Walzer, Alasdair MacIntyre, Charles Taylor; • Crítica ao individualismo liberal e a neutralidade do Estado: para os Comunitaristas, os liberais interpretam de modo errôneo a capacidade de autodeterminação dos indivíduos e negligenciam as precondições sociais sob as quais esta capacidade pode ser exercida significativamente; • Para os liberais, o valor da autodeterminação é tão evidente que não necessita de qualquer defesa; permitir que as pessoas tenham autodeterminação é a única maneira de respeitá- las como seres plenamente morais (em outras palavras, negar para uma pessoa sua capacidade de autodeterminação é tratá-la antes como uma criança ou como animal do que membro pleno da comunidade); • Para os comunitaristas, o problema é que muitas pessoas não estão bem equipadas (não possuem capacidade de autodeterminação plena ou racionalidade) para lidar com decisões difíceis da vida) para bem tomarem decisões: devemos deixá-las por conta própria? • Por que os liberais defendem tão fortemente a importância da autodeterminação? • Autodeterminação envolve, primeiramente, o que fazer com nossas vidas; em um âmbito geral, todos nós temos o objetivo e queremos ter uma vida boa, ter coisas que uma vida boa contém; • Por isso, a necessidade de deliberarmos bem sobre nossos objetivos e escolhas; deliberar é saber o que vai acontecer (resultado) de nossas ações; é um procedimento de minimização do erro; • A deliberação não assume apenas a forma de perguntar qual curso de ação maximiza um valor específico que é sustentado sem questionamento; ela também questiona se o valor realmente vale a pena ser buscado; • “Como pessoas livres, os cidadãos reconhecem-se mutuamente como possuidores do poder moral de ter uma concepção de bem. Isso significa que eles não se veem como inevitavelmente ligados à busca da concepção específica de bem e de seus objetivos finais que abraçam em qualquer tempo dado”[...]. • [...] “Em vez disso, como cidadãos, são considerados, em geral, como capazes de rever e mudar esta concepção com base em fundamentos razoáveis e racionais. Assim, é considerado permissível os cidadãos separarem- se das concepções de bem e fazerem o levantamento e a avaliação de seus objetivos finais” (RAWLS); • Portanto, é importante, para nós, que não conduzamos nossa vida em falsas crenças a respeito do valor de nossas atividades; • A nossa concepção de bem – o nosso próprio bem – está ligada de maneiras importantes às práticas culturais que compartilhamos com os outros em nossa comunidade específica; • Por que os liberais se opõem ao paternalismo estatal? • 1) Porque, para eles, nenhuma vida será melhor por ser vivida exteriormente, segundo valores que a pessoa não endossa; • 2) minha vida só será melhor se eu estiver conduzindo interiormente, segundo minhas crenças a respeito do valor; • Portanto, temos duas precondições para a concretização de nosso interesse essencial de conduzir uma vida que seja boa: • 1) que conduzamos nossa vida do interior, em conformidade com nossas crenças a respeito do que dá valor à vida; • 2) que sejamos livres para questionar estas crenças, para examiná-las à luz de quaisquer informações, exemplos e argumentos que nossa cultura possa nos proporcionar • Preocupação liberal tradicional com as liberdades civis e pessoais: os indivíduos devem ter condições culturais necessárias para adquirir uma consciência das diferentes visões a respeito da boa vida e a capacidade de avaliar essas condições com inteligência; • Preocupação liberal com a educação, a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, a liberdade artística: todas essas liberdades nos capacitam a julgar o que é valioso na vida da única maneira que podemos julgar tais coisas – isto é, explorando diferentes aspectos de nossa herança cultural compartilhada; • A descrição do valor da autodeterminação forma a base do princípio da liberdade de John Rawls: a liberdade de escolha é necessária justamente para que encontremos o que é valioso na vida – formar, examinar e rever nossas crenças sobre o valor; • A autodeterminação deve nos levar a endossar um “Estado neutro” – i.é, um Estado que não justifica suas ações com base na superioridade ou inferioridade intrínseca de concepções de boa vida e que não tente deliberadamente influenciar os juízos de valor das pessoas sobre essas diferentes concepções (Rawls); • Nossos interesses essenciais são prejudicados por tentativas de impor às pessoas uma visão específica de vida boa; como a vida tem de ser conduzida do interior, o interesse essencial de uma pessoa em levar uma vida que seja boa não é promovido quando a sociedade discrimina ou penaliza os projetos de uma pessoa que, ao refletir, ela sente serem os mais valiosos para si (Rawls); O comunitarismo e o bem comum • Os comunitaristas opõem-se ao Estado Neutro – essa ideia deve ser abandonada por uma “política do bem comum” (M. Sandel); • No comunitarismo, o bem comum é concebido como uma concepção substantiva da boa vida que define o “modo de vida” da comunidade; • Esse bem comum (próprio do Estado comunitarista), ao invés de ajustar-se ao padrão das preferências das pessoas (como no Estado liberal), (I) afirma que o modo de vida da comunidade forma a base para um hierarquização pública do bem; e (II) o peso dado às preferências de um indivíduo depende do quanto ele se conforma com o bem comum ou em que medida contribui para este; • Dessa forma, 1) a busca pública dos objetivos compartilhados, que definem o modo de vida da comunidade, não deve ser limitados pela exigência da neutralidade; • 2) a busca pública dos objetivos compartilhados tem preferência sobre o direito dos indivíduos aos recursos e liberdades necessários para que busquem suas próprias concepções de bem; • Portanto, o Estado comunitário pode e deve encorajar as pessoas a adotar concepções de bem que se ajustem ao modo de vida da comunidade, ao mesmo tempo em que desencoraja concepções do bem que entram em conflito com aquelas; • O Estado comunitário é um Estado perfeccionista: envolve uma hierarquização pública do valor de diferentes modos de vida; essa hierarquização se faz em conformidade com as práticas existentes; • Os liberais dizem que a neutralidade do Estado é exigida para que seja respeitada a autodeterminação das pessoas; • Os comunitaristas opõem-se tanto à ideia liberal de autodeterminação quanto à suposta ligação entre autodeterminação e neutralidade. • A crítica da “imagem do homem” liberal - o Eu desonerado (ou o “Eu desvinculado”) • Na visão liberal do eu, os indivíduos são considerados livres para questionar sua participação nas práticas sociais existentes (econômicas, religiosas, sexuais ou recreativas), já que são livres para questionar sua participação em práticas existentes ou para sair delas se acreditam que não valem mais a pena – o eu é anterior aos fins que são afirmados por ele (isto é, o eu é anterior as práticas sociais de uma comunidade). • Essa ideia de que o eu é anterior aos seus papéis e relações socialmente dados e de que é livre somente se for capaz de distanciar-se destas características de sua situação social e julgá-las (deliberar) segundo os ditames da razão foi desenvolvida na modernidade por Kant – Texto O que é o Esclarecimento?
• Crítica ao atomismo liberal: o “eu” é um produto
abstrato artificial de uma teoria que se empenha na defesa dos direitos individuais e, para esse fim, coloca o indivíduo autônomo como seu cerne normativo; o atomismo representa uma visão sobre a natureza e a condição humana que torna plausível uma doutrina da primazia dos direitos. • Os comunitaristas afirmam que a visão liberal do eu é equivocada, uma vez que o eu (indivíduo) está “inserido” ou “situado” nas práticas sociais existentes, que nem sempre podemos recuar ou sair delas; • Teoria da justiça como equidade – o atomismo individual – as principais objeções estariam ligadas a ideia central da TJ: “posição original”: as pessoas chegariam a um acordo (princípios da justiça) ignorando suas capacidades e fraquezas, nem sua posição social nessa sociedade, de modo que pudessem escolher qual forma de distribuição dos “bens sociais básicos” (direitos e liberdades fundamentais, oportunidades sociais, renda e riqueza, as bases sociais do autorrespeito) é mais apropriada (justa); • Para os teóricos comunitaristas, nossos papéis e relações sociais devem ser considerados como dados para fins de deliberação; • Para Alasdair MacIntyre (Depois da Virtude; Justiça de quem? Qual Racionalidade?), no momento em que decidimos como conduzir nossas vidas, “todos devemos abordar nossas circunstâncias como portadores de uma identidade social específica – portanto, o que é o bem para mim tem de ser o bem para uma pessoa que habite estes papéis. • A autodeterminação, na visão comunitarista, é exercida antes dentro desses papéis sociais do que fora deles – dentro das práticas sociais, culturais, políticas e econômicas de uma determinada comunidade; • O Estado, portanto, deve encorajar os indivíduos a estabelecerem compreensões mais profundas destes papéis sociais – práticas sociais; • Os comunitaristas possuem três argumentos contra a descrição liberal do eu e seus fins: 1) a visão liberal do eu é vazia; 2) viola nossa percepção do eu; e 3) ignora nossa inserção nas práticas comunais. • 1º A visão liberal do eu é vazia: • Charles Taylor: questionar todos os nossos papéis sociais é uma condição que derrota a si mesma = a liberdade (liberal) completa seria um vácuo no qual nada valeria a pena ser feito, nada mereceria ser considerado para coisa nenhuma; • A verdadeira liberdade deve ser situada; os valores comunais (da comunidade) são “horizontes providos de autoridade”; • O ponto principal de desavença entre comunitaristas (como Ch. Taylor) e liberais é o seguinte: • Para os liberais, a liberdade de escolher nossos projetos é inerentemente valiosa, algo a ser buscado por si mesmo; a defesa liberal da liberdade encontra-se justamente na importância desses projetos; • Para os comunitaristas, os liberais não dizem que devemos ter a liberdade de selecionar nossos projetos de vida por si mesmos porque a liberdade é a coisa mais valiosa do mundo. • Dessa forma, os liberais dizem que nossos projetos e tarefas são as coisas mais importantes em nossas vidas e é porque são importantes que devemos ser livres para revê-las se percebermos que não valem a pena; a liberdade de escolha não é buscada por si só, mas como uma precondição para a busca de projetos que são valorizados por si sós. • Duas críticas principais: • a) dizer que a liberdade de escolha é intrinsecamente valiosa sugere que quanto mais exercemos nossa capacidade de escolha, mais livres somos e, portanto, mais valiosas são as nossas vidas; • Porém, a vida valiosa é uma vida cheia de compromissos e relações; estas dão profundidade e personalidade a nossas vidas; e o que os torna compromissos é o fato de que não são o tipo de coisa que questionamos todos os dias; • Exemplo do casamento: uma pessoa que se casa 20 vezes não necessariamente tem uma vida mais valiosa (boa) do que uma pessoa que se casa 1 única vez; • b) dizer que a liberdade de escolha é intrinsecamente valiosa sugere que o valor que buscamos em nossas ações é a liberdade, não o valor inerente à atividade em si; • Portanto, para compreender o valor que as pessoas veem em seus projetos de vida, temos que prestar atenção para os fins interiores dela; a liberdade é valiosa porque me permite colocar em prática esses fins; • p.270.