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Direito Penal

A minha primeira sebenta

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 1


Direito Penal

INDICE
DIREITO PENAL .................................................................................................................................................................................................................................... 5
1. Noção.............................................................................................................................................................................................................................................. 5
a) Medidas de segurança............................................................................................................................................................................................................. 5
b) Medidas de correcção.............................................................................................................................................................................................................. 5
c) Penas ....................................................................................................................................................................................................................................... 5
2. Definição estrutural de Direito Penal .............................................................................................................................................................................................. 5
3. Crítica à definição estrutural da norma penal................................................................................................................................................................................. 6
4. Definição formal e material de crime .............................................................................................................................................................................................. 6
5. Direito Penal no quadro das ciências penais ................................................................................................................................................................................. 6
6. Princípio da subsidiariedade do Direito Penal................................................................................................................................................................................ 7
7. Âmbito e disciplina do Direito Penal ............................................................................................................................................................................................... 7
8. O que é a culpa?............................................................................................................................................................................................................................. 7
9. Principais diferenças de regime entre contravenção e crime ........................................................................................................................................................ 7
10. Semelhanças entre ilícito penal e o ilícito de mera ordenação social.............................................................................................................................................. 8
11. Diferenças entre ilícito penal e ilícito de mera ordenação social ..................................................................................................................................................... 8
12. Direito Penal geral e Direito Penal especial ..................................................................................................................................................................................... 8
TEORIA DO BEM JURÍDICO................................................................................................................................................................................................................. 9
13. Noção................................................................................................................................................................................................................................................ 9
14. Evolução do conceito de bem jurídico.............................................................................................................................................................................................. 9
a) Concepção liberal ou individual ............................................................................................................................................................................................... 9
b) Concepção metodológica de bem jurídico............................................................................................................................................................................... 9
c) Concepção social ..................................................................................................................................................................................................................... 9
d) Concepção funcional................................................................................................................................................................................................................ 9
15. O bem jurídico hoje: concepção mista.............................................................................................................................................................................................. 9
16. Princípios fundamentais..................................................................................................................................................................................................................10
17. Relação ordem jurídica penal e ordem jurídica constitucional.......................................................................................................................................................10
TEORIA DOS FINS DAS PENAS ........................................................................................................................................................................................................10
18. Introdução .......................................................................................................................................................................................................................................10
19. Teorias absolutas das penas – teoria da retribuição ou retributiva................................................................................................................................................11
20. Teorias relativas das penas............................................................................................................................................................................................................11
a) Teoria da prevenção ..............................................................................................................................................................................................................11
21. Teoria dialéctica dos fins das penas...............................................................................................................................................................................................12
22. Outras teorias..................................................................................................................................................................................................................................12
a) Teorias unificadoras retributivas............................................................................................................................................................................................12
b) Teorias unificadoras preventivas ...........................................................................................................................................................................................12
TEORIA DA LEI PENAL.......................................................................................................................................................................................................................12
23. Síntese histórica..............................................................................................................................................................................................................................12
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.............................................................................................................................................................................................................13
24. Fundamentos ..................................................................................................................................................................................................................................13
25. Decorrência do princípio da legalidade penal ................................................................................................................................................................................14
26. Decorrências do princípio da legalidade enquanto garantia dos direitos individuais do cidadão.................................................................................................14
a) Representatividade politica e reserva de lei formal...............................................................................................................................................................14
b) Exigência de lei prévia (art. 29º/ 1 e 4 – CRP) ......................................................................................................................................................................14
c) Exigência de lei expressa ......................................................................................................................................................................................................14
d) Exigência de intervenção judicial, “nullum crimen nulla poena sine juditio”. ........................................................................................................................15
e) Proibição de dupla condenação pelo mesmo facto...............................................................................................................................................................15
27. Fontes de Direito Penal ..................................................................................................................................................................................................................15

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Direito Penal

a) A lei (escrita) ..........................................................................................................................................................................................................................15


b) Costume .................................................................................................................................................................................................................................15
c) Jurisprudência ........................................................................................................................................................................................................................15
d) Doutrina..................................................................................................................................................................................................................................15
e) Fontes de direito internacional – tratado ...............................................................................................................................................................................15
28. Interpretação da lei penal ...............................................................................................................................................................................................................15
a) Normas penais incriminadoras .............................................................................................................................................................................................15
b) Normas penais favoráveis ....................................................................................................................................................................................................16
29. Normas incriminadoras...................................................................................................................................................................................................................16
31. Leis penais em branco....................................................................................................................................................................................................................16
32. Concurso legal ou aparente de normas..........................................................................................................................................................................................17
VIGÊNCIA TEMPORAL DA LEI...........................................................................................................................................................................................................18
33. Introdução .......................................................................................................................................................................................................................................18
34. Aplicação da lei...............................................................................................................................................................................................................................18
Duas situações...............................................................................................................................................................................................................................18
35. Constitucionalidade do art. 2º/4 CP................................................................................................................................................................................................18
36. Inconstitucionalidade do art. 2º/4 CP..............................................................................................................................................................................................18
37. Leis temporárias e leis de emergência...........................................................................................................................................................................................18
38. Aplicação da lei no espaço .............................................................................................................................................................................................................19
39. Princípio da tutela ou da protecção dos interesses nacionais .......................................................................................................................................................19
40. Princípio da universalidade ou da aplicação universal...................................................................................................................................................................19
41. Teoria da ubiquidade ......................................................................................................................................................................................................................19
42. Princípio da dupla incriminação e princípio da especialidade........................................................................................................................................................20
43. Princípio da administração supletiva da justiça penal (art. 5º/1-e CP) ..........................................................................................................................................20
TEORIA DO FACTO PUNÍVEL OU TEORIA DA INFRACÇÃO..........................................................................................................................................................20
44. Introdução .......................................................................................................................................................................................................................................20
45. Acção penalmente relevante ..........................................................................................................................................................................................................20
Como se verifica se a acção é típica? ...........................................................................................................................................................................................21
46. Ilicitude ............................................................................................................................................................................................................................................21
47. Culpa...............................................................................................................................................................................................................................................21
48. Punibilidade.....................................................................................................................................................................................................................................21
Porque é que se fala numa subsunção progressiva?....................................................................................................................................................................21
Escola Clássica: .............................................................................................................................................................................................................................22
Escola Neo-clássica: ......................................................................................................................................................................................................................22
Escola finalista:...............................................................................................................................................................................................................................22
49. O sistema clássico ..........................................................................................................................................................................................................................22
50. Criticas ao sistema Clássico...........................................................................................................................................................................................................23
51. Sistema Neo-clássico .....................................................................................................................................................................................................................23
52. Criticas ao sistema Neo-clássico....................................................................................................................................................................................................23
53. Sistema finalista..............................................................................................................................................................................................................................24
54. Criticas ao sistema finalista ............................................................................................................................................................................................................24
55. Acção ..............................................................................................................................................................................................................................................24
56. Tipo ou tipicidade............................................................................................................................................................................................................................25
57. Estrutura do tipo..............................................................................................................................................................................................................................25
58. Elementos objectivos do tipo especial............................................................................................................................................................................................26
a) Agente ....................................................................................................................................................................................................................................26
b) Acção típica ou conduta.........................................................................................................................................................................................................26
c) Resultado ...............................................................................................................................................................................................................................26

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Direito Penal

d) Nexo de causalidade..............................................................................................................................................................................................................26
e) Circunstâncias que rodeiam a conduta .................................................................................................................................................................................27
59. Acepções em que se utiliza a palavra tipo .....................................................................................................................................................................................27
a) Tipo de garantia, total, ou em sentido amplo ........................................................................................................................................................................27
b) Tipo iniciador ou tipo em sentido restrito ...............................................................................................................................................................................27
c) Tipo intermédio.......................................................................................................................................................................................................................27
CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE CRIME.........................................................................................................................................................................................27
60. Quanto ao agente ...........................................................................................................................................................................................................................27
61. Princípio da responsabilidade singular ou princípio da responsabilidade individual .....................................................................................................................28
62. Crimes e função do resultado.........................................................................................................................................................................................................28
63. Importância dogmática e prática da distinção crimes de resultado e crimes de mera actividade.................................................................................................29
64. Tipo em função do objecto..............................................................................................................................................................................................................29
65. Crimes de mão própria ...................................................................................................................................................................................................................30
66. Crimes simples e crimes pluri-ofensivos ........................................................................................................................................................................................30
a) Crimes simples.......................................................................................................................................................................................................................30
b) Crimes pluri-ofensivos, pluridimensionais ou crimes compostos..........................................................................................................................................30
67. Crimes agravados pelo resultado e crimes praeter intencionais ...................................................................................................................................................30
68. Crimes simples ou básicos; crimes qualificados; crimes privilegiados ..........................................................................................................................................31
69. Crimes de intenção ou crimes de resultado parcial .......................................................................................................................................................................31
70. Crimes instantâneos, crimes de Estado e crimes duradouros.......................................................................................................................................................31
E então como é que estes crimes que são ditos de Estado se distinguem dos crimes instantâneos?........................................................................................31
Como é que se distinguem, por sua vez, os crimes de estado dos crimes duradouros?.............................................................................................................31

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Direito Penal

DIREITO PENAL

1. Noção

Conjunto de normas jurídicas que associam factos penalmente relevantes uma determinada consequência jurídica, uma sanção jurídica ou,
conjunto de normas jurídicas que fazem corresponder a uma descrição de um determinado comportamento uma determinada consequência
jurídica desfavorável. A esses factos penalmente relevantes correspondem determinadas sanções jurídico-penais, que são basicamente:

1. As penas, e as principiais são:


⇒ Prisão;
⇒ Multa.
2. As medidas penais, e as principiais são:
⇒ Medidas de segurança;
⇒ Medidas de correcção.

a) Medidas de segurança

Têm um carácter essencialmente preventivo, embora sejam sempre pós-delituais e são baseadas na perigosidade do delinquente.

No âmbito do Direito Penal vigora o princípio da culpa que significa que toda a pena tem como suporte axiológico normativo uma culpa
concreta; a culpa é simultaneamente o limite da medida da pena. Ou seja, quanto mais culpa o indivíduo revelar na prática de um facto
criminoso, maior será a pena, quanto menor a culpa menor será a pena.

O fundamento para a aplicação de uma medida de segurança, não pode ser a culpa, mas sim a perigosidade, ou seja, justifica-se a
imposição daquela medida de segurança quando há suspeita de que aquele indivíduo que cometeu aquele facto penalmente relevante volte a
cometer novo ilícito, de gravidade semelhante.

b) Medidas de correcção

São medidas (penais) que se aplicam a jovens delinquentes. A partir dos 16 anos, o indivíduo tem plena capacidade de culpa e sobre ele
pode recair uma pena: pena de prisão ou pena de multa. Antes dos 16 anos, o indivíduo é inimputável.

c) Penas

Sanção característica do Direito Penal. Prevista e regulada nos arts. 40º segs. CP. A pena de prisão tem um limite mínimo de um mês e um
limite máximo de 20 anos podendo ir até aos 25 anos em determinados casos (art. 41º CP).

A pena de multa tem um limite mínimo de 10 dias e um limite máximo de 360 dias (art. 47º CP).

A pena de prisão distingue-se da pena de multa:

⇒ A pena de prisão é uma pena privativa da liberdade, em que o indivíduo é encarcerado num determinado estabelecimento prisional
onde cumpre a pena, vendo a sua liberdade de movimentação coactada;
⇒ A pena de multa é uma pena de natureza essencialmente pecuniária, se o juiz condenar alguém pela prática de um crime com uma
pena de multa e esta não paga, ela tem a virtualidade de ser convertível em prisão.

2. Definição estrutural de Direito Penal

Direito Penal é composto por um conjunto de normas jurídicas com uma determinada estrutura. Essa estrutura é a descrição de um facto, de
um comportamento humano que é considerado crime ou contravenção, a que corresponde uma sanção jurídico-penal 1[1].

Estrutura da norma penal:

⇒ A descrição de um facto – previsão;


⇒ A sanção jurídica que corresponde à prática desse facto – estatuição.

Mas nem sempre as incriminações ou crimes estão descritos pressupondo da parte do agente, um comportamento activo; em Direito Penal
são crimes não só determinadas acções, como também determinadas omissões. Pune-se não a actividade, mas precisamente o “non facere”,

1[1] Vulgarmente uma pena.

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Direito Penal

uma omissão, uma inactividade, quando a lei obrigava, naquelas circunstâncias, a que a pessoa actuasse. A norma tem uma estrutura
decomposta numa previsão e numa estatuição.

⇒ A estrutura das normas penais insertas na parte especial tem, de um modo geral, esta bipartição entre uma previsão e uma
estatuição;
⇒ As normas da parte geral permitem de alguma forma encontrar princípios e preceitos que contemplam o que está na parte especial.

3. Crítica à definição estrutural da norma penal

Esta definição estrutural do Direito Penal não nos resolve o problema de saber se, em determinados campos em que também são aplicadas
consequências jurídicas desfavoráveis a pessoas que cometem determinados factos relevantes, se isso é ou não Direito Penal, poderá não
ser: poderá ser por hipótese direito disciplinar, ilícito da mera ordenação social; ilícito das contravenções (coimas) etc. Também nestes casos
é cominada uma consequência jurídica desfavorável (uma estatuição) para quem incorre num determinado facto previsto.

O objecto do Direito Penal são os factos penalmente relevantes, sendo os de maior importância os crimes.

4. Definição formal e material de crime

Formalmente pode-se dizer que o crime é uma acção ou um facto típico, ilícito e culposo. Portanto, os crimes principais encontram-se na parte
especial da CP. Mas encontram-se muitos crimes tipificados em outros diplomas legislativos: Decreto-lei 2[2], leis.

Materialmente, crime é todo o comportamento humano que lesa ou ameaça de lesão (põe em perigo) bens jurídicos fundamentais.

Existe um princípio basilar e que dá consistência à criminalização de comportamentos que é o princípio da subsidiariedade do Direito Penal.

O Direito Penal ao intervir, só deve emprestar a sua tutela, só está legitimada a intervir para tutelar determinados bens de agressões humanas
quando essa tutela não puder ser eficazmente dada através de outros quadros sancionatórios existentes no ordenamento jurídico. Ou seja,
quando do direito civil, do direito administrativo, não forem suficientemente eficazes para acautelar esses bens jurídicos que as normas de
Direito Penal procurem acautelar.

Bens jurídicos são valores da ordem ideal que o legislador considera, muitas vezes por opção de para política, outras por opção de política
penal ou política criminal, procurando dar tutela jurídica. São bens jurídicos:

⇒ Vida;
⇒ Integridade física;
⇒ Honra;
⇒ Liberdade;
⇒ Propriedade;
⇒ Património em geral;
⇒ Liberdade de movimentação;
⇒ Liberdade de decisão; etc.

Por detrás de cada tipo legal de crime, encontram-se sempre a necessidade de tutelar um ou mais bens jurídicos. Não é legítima a criação de
um comportamento criminoso, a criação de uma incriminação, sem que por detrás dessa incriminação se tentem proteger bens jurídicos
fundamentais. Formalmente o Direito Penal está legitimado pelas normas constitucionais, mormente o art. 18º CRP, a Constituição aponta
determinados critérios que o legislador ordinário em matéria penal não pode ultrapassar. As normas penais têm de estar em harmonia com as
orientações constitucionais. Mas, não é o legislador penal que cria o bem jurídico. O bem já existe porque é um valor de ordem ideal, de
ordem moral. Simplesmente o legislador, ao atribuir-lhe tutela penal, transforma-o em bem jurídico. A intervenção do Direito Penal por força do
princípio da subsidiariedade só se justifica quando seja para acautelar lesões ou ameaças de lesões de bens jurídicos fundamentais.

5. Direito Penal no quadro das ciências penais

O Direito Penal é composto por um conjunto de normas jurídicas que têm a virtualidade de associar a factos penalmente relevantes – os
crimes e as contravenções – determinadas consequências jurídico-penais.

⇒ Formalmente, o Direito Penal é legitimado pelas próprias normas constitucionais e a visão constitucional do funcionamento do
Estado e da sociedade é reflectida depois pelo legislador em sede de Direito Penal;
⇒ Materialmente, aquilo que legitima o Direito Penal é a própria manutenção do Estado e da própria sociedade.

Portanto, o Direito Penal só deve intervir quando e onde se torne necessário para acautelar a inquebrantibilidade social.

2[2] Mediante autorização da Assembleia da República.

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Direito Penal

Saber quais os bens estes valores da ordem moral e ideal que devem carecer de disciplina jurídica e de tutela penal, pode fazer-se através de
duas maneiras:

1. Através de um processo intra-sistemático, ou seja, inerente ao sistema: averiguar quais são as incriminações constantes de
legislação penal, quer da parte especial do Código Penal, quer de legislação penal extravagante ou avulsa; verificar que
comportamento é que o legislador penal, face ao direito vigente, considera como tal; saber depois de por detrás dessas
incriminações se encontram sempre bens jurídicos que o legislador pretende tutelar.
2. Através de um plano sistemático crítico: indagam que valores, que bens, carecem de tutela penal.

O Direito Penal é talvez o ramo de direito que mais próximo se encontra do ordenamento moral. Muitos comportamentos que são
considerados como criminosos, não deixam de reflectir uma certa carga moral.

6. Princípio da subsidiariedade do Direito Penal

O Direito Penal só deve intervir quando a tutela conferida pelos outros ramos do ordenamento jurídico não for suficientemente eficaz para
acautelar a manutenção desses bens considerados vitais ou fundamentais à existência do próprio Estado e da sociedade.

A este carácter subsidiário do Direito Penal, que se resume dizendo que o Direito Penal intervém como ultima “ratio” no quadro do
ordenamento jurídico instrumental, deve opor-se um outro princípio que é o princípio da fragmentariedade do Direito Penal, o Direito Penal
não deve intervir para acautelar lesões a todos e quaisquer bens, mas tão só àqueles bens fundamentais, essenciais e necessários para
acautelar a inquebrantibilidade social.

O carácter subsidiário e fragmentário do Direito Penal deve ser também analisado em consonância com outro princípio fundamental que é o
princípio da proporcionalidade.

Tal como Gallas dizia: “não se devem disparar canhões contra pardais, mesmo que seja a única arma de que disponhamos”. Significa isto que
há que medir em termos de proporção, em termos de grandeza, a necessidade que há de tutelar um bem fundamental, sendo certo que a
intervenção do Direito Penal, por força das sanções jurídicas que lhe são características, colide com o direito de liberdade que é um direito
fundamental do cidadão. O Direito Penal só deve intervir quando a sua tutela é necessária e quando se revela útil, quando tem alguma
eficácia.

7. Âmbito e disciplina do Direito Penal

Segundo um critério que separa entre aplicação, criação e execução dos preceitos de natureza penal, pode-se distinguir entre:

⇒ Direito Penal material ou substantivo;


⇒ Direito Penal adjectivo, formal ou Direito Processual Penal;
⇒ Direito Penal da execução, também designado por Direito Penal executório ou direito da execução penal.

A dogmática jurídico-penal, ou dogmática penal, é uma ciência normativa que tem como fundamento e limite à lei positivada, a lei vigente.
Neste caso, a lei penal. A dogmática parte da elaboração de conceitos que arruma num edifício lógico e que vem permitir uma aplicação certa,
segura e uniforme da lei penal, ou seja:

⇒ Afirma-se que um crime é uma acção ou um facto típico, ilícito, culposo e punível é obra dogmática;
⇒ Afirmar-se, por exemplo, que um facto ilícito é um facto típico não justificado, é também obra da dogmática jurídico-penal.

8. O que é a culpa?

É um juízo de censura formulado pela ordem jurídica a um determinado agente. Censura-se ao agente o facto de ele ter decidido pelo ilícito, o
facto de ele ter cometido um crime, quando podia e devia ter-se decidido diferentemente, ter-se decidido de harmonia com o direito. Dentro do
âmbito e delimitação do Direito Penal, pode-se distinguir três conceitos:

1. Crimes;
2. Contravenções;
3. Contra-ordenações.

9. Principais diferenças de regime entre contravenção e crime

Nas contravenções não se pune nunca a tentativa, diferentemente do que acontece no âmbito dos crimes por força do preceituado nos art.
22º e 23º CP, ou seja, não há facto contravencional tentado, enquanto que há responsabilidade por crimes praticados na forma tentada. Não
se pune a cumplicidade no âmbito das contravenções; ao passo que os cúmplices dos crimes são punidos com as penas fixadas para os
autores, especialmente atenuadas, conforme preceitua o art. 27º/2 CP. Quanto aos prazos de prescrição do procedimento criminal, tanto
maiores são quanto maiores forem as penas.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 7


Direito Penal

Tendencialmente é verdade que as contravenções são menos graves que os crimes; por força do princípio da proporcionalidade, que é
também um princípio de política penal, a facto menos graves devem corresponder sanções menos graves; onde, as contravenções são menos
sancionadas que os crimes; logo, se os prazos de prescrição do procedimento criminal são mais amplos consoante maiores forem as penas,
então pode dizer-se que os prazos de prescrição do procedimento criminal são mais curtos no âmbito das contravenções do que no âmbito
dos crimes (art. 117º CP).

É admissível a extradição em matéria de crime; não se admite extradição se se tratar de uma contravenção.

No âmbito dos crimes, só há responsabilidade criminal se os factos forem praticados dolosamente; ressalva-se a excepção do art. 13º CP, e a
responsabilização criminal por facto negligente, quando a lei expressamente o disser. Nas contravenções é indiferente a responsabilização
fundada em facto doloso ou facto negligente.

10. Semelhanças entre ilícito penal e o ilícito de mera ordenação social

Ambos os ilícitos tentam proteger valores dignos de protecção legal. O ilícito penal empresta, efectivamente, a protecção jurídico-penal, e o
ilícito de mera ordenação social empresta uma tutela administrativa. Para prevenir violações a esses interesses que carecem de protecção
legal, ambos os ilícitos impõem aos infractores consequências jurídicas desfavoráveis. Por outro lado, o crime tem de ser um facto típico.
Também a contraordenação tem de ser tipificada na lei; conforme a definição do art. 1º CP.

O crime tem de ser um facto ilícito, contrário à lei. Por força do disposto no art. 1º do Dec-Lei n.º 433/82, 27 de Outubro, também a contra-
ordenação. O crime é um facto censurável e a contra-ordenação também.

11. Diferenças entre ilícito penal e ilícito de mera ordenação social

Os seus fins:

Âmbito de aplicação, enquanto que no âmbito do ilícito penal se exige sempre a intervenção judicial, não se pode aplicar nenhuma sanção
jurídico-penal sem a intervenção dos tribunais. Quem aplica as coimas no ilícito da mera ordenação social é a administração; só em caso de
não conformação é que poderá haver recurso para os tribunais comuns 3[3]. As sanções dos ilícitos são diferentes:

1. A sanção característica do ilícito penal é a pena que assume duas modalidades:


⇒ Pena de multa, de natureza essencialmente pecuniária, mas que, quando não paga, pode ser convertida em pena de
prisão;
⇒ Pena de prisão, que consiste numa privação da liberdade humana.
2. A sanção do ilícito de mera ordenação social é a coima, que tem uma natureza pecuniária e que, quando não paga, não pode ser
convertida em prisão.

No ilícito penal é possível a prisão preventiva. No ilícito da mera ordenação social, não é admissível a prisão preventiva; é, contudo possível a
detenção por 24 horas para identificação do suspeito.

No âmbito do ilícito penal, por regra e por força do art. 11º CP, vigora o princípio da personalidade, salvo disposição em contrário, só as
pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade criminal. Diferentemente sucede no ilícito da mera ordenação social, em que as
pessoas colectivas podem ser sancionadas (art. 7º DL 433º/82). Não há impedimento conceitual à aplicação de coimas a pessoas colectivas,
diferentemente do que sucede enquanto regra no âmbito do Direito Penal.

12. Direito Penal geral e Direito Penal especial

A base da distinção encontra-se no art. 8º CP. Quando se fala no artigo em “Direito Penal militar e Direito Penal da marinha mercante”, isso
são fundamentalmente leis penais específicas, ou seja, leis que têm a ver com a categoria funcional de determinadas pessoas e que valem,
portanto, dentro de determinados limites. Aplicam-se, como os nomes indicam, aos agentes que detêm essas qualidades. Portanto, as
disposições deste código penal aplicam-se não só ao Direito Penal, como à restante legislação especial. Significa, pois que o código penal
está dividido em duas partes:

1. Uma parte geral, que vai até o art. 130º CP, inclusive;
2. Uma parte especial, que vai do art. 131º CP, em diante.

Há leis de carácter pessoal 4[4] que saíram posteriormente à feitura e à elaboração do código penal. Leis há que ainda não estão
suficientemente maduras ou experimentadas, para passarem a integrar imediatamente a parte especial do código penal, e consequentemente
não têm aquele carácter de estabilidade que devem ter as normas constantes de um código.

3[3] E não tribunais administrativos.


4[4] Direito Penal especial.

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Direito Penal

TEORIA DO BEM JURÍDICO

13. Noção

Essência do Direito Penal como objectivo de proteger bens jurídicos fundamentais. O Prof. Figueiredo Dias define bem jurídico como,
expressão de um interesse de uma pessoa ou da comunidade, integridade do Estado, vão-se sentar na própria pessoa ou na comunidade.
Trata-se do objecto do Direito Penal, objecto que é em si mesmo socialmente relevante fundamental para a integridade do Estado. A noção
material de crime era todo o comportamento humano que lesava ou ameaçava de lesão bens jurídicos fundamentais. A ideia de que o crime
lesa bens fundamentais e não direitos remonta a Birnbaum (séc. XIX), que vem dizer que os crimes não lesam direitos, mas sim bens, isto é,
entidades para além da própria ordem jurídica. Os bens jurídicos não são realidades palpáveis, concretas, são antes valores da existência
social.

Não é efectivamente o legislador que cria esses bens, pois eles já existem, preexistem, sendo certo obviamente que quando o legislador lhes
confere tutela jurídica transforma esses bens em bens jurídicos. Estes bens são interesses da coexistência social, são valores reputados
fundamentais à própria existência da sociedade organizada em termos de Estado. Os comportamentos que agridam lesem, ponham em
causa, façam perigar esses interesses, devem ser objecto de uma reacção.

O Direito Penal não deve intervir para tutelar todo e qualquer bem jurídico; o Direito Penal deve intervir apenas para tutelar as ofensas mais
graves a esses bens jurídicos que, por outro lado, têm de ser bens jurídicos fundamentais, daí carácter subsidiário e fragmentário do Direito
Penal. O Direito Penal só deve intervir para proteger bens jurídicos fundamentais, ou seja, valores, interesses sociais e individuais
juridicamente reconhecidos quer do próprio, quer da colectividade, em virtude do especial significado que assumem para a sociedade e das
suas valorações éticas, sociais e populares. O Direito Penal justifica a sua intervenção não só devido à natureza dos bens jurídicos em causa,
que têm de ser bens jurídicos fundamentais, mas também atendendo à intensidade da agressão que é levada a cabo para com esses bens
jurídicos fundamentais.

14. Evolução do conceito de bem jurídico

Existem várias perspectivas

a) Concepção liberal ou individual

Ligada ao liberalismo e a Füerbach, constata-se que há crime quando se verifica uma lesão de bens jurídicos que estão concretizados na
esfera jurídica de um certo indivíduo. Portanto, uma lesão de valores ou interesses que correspondem a bens jurídicos subjectivos.

b) Concepção metodológica de bem jurídico

Procuram ver no bem jurídico um papel voltado para uma função interpretativa. Fornecer fórmulas para interpretar as normas. Instrumento de
interpretação dos tipos legais de crimes. O bem jurídico tem como papel fundamentar a intervenção do Direito Penal.

c) Concepção social

Independentemente destes valores e interesses estarem subjectivados, concretizados na esfera jurídica de um indivíduo, podendo estar
efectivamente imanentes à colectividade social.

Não necessitam, de ser individualmente encabeçados na esfera social de um determinado sujeito em concreto. Os bens jurídicos são vistos
numa óptica social, como bens universais pertencentes à colectividade.

d) Concepção funcional

Podia-se ver nos bens jurídicos, funções que esses mesmos bens jurídicos desempenhavam para o desenvolvimento da própria sociedade,
as funções sociais desempenhadas por esses bens.

15. O bem jurídico hoje: concepção mista

O Prof. Figueiredo Dias, diz que os bens jurídicos são uma combinação de valores fundamentais, por referência à axiologia constitucional.
São bens jurídicos fundamentais por referência à Constituição, aqueles que visam o bom funcionamento da sociedade e das suas valorações
éticas, sociais e culturais. Portanto, uma concepção mista em que se dá ênfase a uma combinação individualista, social ou mesmo funcional
do bem jurídico. Os bens jurídicos tutelados pelas diferentes incriminações têm de estar de acordo com a Constituição, significando isto que:
tem de estar em harmonia com o princípio da representatividade política e com o princípio da reserva de lei formal, é a Assembleia da
República que deve efectivamente escolher quais esses valores, quais esses interesses que carecem de tutela jurídico-penal.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 9


Direito Penal

16. Princípios fundamentais 5[5]

De harmonia com os princípios imanentes a um Estado de direito democrático deve-se dizer que só deve haver criminalização de
comportamentos humanos quando a tutela conferida por outros ramos de direitos não seja suficiente para acautelar esses bens jurídicos, é o
princípio da subsidiariedade do Direito Penal. As restrições limitam-se ao necessário, ou seja, se outros ramos do direito através das suas
sanções, forem suficientes para acautelar a manutenção destes bens jurídicos, então não se impõe a tutela do Direito Penal, porque ela deixa
de ser necessária, é o princípio da necessidade. Conjugam-se os princípios da necessidade e da subsidiariedade, o Direito Penal só deve
intervir quando estejam em causa bens jurídicos fundamentais e que outros ramos de direito não sejam suficientes para salvaguardar os bens
jurídicos. A ideia de necessidade – a pena deve ser necessária.

Por outro lado, de harmonia com o princípio ou com o carácter fragmentário do Direito Penal, não são todos os bens jurídicos que o Direito
Penal deve tutelar, mas tão só os que o art. 18º CRP indica: os bens fundamentais. O princípio da proporcionalidade, a intensidade com que
se devem restringir direitos fundamentais do cidadão é variável consoante a necessidade maior ou menor que há de tutelar outros bens
jurídicos fundamentais, por referência à gravidade dos bens jurídicos em questão. A teoria do bem jurídico, legítima a intervenção do Direito
Penal nos quadros valorativos do art. 18º CRP, tendo efectivamente um poder muito forte de critica argumentativa e permite ao legislador, ou
ao jurista verificar:

Por um lado, se esses bens jurídicos que o legislador resolve tutelar quando cria incriminações são:

⇒ Bem jurídico fundamental, se o não forem, a tutela do Direito Penal é inconstitucional;


⇒ Permite verificar se a intensidade da agressão justifica a tutela do Direito Penal, isto é, se é efectivamente necessária a tutela do
Direito Penal ou se outra tutela será suficiente.

Por outro lado, permite dizer se o legislador ordinário respeitou a axiologia constitucional nas diferentes incriminações e nas inserções
sistemáticas dos diferentes tipos legais de crime; permite verificar também se o princípio da proporcionalidade do Direito Penal, assente em
que, as diferentes gravidades de ilícito devem corresponder diferentes penas, se isso é ou não observado.

17. Relação ordem jurídica penal e ordem jurídica constitucional

O Prof. Figueiredo Dias, diz que existe uma axiologia constitucional, os bens jurídicos, são exclusivamente definidos na Constituição. Mútua
referência, só não ordem constitucional, é possível identificar os bens jurídicos que a ordem jurídica vai defender. A restrição do Direito Penal
é a restrição de uma tutela de bens jurídico constitucionalmente consagrados. Compromisso de ter de proteger os bens jurídicos
constitucionalmente consagrados.

⇒ Direito Penal de justiça ou clássico ou primário: corresponde ao núcleo de bens jurídicos consagrados constitucionalmente,
estando consagrados no Código Penal;
⇒ Direito Penal secundário: todos os bens jurídicos que estavam na Constituição, mas não nos direitos, liberdade e garantias, não
devem ser tratados no Código Penal, mas em legislação avulsa.

Não há uma exclusiva vinculação da ordem penal à constitucional. A ordem constitucional identifica valores fundamentais, na ordem social,
encontram-se valores que podem fazer intervir o Direito Penal, valores que poderão não estar referidos constitucionalmente. Não há
correspondência total da ordem penal na ordem constitucional

TEORIA DOS FINS DAS PENAS

18. Introdução

O Direito Penal pode encontrar legitimação a partir de duas ideias fundamentais:

⇒ Da teoria do bem jurídico;


⇒ Da teoria dos fins das penas.

No âmbito dos fins das penas, pode-se distinguir, fins de duas naturezas: fins mediatos e fins imediatos:

⇒ Como fins mediatos das penas tem-se os fins do Estado;


⇒ Como fins imediatos das penas tem-se a ideia de retribuição e de prevenção.

O Direito Penal é um ramo de direito produzido pelo Estado e como tal, deve em última análise prosseguir fins imanentes a esse mesmo
Estado. A finalidade das penas 6[6] pode ser vista não numa óptica mediata de finalidades a prosseguir pelo próprio Estado, mas numa óptica
formal e abstracta.

5[5] Art. 18º/2 CRP.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 10


Direito Penal

Três finalidades podem ser prosseguidas com os fins imediatos das penas:

1. Ideia de retribuição ou culpa;


2. Ideia de prevenção Geral;
3. Ideia de prevenção Especial.

As penas servem para retribuir o mal a quem praticou o mal, esta é a teoria retributiva das penas: tem uma finalidade retributiva. Ou então
poder-se-á dizer que as penas servem para fazer com que as pessoas em geral não cometam crimes, uma finalidade de prevenção geral. Ou
dizer que as penas servem para que a pessoa que é condenada a uma pena e que a tenha de cumprir não volte ela própria a cometer crimes,
tem-se aqui uma finalidade de prevenção especial.

A estas ideias subjacentes aos fins das penas, há que distinguir entre:

⇒ Teorias absolutas das penas;


⇒ Teorias relativas das penas.

19. Teorias absolutas das penas – teoria da retribuição ou retributiva

Apresenta a ideia de que as penas são um mal que se impõe a alguém, por esse alguém ter praticado um crime. Significa a imposição de um
mal a quem praticou um mal, uma ideia de castigo. Escolhe-se uma pena que corresponde a determinado facto, deve ter correspondência
com a proporcionalidade na responsabilidade do agente.

É uma teoria inadequada para fundamentar a actuação do Direito Penal, embora este tenha um fim de retribuição, não pode ter a teoria da
retribuição como fim em si mesmo.

20. Teorias relativas das penas

a) Teoria da prevenção 7[7]:

Numa óptica de prevenção geral, pode-se dizer que as penas pretendem evitar que as pessoas em geral cometam crimes.

Numa óptica da prevenção especial, pode-se verificar que o direito penal, ao submeter um indivíduo a uma sanção por um crime que ele
cometeu, pretende evitar que esse indivíduo volte a cometer crimes. Fá-lo por duas vias:

1. Ou porque esse indivíduo é segregado, isto é, enquanto está a cumprir pena tem a impossibilidade de reincidir;
2. Ou então, já não assente na ideia de segregação, mas numa ideia de regeneração, de recuperação ou de ressociabilização,
através de um tratamento que lhe será submetido no âmbito do cumprimento da pena.

O Direito Penal é chamado a retribuir um crime, mas é concebido com uma ideia de prevenir (teoria da prevenção geral). O objectivo da
pena é essencialmente o objectivo de exercer uma influência na comunidade geral – ameaçar se cometer um crime, pois ao cometer fica
submetido a uma determinada pena – prevenir a prática de crimes.

Füerbach, cria a “teoria psicológica da coacção”, as infracções que as pessoas cometem têm, um impulso psicológico, a função da pena é
combater esse impulso de cometer crimes.

Intimida-se as pessoas, com esta coacção para que os cidadãos em geral não cometam crimes. Esta prevenção geral divide-se em:

⇒ Prevenção geral positiva, revelar à comunidade o que acontece se praticar um crime;


⇒ Prevenção geral negativa revelar a intimidação.

Aparece a teoria da prevenção especial, tem também a ideia de prevenção, mas a prevenção já não é a comunidade em geral, mas sim a
prevenção do indivíduo, ou seja, que o agente não volte a cometer um crime. Pretende evitar a reincidência.

Os principais defensores da teoria da prevenção especial asseguram-na de três formas 8[8]:

1. Salvaguardar a comunidade do delinquente;


2. Intimidar o autor 9[9] com a pena;
3. Evitar a reincidência 10[10].

6[6] Pena, sanção característica do Direito Penal determinadas pela lei.


7[7] Geral ou especial.
8[8] Quando se aplica uma pena a um indivíduo.
9[9] Aquele que praticou o facto.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 11


Direito Penal

É a teoria que mais se opõe à retributiva. O Direito Penal é cada vez mais dirigido à pessoa do criminoso, criando condições para o
sociabilizar. É alvo de críticas. Tal como a prevenção geral, não nos fornece um critério de quanto e a duração das penas. Os sistemas
(teorias) desenvolvidos por si só são falíveis, começando a se desenvolver teorias mistas.

21. Teoria dialéctica dos fins das penas

Klaus Roxin desenvolve esta teoria mista, dizendo que cada uma das teorias per si, de importância solada são insuficientes para justificar os
fins das penas. Engloba três fases:

1. Fase da ameaça penal: a formulação de um preceito legal, abstractamente definido na lei, em que existe a tipificação do
comportamento como criminoso e os estabelecimentos da sanção correspondente; os fins das penas seriam predominantemente
de natureza, de prevenção geral;
2. Fase da condenação: fase em que o indivíduo que cometeu um crime vai ser julgado e em que o juiz lhe comunica a pena
aplicável, momento da retribuição;
3. Fase da execução da pena: em que a finalidade da pena estaria aqui numa óptica de prevenção especial, de recuperação ou
ressociabilização do delinquente.

22. Outras teorias

a) Teorias unificadoras retributivas

Viam no Direito Penal o fim retributivo (fim essencial), mas partindo das insuficiências da retribuição iam apontar ao Direito Penal a finalidade
de prevenção.

b) Teorias unificadoras preventivas

Dois objectivos:

⇒ Aproveitar o que têm de positivo a prevenção especial e geral;


⇒ Criar o que falta nelas, a prevenção.

Características:

⇒ Os fins das penas são essencialmente e exclusivamente preventivos;


⇒ Renúncia de toda a ideia de retribuição;
⇒ Princípio da culpabilidade para a limitação da pena vai-se ter em conta a culpa do agente 11[11]. Apenas não pode ultrapassar a
medida de culpa. Ao grau de culpa vai-se encontrar a medida da pena 12[12].

O Código Penal assume princípios de prevenção especial e um misto de prevenção geral – teorias unificadoras preventivas. Sistema
exclusivamente preventivo em que se procura fazer uma coexistência dos princípios de prevenção especial e geral. Função da tutela
necessária dos bens jurídicos – objectivos de ressociabilização do agente encontrando o limite da pena, a culpa.

TEORIA DA LEI PENAL

23. Síntese histórica

Primeira manifestação, de direito organizado, na península ibérica – período visigótico – relativo ao Direito Penal foi o Código Visigótico, que
tentava restringir o poder do imperador, e o máximo de obediência à lei, referência a incriminações de carácter doloso.

Influência árabe, período da reconquista, não há uma lei concreta.

No séc. XII e XIII, formas de organização do Estado – período afonsino. Concentra-se nos reis os poderes, tendo o mesmo monopólio do
poder de punir. Há tentativas de organizar o poder – centralização do poder real, limitar as questões de justiça privada. Atribuir exclusividade
de repressão pública. As penas eram marcadas por grande crueldade.Nos livros das ordenações há uma linha idêntica na matéria de punição,
estas ordenações mantiveram-se até ao séc. XIX (1852).

Características das ordenações:

⇒ Casuísmo: direito casuísta evolui na aplicação concreta de casos a caso;

10[10] A pena serve para corrigir o delinquente.


11[11] Limita a intervenção penal.
12[12] Vai limitar a medida da pena.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 12


Direito Penal

⇒ Arbitrariedade: o juiz tinha uma longa margem de discricionariedade de fazer funcionar as penas daquele que estava perante si, as
penas eram transmissíveis;
⇒ Desigualdade: as penas eram aplicadas em conformidade com a posição social do acusado.

Este período dura até ao constitucionalismo liberal 13[13]. Há uma tentativa de criação de um Código Penal em 1779, é inspirado pelos
movimentos europeus de Direito Penal 14[14]. No séc. XIX – 1822 – com a constituição liberal vem reorganizar o Estado português – corte com
o regime das ordenações contendo princípios de Direito Penal.

⇒ Princípio da humanização das penas passou a ser proibido certas penas cruéis;
⇒ Combater a desigualdade das penas;
⇒ Necessidade das penas;
⇒ Princípio da proporcionalidade das penas;
⇒ Acabar com a transmissibilidade da responsabilidade criminal.

Em 1852 é feito o primeiro Código Penal Português, transpõe para o Direito Penal os princípios penas consagrados. Em 1886 é feito um novo
Código Penal, não mais do que o Código Penal de 1852 com algumas alterações. Em 1954 é reformado, autoria de Cavaleiro Ferreira. O
Código Penal de 1982 consiste nos projectos e ante-projectos do Prof. Eduardo Correia:

⇒ De 1963, no que à parte geral diz respeito;


⇒ De 1966, no que à parte especial diz respeito.

Sofre alterações em 1984 e uma profunda alteração de 1995, Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, dirigida por Figueiredo Dias,
alteração à parte especial.

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

24. Fundamentos

O Direito Penal funda-se na Constituição, as normas penas ordinárias são autorizadas, são delegadas por outras normas, essas de natureza
constitucional. Na Constituição encontram-se vários conjuntos de normas que conexionam directamente com o Direito Penal. Em primeiro
lugar encontram-se um grupo de normas que proíbem certas penas e certas medidas de segurança 15[15]. Neste sentido pode-se ver aqui que
este conjunto de normas constitucionais que proíbem certas penas ou certas medidas de segurança filiam-se num princípio de política
penal, que é o princípio da humanidade das penas.

⇒ Art. 24/2, proíbe a pena de morte.


⇒ Art. 25/2, proíbe penas cruéis, degradantes, desumanas e que a integridade física das pessoas é inviolável.
⇒ Art. 30/1 e 2, proíbem a existência de penas perpáetuas, de duração ilimitadas ou idefinida.
⇒ Art. 33/3, proíbe, regra geral, a extradição de cidadãos nacionais. Admitindo-as em situações de reciprucidade.
⇒ Art. 33/4, admite, apenas, a extradição mediante requisitos da norma.
⇒ Art. 33/7, admite a extradição mediante determinação judicial.
⇒ Art. 30/4, proíbe penas que promovam a perda de direitos civis, profissionais ou políticos.

Mas na Constituição encontram-se também normas que proíbem a transmissibilidade das penas; o art. 30º/3 CRP, consagra assim, o
princípio da intransmissibilidade das penas e acolhe o carácter pessoal da responsabilidade penal (art. 11º CP).

A Constituição contém um conjunto de normas que delimitam a aplicação no tempo das leis penais e fixam o âmbito da sua interpretação
(art. 29º CRP):

⇒ Art. 29º/1, proíbe-se a retroactividade das leis penais incriminadoras;


⇒ Art. 29º/3, a expressão “expressamente” significa a proibição à integração de lacunas em Direito Penal por analogia;
⇒ Art. 29º/4, impõe obrigatoriamente a retroactividade das leis penais mais favoráveis ao agente;
⇒ Art. 29º/5, consagra-se o princípio “ne bis in idem”, ou seja, o princípio de que ninguém pode ser julgado mais do que uma vez
pela prática do mesmo facto.

“Ne bis in idem” – é uma garantia de não se poder julgar mais que uma vez pelo mesmo crime, exceptuando-se os factos recirridos em que
cada um implica novo julgamento no que haja necessidade por motivos de deficiências de questões técnicas (ex.:
gravação defeituosa) o tribunal manda repetir. O que está em causa é o facto que é praticado e que, em regra, não pode
ser julgado mais do que uma vez com a excepção supra.

13[13] Carta constitucional de 1822.


14[14] Projecto de Melo Freir procura a humanidade das penas.
15[15] Arts. 24º/2, 25º/2, 30º/1 e 2, 33º/1 e 3, 30º/4 CRP.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 13


Direito Penal

Os princípios gerais de direito internacional são fonte de Direito Penal (art. 29º/2 CRP). O Direito Penal funda-se no sentido de que o
legislador ordinário deve de alguma forma dar acolhimento e plasmar a axiologia ou a valoração constitucional e os princípios
ordenadores do sistema penal português.

Diz-se que as valorações, as opções axiológicas constitucionais devem ser respeitadas pelas normas penais, porque é a Constituição que
contem os valores que o Direito Penal deve proteger:

a) Art. 18º/2 - Principio da intervenção mínima (Princípio da necessidade da pena ou principio da máxima restrição das penas e
máxima segurança);
b) Art. 18º/3 e 13º, CRP –principio da igualdade;
c) Art. 25º/1 - Princípio da culpa, sem culpa não há responsabilidade penal;
d) Artigos arás referidos no princípio da humanidade das penas (artºs 24º/2, 25º/2, 30º/1, 23º/3, 4 e 7 3 30º/4);
e) Princípio da jurisdicionalidade da aplicação do Direito Penal ou princípio da mediação judicial (arts. 27º/2, 33º/4, 30º/2 CRP):
f) Art. 29º/5, consagra-se o princípio “ne (não) bis (mais) in idem (do que uma vez em iguldade)”, ou seja, o princípio de que
ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo facto.
g) Art. 29º - Principio da legalidade.

25. Decorrência do princípio da legalidade penal

Princípio “nullum crimen, nulla poena sine lege”, ou seja, princípio de que não há crime nem pena sem lei, extrai-se o seguinte:

⇒ Não pode haver crime sem lei;


⇒ A lei que define crime tem de ser uma lei precisa – “nullum crimen nula poena sine lege certa”;
⇒ Proíbe-se a retroactividade da lei pena – “nullum crimen nulla poena sine lege previa”;
⇒ Proíbe-se a interpretação extensiva das normas penais incriminadoras – “nullum crime nulla poena sine lege strica”;
⇒ Proíbe-se a integração de lacunas por analogia e impõe-se a retroactividade das leis penais mais favoráveis.

Por outro lado, o princípio da legalidade impõe particularidades no âmbito da competência para a criação de normas penais incriminadoras e
normas penais favoráveis e a exigência da intervenção judicial ou da imediação judicial na aplicação ou na apreciação da responsabilidade
criminal do agente. O princípio da legalidade impõe ainda a proibição de uma dupla condenação pelo mesmo facto.

Uma lei penal não deve conter tão só a descrição de um comportamento considerado crime; deve conter, em conexão com essa descrição, a
correspectiva sanção jurídico-penal. O princípio da legalidade tem um fundamento político, um fundamento saído da Revolução Francesa, do
Iluminismo, e que assenta na ideia de que existe uma razão comum a todos os homens que encontram expressão comum na lei e evitam o
arbítrio. Neste sentido, o princípio da legalidade tem como fundamento a garantia dos direitos individuais.

O princípio da legalidade, mesmo no domínio do Direito Penal tem uma justificação e um fundamento de constituir uma garantia de direitos
individuais do cidadão. Enquanto submissão do poder de punir o Estado à lei, o princípio da legalidade tem esse fundamento: garantir os
direitos individuais do cidadão.

26. Decorrências do princípio da legalidade enquanto garantia dos direitos individuais do cidadão

a) Representatividade politica e reserva de lei formal

Uma delas afere-se pelas pessoas que têm a missão de “criar” crimes e estabelecer as correspondentes sanções jurídico-penais, ie, que têm
a missão de fazer leis penais. Do princípio da legalidade decorre a ideia de que não há crime nem pena sem lei (escrita), a definição de um
comportamento como crime e a correspondente sanção que se lhe aplica tem de constar de uma lei escrita. Tem competência para criar
normas incriminadoras 16[16], a Assembleia da República (art. 165º/1, c) - CRP).

b) Exigência de lei prévia (art. 29º/ 1 e 4 – CRP)

É outra concretização do princípio da legalidade na garantia de direitos individuais, a exigência de lei prévia, “nullum crimen nulla poena sine
lege prévia”. Impõe que as leis a aplicar sejam a lei que vigora no momento da prática do facto. Outro princípio que é o da imposição de leis
penais retroactivas quando as leis penais posteriores forem favoráveis ao arguido, ao agente.

c) Exigência de lei expressa

Pode ser analisada a partir de duas outras decorrências:

16[16] Normas incriminadoras: são aquelas que criam crimes ou que agravam os pressupostos de punibilidade ou de punição.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 14


Direito Penal

1. O princípio de que não há crime nem pena sem lei certa – “nullum crimen nulla poena sine lege certa”;
2. Decorrência de que não existe crime nem pena sem lei escrita – “nullum crimen nulla poena sine lege scripta”.

d) Exigência de intervenção judicial, “nullum crimen nulla poena sine juditio”.

Neste sentido, as sanções jurídico-penais sejam elas penas ou medidas penais, têm de ser sempre aplicadas por um órgão de soberania
independente, com a finalidade de aplicar a justiça, que entre nós são os tribunais.

e) Proibição de dupla condenação pelo mesmo facto

Consagra-se o princípio “ne bis in idem”, isto é, o princípio de que ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo
facto. Existem categorias analíticas e sistemáticas da teoria do facto punível: são as categorias da tipicidade, da ilicitude e da culpabilidade.
Muito genericamente dir-se-á:

1. O crime é um facto humano;


2. Tem de ser típico, ou seja, tem de estar descrito numa lei, tem de corresponder a uma descrição legal;
3. Este facto tem ainda de ser simultaneamente ilícito.

27. Fontes de Direito Penal

a) A lei (escrita)

Aqui está a tal decorrência do princípio da legalidade “nullo crimen nulla poena sine lege scripta”, não há crime nem pena sem lei escrita (art.
165º CRP).

b) Costume

Como fonte de incriminação não é admissível em Direito Penal, de contrário violaria o disposto no art. 1º CP, e artºs 29º e 165º/1-c CRP,
nomeadamente estaria a violar o princípio da representatividade política e da reserva da lei formal. No entanto o costume tem valia quando
visa, não criar ou agravar a responsabilidade penal do agente, mas quando a sua intervenção resulte benéfica para o agente: ou seja, quando
o costume se venha traduzir no âmbito de uma norma favorável, isto é, quando o costume de alguma forma venha atenuar ou mesmo excluir
a responsabilidade criminal do agente.

c) Jurisprudência

⇒ Não é fonte imediata de direito.


⇒ Reconduz-se à aplicação da lei ao caso concreto.
⇒ Há uma grande tendência para que os tribunais se orientem para decisões anteriores.

d) Doutrina

Não é fonte imediata de direito, mas sim fonte mediata. Corresponde ao conjunto das opiniões dos eminentes penalistas.

e) Fontes de direito internacional – tratado

São fonte de Direito Penal, tal como a lei, porque depois de todo o processo de assinatura, aprovação, ratificação, eles entram na ordem
jurídica nacional como lei escrita.

28. Interpretação da lei penal

Tem-se de dividir as normas penais em dois grupos: normas incriminadoras e normas favoráveis. Deve entender-se por normas
incriminadoras aquelas que criam ou agravam a responsabilidade jurídico-penal do agente. São aquelas normas que de alguma forma
contêm a criação de crimes, ou que contêm agravamentos dos pressupostos de punibilidade ou de punição.

Normas favoráveis, são aquelas normas que visam diminuir a responsabilidade jurídico-penal do agente, ou atenuá-la, tornando mais
suaves os pressupostos da punibilidade ou da punição.

a) Normas penais incriminadoras

Proíbe-se a interpretação extensiva das normas penais incriminadoras, de outra forma estar-se-ia a violar o princípio da legalidade na sua
decorrência “nullum crimen nulla poena sine lege stricta”, ou seja, de que as normas penais devem ser estritamente aplicadas; é admissível a

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Direito Penal

interpretação restritiva; proíbe-se a aplicação analógica no âmbito das normas penais incriminadoras, quer por analogia legis, quer por
analogia iuris.

b) Normas penais favoráveis

Proíbe-se a interpretação restritiva de normas penais favoráveis; admite-se a interpretação extensiva; relativamente ao problema da analogia:

1. Alguns autores – Teresa Beleza, etc., admitem a analogia, nas normas penais favoráveis;
2. Outros autores – Cavaleiro Ferreira – a analogia em Direito Penal, quer de normas favoráveis, quer de normas incriminadoras, está
vedada;
3. Outros ainda – Frederico da Costa Pinto – entende que no âmbito das normas favoráveis a analogia está de todo excluída. Em
certos casos pode-se admitir a interpretação extensiva de normas favoráveis, mas não é possível o recurso à analogia no âmbito
de normas favoráveis.

29. Normas incriminadoras

A interpretação extensiva em normas incriminadoras não é possível. Só é possível, no âmbito de normas incriminadoras uma interpretação
declarativa lata. Tudo aquilo que a exceda e que vise harmonizar a letra da lei à sua razão de ser, à sua “ratio”, se ultrapassar este sentido
literal máximo possível já se está a fazer interpretação extensiva. Esta não deve ser admitida em Direito Penal, porque se entende que por
força do princípio da legalidade, na sua vertente garantia, se exige que a lei penal seja uma lei penal expressa. Assim a norma deve dizer
expressamente quais são as condutas, activas ou omissivas que, a serem ou não adoptadas, constituem objecto de incriminação em sede de
Direito Penal. No entanto admite-se a interpretação restritiva.

Afirma-se rotundamente que não é possível integrar lacunas por analogia. Isto é, perante um caso omisso que o legislador penal ano tipificou,
não classificou como crime, o juiz não pode, ao contrário de que acontece no domínio do direito civil regular esse caso omisso, nem
recorrendo à analogia legis, nem à analogia iuris, nem tão pouco criar a norma de harmonia com o espírito do sistema. O juiz pura e
simplesmente julga, absolvendo.

30. Normas favoráveis

As normas favoráveis são aquelas que visam, ou que traduzem para o agente, uma posição mais benéfica porque:

⇒ Ou excluem a ilicitude de um facto típico e portanto justificam o facto e tornam-no ilícito, tornando-o ilícito, excluem a
responsabilidade penal, porque não há responsabilidade penal por factos lícitos.
⇒ Ou tornam-se mais brandos, mais suaves, os pressupostos da punibilidade e da punição.

Pode-se fazer interpretação extensiva, mas com limites. Mas já não se aceita que se faça interpretação restritiva de normas penais favoráveis,
isto porque, a ser possível, diminuir-se-ia o campo de aplicabilidade destas normas favoráveis, o que significa aumentar o campo de
punibilidade.

Quanto à analogia:

Existem várias posições. Uma (Teresa Beleza) admite-se a integração de lacunas no âmbito de normas penais favoráveis. Outra posição é a
de que se admite por princípio a integração de lacunas por analogia no âmbito de normas penais favoráveis, desde que essa analogia não se
venha a traduzir num agravamento da posição de terceiros, por ele ter de suportar na sua esfera jurídica efeitos lesivos ou por ter auto-
limitado o seu direito de defesa.

31. Leis penais em branco

É uma norma que contem uma sanção para um pressuposto ou um conjunto de pressupostos de possibilidade ou de punição que não se
encontram expressos na lei, mas sim noutras normas de categoria hierárquica igual ou inferior à norma penal em branco 17[17].

Levantam-se problemas quanto à constitucionalidade de tais normas, precisamente porque no entender de determinada doutrina, estas
normas seriam inconstitucionais por consistirem numa violação de uma decorrência do princípio da legalidade que é a existência de lei penal
expressa, mais concretamente a existência de lei penal certa – “nullum crimen nulla poena sine lege certa”.

A doutrina maioritária defende a constitucionalidade e validade das normas penais em branco, dentro de certos limites ou desde que sejam
respeitados determinados limites.

17[17] Ex: arts. 278º, 213º/1-b, 150º/1 CP.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 16


Direito Penal

Desde que as normas penais em branco contenham os pressupostos mínimos de punibilidade e de punição, ou seja, que digam quem são os
destinatários e em que posição é que eles se encontram e que contenham a respectiva sanção; desde que correspondam a uma verdadeira
necessidade que o legislador tem de tutelar bens jurídicos fundamentais através desta técnica, sob pena de não o fazendo, a alternativa
resultaria da sua desprotecção, estas normas não serão inconstitucionais.

32. Concurso legal ou aparente de normas

Na determinação da responsabilidade criminal dos agentes que praticam factos penalmente relevantes podem suceder situações de anulação
ou concurso de infracções, sempre que o agente com a sua conduta cometa uma pluralidade de infracções. As quais podem traduzir o
preenchimento de vários tipos de crimes, ou do mesmo tipo mais do que uma vez.

A teoria do concurso permite distinguir os casos nos quais as normas em concurso requerem uma aplicação conjunta, das situações em que o
conteúdo da conduta é absorvido por uma única das normas.

⇒ Concurso efectivo ou concurso de crimes: constitui a situação em que o agente comete efectivamente vários crimes e a sua
responsabilidade contempla todas essas infracções praticadas;
⇒ Concurso aparente ou concurso de normas: uma vez que a conduta do agente só formalmente preenche vários tipos de crimes,
na concretização da sua responsabilidade a aplicação de um dos crimes afasta a aplicação de outro ou outras de que o agente
tenha também preenchido os elementos típicos.

Em rigor não se pode falar em verdadeiro concurso de crimes, mas tão só em concurso de normas (concurso legal), o qual se traduz num
problema de determinação da norma aplicável 18[18]. O tema do concurso de infracções deve ser integrado no âmbito da teoria da infracção,
constituindo uma forma de crime. O que se depreende da prática judiciária, em consonância com a maioria da doutrina é que a resolução
concreta do concurso de normas opera no momento final da teoria da infracção. Sendo sempre um dos últimos passos na resolução da
responsabilidade dos intervenientes no crime. A relação de concurso aparente consagra-se por conexões de subordinação e hierarquia,
podendo identificar-se essencialmente três tipos de relações:

1. Relação de especialidade: Uma norma encontra-se numa relação de especialidade em relação a outra quando
acrescenta mais um tipo incriminador, não a contradizendo contudo. Neste sentido, vê-se que por força de uma relação
de especialidade em que as normas se podem encontrar, tanto pode subsistir a norma que contenha a moldura penal
mais elevada, como a norma que contenha a moldura penal mais baixa.
2. Relação de subsidiariedade: Nos casos em que a norma vê a sua aplicabilidade condicionada pela não aplicabilidade
de outra norma, só se aplicando a norma subsidiária quando a outra não se aplique. A norma prevalecente condiciona
de certo modo o funcionamento daquela que lhe é subsidiária. Distinguem-se dois tipos:
⇒ Relação de Subsidiariedade expressa: é a própria lei que afirma expressamente que uma norma só se
aplica se aquela outra não se puder aplicar;
⇒ Relação de Subsidiariedade implícita ou material: resulta quando em face de um raciocínio imperativo, se
chega à mesma conclusão, ou seja, quando por força de uma interpretação verificar-se que a relação que
existe entre as normas não pode deixar de ser uma relação de subsidiariedade.

Existem tendencialmente ou em princípio quatro grandes situações em que as normas se encontram numa
relação de subsidiariedade implícita ou material:

1º. Diz-se que as incriminações de perigo ou os crimes de perigo se encontram numa relação de
subsidiariedade implícita ou material em relação aos crimes de lesão.
2º. Caso em que subsiste uma imputação a título negligente e doloso, sendo certo que a
responsabilidade por facto negligente é subsidiário à imputação por facto doloso;
3º. Diferentes formas de participação ou autoria;
4º. Entre as condutas de omissão e por acção.
3. Relação de consunção: Quando um certo tipo legal de crime faça parte não por uma definição do código, mas por uma
forma característica, a realização de outro tipo de crime, ou seja, quando tem uma discrição típica suficientemente
ampla que abranja os elementos da discrição típica da outra norma.

A finalidade das normas concentra-se sempre na tutela de bens jurídicos, sendo possível identificar em cada tipo legal a ratio da conduta
descrita. A relação de consunção acaba por colocar em conexão os valores protegidos pelas normas criminais. Não deve confundir-se com a
relação de especialidade, pois ao contrário do que se verifica naquela relação de concurso de normas, a norma prevalecente não tem
necessariamente de conter na sua previsão todos os elementos típicos da norma que derroga.

O concurso estabelecido entre as normas revela-se meramente aparente, sendo de excluir a aplicação cumulativa, pois não se aplicam todos os preceitos
18[18]

normativos.

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Direito Penal

VIGÊNCIA TEMPORAL DA LEI

33. Introdução

Uma das decorrências do princípio da legalidade é que não há crime sem uma lei anterior ao momento da prática do facto que declare esse
comportamento como crime e estabeleça para ele a correspondente sanção 19[19]. Em Direito Penal vigora portanto a lei do momento da
prática do facto. Mas a aplicação externa ou exacerbada deste princípio poderia levar a situações injustas. Donde o princípio geral em matéria
penal é de que as leis penais mais favoráveis aplicam-se sempre retroactivamente.

34. Aplicação da lei

Qual é a lei que no momento do julgamento o juiz devia aplicar ao arguido? É a lei do momento da prática do facto, que é a mas favorável, do
que a lei posterior, ainda que essa lei tenha revogado aquela. Existe ultra-actividade da lei penal, porque se aplica sempre a lei penal de
conteúdo mais favorável ao arguido.

O momento da prática do facto é sempre aquele em que, no caso de se tratar de um crime comissivo ou por acção, o agente actuou, ou, no
caso de se tratar de um crime omissivo, no momento em que o agente deveria ter actuado.

Duas situações

Uma nova lei vem descriminalizar uma determinada conduta. Como deve reagir a ordem jurídica? Se a conduta vier a ser descriminalizada
não deve ser condenado por essa conduta, mesmo que o agente tenha já sido condenado e se encontre detido (art. 2º/2 CP). Cessa os
efeitos penais – princípio da aplicação da lei mais favorável.

Regime que se revela concretamente mais favorável, deve-se aplicar este regime ao agente. No entanto a lei no art. 2º/4 CP coloca um limite
para o efeito retroactivo – “salvo se este já tiver sido condenado por sentença transitada em julgado”. É diferente dos efeitos da
descriminalização. Há autores que defendem a inconstitucionalidade do art. 2º/4 CP, outros defendem a sua constitucionalidade.

35. Constitucionalidade do art. 2º/4 CP

A Constituição de 1976 foi revista em 1982, o Código Penal é de 1982 e entrou em vigor em 1983; donde, o legislador penal deveria ter
conhecimento das disposições constitucionais e se legislou ordinariamente consagrando esta ressalva, é porque a ressalva não é
incompatível com o disposto na Constituição, por ser legislação posterior. Não é incompatível o art. 2º/4 CP com o art. 29º/4 CRP, na medida
em que a Constituição manda aplicar retroactivamente a lei de conteúdo mais favorável ao arguido, e arguido tem um sentido técnico-jurídico
rigoroso: uma coisa é arguido, outra é condenado e outra ainda é réu. O art. 2º/4 CP, diz que a lei penal de conteúdo mais favorável só não se
aplica ao condenado, e isto porque, se já há trânsito em julgado da sentença condenatória, é porque esse indivíduo já foi condenado, não se
estando a falar em arguido mas sim em condenado. A entender-se o contrário, ou seja, a entender-se a aplicabilidade da lei mais favorável,
pôr-se-ia em causa o princípio “ne bis in idem”, e também se poria em causa a intangibilidade no caso julgado.

Se realmente se pudesse aplicar retroactivamente esta lei mais favorável, então estava-se a julgar outra vez o mesmo indivíduo pela prática
do mesmo facto. E o princípio “in bis in idem”, de que ninguém deve ser julgado/condenado duas vezes pelo mesmo facto (art. 29º/5 CRP) era
posto em causa.

36. Inconstitucionalidade do art. 2º/4 CP

O Direito Penal tem carácter subsidiário, é o princípio da subsidiariedade do Direito Penal. Logo o Direito Penal só deve intervir quando se
torne necessário a sua intervenção. Não faz sentido que o Estado, equacionando uma valoração eminente a um determinado crime, se
abstenha a partir de determinado momento de impor uma determinada punição; como também não faz sentido continuar a aplicar uma
punição que o Estado recusou num determinado momento. Esta ressalva é inconstitucional porque viola o princípio da igualdade, e também
existe o princípio da igualdade dos cidadãos na administração da justiça.

Um outro argumento para a inconstitucionalidade da ressalva do art. 2º/4 CP, substancialmente não existem diferenças a que se aplique
retroactivamente as normas que operam a descriminalização, das normas que não operam uma descriminalização mas principalmente uma
despenalização, porque nos dois casos se altera o regime penal. O que está em causa é uma diferente valoração do legislador quanto aos
factos considerados crimes.

37. Leis temporárias e leis de emergência

As leis temporárias são as leis que marcam “ab initio”, à partida, o seu prazo de vigência; são as normas que se destinam a vigorar durante
um determinado período de tempo pré-fixado. São leis temporárias que caducam com o “terminus” da vigência que pré-fixaram.

19[19] Nullum crimen nulla poena sine lege previa

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Direito Penal

As leis de emergência são as leis que face a determinado circunstancialismo anormal vêm penalizar, criminalizar determinadas condutas que
até aí não eram consideradas crime, ou vêm efectivamente agravar a responsabilidade penal por determinado facto que até aí já era crime,
mas em que esse agravamento se deve tão só a situações ou circunstâncias anormais que reclamam a situação de emergência.

Ressalva-se no art. 2º/3 CP, que continua a ser punido o facto criminoso praticado durante o período de vigência de uma lei de emergência.
Significa que, não obstante no momento do julgamento a lei já não estar em vigor por já ter caducado ou já ter sido revogada, deve continuar
a ser punido pelo facto que praticou durante esse período em que a lei estava efectivamente em vigor. Em bom rigor, no âmbito das leis
temporárias não há uma verdadeira sucessão de leis no tempo, porque:

⇒ A lei é temporária em sentido estrito, não necessita de nenhuma outra lei para que se possa afirmar uma sucessão de leis penais
no tempo; a lei é só uma só faz sentido falar em sucessão de leis penais no tempo e em retroactividade ou irretroactividade quando
estão em causa mais do que uma lei, pelo menos duas leis. Aqui a lei é só uma.
⇒ Não há uma lei diferente, não há uma sucessão de regimes, donde também não faz sentido falar em aplicação retroactiva porque a
lei é sempre a mesma.

38. Aplicação da lei no espaço

Não são só conexões geográficas que o legislador utiliza para tornar aplicável a lei penal portuguesa, para que seja competente para julgar
factos penalmente relevantes. O legislador utiliza também a conexão dos valores ou dos interesses lesados ou ameaçados de lesão com as
actividades criminosas, o valor dos interesses postos em causa pela prática do crime. Isto evidencia-se em sede de dois princípios:

⇒ Princípio da tutela ou da protecção dos interesses nacionais.


⇒ Princípio da universalidade ou de aplicação universal.

Vindo estes princípios consagrados no art. 5º CP.

39. Princípio da tutela ou da protecção dos interesses nacionais

Quando se trate de crimes expressamente consagrados no art. 5º/1 CP, são crimes que o Estado português entende ferirem a sensibilidade
jurídica nacional, são crimes que põem em causa valores ou interesses fundamentais do Estado português. Para os factos penalmente
relevantes ocorridos em território nacional, a lei portuguesa é competente para os julgar – princípio da territorialidade.

Este princípio da territorialidade é depois complementado pelo princípio do pavilhão ou da bandeira pelo qual independentemente do
espaço aéreo ou das águas, a lei penal portuguesa também se aplica a factos praticados no interior de navios com pavilhão português, ou a
bordo de aeronaves registadas em Portugal.

40. Princípio da universalidade ou da aplicação universal

São de alguma forma crimes que todos os Estados têm interesse em punir. De um modo geral, independentemente da nacionalidade dos
seus autores, são crimes que reclamam uma punição universal e daí que as ordens jurídicas se reclamem competentes para fazer aplicar a
sua lei penal a esses factos descritos no art. 5º/1-b CP. Da alínea c) do art. 5º/1 CP retira-se o princípio da nacionalidade, também dito
princípio da personalidade activa ou passiva.

O princípio da nacionalidade activa diz basicamente que a lei portuguesa se aplica a factos praticados no estrangeiro por portugueses. É de
harmonia com o princípio da nacionalidade activo, que a lei penal portuguesa aplica-se a factos praticados no estrangeiro que sejam
cometidos por cidadãos nacionais.

O princípio da nacionalidade passiva diz que a lei penal portuguesa se aplica a factos cometidos no estrangeiro contra portugueses.

Condições para o princípio da nacionalidade:

1º. Os agentes sejam encontrados em Portugal (art. 5º/1-b CP);


2º. Os factos criminosos “sejam também puníveis pela legislação do lugar em que foram praticados, salvo quando nesse lugar não se
exerça poder punitivo”;
3º. Que “constituam crime que admite extradição e esta não possa ser concedida”, não se admite a extradição de cidadãos nacionais.

Esta 3ª condição prevista na só funciona cumulativamente quando se trate de um caso de nacionalidade passiva, quando se trate de um crime
praticado no estrangeiro por um estrangeiro contra um, português.

41. Teoria da ubiquidade

Visa abranger os delitos à distância.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 19


Direito Penal

O art. 7º CP é importante: se considerar que a conduta ou o resultado típico tiveram lugar em Portugal, então pode-se considerar que o facto
ocorreu em território nacional; e aí poder-se-á aplicar a lei penal portuguesa por força do preceituado no art. 4º CP e que consagra o princípio
da territorialidade, uma vez precisamente que este princípio vem dizer que a lei penal portuguesa é aplicável a factos praticados no território
nacional. Uma vez em sede do art. 5º CP vai-se analisar caso a caso:

⇒ Se será o princípio da protecção dos interesses nacionais, poderá ser um dos crimes elencados no aliena a);
⇒ Se haverá afloramento do princípio da universalidade (alínea b));
⇒ Se será eventualmente o princípio da nacionalidade activa ou passiva previsto na alínea c); e aqui verificar se estão reunidas todas
as condições previstas e se existem ou não restrições à aplicabilidade da lei portuguesa 20[20].

42. Princípio da dupla incriminação e princípio da especialidade

O princípio da dupla incriminação, significa que só é admitida a extradição se o Estado português considerar também crime o facto pelo
qual se pede a extradição ou o facto que fundamenta a extradição.

O princípio da especialidade significa que a extradição só pode ser concedida para o crime que fundamenta o seu pedido, não podendo o
extraditado ser julgado por uma infracção diferente e anterior à que fundamenta o pedido de extradição.

Por outro lado, também em princípio não se admite a extradição quando seja prioritariamente aplicável a lei penal portuguesa.

43. Princípio da administração supletiva da justiça penal (art. 5º/1-e CP)

Admite que o Estado português julgue um criminoso que tenha cometido um crime no seu país de origem contra um cidadão desse país e fuja
para Portugal. Pressupostos:

⇒ Que o agente se encontre em Portugal;


⇒ A extradição seja pedida;
⇒ Seja possível a extradição mas não seja admitida.

O art. 6º do CPdefine as condições gerais de aplicação da lei penal portuguesa a factos cometidos por estrangeiros:

⇒ Princípio de que ninguém pode ser responsabilizado por um facto mais do que uma vez (art. 29º CRP);
⇒ Art. 6º/2 CP, depois de ver que lei penal é competente, tem-se que ter em atenção a lei do lugar onde o facto foi cometido, e mais
favorável, mas que puna o facto.

As condições no art. 6º/2 CP não funcionam quando está em causa o princípio da protecção dos interesses nacionais (art. 6º/3 CP).

TEORIA DO FACTO PUNÍVEL OU TEORIA DA INFRACÇÃO

44. Introdução

É a teoria que tem por objecto o estudo do crime. O conjunto dos pressupostos de punibilidade e de punição que são comuns a todos os
crimes, a todos os factos tipificados na lei como crime. Os requisitos comuns é que um facto deve ter para ser considerado criminoso e para
que dele decorra uma responsabilidade jurídico-penal para o seu autor, para o agente daquela infracção. Pode-se formalmente definir crime
como um comportamento humano que consiste numa acção penalmente relevante, acção essa que é típica, ilícita, culposa e punível.

Esta teoria permite desde logo uma aplicação certa, segura e racional da lei penal. Passa-se dum casuísmo, de verificar caso a caso o que é
crime para através da teoria da infracção, ter-se uma vocação generalizadora de factos penalmente relevantes, de factos criminosos. E
através do estudo destas categorias analíticas pode-se determinar a responsabilidade jurídico-penal duma pessoa, pode-se firmá-la ou
excluía, através duma análise de subsunção progressiva.

45. Acção penalmente relevante

É todo o comportamento humano dominado ou dominável pela vontade.

Através deste conceito, já se está a excluir a responsabilidade jurídico-penal de comportamentos que provêm não de pessoas mas de
animais. Ter-se-á depois de verificar o seguinte: se está em presença de um comportamento humano dominado pela vontade, tem-se de ver
se esse comportamento humano preenche ou não um tipo legal de crime. Tem-se de ver se essa acção preenche a tipicidade de um dos tipos

20[20] O art. 6º CP só tem conexão com o art. 4º CP e com os princípios da universalidade/protecção de interesses nacionais e nacionalidade

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 20


Direito Penal

previstos na parte especial do Código Penal, ou então em legislação penal lateral. Para isso é preciso verificar se essa acção é típica, isto é,
é necessário verificar se estão preenchidos os elementos objectivos 21[21] e subjectivos 22[22] de um tipo legal.

Como se verifica se a acção é típica?

Tem-se efectivamente de analisar esta categoria que é a tipicidade, tem-se de verificar se aquela actuação humana se subsume ao tipo
normativo na previsão dos seus elementos objectivos e subjectivos. Depois, tem-se de ver se o elemento objectivo do tipo está preenchido.

O elemento subjectivo geral do tipo é o dolo. Tem-se de se ver então o que é o dolo: consiste na consciência e vontade de realizar os
elementos objectivos de um tipo legal. Estando preenchida a tipicidade, vai-se verificar que esta categoria analítica que é composta por
elementos subjectivos e objectivos, estando integralmente preenchida indicia a ilicitude.

46. Ilicitude

A ilicitude num sentido formal, é a contrariedade à ordem jurídica na sua globalidade, de um facto ilícito é um facto contrário à ordem jurídica,
contrário ao direito.

Mas numa óptica material, o facto ilícito consiste numa danosidade social, numa ofensa material a bens jurídicos.

Em princípio da lei penal só tipifica factos que são contrários ao direito. Mas a ilicitude indiciada pelo facto típico ou pela tipicidade pode ser
excluída. Pode estar excluída pela intervenção de normas remissivas, que vêem apagar o juízo de ilicitude do facto típico, são as designadas
causas de justificação que, a estarem presentes, justificam o facto típico, excluindo a ilicitude indiciada pela própria tipicidade. Mas pode
acontecer, que preenchido um tipo mediante uma acção penalmente relevante e a ilicitude indiciada pelo tipo, pode ser que não se verifique
nenhuma causa de justificação ou de exclusão da ilicitude. Na maior parte dos casos em que as pessoas cometem crimes não estão a actuar
ao abrigo de nenhuma causa de exclusão da ilicitude.

47. Culpa
É a categoria analítica do facto punível.

Sabendo-se que só se pode formular um juízo de censura de culpa sobre um imputável, porque as penas só se aplicam a quem seja
susceptível de um juízo de censura de culpa; àquelas pessoas a quem não for susceptível formular um juízo de censura de culpa aplicam-se
medidas de segurança, é nomeadamente o caso dos inimputáveis e dos menores de 16 anos.

Logo, para que o juízo de culpa possa ser formulado é preciso que o agente tenha capacidade de culpa. O agente não tem capacidade de
culpa se tiver menos de 16 anos, ou se for portador de uma anomalia psíquica ou de um estado patológico equiparado.

Mas para além de ter capacidade de culpa, o agente também tem de ter consciência da ilicitude do facto que pratica; e para além da
capacidade de culpa e da consciência da ilicitude é preciso, para se formular sobre o agente um juízo de censura de culpa, que o agente não
tenha actuado em circunstâncias tão extraordinárias que o desculpem.

48. Punibilidade

Para além de o facto ter consistido numa acção típica, ilícita e culposa, é ainda preciso que seja punível. Então chega-se à conclusão que por
vezes existem determinados factos praticados no seio de acções penalmente relevantes, típicas, ilícitas culposas, mas contudo os agentes
não são punidos. E porque é que não há punibilidade em sentido estrito?

⇒ Ou porque não se verificam condições objectivas de punibilidade;


⇒ Ou então porque se trata de uma isenção material, no caso de desistência;
⇒ Ou porque se trata de uma causa pessoal de isenção de pena.

Porque é que se fala numa subsunção progressiva?

Porque quando se analisa a responsabilidade jurídico-penal de alguém, tem-se de analisar detalhadamente todas estas categorias. Ainda que
intuitivamente se possa dar automaticamente a resposta, tem-se de percorrer estas etapas porque, por hipótese, se chegar à conclusão que
aquele comportamento não foi dominado nem tão pouco era dominável pela vontade humana, imediatamente se nega a responsabilidade
criminal do agente. Os tipos, a não ser quando a lei expressamente o diga, são sempre dolosos. O estudo analítico do crime, da teoria da
infracção, vai permitir:

21[21] Agente, conduta, resultado, nexo de causalidade.


22[22] Dolo, especiais intenções.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 21


Direito Penal

⇒ Por um lado, fazer uma aplicação certa, segura e uniforme da lei penal;
⇒ Por outro lado, vai ter uma vocação de subsunção progressiva.

Mas se hoje, entende-se que o crime é uma acção típica, ilícita, culposa e punível, esta tripartição entre tipicidade, ilicitude e culpa é uma
conquista dogmática da Escola Clássica. E à Escola Clássica segue-se cronologicamente a Escola Neo-clássica, e a esta segue-se a Escola
Finalista. Todas estas escolas teorizam o crime tripartindo-o, dizendo que era uma acção típica, ilícita e culposa. Agora, o que cada uma
destas escolas considerava como integrante de cada uma destas categorias analíticas é que diverge.

Escola Clássica:

⇒ Beling/Van Listz;
⇒ Acção – naturalista (acção natural);
⇒ Tipicidade – correspondência meramente externa, sem consideração por quaisquer juízos de valor; só elementos objectivos e
descritivos;
⇒ Ilicitude – formal;
⇒ Culpa – psicológica (inserção de todos os elementos subjectivos – dolo e negligência).
⇒ Criticas – os factos penalmente relevantes com negligência e os comportamentos omissos.

Escola Neo-clássica:

⇒ Prof. Figueiredo Dias;


⇒ Acção – negação de valores;
⇒ Tipicidade – o tipo tem também elementos normativos e determinados crimes têm também na sua tipicidade elementos subjectivos;
⇒ Ilicitude – material;
a) Permite graduar-se o conceito de ilicitude;
b) Permite a descoberta ou a formação de causas de justificação.
⇒ Culpa – censurabilidade: pressupostos da culpa – capacidade de culpa, consciência da ilicitude, exigibilidade;
⇒ Os conceitos de acção social e a posição de Figueiredo Dias, renúncia a um particular conceito de acção e os conceitos de:

a) Tipo indiciador;
b) Tipo justificador ou tipo do dolo negativo;
⇒ A teoria dos elementos negativos do tipo.

Escola finalista:

⇒ Wessel;
⇒ Acção – final;
⇒ Tipicidade – o dolo é um elemento subjectivo geral dos tipos;
⇒ Ilicitude – conceito de ilicitude pessoal – o desvalor da acção e do resultado;
⇒ Culpa – normativa; elementos da culpa.

Todos estes sistemas partem duma análise quadripartida do crime, como acção típica, ilícita e culposa.

49. O sistema clássico

Parte de uma concepção positiva, mecânica, mesmo naturalista, lógica da teoria da infracção. O conceito de acção para os clássicos é visto
como um conceito naturalista da acção, como um movimento corpóreo, um esforço muscular ou nervoso que produz uma alteração objectiva
do mundo real.

O tipo ou tipicidade é a correspondência externa de um comportamento considerado acção uma disposição legal, à discrição legal de um tipo
legal de crime. Mas a tipicidade era vista do ponto de vista meramente externo ou objectivo sem nenhuma consideração de valor.

A ilicitude é uma categoria separada. Para os Clássicos a ilicitude é vista numa óptica meramente formal, ou seja, como contrariedade à
ordem jurídica na sua globalidade. Um facto ilícito é um facto contrário à lei. Não vem permitir uma graduação do conceito de ilicitude, porque
se em sentido formal, a ilicitude significa contrariedade à ordem jurídica, se o facto ilícito é o facto que contraria a ordem jurídica, donde
contraria a lei, e o facto lícito é o facto que não contraria a lei, então só se pode afirmar que um comportamento é ou não é ilícito, é ou não é
contrário à ordem jurídica.

Quanto à culpa, para os Clássicos, era nessa categoria dogmática do facto punível que se incluíam todos os elementos subjectivos. Portanto,
a ilicitude e a tipicidade eram meramente objectivas. Tudo quanto fossem elementos subjectivos estaria na culpa. A culpa era vista de uma
óptica psicológica, porque a culpa corresponde à ligação psicológica entre uma pessoa e o seu comportamento, e essa ligação poderia ser
uma ligação dolosa ou uma ligação negligente. Logo, o dolo e a negligência são meras formas de culpa.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 22


Direito Penal

A tipicidade é meramente objectiva. É depois em sede de culpa que se terá de verificar que relação existe entre o agente e o seu facto, para
se poder afirmar uma culpa meramente psicológica.

50. Criticas ao sistema Clássico

A primeira crítica diz respeito ao conceito de acção. Este conceito de acção como movimento corpóreo que produz a alteração objectiva no
mundo exterior é um conceito criticável por várias razões. Mas talvez a crítica mais forte que se pode tecer ao conceito de acção dos clássicos
é precisamente a omissão porque a responsabilidade penal é afirmada por factos cometidos por acção, mas também por omissões
penalmente relevantes. O conceito de acção dos clássicos deixa de fora as omissões, ou os crimes omissivos. Daí que os clássicos tenham
reformulado um pouco esta noção, dizendo então que a acção homicida é a acção que se esperava que o agente tivesse.

Em relação à ilicitude, sendo uma ilicitude meramente formal, só nos permite afirmar se um comportamento, se um facto, se uma acção, é ou
não ilícita, não nos permitindo graduar o conceito de ilicitude.

Em relação à culpa. Sendo a culpa vista numa óptica meramente psicológica, pergunta-se como é que os Clássicos explicam a culpa
negligente, mormente os casos de negligência inconsciente. Nos comportamentos dolosos, o agente conhece e quer empreendida com
determinado resultado típico, ou assumir uma determinada conduta consubstanciada num tipo legal de crime.

51. Sistema Neo-clássico

É desenvolvido na Alemanha a partir dos anos 20, procurando “limar” alguns defeitos ou arestas do sistema clássico. A acção para os Neo-
clássicos:

⇒ Vêem dizer que não é importante verificar se ouve ou não um movimento corpóreo que produziu uma alteração objectiva no mundo
exterior, porque as actuações humanas são pautadas por determinadas valorações.
⇒ O que interessa é efectivamente o valor que está subjacente a um determinado comportamento. Assim, os Neo-clássicos passam a
ver a acção (o crime) como a negação de valores através de um comportamento. Portanto, o crime é todo aquele comportamento que
nega valores.
⇒ Klaus Roxin entende que o que é importante em sede de Direito Penal, em sede comportamental são tão só os factos ou as acções
voluntárias, isto é, aqueles comportamentos dominados ou domináveis pela vontade.

Dentro da vertente Neo-clássica surge outro conceito de acção, que é a acção social, desenvolvida por Smith. Este autor defende que mais
importante que tudo para afirmar a existência duma acção penalmente relevante é verificar se aquele comportamento, se aquela actuação
deve ser tido como uma acção em termos sociais. Isto é, se socialmente aquele comportamento merece a qualificação de acção. E isto
porque, desde logo, há acções que à prática, podem parecer negar valores, mas que não devem ser acções penalmente relevantes de
harmonia com a própria concepção social de acção.

A tipicidade, os Neo-clássicos vêm dizer que a tipicidade é composta por uma série de elementos, e o tipo não é valorativamente neutro,
implica já um juízo de valor para quem preenche a tipicidade. Referem que o tipo tem também elementos normativos, elementos que,
descrevendo entidades do mundo real, carecem duma interpretação complementar pelo recurso a normas. Para estes autores, o tipo é
composto por elementos positivos e por elementos negativos:

⇒ Elementos positivos: aqueles que fundam positivamente a responsabilidade penal do agente;


⇒ Elementos negativos: são as causas de justificação que, quando relevantes, justificam o facto típico.

A culpa para os Neo-clássicos, não é uma culpa psicológica, como pretendiam os Clássicos, mas é antes um conceito que é integrado já por
um critério de censurabilidade assente na existência de determinados pressupostos, nomeadamente a capacidade de culpa e a consciência
da ilicitude. A culpa é já uma culpa com ingredientes normativos e implica um juízo de censurabilidade pela prática de um facto.

52. Criticas ao sistema Neo-clássico

O conceito de acção: um comportamento humano que nega valores. Ora, na negação de valores cabe não só o comportamento activo, como
existem também omissões que podem de igual modo lesar valores. Portanto, aqui neste conceito de crime como comportamento socialmente
relevante que lesa valores, já se pode enquadrar de alguma forma o comportamento omissivo ou a omissão, coisa que ficava de fora do
conceito meramente causal e naturalístico de acção dos Clássicos.

Há determinados comportamentos cuja apreensão da negação ou de valores só pode ser dada pela finalidade do comportamento, ou da
acção. Os Neo-clássicos não incluíam o dolo em sede de tipo ou de tipicidade.

O dolo é um elemento da culpa, ou uma forma de culpa, porque só excepcionalmente a tipicidade é integrada por elementos subjetivos,
chamados elementos subjetivos específicos, com a intenção de apropriação no crime de furto, etc. Também os Neo-clássicos não resolvem
correctamente problema da negligência e dos comportamentos negligentes.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 23


Direito Penal

53. Sistema finalista

Os finalistas propõem um conceito de acção que é um conceito de acção final. Chagam à conclusão que o direito, a realidade normativa, não
pode aparecer totalmente divorciada e desligada da realidade ôntica, da realidade do ser que é anterior à realidade normativa. Se o direito
visa regular comportamentos humanos, estabelecer regras de conduta, então o direito, sob pena de ser uma falácia, tem de respeitar a
natureza ôntica, a natureza do ser, e o que é próprio do ser humano para os finalistas, dentro de um conceito de acção, é o agir com vista à
obtenção de um fim servindo-se de conhecimentos objectivos e causais que permitem essa obtenção, este conceito de acção deve ser
respeitado em sede de tipicidade. Portanto, a intenção que preside a uma determinada acção, que é a sua finalidade, deve ser espelhada no
tipo. Logo, o dolo que é a intenção, o fim da actuação, deve ser um elemento subjectivo do tipo.

Quanto ao conceito de ilicitude: começa a falar-se de um conceito de ilicitude pessoal. Actuar ilicitamente já não é tanto actuar
contrariamente à ordem jurídica na sua globalidade, como pretendiam os Clássicos (ilicitude formal). Já não interessará tanto actuar lesando
bens jurídicos fundamentais, como pretendiam os Neo-clássicos (ilicitude material).

Interessará mais, verificar se aquela pessoa que actua de determinada forma actua ilicitamente, se se lhe pode atacar um juízo de desvalor na
acção ou no facto que pratica. Existe aqui uma certa concepção ética do direito. Dentro deste conceito de ilicitude pessoal de se poder
reprovar uma pessoa por adoptar um determinado comportamento, podem-se distinguir dois desvalores:

1. O desvalor da acção, da conduta empreendida pelo agente;


2. O desvalor do resultado, em que se traduz o comportamento ou a conduta do agente.

A acção, embora no âmbito dos crimes negligentes seja também desvaliosa 23[23], por comparação dos crimes dolosos em que o agente actua
querendo e conhecendo um determinado resultado, o desvalor da acção nos crimes dolosos é muito superior.

Quanto à culpa. Os finalistas têm um conceito de culpa puramente normativo. A consciência da ilicitude, a capacidade de culpa e a
exigibilidade dos comportamentos passam a ser elementos da culpa. Faltando um destes elementos da culpa, já não é possível formular
sobre uma pessoa um juízo de culpa. A capacidade de culpa consiste no fundo em a pessoa ter capacidade para avaliar as exigências. São
incapazes de culpa:

a) Os inimputáveis em razão da idade (menores de 16 anos);


b) Os portadores de anomalias psíquicas, que são inimputáveis em razão da anomalia psíquica.

A consciência da ilicitude é um elemento autónomo da culpa.

54. Criticas ao sistema finalista

O conceito de acção, é um conceito de acção final e os finalistas nunca conseguiram com este conceito justificar muito bem os crimes de
negligentes. Sendo assim também para as omissões. Daí que quem segue a sistemática finalista opte por uma quadripartição do facto
punível, em que se distingue:

⇒ Crime doloso por acção;


⇒ Crime doloso por omissão;
⇒ Crime por acção negligente;
⇒ Crime por omissão negligente.

55. Acção

Acção penalmente relevante é todo o comportamento humano, com relevância no mundo exterior, que é dominado ou dominável pela
vontade. Fica logo excluído os comportamentos ou as acções das coisas, das forças da natureza e dos animais irracionais. Dentro do ponto
de vista dos fins das penais, quer numa óptica retributiva, quer numa óptica preventiva, não faz sentido criminalizar comportamentos que não
sejam dominados pela vontade. Uma acção penalmente relevante pode consistir:

⇒ Num comportamento positivo – num “facere”;


⇒ Num comportamento negativo – num “non facere”.

A acção tem relevância quer consista num comportamento positivo, quer numa omissão. A nossa lei equipara a omissão à acção; essa
equiparação é dada pelo art. 10º CP. Há duas formas de comportamento omissivo penalmente relevante, que se diferenciam: são designadas
omissões puras (ou impróprias) e as omissões impuras (ou impróprias).

Quando o legislador descreve as incriminações, através de normas proibitivas e de normas que pressupõem um determinado resultado típico
do tipo, para estar preenchido, para ser consumado exige uma conduta e um resultado. No caso das omissões impuras nem toda a gente

23[23] Pela inobservância de um dever de cuidado.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 24


Direito Penal

pode incorrer em responsabilidade jurídico-penal por omissão impura, porque o legislador só responsabiliza pelas omissões impuras aqueles
sobre quem recaía ou impendia um dever jurídico que pessoalmente o obrigasse a evitar a produção do resultado típico.

Os clássicos consideravam por acção penalmente relevante todo o movimento corpóreo, esforço nervoso ou muscular, que produz uma
alteração objectiva no mundo real. O conceito de acção causal é criticável, isto porque:

⇒ Torna-se mais difícil de explicar como é que nestes casos das omissões impuras pode haver a acção omissiva;
⇒ Crime de injúria: este crime só é concebível a partir de uma certa ponderação social daquele comportamento como negação de um
determinado valor, só é crime porque socialmente se convenciona que aquele comportamento é uma acção relevante;
⇒ Este conceito de acção causal não afasta, de per si, comportamentos dominados pela vontade.

Só através de um critério exterior ao próprio conceito de acção causal é que se consegue delimitar os comportamentos com relevância penal
e os comportamentos que não têm essa relevância.

Para os Neo-clássicos, o conceito de acção é todo o comportamento que nega valores – é uma negação de valores. Smith vem com um
conceito social de acção, dizendo que acção penalmente relevante é aquilo que é socialmente adequado a ser acção. Mas este conceito não
explica de per si porque é que algumas omissões negam valores não é dada tanto pela acção, mas pela ordem jurídica. Muitas vezes
também, a relevância social da acção não pode estar desligada daquilo que o agente quis. Por outro lado, não há dúvida que o mesmo
comportamento pode ter vária e diferente relevância social, consoante a intenção do agente.

Finalmente o conceito de acção final para os finalistas. É todo o comportamento em que a pessoa se serve dos conhecimentos objectivos e
causais para atingir uma determinada finalidade. O processo causal nos crimes omissivos representa especialidades face aos crimes activos.
Essas especialidades fazem com que os próprios finalistas tivessem de chegar a uma análise quadripartida do facto punível (ou da infracção):

⇒ Crimes dolosos por acção;


⇒ Crimes dolosos por omissão;
⇒ Crimes negligentes por acção;
⇒ Crimes negligentes por omissão.

Este conceito de acção final não é compreensível para abarcar todas as realidades e comportamentos que podem dar origem à
responsabilidade jurídico-penal. Há autores que, em relação ao conceito de acção penalmente relevante, como categoria autónoma da
punibilidade, porque não é um conceito isento de críticas em qualquer formulação, dizem que nós devemos renunciar a um particular conceito
de acção e é própria tipicidade que englobamos os comportamentos por acção e por omissão (Prof. Figueiredo Dias). Há outros autores que
discordam e que dizem que o conceito de acção penalmente relevante e efectivamente uma categoria que não se deve descurar, porque o
conceito de acção tem um determinado rendimento em sede de dogmática jurídico-penal.

56. Tipo ou tipicidade

Por detrás de cada tipo incriminador, o legislador há-de pretender sempre a tutela de um ou mais bens jurídicos, porque o direito penal
encontra a sua justificação na tutela de bens jurídicos fundamentais.

O bem jurídico é algo distinto do chamado objecto do facto ou objecto da acção. Enquanto que o bem é aquela realidade que não é uma
realidade palpável, é um valor, um interesse. O objecto do facto ou da acção é o “quid” concreto sobre o qual incide a actividade criminosa
do agente.

57. Estrutura do tipo

Por detrás de cada tipo legal encontra-se sempre a tutela de um ou mais bens jurídicos. Os tipos têm na sua descrição elementos descritivos,
predominantemente, mas também é concebível que nalguns tipos apareçam elementos normativos. Aliás foram os Neo-clássicos que
chamaram à atenção para a existência destes elementos normativos do tipo.

Os elementos descritivos são aqueles elementos que expressam entidades do mundo real, quer no foro exterior quer interior, quer para a
sua cabal compreensão, não necessitam de nenhuma valoração suplementar feita pelo recurso a uma norma.

Os elementos normativos são aqueles que, expressando também entidades do mundo real, para seu cabal entendimento carecem do
recurso a uma valoração suplementar, do recurso por exemplo a outra norma.

Há quem diga, como Ihering, que não existem elementos puramente descritivos: todos eles são mais ou menos normativos; postulam sempre,
para seu cabal entendimento e compreensão, uma valoração suplementar, seja ética, seja de ordem jurídica. O tipo é integrado sobretudo a
partir duma abordagem finalista, por uma estrutura mista: é composto por elementos objectivos e por elementos subjectivos. Referindo, agora,
tão só ao crime comissivo por acção, ou crime doloso por acção, pode-se encontrar os seguintes elementos objectivos do tipo:

a) O agente;
b) A conduta ou descrição da acção típica;

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Direito Penal

c) O resultado;24[24]
d) O nexo de imputação, também designado de causalidade 25[25];
e) Algumas circunstâncias que rodeiam a conduta ou descrição da acção típica.

Estes elementos objectivos do tipo referenciam entidades ônticas que existem independentemente de qualquer representação entre a mente
do agente e o facto por ele praticado, por isso se dizem elementos objectivos.

Os elementos subjectivos, são aqueles que pressupõem já uma relação com o foro íntimo do agente, ou seja, entre a representação da
mente do agente daquilo que ele pensa e quer aquilo que objectivamente se verifica, por isso se designam elementos subjectivos.

Como elementos subjectivos e no âmbito do crime doloso, encontram-se os chamados elementos subjectivos específicos, que são
elementos que têm de existir para que os tipos legais de crime se considerem efectivamente preenchidos. São as especiais tendências, as
especiais intenções. O elemento subjectivo geral será o dolo, no âmbito dos crimes dolosos.

O dolo consiste no conhecimento e vontade de empreender um determinado tipo legal de crime. O dolo consiste no conhecer e querer os
elementos objectivos de um tipo legal de crime. O dolo apresenta pois, uma estrutura bipartida, integrada por um elemento intelectual que é o
conhecimento – o conhecimento de uma determinada realidade objectiva; e um elemento de natureza volitiva, o querer efectivamente essa
realidade objectiva de determinada forma. Nos crimes negligentes, o elemento geral será a negligência.

58. Elementos objectivos do tipo especial

a) Agente

O agente é aquela pessoa que adopta uma conduta típica descrita num determinado tipo legal de um crime e que empreende a realização
típica – o agente do tipo legal de crime.

b) Acção típica ou conduta

A conduta típica, também dita descrição da acção típica, ou tão só a acção típica, aparece como um elemento objectivo do tipo legal de crime
e encontra-se efectivamente descrita no tipo.

c) Resultado

É também um elemento objectivo do tipo, nos chamados crimes materiais ou de resultado: é o próprio resultado típico. Há crimes em que,
para além da descrição da conduta típica, se exige que espaço-temporalmente se desprenda ou se destaque da conduta típica algo
diferenciado que é o resultado – o resultado típico – para que o facto possa estar efectivamente consumado. Nestes crimes materiais ou de
resultado, que para além da conduta pressupõe, ainda, para a sua consumação, a verificação do resultado típico.

d) Nexo de causalidade

Isto traduz-se, em saber se um determinado resultado pode ser imputado a uma conduta do agente; se aquilo que se verifica pode ser
efectivamente considerado como obra daquela actuação típica do agente. É um elemento não escrito do tipo, isto porque, nos crimes
materiais ou de resultado, naqueles crimes que se designam normalmente por crimes de forma livre. Ou seja, são crimes cuja obtenção do
resultado típico previsto pela norma pode ser obtido, por referência à conduta do resultado típica que é matar, pelas mais diferentes formas.

Por vezes, muito raramente, o legislador pode pretender dar cobertura literal a esse elemento, ou a este nexo de nexo de causalidade ou de
imputação objectiva, e descrevê-lo. É o que acontece nos chamados crimes de realização vinculada. Aqui o crime é de realização vinculada,
pela descrição do elemento, por uma certa descrição do nexo de causalidade. Um outro elemento não escrito no tipo e que existe apenas
nalgumas classificações, ou nalguns tipos de crime – os crimes de omissão impura ou imprópria – é o chamado dever de garante.

Muitas vezes a lei descreve comportamento que considera proibidos e que as pessoas não devem adoptar, porque ao adoptá-los isso importa
a obtenção de um determinado resultado lesivo, o qual pode ser obtido quer por via de um comportamento activo ou de uma acção, quer por
via de um comportamento omissivo ou de uma omissão. Para que uma pessoa seja responsabilizada por ter dado origem à produção de um
resultado típico proibido pela lei em virtude de uma inactividade, ou em virtude da sua passividade ou omissão, é preciso que sobre essa
pessoa impenda um dever jurídico que pessoalmente a obrigue a evitar a produção desse resultado lesivo. Este dever de garante pode
resultar fundamentalmente de três pontos: ou directamente da lei, ou de contrato, ou de uma situação de imergência.

25 [25] Também nos crimes materiais ou de resultado.

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e) Circunstâncias que rodeiam a conduta

As circunstâncias podem ser, para a nossa lei, ou crimes autónomos, ou então elementos que integram qualificações ou priviligiamentos de
tipos legais de crimes.

59. Acepções em que se utiliza a palavra tipo

a) Tipo de garantia, total, ou em sentido amplo

Pretende abranger todos os elementos que concorrem para fundamentar uma responsabilidade criminal, abrangendo simultaneamente não só
a categoria analítica da tipicidade mas também as outras categorias dogmáticas como a ilicitude a culpa e a própria punibilidade. O tipo
garantia corresponde ao conjunto de pressupostos de punibilidade e de punição de um tipo legal, de um crime.

b) Tipo iniciador ou tipo em sentido restrito

O tipo abrange tão só a categoria da tipicidade, com a estrutura somente de elementos objectivos e subjectivos. Podendo-se dizer assim que,
tipo indiciador ou tipo em sentido restrito é a correspondência objectiva e subjectiva à definição de um tipo legal de crime. Ou, por outras
palavras, com a expressão tipo indiciador, tipo em sentido restrito ou tipo de injusto, visa-se a delimitação de um comportamento proibido ou
exigido, ao qual se comina uma sanção penal geral e abstractamente estabelecida.

Tipo em sentido restrito, porquê?

Porque o facto de preencher um tipo neste sentido restrito não significa de per si que a pessoa vá ser punida, porque a pessoa pode ter
actuado tipicamente, todos os elementos objectivos e subjectivos do tipo podem estar preenchidos mas a pessoa não ter responsabilidade
jurídico-criminal porque, por hipótese, naquele caso actuou em legítima defesa.

Designa-se também tipo indiciador porquê?

Porque uma vez preenchida integralmente a tipicidade, preenchidos integralmente os elementos constitutivo do tipo de crime, formula-se um
juízo de valor sobre essa pessoa no sentido de que a tipicidade indicia a ilicitude, a qual pode ser excluída pela intervenção das causas de
justificação.

c) Tipo intermédio

Pretende-se significar que a um comportamento típico acresce simultaneamente um juízo de equidade. Significa pois, a situação de que
alguém cometeu um facto típico em sentido estrito, que é simultaneamente ilícito, ou seja, uma pessoa cometeu um facto que corresponde à
descrição objectiva e subjectiva de uma norma legal, não actuando ao abrigo de nenhuma causa de exclusão da ilicitude, ou não actuando ao
abrigo de nenhuma causa de justificação.

CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE CRIME

60. Quanto ao agente

Pode-se classificar a tipicidade em crimes gerais ou comuns, e crimes específicos ou próprios, podendo estes ainda ser: crimes específicos
em sentido próprio e em sentido impróprio. Os crimes gerais ou comuns são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa, ou
seja, qualquer pessoa pode ser agente ou autor do crime tipificado. São portanto crimes que não postulam de determinadas qualidades,
naturalísticas ou não, na pessoa do agente.

Os crimes específicos ou próprios são aqueles em que os agentes são qualificados por um qualquer dever jurídicos, ou por uma qualquer
situação juridicamente definida. São aqueles que pressupõem como autores dos crimes apenas as pessoas que têm uma qualidade exigida
pelo próprio tipo. Dizem-se crimes específicos em sentido próprio quando para além de só poder ser agente ou autor da incriminação
aquela pessoa que tenha as características exigidas pelo próprio tipo, não existe na lei penal nenhuma tipificação correspondente para o
comum das pessoas. É um crime que só pode ser praticado por aquelas pessoas e mais nenhumas. Não existe responsabilidade jurídico-
penal paralela para quem não tenha essas qualidades pressupostas pelo tipo na pessoa do seu agente.

Os crimes específicos em sentido impróprio são aqueles que exigindo embora essas qualidades específicas do agente, têm paralelo para
o comum das pessoas em termos de responsabilização jurídico-penal. Ainda quanto ao agente, há uma outra classificação que distingue
entre: crimes plurisubjectivos, também chamados de participação necessária e, crimes unisubjectivos ou unisingulares.

Os crimes plurisubjectivos ou de participação necessária são aqueles em que o tipo incriminador exige o envolvimento, exige mais do que
um agente para integrar o tipo. Estes tipos, para estarem preenchidos quanto à pessoa do agente, pressupõem um envolvimento plural.

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Os crimes unisubjectivos ou unisingulares que podem ser praticados por um único agente. São a maior parte deles: o crime de furto,
roubo, homicídio etc., podem ser praticados única e exclusivamente com a colaboração, ou o consenso de uma só pessoa, de um só autor.

Klaus Roxin fala nos chamados crimes de violação de dever. São crimes que são definidos através de um dever jurídico, não tanto pelo
desenvolvimento de qualquer actividade, mas essencialmente pela titularidade de um dever jurídico. Roxin propõe uma sistemática bipartida
da teoria do facto punível. Essa teoria bipartida devia assentar:

⇒ Por um lado, nos crimes que consistem em levar a cabo uma determinada actividade;
⇒ Por outro lado, os crimes que violam deveres jurídicos, normalmente deveres jurídicos de natureza profissional ou deveres jurídicos
funcionais a que uma determinada pessoa está adstrita.

61. Princípio da responsabilidade singular ou princípio da responsabilidade individual

Salvo quando a lei expressamente o disser, apenas as pessoas singulares são susceptíveis de responsabilidade jurídico-criminal. Portanto, só
existe responsabilidade jurídico-penal das pessoas colectivas quando a lei expressamente o determinar. É o que preceitua o art. 11º CP.

Fundamentalmente tem-se acentuado o carácter pessoal da responsabilidade criminal com base em duas ideias:

⇒ Por um lado, Füerbach vem dizer que as pessoas colectivas são incapazes de agir. E isto porque as pessoas colectivas estão
dominadas e só têm capacidade de para agir de harmonia com a especificidade do fim. Neste sentido, as pessoas colectivas não
podem agir como as pessoas singulares. Se o fim das pessoas colectivas tem de ser um fim legítimo, então elas só têm
capacidade de agir legitimamente, porque senão eram nulas por contrariedade à lei, à ordem pública e aos bons costumes.
⇒ Por outro lado, Savigny tem afirmado também a ideia de que não existe responsabilidade penal das pessoas colectivas,
acentuando já não a ideia de incapacidade de agir, mas acentuando a ideia da incapacidade de culpa. A culpa é um juízo
individualizado de censura feita pela ordem jurídica e que se dirige a uma pessoa pela prática de um facto ilícito. E naquilo que no
juízo de censura se reprova ao agente é precisamente o facto dessa pessoa, tendo capacidade e possibilidade de se decidir de
forma diferente, de se decidir pelo direito, ter-se decidido pelo torto, ter-se decidido pelo ilícito.

Neste sentido, uma vez que as pessoas colectivas não têm uma vontade própria real, têm só uma vontade fictícia. Daí a insusceptibilidade de
culpabilizar as pessoas colectivas.

62. Crimes e função do resultado

Os crimes formais ou de mera actividade, não são só crimes de mera actividade. Crimes formais são também omissões puras; enquanto
crimes de resultado ou crimes materiais são também omissões impuras.

Os crimes por acção em cuja tipicidade e cuja conduta típica está descrita efectivamente em termos de acção. Acção que, a ser efectuada
pelo agente, viola uma proibição ou um comando legal.

Existe responsabilidade por acção quando o agente pratica actos que são subsumíveis às condutas descritas nos tipos legais em termos de
acção. Mas também existe responsabilidade por omissão.

As omissões podem ser de duas ordens. Pode-se classificar ou distinguir as chamadas omissões puras das omissões impuras, também
designadas por alguns autores de omissões próprias e omissões impróprias, respectivamente.

Dentro das omissões puras, tem-se a responsabilidade jurídico-penal do agente, na porque ele tenha actuado, mas precisamente porque
omitiu uma conduta que lhe era exigível por lei. Nos caos de omissões puras o agente incorre em responsabilidade jurídico-penal por ter
violado uma norma preceptiva, uma norma que impõe a adopção de uma determinada conduta que é omitida, ou não tem lugar.

No âmbito das omissões impuras tem-se uma situação diferente. Aqui o agente é responsabilizado por um determinado resultado que tem
lugar não por sua acção, não porque ele tenha directamente adoptado uma conduta típica descrita na lei, mas precisamente porque dá origem
a um resultado por uma inactividade sua, violando desta forma uma norma ou um preceito de natureza proibitiva.

Na omissão imprópria o agente é responsabilizado por um crime, porque sobre ele impendia um dever jurídico que pessoalmente o obrigava a
evitar a produção do resultado. E este dever jurídico que impende sobre o agente e que pessoalmente o obriga a evitar a produção do
resultado lesivo, ou típico, pode resultar principalmente de três fontes:

⇒ Directamente da lei;
⇒ Indirectamente da lei ou do contrato;
⇒ De situações de ingerência.

Nas omissões impuras o agente dá origem a um determinado resultado através da sua passividade; por tanto, existe aqui assim a violação de
uma norma proibitiva mediante um comportamento omissivo. Mas por força do art. 10º CP, que equipara a acção à omissão, e onde se

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encontra a base legal da construção das omissões impuras é necessário, para responsabilizar alguém por uma omissão impura, que sobre
essa pessoa recaísse o dever jurídico, oriundo de qualquer destas fontes que pessoalmente o obrigasse a evitar a produção do resultado
lesivo. Portanto, pode-se dizer que:

⇒ Os crimes de omissão pura são os que consistem directamente, pelo próprio tipo legal, na violação de um comando;
⇒ Enquanto que os crimes de omissão impura não consistem já na violação directa de um comando legal, mas sim no levar a cabo,
por remissão, um resultado previsto num tipo que está desenhado em termos de acção.

Pode-se ver então que os crimes materiais ou crimes de resultado são também as omissões impuras, mas crimes formais ou de mera
actividade são também omissões puras.

Os crimes de resultado são aqueles em que espaço-temporalmente se podem destacar ou distinguir algo de diferenciado da conduta, que é
o resultado típico. Os crimes de resultado, ou materiais (omissões impuras), são aqueles que, segundo o tipo desenhado na lei, pressupõe a
verificação de um certo resultado para se poder dizer que se consumou esse crime.

Os crimes de mera actividade também ditos formais (omissões puras) são aqueles em que a mera conduta típica consuma imediatamente o
crime.

63. Importância dogmática e prática da distinção crimes de resultado e crimes de mera actividade.

Tem importância prática desde logo para efeitos de início da prescrição do procedimento criminal.

Os arts. 117º e 118º CP dizem a partir de que momento é que se começa a contar o praz de prescrição do procedimento criminal, e não maior
parte dos casos é a partir da consumação.

⇒ Enquanto o crime de mera actividade está consumado no momento em que o agente actua;
⇒ Nos crimes de resultado o facto só está consumado quando o resultado típico se verifica; e entre o momento em que o agente
actuou e o momento em que o resultado típico se produziu, pode decorrer um espaço de tempo mais ou menos longo.

Por outro lado, esta distinção é também importante para efeitos de possibilidade ou não possibilidade de responsabilidade criminal por facto
tentado.

A tentativa, tal como está tipificada no art. 22º CP, consiste na prática de actos de execução de um crime que o agente decidiu cometer, sem
que o resultado típico se chegue a verificar. Portanto, está construída para os chamados crimes materiais ou de resultado. A tentativa só se
distingue da consumação precisamente pela não verificação de um elemento que é o resultado típico. A tentativa tem três elementos:

1. A prática de actos de execução, elemento positivo e objectivo;


2. A decisão do cometimento de um crime, elemento positivo e subjectivo;
3. A não verificação do resultado típico, elemento negativo e objectivo.

É concebível nos crimes de resultado, falar em tentativa, porque são concebíveis actos de execução com a intenção criminosa do
cometimento de um facto mas em que, por um outro motivo estranho à vontade do agente, o resultado pretendido pelo agente não se tenha
verificado.

64. Tipo em função do objecto

Distingue os chamados crimes de perigo e os crimes de dano ou lesão.

Nos crimes de perigo a descrição típica não exige a lesão efectiva dos bens jurídicos tutelados pela incriminação, mas tão só a colocação
em perigo, tão só a ameaça de lesão desse bem ou bens jurídicos tutelados pela norma. Pelo contrário, nos crimes de lesão, exige-se um
dano ou uma lesão efectiva no bem ou bens jurídicos tutelados pela norma. E fala em bem ou bens jurídicos tutelados pela norma porque há
tipos legais de crimes que tutelam mais do que um bem jurídico. São os chamados crimes pluridimensionais. Os crimes de lesão são desde
logo entre outros:

⇒ O crime do art. 131º CP: uma vez ocorrida a morte, há uma lesão do bem jurídico vida;
⇒ O crime de ofensas corporais (ainda que um pouco controvertidamente) do art. 142º CP;
⇒ O crime de burla, previsto no art. 313º CP, etc.

Os crimes de perigo podem distinguir-se em:

⇒ Perigo concreto;
⇒ Perigo abstracto;
⇒ Perigo abstracto-concreto.

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Direito Penal

Nos chamados crimes de perigo concreto, o legislador tipifica o próprio perigo pela descrição de uma conduta perigosa, da qual se
autonomiza o resultado típico, resultado que é o próprio perigo para o bem ou bens jurídicos tutelados pela incriminação. Donde, os crimes de
perigo concreto, uma vez que têm autonomizado, o resultado da conduta perigosa descrita pelo legislador, que é o próprio perigo, são crimes
de resultado. E os crimes de perigo concreto, quanto ao seu elemento subjectivo, postulam um dolo especial ou específico, que é o chamado
dolo de perigo.

Quanto aos crimes de perigo abstracto aqui o legislador parte da presunção de que aquela conduta descrita é uma conduta perigosa. E
perigosa por referência ao mais variado leque de bens jurídicos. Nos crimes de perigo abstracto o legislador contenta-se com a presunção que
tem de aquele comportamento, aquela actividade, é uma actividade que pode pôr em perigo, pode ameaçar de lesão, vários bens jurídicos,
sem tão pouco ter a preocupação de se lhe referir expressamente. Neste tipo de crime, já não é preciso que se autonomize nenhum resultado
típico que seja o próprio perigo, porque a lei contenta-se com a descrição da conduta que tem como perigosa.

Quanto aos crimes de perigo abstracto-concreto:

⇒ É uma classificação intermédia entre os crimes de perigo abstracto e os crimes de perigo concreto, em que se pode dizer que o
legislador é menos exigente do que em relação aos crimes de perigo concreto, mas mais exigente do que em relação aos crimes
de perigo abstracto. É menos do que nos crimes de perigo concreto porque o legislador descreve no tipo a própria conduta que
considera perigosa, sem necessidade de autonomizar o resultado perigoso, tal como acontece no âmbito dos crimes de perigo
concreto, e que é o próprio perigo.

65. Crimes de mão própria

Estes crimes são aqueles que alguns autores consideram que só podem ser cometidos pelo próprio agente da infracção, pelo próprio agente
material do crime, não admitindo outra forma de autoria, desde logo autoria mediata. A autoria mediata é uma das formas de autoria tipificada
no art. 26º CP.

Outra situação típica de autoria mediata é o caso da coacção, em que alguém coage outrem à prática de um determinado facto. Não se pode
confundir estes crimes de mão própria com os crimes específicos ou próprios:

⇒ Nos crimes específicos ou próprios exige-se uma especial qualidade do agente;


⇒ Os crimes de mão própria são crimes que podem ser praticados por qualquer agente.

66. Crimes simples e crimes pluri-ofensivos 26[26]

a) Crimes simples

São aqueles em que é violado, por lesão ou ameaça de lesão 27[27] um determinado bem jurídico.

b) Crimes pluri-ofensivos, pluridimensionais ou crimes compostos

São aqueles em que são violados, por lesão ou ameaça de lesão, vários bens jurídicos. Qualquer um destes tipos está inserido na parte
especial do Código Penal, num determinado capítulo. Com a adopção das condutas típicas proibidas por estes tipos o agente lesa vários bens
jurídicos.

67. Crimes agravados pelo resultado e crimes praeter intencionais

Os crimes praeter intencionais têm uma estrutura mista, são um misto de um resultado a título doloso. O nexo de imputação dá origem a
segundo resultado imputado ao agente a título de negligência. Diz-se que nos crimes praeter intencionais há uma estrutura mista: misto de
dolo e negligência, ligados por um nexo de imputação objectiva 28[28].

Os crimes agravados pelo resultado, é uma espécie desta figura da praeter intencionalidade, mas abrange um conceito mais amplo. E mais
amplo, porque não supõe que o crime básico, que o primeiro resultado, seja sempre doloso; por hipótese, um resultado negligentemente
provocado pode dar origem a um resultado mais grave, negligentemente ocorrido.

26 [26] Também designados crimes compostos ou crimes dimensionais.


27 [27] Por lesar ou colocar em perigo.
28 [28] Repare-se que em Direito Penal – e é um princípio de Direito Penal que o distingue do Direito Civil – não há responsabilidade objectiva.

Nos termos do art. 18º CP, a imputação de um resultado ao agente há-de fazer-se sempre com base numa culpa, quando mais não haja a título de
negligência. Não há responsabilidade objectiva em Direito Penal – consagra-se no art. 18º CP o princípio da responsabilidade subjectiva ou com culpa.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 30


Direito Penal

68. Crimes simples ou básicos; crimes qualificados; crimes privilegiados

Os crimes qualificados e os crimes privilegiados distinguem-se dos crimes básicos ou simples pelas suas variações agravadas,
designando-se então crimes qualificados, e pelas suas variações privilegiadas, designando-se então crimes privilegiados.

O crimes básico ou crime simples é aquele que descreve os elementos fundamentais de uma certa forma de violação de bem jurídico
tutelado pela incriminação, descrição essa a partir da qual outros tipos fazem inserir determinadas variações ou variantes, no sentido de impor
uma agravação ou uma atenuação de pena.

⇒ Se essas variantes se traduzirem numa agravação da pena, tem-se os crimes qualificados;


⇒ Se se traduzirem numa atenuação, tem-se os crimes privilegiados.

Repara-se que esta classificação é também importante desde logo porque quando estão em causa tipos básicos, tipos qualificados e tipos
privilegiados, normalmente entre eles pode estar em causa uma relação consensual, uma relação de concurso aparente, legal ou de normas,
neste caso numa relação de especialidade.

69. Crimes de intenção ou crimes de resultado parcial

Estes tipos de crime são aqueles em que a tipicidade é descrita em função de uma especial intenção ou tendência, sem a qual o tipo não está
preenchido. Mas, para a consumação do tipo, curiosamente, não se exige que o resultado dessas intenções, ou dessas tendências se
verifique. Quem chamou a atenção para que os tipos por vezes pressupunham determinados elementos subjectivos específicos e refiram as
especiais intenções, foram os Neo-clássicos:

⇒ O tipo de furto, para além de ser um tipo doloso, postula também para além do dolo (em sede de tipicidade), um elemento
subjectivo específico que é a especial intenção de aprovação;
⇒ O crime de burla (art. 313º CP) pressupõe uma intenção de enriquecimento;
⇒ O crime de envenenamento (art. 146º CP) postula uma intenção de lesar a saúde física, ou psíquica de outra pessoa;
⇒ O tipo legal do art. 235º CP tem uma especial intenção: intenção de causar prejuízos ao Estado ou a terceiros.

Significa pois que a tipicidade aqui é descrita em função desta especial tendência ou intenção. Se não se verificar esse elemento subjectivo
específico, o tipo não está preenchido.

70. Crimes instantâneos, crimes de Estado e crimes duradouros

Estas distinções têm reflexos práticos importantes, nomeadamente para contagem dos prazos de prescrição do procedimento criminal, para a
determinação do momento da prática do facto, para a matéria da comparticipação e desistência, entre outras.

Crimes instantâneos são aqueles em que o agente com o seu comportamento dá origem a uma situação de ilicitude que ocorre e se esgota
com a produção desse comportamento.

Nos crimes duradouros o agente com o seu comportamento dá origem também a uma situação de ilicitude, situação essa que fica privada
em relação à coisa de que é proprietário das suas faculdades de uso, gozo e fruição. Mas esse estado lesivo dura enquanto pelo menos a
pessoa que furtou não devolveu o objecto furtado a quem de direito.

E então como é que estes crimes que são ditos de Estado se distinguem dos crimes instantâneos?

Nos crimes instantâneos, efectivamente, detecta-se um momento preciso em que corre e se esgota o estado lesivo, mas em que não há
possibilidade de recomposição do estado lesivo.

Como é que se distinguem, por sua vez, os crimes de estado dos crimes duradouros?

Nos crimes duradouros de que é exemplo o sequestro há efectivamente, para efeitos de consumação formal do crime, a determinação do
momento em que o agente com o seu comportamento dá origem a uma situação de ilicitude, situação de ilicitude que é mantida no tempo
pela própria vontade do agente; e o agente, através de um comportamento seu, pode fazer cessar esse estado ilícito de coisas.

Mas nos crimes duradouros há um estado decrescente de ilicitude progressiva.

Conclusão:

⇒ Nos crimes instantâneos não se verifica um estado lesivo que possa ser removido;
⇒ Enquanto nos crimes de estado já há a possibilidade de remover o estado lesivo;

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Direito Penal

⇒ Nos crimes duradouros, havendo também a possibilidade de remoção do estado lesivo tem-se que, contrariamente aos crimes de
estado, existem graus crescentes de ilicitude, ou uma ilicitude progressiva, o que não acontece nos crimes de estado em que o
grau de ilicitude é sempre o mesmo.

Uma outra distinção que é necessária fazer é aquela que estabelece a diferença entre actos preparatórios:

⇒ De tentativa;
⇒ E de consumação.

Em primeiro lugar, tem-se que atender a dois conceitos de consumação. Por um lado fala-se em consumação formal e essa consumação
formal pressupõe o preenchimento de todos os elementos do tipo incriminatório. Por outro lado, fala-se num conceito de consumação
material que tem a ver com a lesão efectiva do bem jurídico tutelado pela norma jurídico-penal.

Nos crimes materiais ou de resultado só há uma consumação pelo menos formal, quando o resultado típico se tenha produzido. Enquanto
que nos crimes de mera actividade, ou nos crimes formais, como não há um resultado que se tenha que distinguir ou autonomizar da conduta
do agente, o tipo está consumado formalmente quando se verifica a actuação ou a conduta típica do agente. Mas por vezes, tem-se de
distinguir a responsabilidade penal do agente não por facto consumado, mas por actos preparatórios ou por factos tentados.

Quanto aos actos preparatórios eles são uma fase do “inter criminis”, em que normalmente é possível cindir e destacar várias etapas na
evolução do cometimento do crime:

⇒ Há normalmente a pessoa que tem uma intenção criminosa29[29];


⇒ Depois a pessoa passa efectivamente a procurar esse plano, que mentalmente concebeu e prática para efeito determinados actos que
são preparatórios à execução;
⇒ Passa depois aos actos de execução;
⇒ E finalmente, quando acaba os actos de execução, está perante a consumação.

Os actos preparatórios regra geral e por força do disposto no art. 21º CP, os actos preparatórios não são punidos. Só existe punição por
actos preparatórios quando a lei expressamente o disser; ou então o próprio legislador tipifica como crime autónomo actos que são actos de
preparação. Mas a regra geral é a da impunidade dos actos preparatórios e isto porque:

⇒ Em primeiro lugar, porque se tem no Código Penal um pendor objectivista da tentativa. O nosso direito é um Direito Penal de factos
exteriorizados; e o nosso legislador não valora da mesma maneira a intenção e a execução dessa intenção diferentemente.

A punibilidade da tentativa é muito menor do que a punibilidade por facto consumado, pois de harmonia com o que preceitua o art. 23º CP:

⇒ Em primeiro lugar a tentativa só é punida se ao crime consumado respectivo corresponder pena superior a três anos de prisão, a
não ser que a lei expressamente diga que a tentativa é punível.
⇒ Por outro lado, sendo ainda punível a tentativa, a pena é especialmente atenuada.

Só há tentativa, nos termos do art. 22º CP quando o agente passa dos actos preparatórios para os actos de execução. Então a tentativa é
virtualmente punível. Mas para isso o agente tem de empreender já actos de execução, tem de ter a decisão criminosa; e é preciso o
resultado típico não se produzir.

29[29] Que pode não exteriorizar, mas que está em plano.

António Manuel de Albuquerque Pereira – 2400030 – Turma 4N1 – 2007/08 – Direito 32

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