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Gabor Steingart
A maior nação da Europa está em declínio há vários anos. O núcleo da sua economia começou
a encolher: um processo que nenhuma reforma conseguiu conter. Os problemas da Alemanha
estão profundamente enraizados na era do pós-guerra.
O dia 14 de março de 2003 começou de uma forma encorajadoramente espetacular. Não havia
nenhum ataque terrorista a ser noticiado, nenhuma renúncia de figura graduada, nenhum
indivíduo famoso morrera. Em Berlim, o chanceler Gerhard Schröeder foi até o plenário para
apresentar a 33ª declaração de políticas da sua gestão.
Schröeder falou durante 84 minutos, lendo quase timidamente as linhas do seu manuscrito.
Com pouca entonação ou ênfase, ele fez declarações diretas, como: "A reforma e a
modernização do Estado de bem-estar social se tornaram inevitáveis".
Ele falou de forma indiscutível dos "sinais de crise". E disse que não permitiria mais que se
"descartasse a discussão dos problemas apenas porque estes parecem ser inevitáveis". E
apresentou a sua "Agenda 2010", alternando propostas de medidas austeras com apelos por
moderação.
O discurso do chanceler foi chamado de "Coragem para Mudar", e foi o seu mais importante
discurso até hoje. Nenhum chefe de Estado alemão jamais havia dito ao povo de forma tão
honesta aquilo de que este há muito já suspeitava: a era dos fatos positivos acabou; é chegado
o momento dos sacrifícios. O seu discurso na Agenda 2010 poderá ser visto como um ponto de
inflexão na história da Alemanha do pós-guerra.
Isso porque, em algum trecho do caminho, a história alemã perdeu o rumo. A revitalização do
pós-guerra entrou em um declínio gradual, que inicialmente mal foi notado pela população. As
suas cabeças ainda estavam tomadas pela lendária Modell Deutschland, com a qual o
chanceler social-democrata Helmut Schmidt fez a sua campanha na década de 70.
A princípio, a nação inteira se recusou a aceitar que um "processo de encolhimento" teve início
no cerne da economia, no centro produtivo do país. O objetivo da Agenda 2010 era servir como
toque de despertar para que a nação acordasse dos seus sonhos.
Ninguém no exterior esperava tal coisa dos alemães. Alguns ficaram extasiados, outros
amedrontados, e muitos foram tomados por ambos os sentimentos. Deve ter sido
impressionante presenciar um povo se levantando das cinzas das suas cidades para criar
carros e aço, produtos químicos e usinas de energia - e tudo isso com uma qualidade notável.
Os exuberantes políticos alemães deram a esse mais maravilhoso dos mundos o nome de
"Modelo Alemão" e começaram a agir como se tivessem descoberto uma fórmula mágica de
crescimento rápido.
Tal era a sua convicção que muitos sequer notaram o quão pesado esse país das maravilhas
se tornou na Fase Dois, que durou de 1970 até a reunificação, em 1990. Esses foram anos de
sobriedade. O desemprego e a dívida governamental se infiltraram no quadro, como se
procurassem eclipsar todas as realizações do milagre econômico.
Nos anos 70 a taxa de crescimento foi de 31%. Na década de 80 o motor econômico diminuiu o
seu ritmo, e foi registrado um crescimento de 23%. Os índices anuais de crescimento de cerca
de 8% registrados a partir da década de 50 caíram para apenas 2%.
Os sintomas previamente invisíveis da crise agora se tornaram cada vez mais aparentes. Cada
vez mais gente perdeu os seus empregos, a maioria deixando definitivamente as suas fábricas
e escritórios. O desemprego disparou, chegando a mais de 1.100% de 1970 a 1990.
Mas foi só com a Fase Três --quando o território do país aumentou em 110.000 km², cinco
Estados federais e 16 milhões de habitantes-- que o ritmo do declínio começou a se acelerar.
Os anos perdidos tiveram início.
Os anos perdidos
Desde o início dos anos 90, todo o crescimento foi financiado por novas dívidas - a um custo de
bilhões. Os empréstimos superaram o produto interno bruto. Os economistas se referem a isso
como o "crescimento do crédito".
Desde então, todo indicador econômico tem estado no vermelho. O endividamento público
dobrou em um período de quinze anos, chegando aos atuais 1,4 trilhão de euros. O
desemprego disparou em quase 70% desde a reunificação. Janeiro de 2005 marcou a primeira
vez em que mais de cinco milhões de alemães estavam oficialmente desempregados.A história
de sucesso do milagre econômico estava sendo revelada de trás para frente.
A estratégia da Agenda 2010 não funcionou até o momento. A cada dia de trabalho desde o
discurso de Schröeder, a Alemanha perdeu 1.300 empregos tidos como totalmente seguros.
Colocando a situação sob uma perspectiva simples, a população está se deslocando da coluna
dos bens para a coluna das dívidas na folha nacional de equilíbrio financeiro. Ela não está mais
gerando, e sim consumindo, prosperidade. O declínio da ex-super-estrela econômica se
acelera ainda mais com o maior número de aposentadorias no centro produtivo do país.
O objetivo não era uma administração eficiente; era mais importante impedir um retorno do
totalitarismo. "Os aliados queriam nos decapitar", diria mais tarde o conhecido ex-prefeito de
Hamburgo, Klaus von Dohnanyi.
Hoje o Bundesrat pode adiar a aprovação de cerca de 60% de todas as leis federais, e exerce
um voto integral sobre 40% delas. Os compromissos entre o Bundestag e o Bundesrat
precisam ser costurados por uma comissão mediadora. Caso contrário, a legislação
simplesmente fica paralisada - como aconteceu com freqüência no passado.
Tão sério no que diz respeito ao seu impacto, o segundo erro estrutural da nova república foi
construído durante a criação do sistema de previdência social. Após a reforma monetária, a
Alemanha não contava com mais nada - a não ser uma montanha de trabalho a ser feito. A
escala do desafio era gigantesca. Assim como também era enorme o desejo de enfrentá-lo. Os
políticos decidiram vincular a expansão do Estado de bem-estar social à expansão do
emprego.
Nenhum outro país do mundo vinculou o seu sistema de segurança social - segurança contra
grandes riscos como desemprego, doença, velhice e incapacitação total - ao emprego
remunerado de forma tão clara e quase categórica.
O elaborador do Estado de bem-estar social na Alemanha não foi, como muitos acreditam, Otto
von Bismarck, mas Konrad Adenauer - o primeiro chanceler da Alemanha Ocidental.
Ele criou, provavelmente de forma não deliberada, mas com certeza de maneira negligente,
uma máquina de pagamentos que distribuiu benefícios em um patamar que não poderia ser
suportado pela base econômica do país - desde o princípio. Adenauer permitiu que a energia
fosse retirada do núcleo produtivo da economia em um ritmo mais rápido do que seria permitido
pelo crescimento do país.
Segundo os cálculos de Erhard, esse foi um recorde mundial. Assim, os gastos sociais
engoliram "uma parcela do produto nacional maior do que já foi registrado em qualquer outro
país da Terra", advertiu o ministro da Economia.
Os gastos com a previdência dobraram desde a década de 20, e o resultado foi que o milagre
econômico foi seguido de um milagre da previdência - algo que Adenauer desejava e Erhard
temia.
A peça central da estratégia social de Adenauer foi a sua política de pensões. Ela assegurou ao
chanceler o seu lugar nos anais do declínio. O destino dos aposentados alemães da época não
era róseo, conforme sabia Adenauer. Os pensionistas praticamente não se beneficiaram do
milagre econômico.
A hiperinflação dos anos 20 e os títulos sem valor algum que os pensionistas tiveram que
suportar no período nazista reduziram dramaticamente os fundos de pensão. Grande
quantidade de bens imóveis perdeu-se devido aos ataques aéreos.
Embora os cofres para o esquema de pensões de Bismarck ainda não estivessem
completamente vazios, os seus conteúdos diminuíam rapidamente. O governo tinha que tornar
a abastecê-los - caso contrário os aposentados terminariam caindo na pobreza.
Adenauer buscava um novo tipo de sistema de pensões. Foi o seu filho, Paul, que finalmente
ajudou o idoso chanceler. No verão de 1955, ele enviou a Adenauer um panfleto delgado
endereçado ao seu refúgio de férias suíço em Muerren. O documento fora escrito por Wilfrid
Schreiber, um professor à época pouco conhecido que havia sido diretor-executivo da
Federação dos Empresários Católicos.
O panfleto discutia "o pacto de solidariedade entre duas gerações sucessivas". O seu ponto
central era uma idéia sedutora: em uma economia florescente, com salários em ascensão,
qualquer vínculo entre pensões e salários aumentaria automaticamente os benefícios de
aposentadoria.
Ao retornar das suas férias, ele declarou quase imediatamente que o seu objetivo era garantir
que os aposentados "levassem vidas decentes e não tivessem que sair por aí como pedintes".
Uma catástrofe se seguiu. Adenauer pode não ter previsto as conseqüências cataclísmicas,
mas aceitou voluntariamente o risco.
Mas o governo decidiu por algo diferente. A maioria das pessoas no patamar de alta renda teve
permissão para continuar pagando seguros privados apoiados pelo capital. Portanto, a classe
economicamente mais forte permaneceu fora do sistema.
Sob uma perspectiva sistêmica, ele sentiu que os governos não deveriam adotar proteções
coletivas contra o risco da velhice e, ao mesmo tempo, declarar que o outro grande risco na
vida - ter filhos - fosse uma questão de natureza privada. Schreiber insistiu sistematicamente
que ambos os riscos precisariam ser abordados "simultaneamente" e "de forma igual", a fim de
evitar a exacerbação do problema da redução populacional.
E quanto às crianças?
Adenauer, à época com 80 anos de idade, tomou uma decisão favoravelmente inclinada para a
sua própria geração, que já estava aposentada. As famílias com filhos nada receberam. Os
sete milhões de aposentados de 1957 foram os beneficiários exclusivos das contribuições
coletadas. A eles foi prometida uma bênção de dez dígitos na corrida pela eleição.
Devido aos benefícios políticos, todas as outras formas de seguro social foram a seguir
expandidas - seguro desemprego, seguro saúde e, nos anos 90, o chamado "seguro
maternidade".
O professor Oswald von Nell-Breuning, economista, padre jesuíta e defensor de uma reforma
do sistema de pensões, logo admitiu que esse foi um erro grave. Ele pediu à liderança política
que esclarecesse a população: "Querido povo. Aquilo que lhe dissemos no passado sobre
vincular as pensões aos salários brutos foi algo sem sentido. Nós também acreditamos nessa
tolice. Não antecipamos as alterações demográficas e ignoramos totalmente a sua
significância".
Mas o país preferiu seguir sonhando. A Alemanha continuou expandindo o seu Estado de bem-
estar social indexado aos salários até os anos 90. O país dormiu pacificamente enquanto a
globalização se instalava.
O custo do trabalho básico estava aumentando por si próprio, à medida que grandes mudanças
começaram a ocorrer no Extremo Oriente. As velhas e agora vulneráveis indústrias alemãs
ainda estavam sendo subsidiadas enquanto os Estados Unidos ingressavam na era do
computador.
Uma expansão sem precedentes do Estado de bem-estar social entrou em ação. Ela não se
concentrava nos necessitados, mas nos trabalhadores de colarinho azul e branco, a nova
"classe média", conforme uma frase cunhada por Willy Brandt. Isso criou as fundações sobre
as quais o novo governo foi erigido.
O ano de 1969 trouxe uma legislação garantindo que os trabalhadores não assalariados
também receberiam salários integrais durante afastamento por motivo de saúde. Os benefícios
para os desempregados também aumentaram para quase 70% do último salário líquido
recebido.
Além disso, o sistema estabeceu que só faria sentido encontrar um novo emprego em uma
área similar e em uma faixa salarial correspondente ao do trabalho anterior. A assistência
previdenciária aumentou - de 117 marcos alemães mensais em 1965 para 254 marcos dez
anos depois.
Assim como aconteceu com as pensões sob o governo Adenauer, a previdência foi fortalecida.
Se os salários subiam, também subiam os benefícios previdenciários. Tais benefícios se
transformaram efetivamente em um salário mínimo.
O fluxo de capital se reverteu; 1971-1974 foi o último período no qual o capital fluiu para dentro
e para fora do país na mesma proporção. Os alemães estavam investindo no exterior a mesma
quantidade de capital aplicada por companhias estrangeiras na Alemanha - era assim que as
coisas funcionavam naquela época.
Foi então que a maré virou de uma vez por todas. O influxo de fundos diminuiu, e a fuga de
capital se acelerou dramaticamente - chegando a 100% até 1981, e a 700% em 1991.
Nenhuma saída
Desse ponto em diante, a única constante real na política interna alemã foi o fracasso em
implementar uma reforma significativa. O chanceler Helmut Schmidt foi o primeiro a tentar - e
imediatamente perdeu todo o apoio do seu partido. O seu governo de coalizão de social-
democratas e liberais se desintegrou.
Os bilhões em bens que o governo anteviu na Alemanha Oriental simplesmente não existiam. A
produtividade industrial estava abaixo de um terço do nível da Alemanha Ocidental. Essa
produtividade, por sua vez, estava sendo alimentada por uma reserva de capital que já fora
severamente esvaziada.
Mais tarde soube-se que, sob condições mundiais de mercado, havia na verdade um déficit de
doze dígitos. As propriedades estavam contaminadas por produtos químicos, as emissões de
dióxido de enxofre eram sete vezes mais elevadas do que na Alemanha Ocidental e 50% mais
altas do que na Hungria.
O golpe sobre a economia da nova Alemanha unificada tem hoje conseqüências mais sérias do
que os políticos poderiam ter imaginado à época. Daquele momento em diante, dezenas de
bilhões de marcos alemães tiveram que ser transferidos do centro produtivo da economia
ocidental para o leste da Alemanha.
A cada ano, o oeste do país paga cerca 4% do seu produto bruto aos Estados federais do leste.
Como o próprio oeste mal apresenta um crescimento de 4%, essa cifra está sendo drenada do
patrimônio da região. O resultado é aquilo que Klaus von Dohnanyi denominou de "uma sangria
perpétua da nossa economia nacional".
Assim, a reconstrução do leste, que foi financiada por fundos emprestados e por maiores
contribuições do seguro social, se transformou em um programa de desmantelamento do
oeste. Com a sua rápida, e, assim ele acreditava, silenciosa transferência do Estado de bem-
estar social alemão-ocidental para o leste, Helmut Kohl trouxe devastação para os mercados
de trabalho.
Embora os bilhões de marcos ocidentais tenham ajudado a elevar o padrão de vida no leste,
esta não foi uma maneira de criar um ciclo econômico auto-sustentável. Durante anos tem
ficado evidente que a ajuda para a reconstrução do leste criou um Estado que será para
sempre dependente de subsídios.
"É um bom momento para o chanceler corrigir os graves erros da fase inicial", alertou Kurt
Biedenkopf, em março de 1992, quando ainda era ministro da Saxônia. "Helmut Kohl fez tudo
certo politicamente, mas tudo errado economicamente", acrescenta Lothar Spaeth, diretor da
diretoria de supervisão da Jenoptik, no leste da Alemanha. Mas, àquela altura, Kohl não estava
mais preparado para reformular a sua estratégia de reunificação.
Quando a coalizão do Partido Social Democrata (SPD) e do Partido Verde tirou o poder das
mãos de Helmut Kohl em 1998, houve esperanças de que a mudança gerasse uma
recuperação econômica. Gerhard Schröeder utilizou inteligentemente o seu talento econômico,
primeiro dentro do SPD contra o seu rival Oskar Lafontaine, e depois durante a campanha
contra o envelhecido chanceler da reunificação, Helmut Kohl.
Schröeder alegou que reduziria o desemprego e criaria um sistema social apropriado para o
futuro. Ele disse que não planejava fazer tudo de forma diferente, mas fazer várias coisas de
forma melhor. "Se não reduzirmos o desemprego significativamente, não mereceremos ser
reeleitos", concluiu.
Anos de autocongratulação se seguiram. "Governar é divertido!", foi o tema de uma festa feita
para os delegados do SPD no Bundestag.
Mas houve pouco governo. Demorou anos até que Schröeder, que anteriormente dançara com
destreza no palco das políticas domésticas, levasse a sério o seu programa da Agenda 2010.
Ou o país se modernizaria, ou seria modernizado, desse ele aos parlamentares alemães.
Após o discurso ele ofertou ao líder parlamentar do seu partido, Franz Muentefering, um buquê
de flores embrulhado em papel celofane claro, em gratidão à sua lealdade. Mas o partido
queria mais. Para dar um exemplo, queria recuperar o orgulho perdido. Toda vez que o
chanceler falava de "reforma", o partido entendia "crueldade". Ele desejava "modernização", e
o partido suspirava por "justiça".
Quarenta e sete semanas após o seu discurso, Schröeder cedeu o seu cargo de diretor
partidário do SPD a Franz Muentefering. "Qualquer negligência quanto à necessidade urgente
de agir representaria um abandono do juramento feito ao assumir o cargo", disse ele naquela
tarde de sexta-feira. Ele é o chanceler da razão, mas não da reversão. A realidade o modificou
mais do que ele modificou a realidade.