952-1957).
Nas regiões do interior, as barragens hidroeléctricas do Cavado e do Douro revelam-se territórios
para a experimentação e os conjuntos aí edificados, designadamente as pousadas, são obras
extremamente qualificadas. Entre eles, destaque para a capela de Manuel Nunes de Almeida (Picote,
Douro).

16. A pluralidade dos anos 60 (1961-1974)

«Período revelador de um contexto político e social em profunda mutação, as contradições do


poder anunciam a inevitabilidade de uma crescente liberalização associada ao fenómeno,
generalizável a todo o ocidente, decorrente da crescente liderança americana no processo de
globalização económica e mediática. Tempo de pluralidade, os anos 60 são marcados por um esforço
de desenvolvimento industrial por parte do regime e simultaneamente pela ruptura que o eclodir da
guerra de África constitui.»28

Arquitectura Moderna Portuguesa (1920.1970), coord. Ed. Ana Tostões e Sandra Vaz Costa, p.124
Arquitectura Moderna Portuguesa (1920.1970), coord. Ed. Ana Tostões e Sandra Vaz Costa, p.145
Este período é assinalado por uma produção diversificada e, muito provavelmente, mais
personificada. O início da guerra Colonial e a revolução de Abril definem um enquadramento
cronológico, que novamente recupera o empreendimento de grande escala, nomeadamente ligado ao
sector terciário e ao desenvolvimento turístico. O atelier de Conceição Silva domina a actividade
nestas áreas (Hotel do Mar e Edifício Castil). Nuno Teotónio Pereira e Nuno Portas, dentro do espírito
laboratorial que caracteriza aos seus percursos de época, projectam a casa Dr. Barata, em Vila
Viçosa (1958-1962), recorrendo a uma geometria fraccionada que se reflecte no jogo volumétrico do
edifício. O uso da telha regressa. Como peça maior, pode-se evocar o edifício sede da fundação
Calouste Gulbenkian, resultado de um concurso limitado que daria a vitória à equipa construída por
Alberto Pessoa, Pedro Cid e Ruy d’Athougia. Fernando Távora desenha, para Gondomar, o Convento
das Irmãs Franciscanas de Calais (1961-1971).

17. Os anos da revolução (1974-1976)

Dois anos para evocar as operações SAAL que assinalam uma internacionalização da
arquitectura portuguesa. As experiencias desenvolvidas no âmbito da Habitação e dos diálogos
travados com as associações de moradores para a sua resolução são consideradas originais. As
abordagens feitas ao problema variam de região para região, e as concretizações nortenhas, mais
localizadas nos espaços urbanos degradados, diferenciam-se das realizações desencadeadas no
Sul, direccionadas para a construção em altura e situadas em áreas desocupadas. Num processo em
que estão envolvidos muitos profissionais e que proporcionalmente as obras parecem escassear,
destaque para Siza Vieira (brigada de São Victor); Sérgio Fernandez (bairro do Leal); Pedro Ramalho
e Fátima Lima (Antas); Hestnes Ferreira (Cooperativa Habitacional 25 de Abril); Manuel Vicente
(Quinta do Bacalhau); Gonçalo Byrne (casal Figueiras); Cabral de Mello e Maria Manuel Godinho de
Almeida (Cooperativa Chasa) e Francisco Silva Dias (Alto dos Moinhos). A ultima constitui uma
excepção no panorama dos SAAL Sul, por interpretar o tema da habitação unifamiliar com
aproximação aos imaginários vernaculares e meridionais.

18. De 1976 ao fim do século

É o tempo de maior pluralidade expressiva, até pela proximidade temporal deste conjunto de
obras em relação ao presente. Um dos aspectos preponderantes assenta da definitiva projecção
internacional de Álvaro Siza e da promoção da arquitectura portuguesa mereceu no exterior. A lista de
obras escolhidas para a exposição é necessariamente longa e inclui autores mais conhecidos do
público, como Alcino Soutinho, Fernando Távora, Eduardo Souto Moura, Gonçalo Byrne, Manuel
Vicente ou Victor Figueiredo; Até profissionais menos mediáticos caso de, Bartolomeu Costa Cabral,
Paula Araújo da Silva, Paulo Gouveia ou João Paulo Providencia e José Fernando Gonçalves. É
ainda um período atento à temática da salvaguarda do património, como comprovam os projectos da
Flor da Rosa, de Carrilho da Graça, ou a intervenção de Souto moura na Pousada do Bouro. A
inclusão de duas obras da Expo 98 (Pavilhão do Conhecimento dos Mares de Carrilho da graça e a
antiga torre da Petrogal de Manuel Graça Dias e Egas Vieira) completa a selecção.

19. Álvaro Joaquim de Melo Siza Vieira, o MESTRE.

Tenho tanto sentimento


Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
E essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
E a que tem que pensar.

Fernando Pessoa

Álvaro Joaquim de Melo Siza Vieira nasce em 1933 em Matosinhos, Portugal. Em 1949 entra
na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto. Ainda antes de concluir o seu percurso
académico, em 1955, como estudante, é concluída a sua primeira obra29 em Matosinhos. Durante três
anos (1955-1958) colabora com o arquitecto Fernando Távora. Em 1966, começa a leccionar como

Um conjunto de quatro vivendas geminadas em Matosinhos. Esta obra foi concluída em 1954.
tutor na Escola Superior de Belas Artes do Porto (1966-1969) a disciplina de construções e em 1976
já era professor de Arquitectura.
O seu percurso internacional tem sido notável, como pedagogo. Foi professor visitante da
Escola politécnica de Lousanne, Universidade de Pensilvânia, universidade de Los Andes em Bogotá,
e também na escola de design da universidade de Harvard. Continuando o seu percurso na
universidade do Porto, participou em diversas conferências na Europa, América e Japão. Siza vieira,
prémio Pritzker da arquitectura, foi também honorado com o grau de Doctor Honoris Causa por
diversas universidades como a universidade de Valência, em Espanha (1992), Escola politécnica de
Lousanne, Suíça (1993), universidade de Palermo, itália (1995), universidade Menéndez Pelayo
University, Santander, Espanha (1995), Universidade Nacional de engenharia de Lima, Perú (1995), e
a Universidade de Coimbra, Portugal (1997). Siza Vieira é ainda membro da academia de artes e
ciência americana e membro honorário do Real Instituto dos Arquitectos Ingleses, Instituto dos
arquitectos americanos, da Academia de arquitectura de França e a Academia europeia de artes e
ciências.

No início do Novecentos a arquitectura e o Urbanismo foram rompidos por duas grandes forças
conceptuais – o tecnofuncionalismo e o organicismo expressionista.
No entanto, nos anos 20, a energia da vanguarda moderna norteia-se dominantemente pelo
modelo mecanicista.
Nesta sequência Le Corbusier e o Esprit Nouveau enunciam o paradigma de casa como
máquina de habitar30. Em 1933, a carta de Atenas debate a cidade industrial detalhadamente – A casa
máquina harmoniza-se então à cidade máquina.
Este paradigma tecnofuncionalista (mecanicista) instalado, ao conjecturar a revolução Industrial
comportou várias críticas dos movimentos “Arts and Crafts”, da Arte Nova, do Expressionismo e do
organicismo. O que se reconhecia, logo após a I Guerra Mundial, era que o desenvolvimento
tecnológico não se verificava automaticamente em progresso social. Esta dicotomia não fora prevista
pelos arquitectos e urbanistas modernos vítimas de um modelo politico de crescimento capitalista.
Portugal no seu contexto social e económico singular, nos anos 40, expressava tardiamente um
princípio frágil do movimento moderno. Nos anos 30/40 o racionalismo personificou a luta contra o
estilo nacionalista assumindo a priori características específicas.
Em Lisboa, a primeira orientação seria assumida pelo movimento tecnicista moderno enquanto
o grupo do Porto se sentiu mais identificado com as artes plásticas.
Entre 1955 e 1960, o inquérito à arquitectura popular, veio consagrar a arquitectura vernacular
portuguesa artesanal – a arquitectura popular do norte evidenciada pela sua organicidade, resistia às
referências modernas mais modelizadas em torno da matriz industrial geométrica.
Nos anos 50, a revista arquitectura, impunha um outro modo de ver o moderno. Como
referência, o olhar de Bruno Zevi, Aalto e Wright, o estilo internacional não era seguido apenas pela

Congresso de La Sarraz (Declaração CIAM, 1928)


sua matriz, mas sobretudo pela sensibilidade organicista. No Norte, esta tendência aparece em torno
da Escola do Porto, explicitada em diversas preocupações. O pedagogo Carlos Ramos e outras
personalidades31, introduziram e desenvolveram uma nova linguagem, técnica construtiva e
problemática antropológica. Siza Vieira insere a sua actividade criativa em todo este complexo
terreno.
Este contexto de crise do paradigma de estilo internacional32, ajudam a consolidar o jovem
arquitecto Siza Vieira num processo mais inventivo e integrado de projectar. Mais complexo e a uma
escala mais humana, com variáveis aleatórias que fazem do construir um jogo complexo. Esta
metodologia é processo. Processo que se fortaleceu em experiencias e em aprofundamentos da
arquitectura. A ligação intensa com o cliente, o local e os meios técnicos e humanos da obra global
produziram uma visão integrada dos aspectos estruturais e técnicos, sociais e estéticos da
arquitectura. A ligação intensa com o cliente, o local e os meios técnicos e humanos da obra global
produziram uma visão integrada dos aspectos estruturais e técnicos, sociais e estéticos da
arquitectura. Os tratados de Vitrúvio, Alberti, Blondel, Durand e Semper fornecem uma referência
triádica à arquitectura – Solidez técnica, Utilidade Programática e Estética. Nestas referências Siza
não aplica academicamente e estaticamente, coordena sim organicamente esta tríade na vivência
concreta das suas obras. É uma triunicidade que se afirma. O Observar atento, a grande abertura
popular, a sensibilidade de artista consolidam também uma especial atenção pelo “lugar”.
Inicialmente, o Genius Loci foi apreendido de modo atávico. O “Topos” reduzia-se assim a
território etológico. Com o avanço do racionalismo, a referência espacial geométrica desenvolve-se a
perspectiva (lugar visto essencialmente por fora) permitindo uma abordagem rigorosa
quantitativamente, Mas só a apreensão mais global traduz uma racionalidade mais rica à noção do
lugar.
O lugar existencial é um lugar habitável, um lugar plástico, mas também um lugar de
potencialidades latentes à espera de um olhar revelador desses elementos ocultos mas virtualmente
decifráveis.
Este lugar vivido por dentro é uma componente essencial da arquitectura de Siza Vieira. A outra
característica fundamental é o método de projectar. Projectar é processo e não meta. Assim o
processo de projectar em Álvaro Siza Vieira introduz a dimensão temporal. “O esquisso que nasce do
insight – lugar habitável acumula experiencia com balanços sucessivos que são sucessivos desenhos
sobre o desenho até que o traçado confirma e disciplina o que foi encontrado genericamente, como
uma metamorfose biológica.
Há uma triunicidade na formulação projectual de Álvaro Siza – O programa, a opção estrutural
e o sítio está intimamente imbricados. Triunicidade Sistémica em que a forma não é tratada como
componente separada mas ressalta como harmonia resultante de espírito do lugar, da estratégia
estruturo-funcional e da finalidade sócio programática. A beleza, diferentemente de alguns tratadistas
clássicos como referimos, não é autonomizada como decoração justaposta à construção. A forma

E. g. Fernando Távora, Loureiro, Viana de Lima, Octávio Lixa Filgueiras e Arnaldo Araújo.
A especificidade do atraso das forças produtivas industriais no país e presença de métodos artesanais tradicionais.
plástica é elaborada como imprescindível e necessária coesão sintética de múltiplo-uno, da
triunicidade:
LUGAR – ESTRUTURA – PROGRAMA
Esta forma que resulta, esta forma que se encontra sem procura prévia e isolada está implícita. É
uma ordem criativa consciente. Consciente porque é feita de distância e implicação na obra aberta de
poética e racionalidade. Por isso, o carácter métrico, o carácter canónico de projectação em Álvaro
Siza Vieira está intimamente ligado à organicidade do método de observação do lugar.

“Não sou capaz de aceitar uma linguagem pré-estabelecida. Quando trabalho num contexto,
sou incapaz de decidir qual é o estilo apropriado para utilizar nesse contexto.

“O lugar aparece fortemente no desenvolvimento do desenho. O programa ou características


funcionais podem ser prioritárias, mas todos os elementos, em doses distintas, convivem em cada
projecto. A maturidade e a preparação incorporam um maior número de recursos.”

Mesmo se não existisse um código universal, porém o controlo do desenvolvimento do projecto


deve apoiar-se em coisas sólidas como, por exemplo, a forma de um animal ou de um ser orgânico. É
um elemento de controlo do mesmo modo que a geometria do mundo natural” (Siza Vieira, A. 1986).
Capitulo II
Mentalidade e Meio
«Um país vale profundamente na civilização pelo
grau com que, nacionalizando-os, aprofunda e dá novo
sentido aos elementos gerais comuns a todos os países
da civilização a que pertence.»
Fernando Pessoa

Este nosso estudo pretende averiguar, através do método experimental33 e do conhecimento


teórico, a existência de elementos congregadores, de natureza conceptual, formal, artística e técnica
(material e construtiva), que sirvam de suporte à sistematização daquilo que poderemos chamar o
símbolo arquitectónico português, na sua tradição e inovação.

Portugal apresenta-se, no contexto europeu, social e culturalmente, como verdadeiramente


original. A sua posição marginal e periférica em relação aos grandes pólos europeus difusores de
vanguarda cultural34 contribuiu para que os modelos tradicionais anteriores tendessem a permanecer
muitas vezes imutáveis. Assim, com a força de uma “contratendência reactiva” e com vontade
integradora, tenta superar a omnipresente vertente conservadora do seu povo pela única via da
metamorfose ideológica e formal. É o que acontece com a sua arquitectura.
Os modelos artísticos europeus, sinal da modernidade e dos novos tempos, eram de grande
importância para Portugal, contribuindo vivamente para o desenvolvimento dos processos artísticos
nacionais. A arquitectura portuguesa, na sua longa história, foi fortemente marcada pelas influências e
correntes arquitectónicas exteriores e pela sua completa assimilação e nacionalização. No entanto
algo de singular caracterizava este continuo processo criador. A frequente importação de novos e
modernos ideais não era directamente introduzida em Portugal; havia sim uma lenta assimilação e
reinterpretação dos modelos antigos que iam sendo adaptados às novas correntes. O ecletismo na
arquitectura portuguesa é por vezes considerado aleatório, até pelos seus parcos recursos, e de

Entenda-se método experimental - a forte base da diacronia da história da arquitectura portuguesa e o tematismo dos variados
estilos arquitectónicos.
Entenda-se Vanguarda cultural como novas correntes ideológicas, sociais, culturais e arquitectónicas.
algum modo transformador, ao repensar, adaptar e finalmente integrar. Recebendo um novo sentido,
nacionalizando e tradicionalizando, se afirma o tão singular e original objecto arquitectónico.
Goitia35, ao enumerar alguns valores comuns no contexto ibérico da arquitectura tais como os
da «planitude, horizontalidade, cubicidade», assume que a «estrutura espacial elementar» de outrora
estava sempre presente. Estes valores traduziam-se numa estrutura simples e clara, no que diz
respeito «a la sinceridad y a la verdad de los volumes». Assim, as expressões do novo ideal eram
interpretadas num «tratamento decorativo em superfície», num desejo, muitas vezes incoerente, de
uma crescente complexidade do objecto arquitectónico, limitado aos recursos e às impossibilidades
de realização do vulgar quotidiano.
Portugal, um pequeno país do sudoeste europeu, ou melhor, a nação mais ocidental do
continente europeu, apresenta expressões de arquitectura, marcantes e diversificadas por todo o
território. Estas decorrem do entendimento, da apreensão, interpretação e regionalização das novas
linguagens pelos artífices locais. Como afirma J. M. Fernandes36, «Os contrastes de entendimento
das formas e dos espaços, e mesmo as oposições geradas pelas distintas influências, têm um papel
catalisador e dialéctico.»
Neste particular, desempenharam um papel de primordial significado no contexto das
construções públicas portuguesas, os arquitectos régios oficiais. Foram eles, pela sua mobilidade,
quer estrangeira quer nacional, os grandes instrumentos e fomentadores das novas linguagens
arquitectónicas. Cito, a título de exemplo, entre eles, Diogo da Arruda, que “construiu” a janela
manuelina do Convento de Cristo em Tomar, iniciada em 1515.
Numa palavra, o manuelino – afirmando-se, na sua identidade 37, na diáspora ultramarina – e a
arquitectura chã, iniciada na mesma época, além de atestarem nos portugueses «o gosto inato de
construir», são o expoente máximo da singularidade da arquitectura portuguesa.
Segundo Manuel Rio-Carvalho, são importantes os aspectos patentemente INTEGRADORES e
TRADICIONALISTAS da nossa arquitectura: «Embora a evolução da arte portuguesa se processe por
uma série de movimentos artísticos importados, julgo que a sua tonalidade específica é proveniente
de uma operação mental pela qual se procura que as grandes correntes possam ser integradas num
contexto anterior, já conhecido e dominado, […] o querer conservar e querer inovar, e o querer
conciliar estas tendências está na base da grande originalidade da arte portuguesa: originalidade não
de uma criação ab initio, mas conseguida através de uma alquimia intelectual; […] o processo pelo
qual uma estrutura, que traduz todo um sistema de relações, é rarefeita até se tornar numa forma
revela a preocupação de tornar possível a integração da modernidade na tradição, e do
desconhecido, dando-lhe um sentido novo, que não o original.»
José Augusto França acentua o carácter tradicionalista – a que chama de conservador – da
nossa arquitectura, num contexto temporalmente mais amplo: «Num país que tinha fundido o gótico

Vide CHUECA GOITIA, Fernando, Invariantes Castizos de la arquitectura Espanola, Madrid, Editorial Dossat, 1979.
Arquitectura Portuguesa, uma síntese, cit p.24
Entenda-se Identidade pela abertura do espírito Lusitano e espontânea apropriação das vivências ultramarinas em época dos
descobrimentos.
no manuelino e o século XVI e o maneirismo no barroco, com mais razão o estilo europeu dos anos
20 (do século XVIII) trinta anos mais tarde fazia ainda figura de moderno… Tendo a característica
fundamental da arquitectura portuguesa sido sempre o seu estilo conservador […]» E confirmando a
ideia de uma tendência integradora das correntes artísticas europeias na nossa arquitectura,
podemos referir Pais da Silva, que faz ressaltar a capacidade ADAPTATIVA desta, a propósito do
gótico, em que «os figurinos importados foram rapidamente repensados com originalidade e com tal
força que a sua adaptação conferiu à arquitectura gótica portuguesa situação muito particular».
O carácter tradicionalista e integrador também são referidos por Maria João Madeira Rodrigues,
no contexto da cidade como «objecto de arte», estabelecendo assim a ligação destes aspectos
comuns à arquitectura e ao urbanismo: «Por um lado [as populações de Lisboa] integram-se na nova
ordem industrial e são os seus próprios agentes motores; por outro, ainda próximos da sua
implantação rural, e pelas próprias contingências do processo urbano lisboeta, na periferia da cidade,
mantêm uma herança arcaica de usos e costumes que os faz reviver um sistema antigo […]»38.

«O génio lusíada é mais emotivo que intelectual. Afirma e não discute. Quando uma ideia se
comove, despreza a dialéctica; e é sendo e não raciocinando que ela prova a sua verdade.
A emoção afoga a inteligência, ultrapassando-a como força criadora. E assim, corresponde à
nossa superioridade poética, uma grande inferioridade filosófica. O português não é nada filósofo; a
luz do seu olhar alumia mais do que vê; não abrange, num golpe de vista, os conhecimentos
humanos, não subordinando-os a uma lógica perfeita e nova que os interprete num todo harmonioso.
O português não quer interpretar o mundo nem a vida, contenta-se em vive-la exteriormente; e
tem, por isso, um verdadeiro horror à Filosofia, imaginando encontrá-la em tudo o que não entende.
Daí a sua incapacidade construtiva de novas verdades que representam o móbil superior do
Progresso.»39

“A arquitectura portuguesa, na sua diacronia da história, nunca se revelou, quanto hoje, alheada
da sua circunstância. Se a arquitectura, como organizadora do espaço, cria circunstância e ela não
poderá posicionar-se numa posição de vítima, mas deverá agir para a valorização da circunstância
pré-existente.
O caos da arquitectura contemporânea portuguesa é revelado com a reprodução abusiva de
técnicas obsoletas, sem sentido. A criação espacial que não corresponde à função ou às
necessidades dos utilizadores, a utilização de «colunas» e outras formas de «gosto», inúteis mas que
revivem o tematismo de tempos antigos e suas arquitecturas, o ignorar de valores legados pelo
passado, desprezando a relação entre a arquitectura e a circunstância – um ciclo vicioso.

Rodrigues, Maria João Madeira, «Tradição, Transição e mudança – A produção do espaço urbano na Lisboa oitocentista», in
Boletim da Assembleia Municipal de Lisboa, nº84, Lisboa, 1979.
Arte de ser Português, cit. p.76-77.
O inevitável avanço das tecnologias construtivas vão alterando as técnicas tradicionais de
construção. A falta de mão-de-obra e o fazer rápido evidencia-se no plano económico entre outros
factores, catalisando com maior rapidez as técnicas construtivas. Ainda assim, a evolução tem sido
lenta e está longe de estar presente em todo o território onde as técnicas tradicionais construtivas
ainda resolvem a escolha da solução técnica para os problemas correspondentes às realidades de
todo o país.
A arquitectura como geradora e organizadora espacial interior cria espaços para o homem. Só
poderá ser verdadeira se corresponder à função que lhe foi atribuída a priori, se originar um espaço
vivido, para que o homem encontre o seu espaço, ambiente, criado à escala das suas necessidades.
O homem deve encontrar o «seu» espaço, o ambiente criado à escala das suas necessidades e das
possibilidades, quer como individuo quer como elemento de um grupo social.”40

Távora, Fernando, in Da organização do espaço, p. 56.


Capitulo III
Experimentação (inovação)
Reflexões sobre o papel do arquitecto na sociedade

O arquitecto é um ser de constante procura do novo e ideal. O seu espírito reflexivo omnipresente e
interventivo, é caracterizado muitas vezes por um ser incómodo dentro de uma sociedade controlada
e regida por poderes. O arquitecto como ser livre e autónomo, tem o poder e a obrigação de criar
novas formas de habitar, criar sentimentos, rasgar dogmas instalados, e fundamentalmente, criar na
sociedade um espírito de ser-pensante sobre o modus operandi corpóreo e universal. O arquitecto,
como fazedor do belo, poderá ser comparado a um sapateiro 41, que através do belo utilitas ajuda a
caminhar o mundo para o futuro. Ao trazer novos mundos ao mundo, o seu poder quase religioso,
rege-se por uma simplicidade humana e para o humano, já que como fazedor de sonhos ele
concretiza o futuro. O arquitecto não é apenas um técnico, mais uma etapa, e sim a alma corpórea de
um sonho construído.

“Shömaekers” – Sapateiro (em Holandês) significa “fazedor do belo”.


Anexos
TEXTO 1

DA INTROVERSÃO À METÁFORA

A «revolução tranquila» de Álvaro Siza Vieira, como foi definida pela revista Architecture d'Aujourd'hui,
começou há meio século, com quatro moradias na Avenida D. Afonso Henriques e na Rua Dr. Filipe
Coelho, em Matosinhos, projectadas pelo então aluno da ESBAP, que concluiria o curso de
Arquitectura com 20 valores.

Em 50 anos, o arquitecto espalhou pelo Mundo vivendas particulares e bairros sociais, piscinas e
pavilhões, bancos e estações, universidades e museus, mercados para legumes e depósitos de água,
planos de remodelação ou expansão urbanas e cenários para bailado, restauros delicados e edifícios
exuberantes, memoriais e boutiques, templos e hospitais, num processo que, na feliz expressão do
seu colega, amigo e cliente, Alexandre Alves Costa, foi «da introversão mais extrema à metáfora quase
monumental.»

O jovem de Matosinhos que queria ser escultor mas, por respeito ao pai, engenheiro que admirava, se
matriculou no Curso de Arquitectura, com seu lápis num permanente desenhar, pode aparentar certas
contradições ao longo destas cinco décadas. As suas iniciais «casas introvertidas», em que o exterior
era uma parede lisa, qual muralha a desviar os olhares do exterior - pois toda a habitação era virada
para dentro, com superfícies envidraçadas a dar para um pátio -, partiam de uma ideia diferente da que
vai explorar nos seus museus «desenhados pela luz» (como lhes chamou Ana Milheiro), com as
paredes enjaneladas, as janelas vigia, a mesa invertida para entrada da luz superior.

Um exercício arriscado é tentar estabelecer alguns pontos de contacto entre certas peças que edificou
e os autores com quem estabeleceu cumplicidades, pois, como garantia a prestigiada revista francesa
num número sobre o arquitecto galardoado com os prémios Mies van Der Rohe e Alvar Alto, «como
todas as obras superiores, ela é inclassificável».

Ponto de partida é, sem dúvida, a concepção e a implantação do Salão de Chá da Boa Nova, cujas
rochas naturais estão enquadradas «até ao ponto de levarem aquele visitante japonês a afirmar que
eram de plástico» (como referia Alexandre Alves Costa).

Na análise de José Salgado, ali «há soluções formais em que a inspiração em Alvar Aalto é muito
nítida, nomeadamente na inclinação dos tectos e no desenho de algumas situações decorativas». Mas
podem detectar-se também outras referências, como a de Le Corbusier «no desenho da chaminé
exterior» ou a de Frank Lloyd Wright «nos grandes balanços da cobertura», além do «perfume» do seu
mestre e amigo Fernando Távora, a quem tinha sido confiado o projecto. «O mais importante, porém»,
conclui José Salgado, «é o vigor da linguagem de Siza, aqui ainda sobrecarregando de
intencionalidades toda a pormenorização, mas já com autonomia suficiente para não deixar dúvidas
sobre o seu carácter.»

De resto, há referências que o próprio assume, das «evidentes influências de Alvar Aalto» na Boa
Nova à «atracção muito forte por Frank Lloyd Wright» na Piscina das Marés, da «organização típica da
casa moderna, muito próxima de [Marcel] Breuer», na Casa de Ofir, à Casa Avelino Duarte, em Ovar,
que se tornaria conhecida como a «Casa [Adolf] Loos.»

Outras, porém, revelam algo da sua ironia delicada, como a escolha das cores exteriores, do vermelho
vivo da Bouça, numa homenagem ao arquitecto alemão Bruno Taut, ao tom de cinzento que Otto
Bartning usou em Siemensstadt, que repetiu no edifício berlinense Bonjour Tristesse.

As suas «citações» chegam ao ponto de lhe permitir conciliar o quase inconciliável, como nota Jacinto
Rodrigues, referindo-se ao Ponto e Vírgula, em Haia, onde, «com a sua sensibilidade poética e a sua
excepcional cultura arquitectónica, Siza realizou um edifício com duas casas ou uma casa com dois
edifícios: é difícil definir este "camaleonismo" morfogénico». Neste caso, o arquitecto português cujo
génio foi reconhecido com o Prémio Pritzker, essa espécie de Nobel da Arquitectura, ergueu um dos
edifícios com referências ao expressionismo da Escola de Amesterdão (Klerk e Kramer) e fez a outra
com inspiração no neoplasticismo da escola de Roterdão (Oud e Ritveld).

Acima de tudo, Álvaro Siza é um autor desconcertante, já que os admiradores parecem ficar sempre
surpreendidos com a sua derradeira obra. A certa altura, era a Faculdade de Arquitectura do Porto, em
que o nome que mais projectou a chamada Escola do Porto edificava a sua sede. Depois, a Igreja do
Marco de Canaveses, mesmo incompleta, que o arquitecto diz que ainda faltam umas pinturas de seis
metros, «deformadas segundo a perspectiva». Logo a seguir, o Museu de Arte Contemporânea de
Serralves, a impressionas mas ainda.

Numa conversa com o arquitecto Nuno Portas, publicada na revista Vida Mundial, quando o colega
sublinhava a sua discreta intervenção no Chiado, Álvaro Siza contestava essa imagem de modéstia,
contrapondo: «Eu costumo dizer: dêem-me um arranha-céus para eu fazer em Nova Iorque e quero
ver o que vão dizer a respeito de modéstia.» Eis, agora, para quem duvidava, as suas Torres de
Alcântara.

Enquanto se debruçava sobre a grelha setecentista da Baixa lisboeta e descobria um percurso latente,
que se tornava numa nova passagem pública entre o Chiado e a Igreja do Carmo - numa atitude que
definiria, no seu livro Imaginar a Evidência, como «um trabalho de detective» -, ia concebendo o
pavilhão de Portugal.»

E esse novo ícone na beira-Tejo, quase em jeito de contraponto à Torre de Belém, com a pala que
alguns rotularam, não por qualquer exuberância do rendilhado, mas pela sua própria concepção, de
«barroca», é tudo menos uma discreta intervenção num território. Afinal, como sustenta Vittorio
Gregotti, o seu amigo Siza é «um dos arquitectos que, por si só, poderia renovar a Arquitectura».
Chega de Palavras.

Fernando Madaílpaula Lobo in Diário de Notícias de 2004.01.09


Exposição do Mundo português

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