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Sitcom de

Evana Ribeiro

Episódio 1:08
“Eu compro esse corcel”
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CENA 01 – CASA DE DOMI/SALA – INT – DIA


Alpatino e Hecilépiton se levantam do chão, com caras de sono.
Domi entra, vinda da cozinha.

DOMI – Ah, os bonitos resolveram acordar do sono de beleza, foi?

ALPATINO – Que hora é essa?

DOMI – Passa das dez, gracinha. Podem puxar o carro e ir lá pra casa da
prima de vocês, tá?

HERICLÉPITON – Nossa, que hospitalidade! (t) Vou buscar o carro, tá,


Alpatino?

ALPATINO – Beleza, Heri. Não demora, tá?

Hericlépiton sai. Alpatino dá uma olhada em volta da sala,


procurando os cachorrinhos.

ALPATINO – Cadê eles?

DOMI – Tia Neide tá alimentando eles.

ALPATINO – Ah, bom.

DOMI – Que é, rapaz? Achou que eu ia tirar onda de Nazaré e


seqüestrar os filhotes dentro da minha casa?

ALPATINO – Sei lá...


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DOMI – Mas pense no Mancha, meu cachorro, pai dos filhotes. (t) Você
acha justo que os pais se separem de seus filhos?

ALPATINO – E os pais ligam?

CORTA PARA

CENA 02 – RUA – EXT – DIA


Hericlépiton chega a um galpão, em cujo portão entreaberto está
escrito: “NÃO ESTACIONE. GARAGEM.” Ele entra no galpão e demora-se
ali por alguns instantes. Depois de aproximadamente um minuto, ouve-
se o grito de Hericlépiton.

HERICLÉPITON (off) – Cara! Cadê o meu carro?

CORTA PARA

CENA 03 – CASA DE DOMI/SALA – INT – DIA


Alpatino e Domi esperam a volta de Hericlépiton, sentados lado a
lado no sofá.

ALPATINO – Ele tá demorando demais.

DOMI – Também acho!

Hericlépiton entra, desesperado.

ALPATINO – O que foi? Que cara é essa?

HERICLÉPITON – Fomos roubados.


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ALPATINO (assustado) – Como é?

HERICLÉPITON – O Corcel sumiu!

ALPATINO – Da garagem?

DOMI – Corcel?

NEIDE (entrando) – Esse carro ainda existe?

HERICLÉPITON – Existe e eu tinha um. Pelo menos até ontem!

DOMI – Tia, Corcel é um carro?

NEIDE – É. Um carro meio antiguinho. (t) Em que mercado de pulgas


vocês compraram ele?

ALPATINO – Um cara meio doido tava endividado e quis vender o carro


pra gente em suaves prestações.

HERICLÉPITON – Agora esse bendito carro me some! Como é que a


gente vai voltar pra casa?

CORTA RÁPIDO PARA

CENA 04 – CASA DE LOLITA/QUARTO DE LOLITA – INT – DIA


Alpatino e Hericlépiton estão ao lado da cama de Lolita, com a
caixa dos cachorrinhos ao lado. Lolita espirra sem parar, deitada e
enrolada em um lençol.
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LOLITA – Dêem o fora daqui com esses cachorrinhos!

ALPATINO – Mas eles são tão fofinhos...

LOLITA (grita) – Meu nariz não tá achando nada fofinho. Fora!

HERICLÉPITON – Alpa, leva eles pra fora que eu falo com a prima.

ALPATINO – Beleza.

Alpatino sai com a caixa dos cachorrinhos. Lolita levanta.

LOLITA – Agora fala que é que tu quer!

HERICLÉPITON – Uns trocados pra voltar pra casa.

LOLITA – Como? Vocês não tem dinheiro?

HERICLÉPITON – Estamos desprevinidos.

LOLITA – Ê, pindaíba!

HERICLÉPITON – Mas a gente nem costuma andar assim, sabe? Foi que
roubaram o corcel que eu comprei e agora...

LOLITA – Nossa, que chato. Nem sabia que tu tinha carteira...

HERICLÉPITON – Tirei ano passado.


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LOLITA – Já ligou pra polícia?

HERICLÉPITON – Liguei. Agora a gente tem q voltar pra casa e esperar...

LOLITA – Acho que tenho alguma coisa aqui no meu porquinho. (aponta
para um porquinho amarelo sobre o criado mudo)

HERICLÉPITON – Ah, que massa! (vai pegar o porquinho) Vou quebrar


ele aqui, tá?

LOLITA (levanta imediatamente e agarra o porquinho) – Tire as patas,


Hericlépiton! Tire as patas! Não é assim que se pede dinheiro
emprestado não.

HERICLÉPITON – Me empresta.

LOLITA – Palavra mágica?

HERICLÉPITON – Me empresta, por favor.

LOLITA – E o que mais?

HERICLÉPITON (ajoelha) – Me empresta, por favor, minha priminha tão


bonitinha fofinha e gostosinha do coração!

LOLITA – Era pra emprestar o que mesmo? É que eu me empolguei com


os elogios...

HERICLÉPITON – O dinheiro do teu porquinho...


LOLITA – Ah, tá. Vou pensar no caso.
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CORTA PARA

CENA 05 – CASA DE LOLITA/SALA – INT – DIA


Alfredo termina de se arrumar para sair. Alpatino o persegue, por
toda a sala, falando sem parar.

ALPATINO – Sabe o que é, tio, eu não tô assim muito confiado no


trabalho da polícia não. Tipo, eu sei, tem uma galera do bem, que
trabalha direitinho, mas também tem as almas sebosas... Aí eu pensei:
por que não pedir pro tio Alfredo tomar a frente das buscas por causa
do carro, né?

ALFREDO – Pára de me seguir, rapaz! E desde quando eu sou teu tio?

ALPATINO – Padrasto da Lô é como se fosse pai. E Lô é minha prima,


aí...

ALFREDO – Tá, tá, deixe para lá. Só que não vai dar pra eu ficar
correndo atrás do ladrão do carro. Isso é coisa pra delegacia de roubos
e furtos de veículos, eu só chego até o Instituto de Criminalística.

ALPATINO – Puxa, que chato.

ALFREDO – Mas relaxa! Quantas pessoas iam querer roubar um carro


velho?

ALPATINO – Pra fazer desmanche, quem sabe.


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ALFREDO – É... Dizem que fusca é um carro muito visado pra


desmanche.

ALPATINO – Mas não foi um fusca, foi um corcel.

ALFREDO – Que seja. (t) Agora eu tô atrasado, tá? Falamos depois.


Tchau.

ALPATINO – Tchau!

Alfredo sai. Alpatino senta na poltrona.

CORTA PARA

CENA 06 – CASA DE DOMI/SALA – INT – DIA


Domi fala ao telefone com um desesperado.

DOMI – Peraí, fala de novo que eu não entendi direito. (t) Ah... Você
vendeu um carro usado e o comprador não pagou nem a primeira
parcela, é isso? (t) Como é o carro? (t) Corcel, 86, bege. (t) Como é? (t)
Tá, tá bom. (t) Entendi, vocês querem que a gente ajude nas
negociações. Como é o nome do caloteiro mesmo? (t) Hmmm... Pode
ficar tranqüilo, senhor Bonifácio! Vamos resolver seu problema num zás-
trás!

Domi desliga o aparelho, com ar de satisfação.

CORTA PARA
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CENA 07 – CASA DE LOLITA/SALA – INT – DIA


A sala está vazia. Domi entra, chamando.

DOMI – Lô!

LOLITA (vinda do quarto) – Domi?

DOMI – Muito bonito, a porta aberta...

LOLITA – Alpatino tava aqui. Acho que ele foi lá fora.

DOMI – Ah, tá. Falando nisso, teu primo Hericlépiton tá aí?

LOLITA – Tá lá em cima, contando as moedinhas pra passagem de


ônibus.

DOMI – Moedinhas?

LOLITA – Ele me convenceu a fazer uma boa ação. Quebrei aquele


porquinho amarelo.

DOMI – O porquinho amarelo? Como ele te convenceu?

LOLITA – Ameaçou se matar. Como a última coisa que eu quero é um


cadáver no meu quarto, acabei quebrando o porquinho.

DOMI – Só espero que ele não tente fazer isso depois que eu falar com
ele...

LOLITA – O que tu vai falar com ele?


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DOMI – Ele tá lá no teu quarto, né? Então me leva lá que eu explico


tudo de uma vez.

LOLITA – Tá bom!

Elas saem, rumo ao quarto de Lolita.

CORTA PARA

CENA 08 – CASA DE LOLITA/QUARTO DE LOLITA – INT – DIA


Lolita, Domi e Hericlépiton estão reunidos no quarto. Ele está
sentado na cama, Lolita em um pufe cor-de-rosa e Domi em pé.

HERICLÉPITON – Ô Dominique, dá pra parar com esse suspense e falar


logo?

LOLITA – É, Domi. Até parece que tu vai ler resultado de teste de DNA!

DOMI – É que eu tou pensando aqui em como vou dizer pro cara aí que
ele tá sendo perseguido!

HERICLÉPITON (surpreso) – Perseguido?

LOLITA – Perseguido pela polícia?

DOMI – Não, perseguido pelo dono de um Corcel 86. Tal de Bonifácio,


sabe?

HERICLÉPITON – Como é que tu conhece o Bonifácio?


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DOMI – Ele ligou lá pra Central pedindo ajuda pra recuperar a grana.

HERICLÉPITON – Mas como eu vou pagar esse negócio se o carro foi


roubado? Me nego!

DOMI – Ah, foi ele quem roubou o carro, tá? Quer dizer, roubou não: se
reapropriou do carro.

CORTA PARA

CENA 09 – CASA DE LOLITA/COZINHA – INT – DIA


Domi, Lolita, Alpatino e Hericlépiton conversam.

ALPATINO – Reapropriação? Que mané reapropriação, rapaz? Isso é


roubo, R-O-U-B-O!

LOLITA (comendo) – Quer parar de berrar?

ALPATINO – E o que a gente vai fazer?

DOMI – Pagar o dinheiro do cara, uai.

HERICLÉPITON – Com que dinheiro?

LOLITA – Não olha pra mim que eu não tenho mais porquinho pra
quebrar!
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HERICLÉPITON – Vê só, Dominique. A gente tinha feito mesmo um


acordo, a gente comprou o Corcel pra pagar em suaves vinte e quatro
prestações.

DOMI – E pelo jeito não pagaram nenhuma, pro cara pegar o carro de
volta...

HERICLÉPITON – Mas a culpa não foi minha, foi do Alpatino.

ALPATINO – Lá vai tu com essa história de novo, é?

DOMI – Olha, esqueçam esses problemas de família, não é nosso


departamento...

HERICLÉPITON (interrompe) – Não, mas você precisa saber! Todo


mundo precisa saber o que ele aprontou. (t) É que esse louco inventou
de se engraçar com uma mulher casada, sabe? Saiu com ela, pagou
jantar caro, motel os olhos da cara, táxi com ar-condicionado e DVD...

ALPATINO (interrompe) – Pára com isso!

LOLITA – Não, continua! Isso tá interessante.

HERICLÉPITON – Então. Também pagou umas roupinhas de marca,


sapato, ração pro cachorro...

ALPATINO – Eita, que mentira!


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HERICLÉPITON – Comprou ração pro cachorro sim, não venha me fazer


passar por mentiroso, não. Ele fez tudo isso com o dinheiro que era pra
pagar as duas primeiras prestações do carro.

DOMI – Meu irmão... Quero um desses pra mim!

HERICLÉPITON – Casa primeiro e depois ele pode te dar uma chance.

DOMI – Eu, hein...

HERICLÉPITON – E depois o cara, o urso lá, descobriu e pra não fazer


um escândalo, pediu dinheiro! Nessa a gente gastou todo o dinheiro que
tinha, que não tinha e que poderia ter! (t) E quem se lasca sou eu!

ALPATINO – Ora, eu não tive culpa!

LOLITA – Sim, inocente!

HERICLÉPITON – Mas voltando ao assunto... Preciso do Corcel de volta.

DOMI – Assim, cara. Se o negócio é dinheiro, esqueça. A Central não


tem contrato com banco de empréstimo.

HERICLÉPITON – Não, não é isso! Mas se você pudesse interceder lá


com o Bonifa... Pra ver se ele dava mais um prazinho e devolvia o carro,
né?

DOMI – É graça mesmo... Nos últimos dias só tem vindo assim: um liga
pedindo uma coisa, o outro pede exatamente o contrário!
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LOLITA – E isso é ruim?

DOMI – Claro que é! A gente nunca sabe qual dos dois vai pagar mais!

Alpatino e Hericlépiton se entreolham.

HERICLÉPITON – Então se depender desse critério, estamos ferrados.

ALPATINO – Não deu nem pra curtir o Corcelzão direito...

HERICLÉPITON – Mas tu nem sabe dirigir!

ALPATINO – Mas tem você!

HERICLÉPITON – Olha a minha cara de quem vai tirar onda de chofer.

DOMI – Vê só, eu sei que você tá liso, leso, louco, comprando fiado e
pedindo o troco. E como vocês são primos da minha melhor amiga...

LOLITA (interrompe) – Única...

DOMI (continua) – Minha melhor amiga, eu posso pensar no caso de


fazer um servicinho de grátis, na faixa e sem nenhum custo adicional.
Antes eu vou trocar uma idéia lá com o seu Bonifácio, ver qual é a dele.

HERICLÉPITON – Já vou te adiantando que esse Bonifácio é alma


sebosa!

DOMI – E não vale influenciar na minha decisão.


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HERICLÉPITON – Sim, senhora.

CORTA PARA

CENA 10 – CASA DE DOMI/SALA – INT – DIA


Domi e Fred conversam.

DOMI – Bem, o negócio é o seguinte. Eu preciso conversar com um tal


de Bonifácio, mas eu não quero ir sozinha. Dá pra você ir junto?

FRED – Por quê?

DOMI – Porque eu tô com medo, caramba.

FRED – Dominique com medo?

DOMI – Algo contra?

FRED – Mas tu não tem medo nem de barata, vai ter medo de um tal
Benefício?

DOMI – É Bonifácio.

FRED – Que seja. Mas tu com medo de homem é uma coisa inédita.

DOMI – Sei lá... Disseram pra mim que esse tal de Bonifácio é alma
sebosa.

FRED – Alma por alma, tu ganha dele com certeza.


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DOMI – Vai te lascar, Fred.

FRED – Tá vendo? Uma pessoa que manda os outros se lascarem assim


desse jeito tão... Dominique de mandar os outros se lascarem, não
precisa de um pobre Frederico pra nada!

DOMI – Quer dizer que tu não vai comigo?

FRED – Não.

DOMI – Tá certo... Valeu! Depois, quando eu receber a grana que eu


vou receber pra recuperar o Corcel, não venha pedir penico.

Domi sai batendo a porta. Fred deita no sofá.

FRED – Se a recompensa fosse o carro até que eu ia...

NEIDE (entrando) – Falando sozinho, é?

FRED – Só pensando alto. (t) Tia, o que a senhora ia achar se eu tivesse


um carro?

NEIDE – A única palavra que me vem à cabeça quando penso em você


com um carro é desastre.

Neide volta para a cozinha.

CORTA PARA
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CENA 11
Tomada da BR-101 em obras.

CORTA PARA

CENA 12 – ÔNIBUS – INT – TARDE


Alfredo e Domi conversam. O trânsito está incrivelmente lento e
poeira entra pelas janelas do ônibus. Domi fecha a sua janela.

DOMI – Pôxa, Alfredo... Brigada mesmo, viu? Eu tava mó sem graça de


te pedir qualquer coisa...

ALFREDO – Não esquenta com isso não, menina. Não foi você quem
pediu mesmo, foi Lolita. (t) Mas tem que tomar cuidado com esse povo
mesmo... A gente nunca sabe o que se passa pela cabeça de um
Bonifácio da vida... Ou de um Marião...

DOMI – Essa briga de vocês não acaba nunca, né?

ALFREDO – Não! Eu sou um homem do lado da lei e da ordem, não


compactuo com ladrões de sinal de rádio.

DOMI – E se a Caribe deixasse de ser pirata um dia e virasse uma rádio


oficial, direitinha, da lei?

ALFREDO – Ah, Dominique... Eu não acredito mais em Cegonha.

DOMI – Mas o Marião não é ruim...


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ALFREDO – Eu sei! A gente era amigo no colégio. Até eu mudar pro


colégio militar e ele começar a dizer que eu tava metido. Depois
perdemos contato... E quando nos reencontramos foi assim!

DOMI – Puxa, que história.

ALFREDO – Mas vamos deixar isso pra lá.

DOMI – Tá bom...

Domi olha pela janela.

CORTA PARA

CENA 13
Tomada aérea do Conjunto Marcos Freire, Jaboatão.

CORTA PARA

CENA 14 – RUA – EXT – TARDE


Mostra a fachada de um galpão, com a fachada mal rebocada, sem
pintura e com uma placa cujos dizeres não dá para identificar bem.
Alfredo e Domi se aproximam dali caminhando devagar.

DOMI – Seu Bonifácio disse que era aqui.

ALFREDO – Aqui onde?


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DOMI – Na frente de um galpão. (avista um senhor sentado em um


banquinho na frente de um bar ao lado do balcão) Ó, eu vou ali
perguntar àqueles senhores, vai que eles conhecem o tal de Bonifácio.

Domi vai andando na frente, até se aproximar do grupo de


homens bebendo na frente do bar. Alfredo vai logo atrás dela.

DOMI – Oi, licença... Algum de vocês conhece seu Bonifácio?

BONIFÁCIO (levanta-se) – Sou eu mesmo! E a senhorita?

DOMI – Dominique, da Central de Atendimento aos Desesperados. (t) O


senhor tinha me chamado, né?

BONIFÁCIO – Justo! Me acompanhe, por favor. (para os outros que


bebiam com ele) Volto logo.

Bonifácio e Domi entram no galpão. Alfredo atrás deles.

CORTA PARA

CENA 15 – GALPÃO – INT – TARDE


Os mesmos da cena anterior. Bonifácio caminha por todo o galpão,
enquanto Alfredo e Domi permanecem parados perto da entrada,
observando tudo um pouco desconfiados.

BONIFÁCIO – Arrastem uma cadeira, sentem aí!

ALFREDO (baixinho) – Isso aqui parece um centro de desmanche de


automóveis!
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DOMI – Alfredo, é uma oficina!

ALFREDO – Muito suspeito... Muito suspeito!

BONIFÁCIO (voltando) – Vocês ainda não se sentaram?

DOMI – Tá bom assim mesmo, seu Bonifácio.

BONIFÁCIO – Então digam a que vieram.

DOMI – Na verdade a gente é que quer saber o que o senhor quer.

BONIFÁCIO – Ah, sim, é mesmo. Preciso da ajuda de vocês para receber


o dinheiro que aquele Hericlépiton tá me devendo pelo carro.

DOMI – Mas... Seu Bonifácio, o senhor não já pegou o carro de volta?

BONIFÁCIO – Sim, mas e o tempo que ele me deixou sem carro, não
conta? Quero o dinheiro pelos dois meses que aquele salafrário me
deixou sem o menino dos meus olhos, meu filho predileto! (caminha até
o veículo que está coberto por uma capa preta e se debruça sobre ele)
Meu Corcelzinho querido! (afasta um pouco a capa, mostrando parte do
capô, e o beija)

ALFREDO – Mas... Se o senhor gosta tanto do carro, por que resolveu


vender?

BONIFÁCIO – Problemas financeiros, só isso. Foi num momento de


desespero que eu acabei vendendo meu Corcel querido.
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ALFREDO – Então tá.

BONIFÁCIO – Vão me ajudar a receber o dinheiro?

DOMI – Vamos tentar, aí!

BONIFÁCIO – Tentar? Vocês vão é conseguir!

DOMI – Cada um usa as palavras que quiser.

CORTA PARA

CENA 16 – ÔNIBUS – INT – NOITE


O veículo está quase vazio. Domi e Alfredo conversam.

ALFREDO – Então, que achou do homem?

DOMI – Doido. Completamente adoidado.

ALFREDO – Pois eu continuo achando que ele é um desmanchador de


carro usado.

DOMI – Nada... Ele tem cara de desajustado mesmo. Uma hora vende,
outra hora desiste, depois quer alugar... Que bichinho enrolado!

ALFREDO – E o que você vai fazer agora?

DOMI – Tô pensando...
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CORTA PARA

CENA 17 – CASA DE DOMI/SALA – INT – NOITE


Fred, Alpatino e Hericlépiton conversam bebendo cerveja e
assistindo a um DVD de uma banda de forró qualquer. Domi entra,
sozinha.

DOMI – Ei, que bagaceira é essa aqui?

HERICLÉPITON – Ah, conseguiu falar com o Bonifa?

DOMI – Consegui.

HERICLÉPITON – E aí?

DOMI – Fred, abaixa primeiro esse negócio.

Fred abaixa o volume da televisão. Domi senta no sofá.

DOMI – Então... Ele disse que quer o dinheiro dos dois meses que vocês
ficaram com o carro.

HERICLÉPITON – E devolve pra gente depois?

DOMI – Devolve... Devolve é uma bordoada na tua cabeça.

ALPATINO – Quer dizer que ele não vai mais devolver o carro?

DOMI – Não.
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HERICLÉPITON – Ele é louco?

DOMI – Se não é, tava agindo como um. Tratava o carro como se fosse
uma mulher...

HERICLÉPITON – Como se fosse minha mulher! Esse carro é meu e eu


não vou ficar sem ele!

DOMI – Bom, eu vou ajudar vocês. Mas só porque achei ele meio doido
e porque Alfredo falou tanto que ele podia ser um desmanchador de
carros que fiquei com medo.

ALPATINO – E como a senhorita pretende nos ajudar a recuperar o


carro.

DOMI – Eu também tenho que ter idéias?

ALPATINO – É claro! Esse é o seu trabalho.

DOMI – A gente faz as coisas de graça e você ainda vem exigindo?

CORTA PARA

CENA 18 – RÁDIO CARIBE/ESTÚDIO – INT – NOITE


Lolita está fumando um cigarro de cereja durante o intervalo de
seu programa. Marião entra repentinamente no estúdio.

MARIÃO – E aí, dona Lolita? Qual é a boa?

LOLITA – A de sempre. Milagre é o senhor por aqui!


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MARIÃO – Vim falar com você.

LOLITA – Sobre?

MARIÃO – É que eu andei fazendo umas pesquisas de campo, sobre os


programas da Caribe, e o seu programa obteve um retorno expressivo.

LOLITA (sorrindo) – É mesmo?

MARIÃO – É.

LOLITA – E que maravilhas os amados ouvintes, amadas ouvintes


disseram da Lô aqui?

MARIÃO – 25% dos entrevistados disseram que não ouvem o programa


porque é muito tarde; 30% disse que assim tá ótimo, mas não gostam
da tua voz de quenga; 10% não gostam das músicas; e o resto dos
entrevistados ama o programa do Marinho e quer que ele fique no ar a
madrugada inteira, incluindo o horário do seu programa.

LOLITA – É brincadeira, né?

MARIÃO – Não, é sério. Vamos fazer mudanças aqui nessa rádio!

LOLITA – E isso quer dizer que não vou mais apresentar o programa?

MARIÃO – Vamos promover algumas...


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LOLITA (grita) – Não quero saber de mudança nenhuma no meu


programa!

MARIÃO – Calma, menina, deixa eu explicar!

Lolita queima o braço de Marião com o cigarro e sai correndo.

CORTA PARA

CENA 19 – RUA – EXT – NOITE


Lolita se afasta do prédio da Rádio Caribe em desabalada carreira,
montada em uma bicicleta. Sonoplastia: Atropelamento e fuga –
Skowa e a máfia.

CORTA PARA

CENA 20 – CASA DE DOMI/SALA – INT – NOITE


Os mesmos da cena 17. A campainha começa a tocar loucamente.

DOMI (indo atender) – Já vai, ô do incêndio!

Domi abre a porta e dá de cara com Lolita, suada e com a


respiração ofegante.

LOLITA (entra gritando) – Eu me demito! Eu me demito! Eu me demito!

DOMI – E vem dizer isso logo pra mim?

LOLITA (se jogando nos braços de Domi e começando a chorar


escandalosamente) – Ai, minha amiga! Meu mundo caiu!
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FRED – Sai de baixo todo mundo!

LOLITA – O Marião acabou de me avacalhar! Nunca fui tão humilhada


em toda a minha vida!

DOMI – Meu Deus! O que ele fez?

LOLITA – Veio com uma pesquisa arrevesada lá, dizendo que meu
programa é uma droga que ninguém ouve.

FRED – DataCaribe? Que novidade é essa?

LOLITA – Quem sabe? Mas ele vai acabar com meu programa. (t) O que
vai ser da minha vida sem meus amados ouvintes, amadas ouvintes?

Lolita começa a chorar de novo, muito teatral. De repente, pára e


olha para todos, muito séria.

LOLITA – Mas eu vou me vingar.

CORTA PARA

CENA 21 – CASA DE LOLITA/SALA – INT – NOITE


Lolita entra intempestivamente, seguida por Alpatino e Domi.

LOLITA (gritando) – Alfredo! Alfredo!

ALPATINO – Lolita! Olha a lei do silêncio!


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LOLITA – Lei do silêncio pro teu nariz! (grita mais) Alfredo!

ALFREDO – Que foi, menina?

LOLITA – Eu quero fazer uma denúncia.

ALFREDO (interessado) – E quem é o denunciado?

LOLITA – O Marião.

Alpatino e Domi se entreolham, abismados.

ALFREDO – Muito bem, Lô, muito bem. Venha aqui pra dentro e diga
tudo o que você sabe.

Lolita acompanha Alfredo para dentro da casa. Alpatino e Domi


ficam sozinhos.

ALPATINO – E agora?

DOMI – Agora a gente fica esperando com cara de pastel de vento.

Eles ficam se olhando por alguns instantes, depois sentam lado a


lado no sofá, guardando uma certa distância um do outro.

CORTA PARA

CENA 22 – CASA DE LOLITA/COZINHA – INT – NOITE


Lolita e Alfredo estão de lados opostos da mesa, se olhando sérios.
Apenas uma das luzes está acesa, deixando o lugar com aspecto um
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pouco sombrio. Sobre a mesa, uma barra de chocolate e no centro, uma


fruteira.

ALFREDO – Jure sobre esta barra de chocolate branco com cookies que
vai dizer apenas a verdade, nada mais que a verdade.

LOLITA (com a mão sobre a barra) – Juro dizer a verdade, somente a


verdade, nada mais que a verdade.

Lolita tira o chocolate da mesa e leva ao seu colo.

ALFREDO – Agora me diga...

LOLITA – Eu sei tudo o que acontece dentro da Caribe. Sei como fazer
pra botar aquela joça abaixo.

ALFREDO – E como você sabe?

LOLITA – Por que eu...

As luzes se apagam repentinamente e a fala de Lolita é


bruscamente cortada. Em off, ouve-se os moradores gritando.

CORTA PARA

CENA 23 – CASA DE LOLITA/SALA – INT – NOITE


Tudo na escuridão. A única luz, muito fraca, vem do celular de
Domi. Alpatino está muito quieto.

DOMI – Ei... Cê tá vivo?


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Alpatino não responde. Domi coloca a luz na cara dele.

DOMI – Acorda pra Jesus, rapaz! Eu tenho medo de escuro!

Domi continua tentando fazer Alpatino voltar a si. A luz do celular


apaga.

CORTA PARA

CENA 24 – RUA – EXT – NOITE


Fred, Hericlépiton e Neide estão parados na frente da casa. Luz
muito fraca, provida por lanternas mais a luz da lua cheia. Fred fala ao
celular.

FRED – Olha, é o seguinte. Aqui na rua 02, do Bairro São Francisco, teve
uma queda de luz. (t) Referência? É perto de uma pracinha. Uma praça
meio caída, meio fuleira, dá pra achar. (t) Como? Vocês me pedem pra
dar essas mil referências e depois dizem que já sabem? (t) Ora, vão se
lascar!

Fred desliga o telefone, emburrado.

NEIDE – Ai, Fred... Esse ‘vai se lascar’ não teve muita força.

FRED – Eu sei, tia. Só Dominique é Dominique.

HERICLÉPITON – Eu quero saber que fim vai levar meu carro nessa p...

NEIDE (interrompe) – Meu filho, olha a censura!


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HERICLÉPITON (continuando) - ... desse ca...

NEIDE (interrompendo de novo) – Seu Hericlépiton! Olhe a compostura!

HERICLÉPITON – Que compostura? Quero meu carro de volta! Exijo


meus direitos! Não sou ninguém sem aquele Corcel!

Os três ficam em silêncio por alguns instantes. O telefone de Fred


começa a tocar (uma música bizarra).

FRED – Central de A... Alô? (t) Sim. (t) Sim. (t) Sim.

NEIDE – Esse tá bom... Diz mais sim que noiva doida pra casar!

FRED (off, exaltado) – Como é?

NEIDE – Calma, eu só disse que...

FRED – Eu ganhei?

HERICLÉPITON – Ganhou? Ganhou o quê?

Fred desmaia, com um sorriso bobo no rosto. Neide e Hericlépiton


avançam para acudi-lo.

CORTA PARA
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CENA 25
Tomada da rua de Domi às escuras. Letreiro com os dizeres:
“Algum (muito) tempo depois...” As luzes se acendem. Ouve-se, em off,
os gritos das pessoas.

CORTA PARA

CENA 26 – CASA DE LOLITA/COZINHA – INT – NOITE


Agora todas as luzes estão acesas. Alfredo está em pé, sério.
Lolita, sentada, em estado de choque.

ALFREDO – Lolita?

LOLITA (voltando a si) – Oi?

ALFREDO – Pode começar a falar.

LOLITA – Falar o quê?

ALFREDO – Falar sobre o Marião.

LOLITA (fazendo-se de desentendida) – Foi?

ALFREDO – Sim, senhora.

LOLITA – Que coisa… Não lembro de nada.

ALFREDO – Você não lembra?


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LOLITA – De jeito nenhum! (t) Aliás, o que tô fazendo aqui? Preciso


voltar pro meu trabalho.

Lolita levanta e sai. Alfredo atrás dela.

CORTA PARA

CENA 27 – CASA DE LOLITA/SALA – INT – NOITE


Lolita entra na sala e paralisa, surpresa, poucos passos depois.

LOLITA – Carambolas!

Corta rapidamente para o outro lado da sala, mostrando o motivo


do susto de Lolita: Alpatino e Domi estão se agarrando no sofá.

CORTA PARA

CENA 28
Mostra o relógio digital da sala de Dominique, indicando o horário:
23:59. Muda para 0:00.

CORTA PARA

CENA 29 – CASA DE DOMI/SALA – INT – NOITE


Todos estão reunidos, em torno de Alpatino e Domi.

FRED (zombeteiro) – Você, hein? Quem diria!

DOMI – O que foi? Já não dá nem pra se agarrar em paz!


33

FRED – Não é isso. É que esse é o último cara da face da Terra que eu
achei que fosse agarrar você!

NEIDE – Fred, sabe aquela música do Leandro e Leonardo? (canta)


Entre tapas e beijos, é ódio é desejo, é sonho é ternura...

DOMI – Tia, pode parar com o show de calouros.

LOLITA – Mas... Vê só. (t) Vocês tão mesmo a fim um do outro, à vera?

ALPATINO (olhando para Domi) – Acho que sim.

FRED – Que maravilha! Agora somos todos uma grande família!

DOMI – Eita, exagerado...

FRED – Aproveitando esse clima de alegria, de amor, vou dar uma


notícia pra vocês. Arrumei um trampo.

DOMI – Eita, que mentira!

FRED – Não, é sério! Eu não tava nem ligado, mas ligaram da agência e
disseram que eu vou trabalhar de guia de turista lá em Porto de
Galinhas.

NEIDE – Tá explicado porque foi que tu desmaiou naquela hora.

FRED – E a grana vai ser boa! Muito boa! Dá até pra pagar prestações
de um carro, tipo, um Corcel, sabe?
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HERICLÉPITON – Você faria isso por mim?

FRED – Claro! Somos quase parentes, não é? E parentes se ajudam. (t)


Mas, é claro, vou fazer minhas exigências.

ALPATINO – Lá vem...

FRED – Calma, gente! Eu só quero parte no carro. Eu vou dar o


dinheiro, também tenho meus direitos, né?

Hericlépiton olha desconfiado para Fred.

CORTA PARA

CENA 30 – RUA – EXT – DIA


Surge o letreiro com os dizeres “Dias depois...”
O Corcel bege está estacionado na frente da casa de Domi. Todos
os personagens da cena anterior saem da casa. Fred se adianta e entra
no carro.

FRED (põe a cabeça pra fora do veículo) – Lá vou eu!

Fred dá a partida e sai cantando pneu.

LOLITA – Assim... Domi, ele tem carteira?

DOMI – Vencida. Mas ele nem é doido de pegar a BR! (t) E a história lá
da rádio?
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LOLITA – Me acertei com o Marião. Ele disse que meu programa vai
mudar de horário. E também me chamou de doida porque saí correndo
sem deixar ele terminar de falar. (t) Sou doida?

DOMI – Um pouquinho só.

O Corcel quase bate num poste.

NEIDE – Eu disse que Fred com um carro era desastre na certa...

********** FIM DO EPISÓDIO **********

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