6 CULTURA & ARTE
Umuarama, domingo,18 de maio de 2008
O MEDO DAS LETRAS
Até onde pode chegar um país cuja população tem medo das letras e demais signos
da linguagem? Que por preguiça (ou medo) foge de simples textos como o diabo da
Dê-se a
cruz? Certamente a lugar nenhum ou, mais realisticamente, a algum lugar no passado.
Retrocederemos. É lastimável nos perceber andando na contramão da evolução
humana, dessa busca milenar por superação.
Ainda na pré-história, ao sentirem necessidade de comunicação, os hominídeos
começaram a ensaiar alguns grunhidos, que evoluíram para sons e feições mais
honra
desta dança.
distintas, que evoluíram para fonemas, palavras e assim por diante. Juntamente com
a evolução da linguagem falada e a necessidade de registro disso tudo, foi nascendo
e se desenvolvendo a linguagem escrita. O que era rabisco transformou-se em
gravuras, que se tornaram ideogramas, que moldaram as letras, que unidas formaram
alfabetos, palavras e, finalmente a base de toda a comunicação inteligente. Se
considerarmos que esse esforço em favor da civilidade ocorreu em vários lugares ao A dança vem expressando os nos-
redor do mundo, originando línguas e culturas diferentes, ficamos mais maravilhados sos sentimentos desde muito antes de
ainda, pois percebemos uma necessidade universal de que isso tudo existisse.
qualquer registro histórico da humani-
Pena que são poucos os que percebem essa necessidade e a importância da
linguagem em seu cotidiano. Grande parte das pessoas, além de não se importarem, dade. É uma forma de expressão pri-
estão começando a negar essa herança e mais, estão a destruí-la. Falaremos apenas mordial. Dançamos em rituais religio-
de Brasil pra não passar tanta vergonha. De acordo os vários estudos e avaliações sos, folclóricos, culturais ou apenas por
nacionais e internacionais de 2007, somos um pais no qual dois terços da população diversão, e também dançamos artisti-
de 12 a 45 anos são analfabetos funcionais, ou seja, pessoas que sabem reconhecer camente. Apesar da dança artística
palavras e o que elas significam isoladamente, entretanto não conseguem extrair o carregar uma natureza mais complexa
significado de um texto simples, como um anúncio. uma placa ou uma piada. Pra piorar, de significados, a dança em geral pode
temos a mesma porcentagem de gente que não consegue resolver um problema ser considerada como uma forma de
matemático onde constem duas ou mais operações simples (adição, subtração, divisão celebração da nossa condição huma-
e multiplicação), isso significa que 75% desse pessoal não consegue responder: na, do nosso corpo e nossa capacida-
“Quantas laranjas restam, depois de oito dias, em uma árvore que produz uma laranja
de de nos expressarmos através dele.
por dia, mas perde uma a cada dois dias?”
Pois é, se continuarmos nessa marcha, com o ensino fundamental ideologicamente Uma das principais artes cênicas,
equivocado que temos e a pouca ênfase na leitura como forma de prazer e não apenas ao lado do teatro e da música, a dança
como uma necessidade (o que sem dúvida é), precisaremos de mais algumas poucas se manifesta através de signos de mo-
gerações para termos 100% da população do país incapacitada de entender coisas
O Brasil em Cannes
simples como: “Não pise na grama”; “Cuidado, cão bravo”; “Perigo - Proibido Nadar”;
“Em caso de incêndio aperte o botão” ou até mesmo um simples recado como “Benzinho,
fui visitar sua mãe no hospital, coisa grave, me ligue”. Imagine como seria insuportável
viver num país onde os donos de empresas, administradores, porteiros, bombeiros,
professores, padres, pais, mães e filhos não consigam montar um móvel ou instalar um
eletrodoméstico por não entenderem o que diz o manual? Imagine então comandar um
país decentemente. Criado em 1946, o Festival de Can-
Deveríamos acabar com essa tradição nacional do atalho e gambiarras em geral, nes chega à sua 61ª edição em 2008.
que sempre tende a nivelar tudo e todos por baixo, ignorando a lei do merecimento O festival de cinema está sendo realiza-
e da qualidade. A honra ao mérito leva uma rasteira e é jogada na lama, desestimulando do desde o dia 14 de maio (quarta-feira)
quem se esforça, pois no fim das contas todos tem direito a tudo sem necessidade de na cidade de Cannes, na França e se
preparação alguma ou dever algum. É hora de parar de mascarar os dados estatísticos encerrará no dia 25 do mesmo mês
com paliativos irresponsáveis, como essas cotas criadas na educação. Deveríamos (domingo).
nos concentrar em acabar com o verdadeiro gerador destas estatísticas indecentes de O Brasil está sendo representado
uma forma responsável e definitiva. Fortalecendo a lei do esforço e merecimento por dois filmes na categoria principal:
criaríamos uma demanda real e qualificada para a educação do país, iniciando um ciclo “Blindness” (ainda sem nome em por-
virtuoso de qualificação da população, evitando a necessidade de se diminuir o nível
tuguês) de Fernando Meirelles e “Linha
do ensino para que ele acolha estudantes e educadores despreparados que só fazem
aumentar os problemas sociais. de Passe” de Walter Sales e Daniela
Chato, mas não existe mágica. Difícil? Não, demorado, mas precisamos de Thomas. Na categoria “Um Certo Olhar”,
medidas urgentes. Entretanto, antes de começar qualquer caminhada é bom uma das mais importantes do festival, o
colocar os pés no chão. filme “A Festa da Menina Morta”, de
Matheus Nachtergaele, em seu primei-
ro trabalho como diretor e roteirista de
Tiago Knoll Inforzato é músico e cinema, faz as vezes verde-amarelas.
escritor de Umuarama. Colaborador do E ficou por conta do filme de Meirelles
Zine “Culturanja” e deste jornal. a sessão de abertura desta edição do
tiago.inforzato@gmail.com / festival. “Blindness”, que em português
www.culturanja.blogspot.com significa “cegueira”, é uma adaptação do
romance “Ensaio Sobre a Cegueira”, do
português José Saramago, e conta a his-
CRÔNICA tória de uma misteriosa epidemia de ce-
gueira que se abate sobre uma cidade
moderna e anônima. No elenco tempos
estrelas do quilate de Julianne Moore,
Uma manhã Mark Ruffalo, Danny Glover e o mexicano
Gael García Bernal.
Independente, seja um você também!
Para ontem à noite foi programado
um evento interessante em Umuarama.
Duas bandas da cidade se apresenta-
ram no Kabuki Snooker Bar e tocaram
músicas de autoria própria. Interessante
porque em nossa região a criatividade e
o empreendendorismo estão em baixa.
Muito bom pois podemos sentir que algo
está mudando por aqui.
As bandas Nevilton de Joke Box,
ambas de Umuarama, são um exemplo
local de um movimento artístico nacio-
nal, o movimento indepentende. Mas o
que são eles? Simples, eles são uma
fatia dos artistas nacionais que não estão
vinculados a grandes empresas, como
renomadas gravadoras, redes de televi-
são, grandes editoras e demais empre-
sas de divulgação e promoção de arte.
Eles se autogerenciam e financiam.
E não é só no mundo da música que
podemos ver estes artistas independen-
tes. Temos escritores, cineastas, drama-
Acorda, abre os olhos. São dez horas da manhã. Instintivamente vem turgos, artistas plásticos e outros, de vários
o desconforto de acordar só. Entretanto, agradece aos céus por não ter segmentos, que produzem e vendem sua
mais aquele emprego besta de intermináveis oito horas diárias, bem arte por si só. Eles criaram um nicho de
sofridas, agüentando as ladainhas daquele chefe idiota. Era aliviante
respeitar seu relógio biológico, estava mais saudável do que nunca, uma
“saúde de ferro”, como lhe dizia o médico.
Sai da cama e ruma ao banheiro afim de tomar aquele banho matinal
para que possa ficar, definitivamente “em pé”. Com o sono afugentado,
Agenda
veste-se com seu robe e vai até a cozinha de seu pequeno apartamento.
DANÇA: (III Mostra Unipar de Dan-
Coloca a água na chaleira vermelha e a leva ao fogão. Enquanto a água
ça Contemporânea*)
ferve, separa o pó negro e cheiroso do café moído ainda ontem na feira do *Censura: 15 anos e entrada franca.
bairro e prepara para si um ovo mexido. Os ingressos serão distribuídos na entrada
A água fervida, passando pelo pó, emana o irresistível cheiro do café que principal da UNIPAR em Umuarama.
perfuma todo o ambiente. Alcança o patê de presunto na geladeira, passa ESPETÁCULOS: DIA 18, Pouco Aci-
num pão francês e junta o ovo mexido. “Isso sim que é um sanduíche” – ma, Cia. Suspensa (Belo Horizonte/
pensa. O café está pronto. Quebra seu jejum devagar, aprecia como os MG), 20h, Teatro Unipar. 19, Pouco
sabores do pão, do ovo e do patê se complementam sem se misturar e, a Acima, Cia. Suspensa (Belo Hori-
cada gole do café, sente seus neurônios mais despertos. “Bom dia vida” – zonte/MG), 20h, Teatro Unipar; Ou-
pensa novamente. tro Lugar, Focus Cia. de Dança (Rio
Terminado o ritual do despertar, volta ao closet. Veste-se casualmente de Janeiro/RJ), 21h, Campus 3 da
para sair de casa. Antes de sair, no caminho para a porta, retém-se na Unipar. 21, B-612 O Essencial é
estante de livros. Para. Olha para o porta-retratos que nela repousa. Acolhe Invisível aos Olhos, Focus Cia. de
o porta-retratos em suas mãos, o traz para perto do rosto e o beija Dança (Rio de Janeiro/RJ), 20h,
carinhosamente. Devolve-o. Sai de casa. Tranca a porta. E como em Teatro Unipar. 22, Carne Santa, Cia
todos os dias dos últimos 3 meses, pensa, esperançoso e melancólico, Borelli de Dança (São Paulo/SP). 23,
na pessoa com a qual, um dia, voltará a dividir o mesmo teto. Romeu e Julieta, Grupo Danç’art
vimento corporal, não necessari-
amente com música, mas estes
movimentos sempre são dotados de
ritmo, harmonia e demais caracterís-
ticas comuns às artes.
A evolução dos estilos de dança,
como em todas as manifestações artís-
ticas, foram reflexos dos momentos
históricos da humanidade, já que arte é
uma forma de exteriorização de senti-
mentos e anseios de uma população
ou grupo cultural. Do ritualismo das
danças tribais ao formalismo românti-
co do Ballet Clássico; passando pelo
questionamento da forma na dança
moderna e a inclusão de novos parâ-
metros de expressão, aliados à tecno-
O júri do festival, que decidirá os
ganhadores da Palma de Ouro deste
ano, é presidido pelo ator e diretor Sean
Penn e será integrado pelo ator, roteiris-
ta e cineasta mexicano Alfonso Cua-
rón, a atriz israelense Natalie Portman,
o ator, diretor e roteirista italiano Sergio
Castellitto, o cineasta francês Rachid
Bouchareb, a atriz alemã Alexandra
Maria Lara e o diretor tailandês Apicha-
tpong Weerasethakul.
Seminário de Cinema
em Umuarama
A parceria entre a Funcelt e os
Cursos de Comunicação Social e Psi-
cologia da Unipar rendeu mais um even-
to cultural na cidade: O Seminário de
festivais, mostras, feiras e vários outros
eventos que possam criar oportunidades
de negócio e divulgação, e nesses even-
tos trocam experiências e aumentam a
qualidade dos trabalhos que produzem.
Com a popularização dos progra-
mas de criação visual, de gravação de
áudio e com a popularização da inter-
net e outras mídias, o trabalho dos
artistas pode se propagar a distâncias
jamais imaginadas até mesmo pelos
mais otimistas. A banda Nevilon de
Umuarama, por exemplo, é ouvida por
pessoas da Europa, da América do
Norte e até mesmo do Japão, além de
já ter tocado em cidades como Brasí-
Umuarama, de 18 a 25 de Maio de 2008)
(Umuarama/PR), 20h, Centro Cultural
Schubert; Occo, Cia Marcella Reichelt
(Florianópolis/SC), 20h, SESC. 24, Meu
Corpo do Outro, Cia. Unipar de Dan-
ça (Umuarama/PR). 25, Decalque,
Ballet de Londrina (Londrina/PR), 20h,
Teatro da Unipar.
OFICINAS: 19, Cia. Suspensa (Belo
Horizonte/MG), 09h às 12h, Centro
Cultural Schubert; Focus Cia. de Dan-
ça (Rio de Janeiro/RJ), 9h às 12h, Espa-
ço Cultural Unipar. 22, O Corpo Como
Centro de Investigação, Cia. Borelli
de Dança (São Paulo/SP), 9h a 12h,
Espaço Cultural Unipar; Iniciação à
Dança, Ballet de Londrina, 13:30h às
16:30h, Espaço Cultural Unipar.
Música:
20, Banda Mr. Dick (Cascavel/PR)
Por Tiago Knoll Inforzato
logia, na dança contemporâ-
nea, a dança sempre se supe-
ra e surpreende.
Mas apesar de toda a
evolução e da criação de
estilos diferentes de dan-
çar, em todos eles a base
e motivo desta forma de arte tão interes-
sante foi mantida, que é a exploração
do corpo. E é a capacidade desse nos-
so instrumento tão peculiar e aparente-
mente limitado – e a dança prova bem
o contrário – na transmissão dos senti-
mentos e mensagens mais diversas,
sem o uso da palavra, que transforma a
dança numa forma de expressão artís-
tica peculiar e cheia de beleza.
Cinema, que se realizará em quatro
etapas mensais, no Centro Cultural
Schubert. E o melhor é que a proposta
do evento não é de apenas exibir filmes,
mas também de analisar e debater seus
temas e linguagens neles utilizadas.
A primeira destas etapas aconteceu
no dia 15 de maio (quinta-feira), com a
apresentação do filme Pequena Miss
Sunshine (Little Miss Sunshine, 2006),
ganhador de 2 Oscars e outros diversos
prêmios como o Independent Spirits
Awards, dos diretores americanos Jona-
than Dayton e Valerie Faris. A história é
de uma família norte-americana que
viaja, em uma velha Kombi amarela, do
Novo México à Califórnia para que sua
filha participe de um concurso de beleza
infantil. Cada um da família tem uma
personalidade distinta e ao conviverem
num espaço tão pequeno cria-se diver-
sas situações de choque que provocam
reflexões sobre diversidade, relaciona-
mentos e seus limites.
O seminário de cinema tem entra-
da franca, com início marcado para as
20h e será realizado no Centro Cultural
Schubert, em Umuarama. Acompanhe
a Agenda Cultural para não perder as
próximas exibições e debates.
lia, Curitiba e Goiânia, em eventos
organizados pelas próprias bandas
destas cidades. Um artista plástico de
qualquer cidade, do interior de qual-
quer estado, pode vender sua obra
para qualquer acervo de grandes me-
trópoles culturalmente mais robustas,
ou até mesmo expor seus trabalho em
sites da internet. Um escritor pode pu-
blicar livros eletrônicos ou de papel
sem precisar esperar a boa vontade
das grandes editoras. Mas o mais inte-
ressante é que todo esse material pode
ser comercializado, gerando renda ao
criador da obra. O grande desafio então
é atingir o público, cada vez mais seg-
mentado e com cada vez mais opção de
escolha e acesso a novas tendências.
Enfim, o evento deste sábado 17, é
apenas a ponta do iceberg. São as
forças indepententes que estão atin-
gindo este rincão distante que é Umu-
arama e certamente ainda veremos
muita coisa boa acontecendo, é só
exercitar sua independência e se infor-
mar para não perder o bonde.
[Pop Rock], 24h, By Night. 21, Banda
Thiaveya (Curitiba/PR) [Pop Rock],
24h, Stone; Carlinhos (Umuarama/
PR) [MPB, Pop Rock], 21h, Ilha do
Chopp. 22, Ton e Lu (Umuarama/
Pr) [MPB, Bossa Nova], 21h às 23h,
Tio Salin. 23, Tidão (Umuarama/
PR) [MPB, Pop], 21h, Ilha do Chopp.
Cinema:
16 a 22 no Cine Vip, Super-
Heroi : O Filme [Comédia, Dubla-
do], 18h; O Caçador de Pipas [Dra-
ma, Legendado], 19:30h; Olhos do
Mal [Terror, Legendado], 21:30h,
R$ 10,00 (estudantes R$ 5,00).
Especiais:
21, Sarau da Funcelt [Dança,
Música, Teatro e Literatura], 21h, Cen-
tro Cultural Schubert, entrada franca.